Discurso durante a 98ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

APELO AOS SENADORES NO ENGAJAMENTO PARA QUE AS PALAVRAS "DESENVOLVIMENTO" E "BEM-ESTAR SOCIAL" VOLTEM A INFLUENCIAR AS AUTORIDADES BRASILEIRAS.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • APELO AOS SENADORES NO ENGAJAMENTO PARA QUE AS PALAVRAS "DESENVOLVIMENTO" E "BEM-ESTAR SOCIAL" VOLTEM A INFLUENCIAR AS AUTORIDADES BRASILEIRAS.
Aparteantes
Amir Lando, Casildo Maldaner, José Alencar, Ney Suassuna.
Publicação
Republicação no DSF de 29/08/2001 - Página 18712
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, BEM ESTAR SOCIAL, AUMENTO, DEPENDENCIA, PAIS, DESNACIONALIZAÇÃO, ECONOMIA, FALTA, PLANEJAMENTO, POLITICA ENERGETICA.
  • CRITICA, MODELO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, AMEAÇA, FALENCIA, BRASIL, SEMELHANÇA, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito embora a nossa língua portuguesa ainda não tenha extinto as palavras - que constam, aliás, dos nossos dicionários - “desenvolvimento” e “bem-estar social”, temos certeza absoluta que, pelo comportamento do Governo Federal desde os idos de 1995, “desenvolvimento” e “bem-estar social” já deveriam ter sido abolidos do nosso vernáculo. Hoje, prevalecem outras palavras que anotei em um pequeno glossário, do qual não farei comentários porque já são conhecidas do povo brasileiro, das Srªs e Srs. Senadores. Tal a sua repetição, que chegamos a pensar que “desenvolvimento” e “bem-estar social” são coisas do passado. Hoje, como eu disse, o que o Governo prescreve é o seguinte: receituário do FMI, privatização das estatais, superávit fiscal, pagamento da dívida, racionamento de energia, confiança do mercado, equilíbrio das contas externas, empréstimo ponte, demissão voluntária de servidores, economia dolarizada, dólar flutuante, mercado financeiro, blindagem financeira - essa é uma última expressão criada para evitar o contágio do que está acontecendo na Argentina, esse empréstimo que o Brasil tomou ao FMI que se chama blindagem financeira -, enxugamento da folha, disciplina fiscal, economia globalizada, congelamento de salários e, por último, aumento aos servidores de 3,5% porque não dá mais - apesar de ser essa uma decisão tomada por causa do Supremo Tribunal Federal.

Sr. Presidente, apesar de todo esse glossário que surgiu ao longo do tempo durante o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que significou antes de tudo pobreza para o Brasil, aumento do desemprego, que significou o surgimento de várias crises sucessivas obrigando o Brasil a tomar mais dinheiro emprestado ao FMI para cumprir o seu receituário; apesar de tudo isso, Sr. Presidente, conforme dados divulgados pelo próprio Banco Central, na Internet e nos jornais, o grau de dependência do Brasil aumentou assustadoramente entre os anos de 1995 e 2000 e continua aumentando no ano de 2001, é claro! Dos onze indicadores apontados e estudados pelo Banco Central, pelo menos dez pioraram de 1995 para cá. Os números indicam que de 1995 a 2000 o País passou a gastar mais com a sua dívida externa, porque os gastos saltaram - repare bem - de 3% do PIB, em 1995, para 9,4% no ano de 2000, crescimento assustador, que compromete o futuro de nossas gerações. A dívida externa líquida, que é tudo que o País deve no exterior menos as suas reservas em dólar, cresceu 18,8%, pois passou - a dívida externa líquida - de 22,6%, no ano de 1995, para 39,6% do PIB, no ano de 2000. Esse é um aumento considerável, porque antes era 22,6% e, agora, passou para 39,6% no ano de 2000.

A Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e de Globalização Econômica, a Sobeet, por intermédio de seu Presidente, Antônio Correia de Lacerda, afirma o seguinte: “O aumento da dependência é fruto da desnacionalização da economia e do câmbio fixo até o ano de 1999.” Ele acrescenta a seguinte informação: “O passivo externo líquido, que é o volume de dinheiro que os estrangeiros aplicam aqui menos o que os brasileiros investem ou emprestam no exterior, passou de US$195 bilhões em 1995 para US$355 bilhões no ano de 2000. A previsão é a de que até dezembro de 2001 esse passivo externo líquido atinja a casa de US$382 bilhões.

Esse modelo que está sendo utilizado pelo mundo subdesenvolvido para equilibrar as suas contas não apenas é falido, mas também está falindo as nações que se engajaram nesse processo.

A prova está na crise argentina, que é o demonstrativo mais eloqüente, mais claro de que a utilizada política de sucateamento das empresas nacionais, de venda de nossos ativos, de congelamento de salários, de perda de competitividade das nossas empresas, é desastrosa. Ela levou a Argentina à débâcle e, mais cedo ou mais tarde, infelizmente - não desejo isso para o nosso País -, poderá levar o Brasil à mesma situação.

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) - V. Exª concede-me um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Concedo o aparte ao nobre Senador Amir Lando.

O Sr. Amir Lando (PMDB - RO) - V. Exª, nobre Senador, mais uma vez, mostra o seu interesse e a sua devoção ao Brasil. A pátria é algo sagrado. Não há coisa mais agrada do que o amor à pátria. E aqui V. Exª, com todo o conhecimento, perspicácia e conteúdo profundo que traz à tona, mostra que é hora de pensar na maneira de buscar soluções para evitar que o Brasil, amanhã, esteja na situação da Argentina, que hoje é uma caixa vazia. Os argentinos são estranhos no próprio país; hoje eles nada têm de seu, nem mesmo o petróleo lhes pertence. Todas as concessões das estradas e dos serviços públicos foram feitas às multinacionais, que não têm nenhum compromisso com a nação argentina, nem com o povo argentino. Do sistema bancário nem se fala. É o desespero de uma terra sem esperança, de uma terra sem um projeto nacional. Talvez fosse mais fácil para a Argentina hoje ser um Estado americano; assim, renunciaria em definitivo à soberania que já não lhe pertence. Essa é uma afirmação drástica que faço, porque entendo que não há saída, pois um Estado que perde a própria moeda, o próprio símbolo da nacionalidade, realmente não tem perspectiva de autonomia, de independência, nem de coisa alguma. Ao saudar V. Exª pelo brilhante discurso, gostaria de dizer que temos de prevenir para que isso não aconteça no Brasil. Vamos resistir! E resistiremos com certeza. Estaremos sempre presentes deste lado da trincheira, a favor do Brasil. Parabéns a V. Exª. Peço ao Presidente que registre a minha presença, já que, por ter um compromisso na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização, não participei das votações. Obrigado.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Senador Amir Lando, agradeço a V. Exª o substancioso aparte que incorporo ao meu discurso. Devemos ser otimistas. Se não me engano, era o Presidente Juscelino Kubitschek que afirmava que até se pode errar em sendo otimista, mas o pessimista já começa errando. V. Exª é um exemplo de homem público atualizado. V. Exª, que tem uma atuação marcante e independente nesta Casa - como todos sabemos -, reconhece que não podemos conduzir o Brasil para o caos; pelo contrário, é melhor prevenir do que remediar.

Apesar de militar na Oposição, no PSB, temos lembrado ao Governo Federal o perigo que representa essa política de venda de nossas empresas e de enfraquecimento da nossa economia. Enquanto nos Estados Unidos os juros estão baixando - chegaram hoje ao patamar mais baixo dos últimos anos: 3,5% -, no Brasil, o Ministro da Fazenda insiste em aumentar os juros para 19% ao ano.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Eminente Senador Antonio Carlos Valadares, pedi este aparte para levar-lhe o meu abraço de congratulações pela abordagem desse tema. O Brasil realmente precisa voltar a trabalhar e a crescer, porque, dessa maneira, a própria dívida externa não será servida, e o País poderá entrar em situação de insolvência. Portanto, mesmo aqueles que são rigorosamente contra qualquer tipo de renegociação acabarão tendo que fazê-la. O passivo externo líquido, hoje, atinge cerca de 80% do PIB. V. Exª tem razão ao dizer que devemos fechar o ano de 2001 com um número que se aproxima dos US$400 bilhões. Hoje o nosso PIB é estimado em R$1,2 trilhão e a taxa cambial é de aproximadamente US$2,55, isso significa que o nosso PIB - que é obviamente medido em dólares - está em torno de US$490 bilhões. Um passivo externo líquido de US$380 bilhões, estimado para o final do ano, significa mesmo 80% do PIB, o que é realmente aterrador, porque a parcela do passivo externo líquido representada por investimentos diretos demanda mais divisas do que a parcela representada por dívida externa, porque os investimentos diretos obviamente exigem remuneração superior às taxas de juros. Desse modo, estamos realmente caminhando para uma situação muito difícil e precisamos romper urgentemente esse quadro. As decisões na Administração Pública são atribuições de políticos com P maiúsculo e não de técnicos por uma razão muito simples: o político - e, quando falo político, refiro-me ao estadista - é um oceano de conhecimentos, ainda que com um palmo de profundidade, enquanto o técnico é um poço de conhecimento profundo, porém específico. Estamos sentindo que o Brasil está repleto de poços rasos tomando decisões. Além de se tratar de conhecimento específico, ainda é raso, o que é uma agravante. Então, não podemos, de forma alguma, deixar de considerar que o Brasil precisa mudar, e as mudanças de que o Brasil precisa são filosóficas no campo da retomada do desenvolvimento, porque no Governo estarão brasileiros com sensibilidade social e sentimento nacional, sentimento de Pátria, que não transigirão de forma alguma com a improbidade no trato da coisa pública. Por isso, levo o meu abraço de congratulações a V. Ex.ª pela abordagem desse tema, que é altamente preocupante. O Brasil precisa voltar a crescer, mas para isso tem que pagar juros compatíveis; a empresa nacional tem que pagar juros compatíveis com os juros vigentes no mercado internacional, sem o quê o Governo não pode submeter a economia brasileira a esse tipo de competição predatória. Não temos como competir no mercado global enquanto não tivermos um tratamento igualitário em termos de custo de capital e também de sistema tributário. O nosso sistema tributário se transformou num verdadeiro cipoal burocrático, que é um entrave para o desenvolvimento das empresas brasileiras. Daí por que estamos vendo jovens e mais jovens procurando trabalhar em outros países, até em Portugal, para se realizar. Por quê? Porque o Brasil deixou de ser aquela terra prometida que foi no passado, para onde vinham os italianos, os alemães, os portugueses principalmente, os espanhóis, os árabes, os japoneses, buscando oportunidade de crescimento conosco. Hoje, não. É o nosso jovem que tem que abandonar um País rico como o nosso e buscar oportunidade de vida no exterior, porque não enxerga perspectivas de trabalho para aplicar nem mesmo os conhecimentos que buscou na universidade. É isso que nos preocupa, eminente Senador Antonio Carlos Valadares. Levo o meu abraço de congratulações a V. Ex.ª pela abordagem segura que faz desta tribuna.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Concede-me V. Ex.ª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Farei um ligeiro comentário comentário, mas em seguida concederei o aparte a V. Exª.

Senador José Alencar, V. Ex.ª, que construiu a sua bagagem de conhecimento da qual todos nos nutrimos, nos alimentamos, pelo trabalho persistente, não só em Minas Gerais como em outros Estados, pontificando, acima de tudo, pelo interesse nacional por se tratar de um empresário comprometido com a nacionalidade, com o desenvolvimento, com o bem-estar social. Tudo o que V. Ex.ª disse certamente calou bem fundo no coração de todos aqueles que escutaram o seu aparte, que foi uma verdadeira lição de economia, de experiência que todos nós estamos incorporando, inclusive, eu, ao meu discurso.

O Governo Federal impôs essa política, e agora a de racionamento, num País que, em termos comparativos, assim como a Arábia Saudita tem grande potencial petrolífero, tem potencial hidráulico, que tem em seu território, não em áreas concentradas, 20% do manancial de água doce do mundo. Somos uma nação privilegiada, que tem o rio São Francisco, que deu tantas hidrelétricas e que foi, ao longo do tempo, abandonado. A sua calha, antes tão profunda, hoje está muito rasa. Sua vazão reduziu substancialmente e algumas de nossas hidrelétricas estão ameaçadas de não continuarem a funcionar por falta de água. Faltou a este Governo, já com sete anos de existência, capacidade de previsão. Era preciso providenciar a recuperação do rio São Francisco, projeto inadiável, mas que foi adiado em função de outras questões políticas, inclusive uma transposição inadequada.

Tem razão V. Exª, Senador José Alencar. Vamos trabalhar a fim de que o Brasil continue a crescer. Mas, lamentavelmente, dentro do espírito e da filosofia deste Governo, não cresceremos nunca. É preciso que no próximo ano, nas eleições, o povo brasileiro, que sofre na própria carne as conseqüências de uma política cruel e desastrosa, dê o seu recado.

Concedo o aparte ao nobre Senador Casildo Maldaner.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Antonio Carlos Valadares, com a permissão de V. Exª, antes de fazer o aparte propriamente dito, eu gostaria de fazer o registro de que o Vice-Prefeito, Vereadores, empresários e representantes da sociedade da cidade de Rio Sul, que fica no alto vale, no meu Estado de Santa Catarina, estão na tribuna de honra. Diante daquele princípio sobre o qual falou o Senador José Alencar, de Minas Gerais, de que, se analisarmos a nossa dívida em relação ao dólar, comparando com o PIB brasileiro, estaria em mais ou menos 79% ou 80%. Veja bem onde é que estamos chegando. Hoje, os dados estão aí, e o Governo reconhece que o nosso endividamento está em torno de 51%. Há o reconhecimento público em relação ao Produto Interno Brasileiro; o nosso compromisso está nisso. Há pouco tempo, o nosso PIB era de aproximadamente 30% em relação à dívida brasileira, hoje já estamos em 51%. Veja bem, quando V. Exª invoca alguns neologismos, alguns pressupostos, algumas frases usadas pelo Governo, essas questões, por exemplo, do ajuste fiscal, do equilíbrio, da responsabilidade fiscal e do racionamento da eletricidade. Quando V. Exª fala em racionamento da eletricidade, eu me pergunto: será que não houve um racionamento de responsabilidade? Ouvi o Senador Amir Lando falar sobre a Argentina. Penso que, para nós, da América do Sul, a questão da reeleição não pegou bem, Senador Carlos Valadares, porque Calos Menem foi reeleito baseado numa proposta de continuar o Plano da Argentina. Ele tinha que ser reeleito, tinham que mudar a Constituição da Argentina, porque, se não fosse ele, cairia por terra a grande arrancada, a grande modernização da Argentina. Essa foi a tese, e o Parlamento argentino foi a favor. Talvez seguindo o exemplo da América do Norte. E aí foi levado, a Argentina mudou e Menen foi reeleito. Em função disso, começaram a impregnar os ouvidos do nosso Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1996. Fernando Henrique foi eleito em 1994 com a proposta de mudar o Brasil, trazer a estabilização, de fazer as reformas do que era necessário para o País. Em 1996, nos encontros com o Menen, que havia sido reeleito, o Presidente da Argentina sugeriu que o nosso Presidente também realizasse mudanças, alterrasse a Constituição, implantasse o instituto da reeleição, alegando que havia sido reeleito com uma diferença muito grande de votos. E acabou convencendo o Presidente. E o nosso Presidente, em vez de implantar as reformas, colocou a tropa de choque aqui dentro do Congresso Nacional para fazer as mudanças na Constituição e implantar a reeleição também, como ocorreu. Senador Antonio Carlos Valadares, se não houvesse a reeleição na Argentina assim como no Brasil, quem sabe estaríamos melhores, porque as propostas não podem ser em torno de pessoas, mas em torno de ideais. As coisas devem acontecer em torno de propostas concretas, e não em torno de pessoas, como vimos na Argentina e no Brasil. Implantamos aqui e, a partir de 1996, não houve mais progresso porque tudo estava em torno da reeleição. E agora, Senador Antonio Carlos Valadares, precisamos correr atrás dos prejuízos, temos que fazer a reforma possível, e não a desejada pelo País. E estamos nessa situação, como é reconhecido pelo Governo, com um endividamento público já de 51% do PIB e, como disse o Senador José Alencar, traduzindo em dólar, já vamos para muito mais. Por isso que a preocupação e a análise de V. Exª, que veio à tribuna hoje, são acertadas. O Brasil está lhe acompanhando, posto que todos nós estamos preocupados com isso, e temos que tentar tirar o prejuízo, nessas alturas do campeonato. Assim, eu gostaria de me solidarizar com a idéia que V. Exª traz neste momento, pois é algo para todos meditarmos.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Agradeço a V. Exª, Senador Casildo Maldaner, que é um grande debatedor nesta Casa, que conhece em profundidade os problemas nacionais, fato demonstrado não só na discussão plenária como na sua participação efetiva nas comissões do nosso Senado Federal. O que V. Exª disse aqui sobre a reeleição é a realidade. Ela foi criada não como uma instituição para beneficiar, do ponto de vista político, o nosso País, os Estados e os Municípios. Ela se transformou em um projeto pessoal do Presidente da República, de Governadores, de Prefeitos, que não só gastaram as energias desse combalido País, como muitos enterraram recursos suados da população com a venda de estatais, ou em obras sem nenhuma objetividade, sem nenhum fundamento econômico, como aconteceu em meu Estado. Vi, pela televisão, o Estado do Paraná se mobilizando; observamos isso também nos discursos aqui proferidos pela Bancada do Paraná. Tive a oportunidade de ver a bravura do povo do Paraná para, diante das lições passadas, tentar evitar, a qualquer custo, a venda de sua estatal, à Copel. Lamentavelmente, por um voto, a Assembléia posicionou-se a favor. Mas sabemos que existe muita interferência indevida, muita pressão que não vem a público, muita vantagem que não pode ser publicada. É esta a democracia da reeleição, que possibilitou a que governadores se considerassem donos do Tesouro, do futuro do Estado, e o Presidente, o dono do País. Hoje estamos mergulhados num cenário ameaçador: o que acontece na Argentina e nos países vizinhos pode acontecer - é claro que pode acontecer - no nosso País.

Tivemos exemplos, depois da quebra da Rússia, que demonstram isto; a Malásia quebrou; a Tailândia e a Indonésia também quebraram e resolveram atender ao FMI, e até hoje estão mergulhadas numa crise sem precedentes. A Malásia, por ter um ditador, fechou o país para não se evadirem recursos do povo, lacrou os bancos para não se emitir dinheiro e hoje se recuperou totalmente. A sua dívida externa praticamente foi zerada, o emprego voltou a ser gerado e o país está vivendo melhor. Não sou economista, mas existem alguns economistas famosos que estão dizendo que se trata de uma fórmula que pode ser estudada. A própria Argentina, verificando que na base do desespero não haverá saída, poderá assumir o exemplo da Malásia. Acima de tudo, está a salvação de seu povo, de sua gente. Espero que a Argentina não chegue a esse ponto, nem mesmo o Brasil. No entanto, fica o exemplo.

O FMI deve tomar o cuidado de não exigir das nações subdesenvolvidas um sacrifício acima de suas forças, levando as pessoas ao desespero, à fome, à miséria.

Há um Ministro da Fazenda no Brasil que nunca tive o prazer de ver visitando o nosso Nordeste. S. Exª precisa ir ao Nordeste mais amiúde para conhecer a miséria em que estamos vivendo.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - V. Exª me concede um outro aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Concedo, com prazer, um outro aparte a V. Exª.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Invocaram, à época da reeleição, o sistema americano. Nos Estados Unidos há reeleição. Não somos contra os Estados Unidos, mas não temos a tradição da reeleição.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - A diferença, Senador Casildo Maldaner, é que lá havia uma tradição, não foi em cima de nenhum mandato. Tradição, em curso, que a reeleição foi aprovada, como aqui

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - E aqui, implantou-se uma reeleição sem tradição na América do Sul e, ainda, em curso. Foi algo casuístico. Creio que para o Menen teria sido melhor que não houvesse a reeleição. Ele teria saído bem. Hoje, vejam como ele se encontra, vejam o País e a sua própria pessoa. Talvez até para o Fernando Henrique Cardoso, o nosso Presidente, se não houvesse a reeleição ele sairia bem do cargo. Poderia, até, elege o seu sucessor; o plano de estabilização poderia continuar e ele estaria hoje menos envelhecido, e menos sofrido. Estaria percorrendo o mundo, fazendo palestras como estadista responsável pela implantação do sistema de estabilização econômico do Brasil, estaria muito mais descansado. Agora está correndo atrás do prejuízo e sofrendo. O Brasil não tinha tradição de reeleição. Mudar as regras durante o jogo pode acabar dessa forma. Aconteceu na Argentina e está acontecendo aqui, infelizmente.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Concluindo, Sr. Presidente, iniciei o meu discurso dizendo que desenvolvimento e bem-estar social não eram palavras queridas pelo Governo, e se dependesse dele, até pelo seu próprio comportamento, essas palavras já deveriam ter sido abolidas da nossa língua, tal o desinteresse, tal o despreparo com que são tratadas as questões social e desenvolvimentista do Brasil.

Vejam o caso, e o Senador Ney Suassuna já mencionou o assunto várias vezes, da extinção da Sudene. Ocorreu um foco de corrupção naquele órgão e em vez de o Governo se debruçar na punição dos culpados, na investigação daquilo que foi subtraído do País por aliciamento, corrupção e fraude, o Governo encontrou um remédio muito fácil: extinguiu a Sudene. Ora, se fosse essa a solução, muitos órgãos teriam que ser extintos porque a corrupção tornou-se infindável no Brasil. Sr. Presidente, diante do alerta, não apenas meu, mas também de outros eminentes Senadores que engrossaram nossas fileiras em defesa de um novo modelo para a economia nacional, que tenha em vista emprego, empresa, independência, insubordinação e irresignação diante do quadro de miséria por que estamos passando, esperamos que o Governo enfrente o FMI e os Estados Unidos. O modelo é injusto e excludente. A palavra “desenvolvimento” e a expressão “bem-estar social” têm que voltar ao nosso meio.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - Concedo um aparte ao nobre Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Antonio Carlos Valadares, concordando com V. Exª em praticamente tudo o que foi dito, peço que inclua, nesse modelo, o treinamento da juventude, que, aliás, é o tema do meu discurso de hoje. Se não educarmos a juventude, se não a treinarmos para o mundo globalizado -- não basta a educação --, vamos ter problemas. Com toda certeza, precisamos de um plano para a próxima geração. Um país tem continuidade se a juventude for vista como investimento. E não é o que temos feito.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (PSB - SE) - De fato, as universidades brasileiras são o testemunho de tudo isso. O Brasil é um dos países que menos aplica recursos na universidade; perde feio para a Argentina, que hoje está em crise, perde para o Chile, para o Peru, para a Venezuela. E isso é inconcebível num país de dimensão continental e com tanta potencialidade como o Brasil. Agradeço a V. Exª pelo aparte.

Afinal, Sr. Presidente, termino concitando todos os Senadores e Senadoras: devemos pensar no futuro do País, fazendo com que a palavra “desenvolvimento” e a expressão “bem-estar social” voltem a influenciar as nossas autoridades.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/08/2001 - Página 18712