Discurso durante a 92ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PROTESTOS CONTRA AS CRITICAS GENERALIZADAS AO PARLAMENTO BRASILEIRO.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • PROTESTOS CONTRA AS CRITICAS GENERALIZADAS AO PARLAMENTO BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2001 - Página 16517
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • APOIO, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, RESTRIÇÃO, IMUNIDADE PARLAMENTAR.
  • APREENSÃO, INFERIORIDADE, REPUTAÇÃO, SENADO, NECESSIDADE, PROVIDENCIA, MESA DIRETORA, RECUPERAÇÃO, RESPEITO, GARANTIA, DEMOCRACIA, PAIS.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na Assembléia Nacional Constituinte - alguns que aqui se encontram dela fizeram parte -, houve um trabalho intenso no sentido de que se disciplinassem os problemas de inviolabilidade e da imunidade parlamentar.

Os que defendiam que essa imunidade não deveria passar da porta do Parlamento, que apenas ficasse cingida às opiniões, palavras e votos, fomos derrotados. Alguns, àquela altura, já tinham buscado o mandato não para dele obter a imunidade, mas para ficar no terreno da impunidade. E o que é mais grave é que isso foi aprovado, e os que tinham contra si pedidos de licença para abertura de processos se viram acobertados por esse manto.

            Passada a Assembléia Nacional Constituinte, com o correr do tempo, aqui no Senado, há três ou quatro anos, apresentei uma emenda constitucional muito simples, até singela, dizendo que a imunidade se restringia exatamente às opiniões, palavras e votos do Parlamentar. E declarava que, nos crimes comuns ou com eles considerados conexos, os Parlamentares não estariam à salvo pela imunidade, uma vez que se tratava de crime comum. Dessa forma, deveria quem tivesse cometido a infração penal a ela se submeter, independentemente da licença desta Casa.

Essa emenda foi fundida com outras, e nós a aprovamos. Foi enviada à Câmara dos Deputados, e, agora, Sr. Presidente, o que se nota, em toda a imprensa, é que o Senado é tido como uma Casa cuja vidraça precisa ser estilhaçada a toda hora.

A honra, a dignidade, a postura dos Senadores está toda ela nivelada ao que há de pior. Dizem, inclusive, que há Colegas que nem se identificam como Senador, pela frase que corre por aí: que esta é uma Casa que os palhaços não querem com ela sequer ser assemelhados, que aqui se cometem os piores crimes. E todos os Senadores - aquilo que no passado dizia, salvo exceções honrosas - são colocados no mesmo plano.

Quero dizer à Casa que tenho honra e orgulho em ser Senador. Em nenhum instante me passa pela cabeça que esta Casa é situada apenas como um covil de tudo aquilo que não presta.

Custou-me muito chegar até aqui, desde os bancos acadêmicos, desde uma vida pública, para que, de uma hora para outra, não se façam as exceções e se enxovalhem o Parlamento, que é a Casa de ressonância do povo, onde vêm desaguar todos os clamores populares, para dizer ao povo que não merecemos o seu julgamento afetivo nem efetivo.

E quando vêm as pesquisas, alguns órgãos procuram situar este em primeiro, este em segundo, este em terceiro, como se o Parlamento fosse um valhacouto.

É preciso que o Senado reaja!

Lembro-me, Sr. Presidente, quando jovem estudante de Direito, de um poema de Bertold Brecht: um cidadão estava sentado em um banco de uma praça, e passou um policial espancando um negro. Ele teve ímpetos de se levantar, de protestar contra aquele espancamento, mas, no mesmo instante, raciocinou: não sou negro, não tenho nada a ver com isso. No domingo seguinte, na mesma praça, em igual banco, passava um bêbado sendo espancado por um policial. Ele próprio teve vontade de levantar-se e protestar, mas, ao mesmo tempo, raciocinou: não sou bêbado, não bebo, por que vou protestar? No domingo seguinte, Sr. Presidente, ele mesmo foi preso e balbuciou as seguintes palavras: “É tarde demais agora para eu protestar”.

Espero que o Senado tome uma providência pela Mesa. As coisas estão tomando um tal vulto, que me parece que uma avalanche a todos acabará levando à vala comum, e nenhum Senador, por mais respeito que goze do seu povo, do seu Estado, receberá o respeito que merece, porque, uma vez que nós próprios estamos permitindo que sejamos desrespeitados, lá fora o exemplo se seguirá.

Lamento, Sr. Presidente, que não possa dispor de um tempo para abordar, da tribuna, em termos jurídicos, o que é a imunidade parlamentar. Tenho um parecer feito há mais de vinte anos no Instituto dos Advogados Brasileiros que vou desencavar do meu arquivo para trazer à tribuna do Senado, porque não mais é possível que se enxovalhe toda uma Mesa, de ponta a ponta, como se nela não existisse nenhum homem sério, que se estenda isso para o Plenário do Senado e fiquemos absolutamente eqüidistantes, senão indiferentes, ao que se passa.

É como se aquele cidadão estivesse sentado no banco da praça - quero dizer que a praça aqui é a praça da moralidade - e nenhum de nós tivesse coragem de protestar. Precisamos dar um basta nisso. O Parlamento é uma das coisas que mais deve ser amada pelo povo. Parlamento fechado é sinônimo de que se pôs uma tábua, uma placa à sua porta, dizendo que a ditadura reina neste País.

Ora, Sr. Presidente, aqui não existe uma ditadura no sentido típico do termo, e, etimologicamente, nem se precisa lembrar o que vale uma ditadura. Sabe V. Exª que, como Deputado Federal, fui cassado pelo AI-5, quando perdi dez anos dos direitos políticos e o meu lugar de professor na Faculdade de Direito, não para ver o Parlamento hoje abastardado. Se dei a minha contribuição foi para que ele florescesse mais, como algumas raízes que, quando são cortadas, brotam mais fortes. O Parlamento - sobretudo, o Senado Federal - está permitindo que se desloque o eixo que era nosso para uma outra Casa, a qual merece todos nossos elogios, mas que não pode lançar ética para dizer que o Senado não a possui.

Peço a V. Exª, como um dos mais simples e humildes integrantes desta Casa, que a Mesa faça o que tem feito, ou seja, reunir-se - porque tenho conhecimento disso - para encontrar uma saída à altura do Senado Federal e não mais para permitir o nosso silêncio - e aqui devo dizer que o silêncio é o clamor de tudo aquilo que não fala -, não mais para permitir que quedemos indiferentes, eqüidistantes, como se fosse possível emascular uma Casa inteira.

Sr. Presidente, que estes cinco minutos possam se transformar em uma reflexão ao povo brasileiro! Que o povo sinta que precisa amar o seu Parlamento, distinguir os que são bons no Congresso Nacional e punir os que são maus, com a eleição que se avizinha! Que, sobretudo, o povo sinta que Parlamento sem funcionar é Parlamento abstrato, morto, e tudo o que se diga “não”, o que é um subproduto terrível que não pode continuar.

Tenho convicção de que a Mesa continuará se reunindo e dará uma resposta ao povo. E, se não der a resposta política, que dê a resposta jurídica! Os Tribunais precisam ser convocados, para que se não enlameie, da forma como está acontecendo, o Congresso Nacional, em particular o Senado Federal.

Agradeço a V. Exª pela atenção dispensada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2001 - Página 16517