Discurso durante a 97ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DO GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO NORTE, GARIBALDI ALVES, ACUSADO DE TRAFICO DE INFLUENCIA NO ESTADO.

Autor
Geraldo Melo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RN)
Nome completo: Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), GOVERNO ESTADUAL.:
  • DEFESA DO GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO NORTE, GARIBALDI ALVES, ACUSADO DE TRAFICO DE INFLUENCIA NO ESTADO.
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/2001 - Página 17568
Assunto
Outros > ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • ANALISE, DENUNCIA, ATUAÇÃO, PARENTE, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), EXECUÇÃO, TRAFICO DE INFLUENCIA, ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, PROVA, PARTICIPAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL.
  • ELOGIO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), DISTRIBUIÇÃO, NOTA OFICIAL, ESCLARECIMENTOS, IMPRENSA, CRIAÇÃO, COMISSÃO, OBJETIVO, AUXILIO, INFORMAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO.
  • ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, APROVAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, INVESTIGAÇÃO, POSSIBILIDADE, PARTICIPAÇÃO, CORRUPÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), MOTIVO, INSUFICIENCIA, EXIGENCIA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

O SR. GERALDO MELO (Bloco/PSDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, num final de tarde, chegar alguém à tribuna com essa quantidade enorme de papéis assusta. Mas quero tranqüilizá-los, porque não pretendo ler todo esse acervo.

Sr. Presidente, na sessão de ontem, o Senador José Agripino, do PFL de Minas Gerais, meu conterrâneo e dileto amigo, veio à tribuna dizendo-se constrangido por ter de tratar, aqui, de um problema da nossa província. Eu aqui estou para tratar do mesmo problema. Só que não estou constrangido, porque, há um ano ou mais, estive nesta tribuna tomando - como o fez o Senador José Agripino Maia ontem - a iniciativa de falar sobre um problema provinciano, naquela ocasião, para criticar o Governador do Estado.

Hoje, venho para falar em favor do Governador do Estado, embora não imagino que tenha vindo para defendê-lo, porque não acho que haja propriamente necessidade que alguém o defenda no episódio a que vou me referir.

O Senador José Agripino relatou para esta Casa um episódio que vem ocorrendo no Rio Grande do Norte, chamando a atenção do Estado e de certos veículos da imprensa nacional.

O fato é o seguinte: um cidadão que não é do Rio Grande do Norte foi preso sob suspeita de estar associado, primeiro, a uma grande operação que eles chamam de resgate de presidiários de uma penitenciária do Estado e, depois, suspeito de autoria de assassinato de alguém que foi morto violentamente numa pousada, localizada na Praia do Cotovelo, no litoral sul do Rio Grande do Norte. Esse cidadão, procurado pela Polícia, fugiu do Estado, foi preso no Paraná e levado para o Rio Grande do Norte. Lá, depois de mais ou menos um mês de recolhimento em uma cela, aguardando o andamento das investigações, prestou um depoimento cujo texto integral tenho em meu poder. Em vez de falar sobre os fatos de que era acusado, denunciou a existência de uma articulação, coordenada por um cunhado do Governador do Estado, para praticar tráfico de influência junto ao Governo do Rio Grande do Norte.

Foi um depoimento que, naturalmente, chocou a opinião pública e teve, inclusive, o condão de desviar a atenção de todos do problema pelo qual esse indivíduo havia sido recolhido no Rio Grande do Norte. Ele soube se tornar atrativo, porque somente aparece de capuz - o que até hoje não entendo - e deu à sua presença na mídia e nas discussões um toque espetacular, por um lado, e romântico, por outro.

Em seu depoimento, realmente fala de um esquema de tráfico de influência. Não sou policial, não pertenço ao Ministério Público, nem me sinto na obrigação de participar dessas investigações. Até como ex-Governador de Estado, acredito que nenhum Governo - federal, estadual ou municipal - está livre de que alguém pretenda se organizar para praticar tráfico de influência e levar vantagens.

Portanto, o meu objetivo aqui não é o de discutir se há ou não um esquema supostamente montado por um cunhado do Governador ou por quem quer que seja, para tirar vantagens do Governo do Estado. O que quero dizer é que nesse depoimento espetacular, embora longo, esse suspeito que se encontra preso fala que o cunhado do Governador teria montado empresas fictícias para ganharem licitações no Estado, mas não cita uma única licitação que uma dessas empresas tenha ganho. Fala, sim, de uma obra, construção de uns galpões, que teria sido contratada não pelo Governo do Estado nem por nenhum órgão público, mas pelo próprio cunhado do Governador. Esse é um problema particular do cunhado do Governador, uma obra privada que não tem nada a ver com o interesse público.

Há um único fato concreto citado por esse cidadão, algo que me recuso a aceitar como verdadeiro. Esse fato não atinge o Governador nem o Governo. Na realidade, ele atingiria, se fosse verdadeiro, o nosso colega Senador Fernando Bezerra, pois se refere a uma conversa que teria ocorrido entre o cunhado do Governador e o Ministro Fernando Bezerra, então titular do Ministério da Integração Nacional, envolvendo um fato concreto. Mas o Ministro Fernando Bezerra peremptoriamente nega que, em qualquer momento, tenha recebido telefonema narrado detalhadamente por esse indivíduo no seu depoimento. E entre a palavra desse indivíduo e a palavra do Senador Fernando Bezerra, eu acredito no Senador Fernando Bezerra.

O SR. GERALDO MELO (Bloco/PSDB - RN) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Na realidade, portanto, não há nenhum fato concreto, a não ser a indicação desse cidadão de que um esquema de tráfico de influência teria sido montado. O próprio Senador José Agripino, como eu disse, fez referência ao assunto, mas não trouxe a esta Casa nenhum fato concreto capaz de comprometer a lisura e a probidade do Governo atual do Rio Grande do Norte.

O que seria grave, entretanto, apesar de não haver um fato concreto, seria uma atitude leniente do Governo do Rio Grande do Norte com relação a esse episódio. Mas o que fez o Governador do Estado ao tomar conhecimento dos fatos? Numa nota, distribuída à imprensa por S. Exª, no dia 19 de julho de 2001, deixa muito claro:

Diante dos desdobramentos políticos de um episódio policial que está sendo objeto de inquérito pelo Ministério Público, e que faz referência, inclusive, a um familiar meu, sinto-me no dever de, pessoalmente, prestar ao povo alguns esclarecimentos, fixando a posição do Governador diante desses fatos.

1 - Não só o Governador, como todo o Governo, não reconhece parentes nem parentesco de espécie alguma no trato da coisa pública e, portanto, não privilegia familiares, amizades ou afeições no gerenciamento das questões de interesse público;

2 - A citação do nome de um meu cunhado, em depoimento de um acusado de homicídio e estelionato, não inibe meu Governo de apurar com rigor e isenção todos os fatos, mesmo que me causem constrangimento e sofrimento pessoal, por colocar acima de tudo o respeito à lei e à moralidade pública;

3 - Embora, pela origem, eventualmente, possa ser desqualificada a acusação, determinei a todos os órgãos do Governo, especialmente à polícia estadual, a ampla e rigorosa apuração de todos o fatos, bem como irrestrita colaboração ao Ministério Público e ao Judiciário para o bom êxito das investigações e punição conforme a lei de quem for encontrado em culpa.

            Segue a nota descrevendo outras providências que o Governador tomou, das quais destaco apenas uma: a criação de uma comissão no âmbito do Governo do Estado, integrada pelo Chefe da Casa Civil, Professor Luís Eduardo Carneiro Costa; pelo Consultor Geral do Estado, Professor Ivan Maciel de Andrade; e pelo Controlador Geral, Carlos Roberto de Miranda Gomes, para que essa comissão tenha a responsabilidade de prestar ao Ministério Público toda e qualquer informação necessária à apuração irrestrita e cabal de todos os fatos a que se refere esse depoimento.

Portanto, com relação a esse ponto, não houve, por parte do depoente, a indicação de um único fato que incrimine o Governo. Houve a informação de que teria sido montada, por um cunhado do Governador, uma estrutura destinada a exercer tráfico de influência junto ao Governo, mas não houve nenhum fato envolvendo as empresas referidas pelo depoente. Nenhum fato foi por ele apresentado, mostrando que esse esquema de tráfico de influência havia sido bem sucedido nessa licitação ou naquela outra.

Finalmente, o Governo do Estado tomou todas as medidas para facilitar um trabalho de investigação, que, na realidade, está sendo feito pelo Ministério Público. É o Ministério Público quem está fazendo a investigação. A propósito, encontrei num discurso do Senador José Agripino a declaração de que, segundo o Ministério Público do Rio Grande do Norte, teriam sido encontrados documentos comprometedores, provas daquilo que o acusado de homicídio disse em seu depoimento, demonstrando claramente indícios fortíssimos de que, no Governo do Rio Grande do Norte existiam, por parte do cunhado do Governador, tráfico de influências, superfaturamento de obras e influência no pagamento de precatórios trabalhistas, entre outras coisas.

“Na realidade - são palavras do Senador José Agripino - existiam, por parte do cunhado do Governador...” - o cunhado do Governador não integra o Governo do Estado, e se ele tiver praticado algum ato dessa natureza, vou repetir aqui as palavras do Governador que ouvi reiteradamente nos últimos dias: “... se vier a ser demonstrado que algum fato ocorreu, quem o praticou traiu o Governador e deve pagar por isso, seja parente ou não”.

Mas, apesar de se declarar aqui que, segundo o Ministério Público, foram encontrados documentos comprometedores e provas, há aqui uma carta de um membro do Ministério Público, reagindo a uma notícia de jornal, que teria declarado isso que foi repetido no discurso do Senador José Agripino. Por meio dessa carta, ele comunica ao Governador pelo Ofício nº 5/2001/13-A, da Procuradoria de Justiça, assinada pelo 13º Promotor de Justiça de Natal, em que ele comunica haver dirigido carta ao jornal que publicou declarações supostamente suas, desmentindo cabalmente e declarando textualmente, na nota à imprensa, que também distribuiu, o seguinte:

Urge explicar que, nas oportunidades em que fui entrevistado pelos meios de comunicação, informei que não existia, até aquele momento das investigações, qualquer indício da prática de ilicitude por parte do Governador do Estado do Rio Grande do Norte ou de qualquer dos Secretários de Estado, como pode se exprimir das matérias jornalísticas publicadas no Jornal de Hoje (edições dos dias 25 de julho e 06 de agosto) e no Diário de Natal (edição do dia 07 de agosto), todos do corrente ano.

            Com isso, esclareço, portanto, que não há fatos concretos que tenham sido revelados com relação ao Governo do Estado, que um membro do Ministério Público, em nota à imprensa, declara que não se dispõe de qualquer prova ou indício de que o Governador ou qualquer dos seus Secretários tenha praticado algum ato de improbidade.

Dito isso, desejo referir-me a um outro aspecto, que é o último, Sr. Presidente, que vou abordar nesta ocasião.

O Senador José Agripino declarou-se indignado com o fato de que foi proposta uma CPI à Assembléia Legislativa para a apuração dos fatos. Ao que me consta, foram alegadas duas coisas. A primeira foi de que não havia necessidade de fazer uma CPI cujos resultados seriam depois entregues ao Ministério Público, se os fatos a ele já foram entregues. A CPI seria apenas um instrumento de manifestação política a respeito do assunto, porquanto o trabalho da CPI na Assembléia Legislativa termina sendo entregue ao Ministério Público. E o Ministério Público, que comanda as investigações, já está com a matéria em mão.

A segunda coisa que foi alegada - ao que me conste - é que o requerimento de CPI não satisfazia às exigências da Constituição, que determina que ele deva atender a determinados requisitos. E repito as palavras do Senador José Agripino:

Mas, o que ocorreu? Esta é a tristeza que o Rio Grande do Norte tem a lamentar. A maioria, movida pela pressão do Governo, em vez de agir como este Plenário, submeteu o requerimento não à Mesa, mas à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e depois ao Plenário, onde o Governo é maioria, negando o direito constitucional das minorias de investigar os fatos por intermédio de uma CPI, desde que cumpridos os preceitos regimentais constitucionais.

No entanto, por uma manobra do Governo do Estado, a maioria dos governistas se moveu e abafou a CPI, rasgando o Regimento da Assembléia e a Constituição do Estado do Rio Grande do Norte.

            Diz bem o Senador José Agripino que requerimentos de CPI devem ser atendidos, desde que cumpridos os preceitos regimentais e constitucionais. Aliás, assim entende sempre S. Exª, como eu e como tantos aqui.

O que ocorreu no Rio Grande do Norte foi que, com número mais do que suficiente, a maioria requereu a instalação da CPI, com um requerimento que não estava vazado de forma a satisfazer as exigências constitucionais. A Mesa encaminhou o requerimento à Comissão de Constituição e Justiça, cuja decisão foi levada a Plenário. E o Plenário derrubou a constituição da CPI.

Aqui no Senado Federal, que, de acordo com o Senador José Agripino, inspira sua postura em relação a tais assuntos, ocorreu situação muito semelhante. No ano de 1996 foi requerida ao Senado Federal a instalação da CPI dos Bancos. Assinaram o requerimento Senadores em número mais do que suficiente. Apresentado e lido o requerimento, o Presidente da sessão, naquele dia o Senador Renan Calheiros, considerou que, havendo número suficiente, a CPI era tida como constituída pela Mesa. Foi o Partido do Senador José Agripino, no momento em que as indicações dos membros da CPI foram feitas à Mesa, que levantou a tese de que o requerimento não satisfazia as exigências constitucionais - exatamente o que aconteceu no Rio Grande do Norte.

Lá, como aqui, havia número, e lá, como aqui, declarou-se que não haviam sido satisfeitos os requisitos constitucionais. O que fez a Mesa lá? Mandou para a Comissão de Constituição e Justiça. O que fez a Mesa aqui? Mandou para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. De volta, o parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado entendia que o requerimento não satisfazia as exigências constitucionais. Por uma questão de ordem levantada, entendia a Liderança do PFL, pela voz do Senador Hugo Napoleão, que a CPI deveria ser derrubada. O Presidente da sessão nesse dia era o Senador José Sarney, que não acolheu a questão de ordem e entendeu que a CPI deveria ser mantida.

Foi formulado um recurso ao Plenário pelo Líder do Partido do Senador José Agripino, Senador Hugo Napoleão, e outros Srs. Senadores. O requerimento, se fosse aprovado, derrubaria a CPI. Os Senadores José Eduardo Dutra e Antonio Carlos Valadares requereram votação nominal. Foi feita a votação nominal, e o Plenário do Senado, exatamente como fez o Plenário da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte, acolheu o recurso e derrubou a CPI. Isso aconteceu aqui, como aconteceu lá.

Foi feita a votação nominal e aqui tenho os resultados da verificação de votação do Recurso nº 2, de 1996.

Quem votou “sim” votou para que não se instalasse a CPI, apesar de ter sido requerida por um número de Senadores mais do que suficiente: mais de 27 Senadores. Aqui tenho a folha de verificação de votação: votaram “sim” 48 Senadores; votaram “não” 24; abstiveram-se 3.

Aí minha estranheza com relação à posição do Senador José Agripino. O que aconteceu no Rio Grande do Norte foi exatamente o que aconteceu no Senado Federal. Lá, como aqui, prevaleceu a decisão do Plenário. Entende S. Exª hoje que essa decisão do Plenário não poderia ser tomada porque contraria um princípio constitucional. Mas, aqui, quando a matéria foi votada, eu estava presente e votei “sim”, acolhendo o recurso. O Senador José Agripino também estava presente e também votou “sim”. Votaram “sim” 48 Srs. Senadores, e entre esses Senadores que votaram “sim” estava o Senador José Agripino.

Ao votar dessa maneira, entendeu S. Exª, como entendo eu, que a minoria - no caso do Senado, 27 Senadores, que representam 1/3 da Casa - pode requerer uma CPI e ela tem que ser instalada, desde que o requerimento guarde conformidade com as exigências da Constituição e do Regimento. Quando não guarda, esse requerimento não pode prosperar, e nada impede que os 27 Senadores ou mais voltem a requerer a CPI.

Quis prestar este esclarecimento à Casa, com minha voz mais voltada para o Rio Grande do Norte, porque, diante do que foi dito ontem aqui, talvez o Senado pudesse chegar a conclusões que implicassem uma injustiça tanto em relação ao Governador do Rio Grande do Norte quanto em relação à Assembléia Legislativa. Até agora não há nenhum fato que incrimine o Governador nem o seu Governo. E a Assembléia Legislativa agiu rigorosamente de acordo com normas consagradas pelo Congresso Nacional, pelo Senado Federal, e que, quando aplicadas nesta Casa, tiveram tanto o meu apoio quanto o do Senador José Agripino e do Senador Fernando Bezerra, que como eu e o Senador José Agripino também votou “sim” naquela votação.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/2001 - Página 17568