Discurso durante a 98ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE A AJUDA DO FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL - FMI A ARGENTINA.

Autor
Roberto Saturnino (PSB - Partido Socialista Brasileiro/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • COMENTARIOS SOBRE A AJUDA DO FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL - FMI A ARGENTINA.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/2001 - Página 18201
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, AUXILIO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, RECURSOS, COMBATE, CRISE, ECONOMIA, CURTO PRAZO, TROCA, EXIGENCIA, ESFORÇO, POPULAÇÃO, ANALISE, EFEITO, BRASIL.
  • REGISTRO, TENTATIVA, GOVERNO ESTRANGEIRO, ACORDO, INTEGRAÇÃO, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), LOBBY, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA).
  • DEFESA, POLITICA EXTERNA, BRASIL, LOBBY, INDEPENDENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, REFORÇO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).

O SR. ROBERTO SATURNINO (PSB - RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Argentina finalmente recebeu a sua ajuda, dimensionada para evitar o colapso a curto prazo, dentro daquilo que já era esperado internacionalmente. Ainda não se conhecem em detalhes as condições dessa nova intervenção do Fundo Monetário, mas parece que há exigências muito pesadas, como arrochos fiscais sobre as Províncias, e os governadores estão inquietos e revoltados. O fato é que ainda não se conhecem na inteireza essas condições negociadas com o Fundo Monetário Internacional.

O que todos sabemos - nós, os argentinos, o mundo inteiro - é que essa ajuda, que, como sempre, veio gotejante, é feita para evitar um colapso a curto prazo, mas não para resolver o problema econômico, especialmente cambial, em que a Argentina se encontra. Todos sabem que a questão está no câmbio, e que, para manter o câmbio rígido, praticamente dolarizado, não tendo, na sua economia, produtividade comparável à dos países mais ricos do mundo, a Argentina está condenada a ter déficit perene em seu balanço de pagamentos e tender sempre para a insolvência. Então, todos sabem que essa é a grande expectativa do mercado internacional.

O que não se sabe, Sr. Presidente, é a respeito da negociação de aspectos particulares que ainda não vieram a lume, mas que estão implícitos nas declarações do Ministro Cavallo e do Vice-Ministro Daniel Marx. Isso não está no noticiário, mas a demora, a angústia e o aperto infligidos aos argentinos tiveram um propósito que é um recado: “Não haverá mais acordo desse tipo com a Argentina. A situação tornou-se inviável. Estamos concedendo essa ajuda para evitar o colapso, porém a Argentina agora terá que tomar decisões mais drásticas”.

O caminho apontado pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Tesouro americano é o da integração da economia argentina com a economia americana, ou seja, é no sentido de a Argentina ser a pioneira de um acordo interamericano de uma área de livre comércio. É a integração que o Governo Bush quer. Para isso, ele vai utilizar-se da fraqueza Argentina, da sua dependência e inviabilidade para, indiretamente, pressionar o Brasil e obter também do nosso País a aquiescência para a participação na Alca. A Argentina será obrigada a pressionar o Brasil a integrar o Mercosul à economia americana. Esse é o objetivo da gestão do Presidente George Bush.

Diante dessa inviabilidade, a Argentina terá que tomar uma decisão: ou o Governo de la Rúa desvaloriza o peso e, por conseguinte, desdolariza-se também e dá o grito de independência - e todos sabemos da sua dificuldade em tomar essa decisão, porque isso poderia levar o seu país a uma quebradeira, tal o estado de endividamento das empresas argentinas em dólar, e o que é muito difícil também pelas suas fracas condições políticas, pois se trata de um governo que se dobrou, que já concedeu o que não podia politicamente -, ou, então, acaba cedendo totalmente e integra-se economicamente aos Estados Unidos.

Nessa operação, evidentemente haverá conseqüências muito graves para o Brasil. É esse o aspecto que quero ressaltar aqui. O Brasil, até agora, tem ajudado a Argentina, com a concordância da opinião pública nacional. Todos sabemos da importância fundamental da integração do Brasil com a Argentina como início de uma integração do continente sul-americano. A nossa indústria tem feito certos sacrifícios para favorecer essa integração. Porém, em um momento grave como este, diante da situação de encurralamento em que o país irmão está colocado, o Brasil também tem que desenvolver um outro tipo de política e exercer a sua pressão para levar a Argentina a rejeitar a pressão americana e a integrar-se mais ao Brasil. Vamos inclusive estudar e preparar, em prazo razoável, o estabelecimento de uma moeda comum.

Devemos aproveitar todo o impulso já dado ao Mercosul para atingir metas mais avançadas e impedir a entrega da Argentina aos Estados Unidos da América, o que significaria o fim do Mercosul e o início de um processo muito mais rigoroso de integração de toda a América na Alca.

É claro que o Brasil pode rejeitar a proposta. O Brasil tem condição de subsistir como Nação, dada a sua dimensão e o potencial do seu mercado interno. O Brasil pode resistir a isso e deverá fazê-lo, acredito, porque esse é o grande desejo da opinião pública brasileira. Porém, é preciso reconhecer a gravidade da questão, como ela se apresenta diante da explícita pressão americana pela integração, e o que o Brasil pode e deve fazer, aproveitando o seu relacionamento com a Argentina, para impedir que o país irmão se entregue totalmente e para que ele realize conosco a integração. Devemos buscar a ajuda de outras nações, buscar fórmulas, enfim, para aprofundar o Mercosul.

Tudo isso, Sr. Presidente, está-se passando num cenário internacional que, por outro lado, é altamente desanimador. O Federal Reserve, o Banco Central americano, mais uma vez, baixou a taxa de juros para 3,5% - o ponto mais baixo dos últimos anos -, denunciando que a economia americana continua em declínio, prognosticando uma recessão mundial. O Japão já desceu a taxa de juros a zero e não consegue reativar a sua economia. Enfim, o cenário internacional é desfavorável e desanimador.

Essa nova configuração da situação argentina deve nos preocupar muito mais. O Governo brasileiro deve evidentemente mudar a sua orientação, porque ele continua insistindo nas privatizações, a exemplo do escândalo do Paraná; continua tratando a questão do superávit primário com o mesmo rigor e, por último, quer conceder esse ridículo aumento para os servidores públicos.

É preciso que o Congresso Nacional tome a iniciativa de fazer mudanças que o Governo não mostra disposição para fazer, porque o cenário mudou, agravou-se internacional e regionalmente com a pressão que a Argentina está sofrendo. Aquele país será levado, muito provavelmente, a uma rendição que atingirá o Brasil e que trará conseqüências muito negativas para o nosso País. Essa é que é a verdade!

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/2001 - Página 18201