Discurso durante a 104ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à política educacional brasileira.

Autor
João Alberto Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MA)
Nome completo: João Alberto de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIAL.:
  • Comentários à política educacional brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 31/08/2001 - Página 19037
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, MELHORIA, ACESSO, EDUCAÇÃO, CRIANÇA, BRASIL, IMPORTANCIA, IMPLEMENTAÇÃO, INICIATIVA, CRIAÇÃO, ESPAÇO, COMUNIDADE, JUVENTUDE, ATIVIDADE, LAZER, REDUÇÃO, VIOLENCIA.
  • ANALISE, DADOS, EDUCAÇÃO, JUVENTUDE, ACESSO, ENSINO MEDIO, INTERNET, REGISTRO, DESEMPREGO, OMISSÃO, PARTIDO POLITICO, CLASSE POLITICA, NECESSIDADE, ALTERNATIVA, INCENTIVO, CRIATIVIDADE, CIDADANIA.

  SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (PMDB - MA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil considera que já venceu a batalha para colocar a criança na escola: há quatro anos o percentual de crianças de 7 a 14 anos na escola é de 96 %. Não se pode negar que esse é um resultado excelente no âmbito de um País com a imensidão geográfica do Brasil. Ainda um pequeno esforço, inclusive utilizando os meios que proporcionam educação a distância, e o índice deverá atingir 100%. Nada mais alvissareiro para o Brasil que, a partir desse estágio, poderá iniciar a implementação de iniciativas para criar espaços comunitários, incrementar atividades de lazer e estabelecer condições para a diminuição da violência. De acordo com estudo efetuado pela Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura - Unesco, a falta desses espaços é terreno fértil para a raiz da violência que irá explodir na juventude. Para efetuar o estudo, a Unesco trabalhou 12 cidades brasileiras, onde testou aproximadamente 30 iniciativas diversificadas de atendimento à população dessa faixa etária.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é minha intenção abordar o problema da escolarização das crianças neste pronunciamento, até porque a solução está encaminhada. Meu objetivo é comentar a atenção dispensada aos jovens brasileiros, pelo Governo e pelos Partidos Políticos.

            Existem hoje no Brasil cerca de 32 milhões de jovens entre 15 e 24 anos de idade. Setenta e oito por cento deles vivem nas cidades e 65,2 % estão procurando emprego. Dos que têm entre 15 e 18 anos, 19% estão na escola de ensino médio. Dos 81% matriculados no ensino médio, somente 36% concluem esse nível de ensino.

            Na Europa, um terço dos jovens europeus tem acesso à Internet. No Brasil, 9% têm acesso a computadores e apenas 4% navegam na Internet. Dos que acessam a Internet, 16% são da classe C, e 4% da classe D. Segundo comentário do jornalista Márcio Moreira Alves, “Essa situação configura um apartheid digital, em que estão se formando legiões de excluídos tecnológicos”.

            No que diz respeito ao emprego, “os jovens já começam a vida enfrentando o obstáculo da exigência de experiência para obter o primeiro emprego”. E os que são assumidos como estagiários, em geral, constituem mão-de-obra barata, utilizada pelas empresas para diminuírem seus custos operacionais.

            Quanto ao papel desempenhado pelos Partidos Políticos e pelos políticos em prol da juventude, o quadro, infelizmente, é de desalento. Os Partidos Políticos e os políticos desconhecem os jovens, não falam aos jovens, não ouvem os jovens, não têm propostas para os jovens. Por sua vez, os jovens têm baixíssima consideração pelos políticos. É a camada da população que tem o menor apreço por seus representantes.

            Os estatutos dos Partidos, em geral, prevêem a participação dos jovens em seus quadros. No entanto, tal participação não possui nenhuma representatividade social, nem voz nas decisões, são grupos meramente formais. Além disso, os entreveros para a conquista do poder freqüentemente conduzem ao desrespeito as regras acordadas e criam casuísmos que subvertem a ética da obediência às diretrizes que o jovem aprende desde criança quando começa a brincar em grupo com outras crianças. Nesse contexto, vai-se a noção e a validade das posturas e dos valores da cidadania, base para a vivência em coletividade.

            A realidade configura-nos no Brasil uma juventude que se desenvolveu sob o signo da violência urbana, assumindo o medo como denominador comum. Uma juventude cujas perspectivas estão marcadas pelo temor e pela insegurança, por certo desencanto, pelo conformismo, por certa perplexidade diante das estruturas e da própria existência.

            O mundo globalizado tornou-se cabalístico para os jovens. A visão neoliberal prega um Estado mínimo, mas não especifica as características do Estado mínimo, nem os Governos o fazem. Os recursos estão extremamente centralizados, mas as necessidades essenciais disseminadas e minimamente atendidas. Os governantes reduziram-se a meros administradores de volumosas dívidas. A noção de nacional diluiu-se na abrangência de uma realidade indefinida, etérea, engolida por uma espécie de soberania universal, sem horizontes e sem plasticidade. O livre mercado mundial é defendido, é pregada a igualdade, mas há proteções fortes e domínio férreo do mais poderoso sobre o mais fraco.

            O contexto único, a igualdade “estabelecida” pela hegemonia, o predomínio da contabilidade financeira, o desprezo e a refutação de idéias políticas e econômicas alternativas embotam a criatividade da juventude e amarram o País e o mundo a uma deprimente sensação de hermetismo e unilateralidade, de horizontes fixos, de certezas irrefutáveis, de caminhos traçados e imutáveis, de mecanicismos naturais, insuperáveis apesar das injustiças que se observam.

            Tudo isso aprisiona e entristece os jovens, exatamente na etapa da vida em que começa o exercício da liberdade. Uma liberdade, porém, que vêem assegurada pelos outros. Segundo o filósofo Kant, “os seres que descobrem a liberdade não se satisfazem com o conforto garantido pelos outros”.

            Durante a IV Conferência Ministerial dos Países mais Populosos do Mundo, realizada recentemente em Pequim sob o patrocínio da Unesco, o representante do Ministério de Educação do Brasil anunciou que o Brasil, no espaço de 10 anos, pretende colocar na escola todos os seus jovens de 15 a 18 anos de idade.

            Faz bem o País quando pretende voltar-se para a juventude. É preciso abrir as portas da escola aos candidatos ao ensino médio. Essa é condição primordial para que o Brasil continue a ser pensado com a criatividade que é apanágio dos jovens e para que estes, por falta de espaço para idéias e utopias, não se entreguem às drogas, à bebida, ao percorrer vazio durante as noites urbanas, à baixa auto-estima e à violência.

            A pesquisa da Unesco identificou e enunciou numerosas recomendações de políticas públicas, julgadas apropriadas para auxiliar os jovens a progredirem na vida. Recomendou, entre outras iniciativas, o estabelecimento de redes de acompanhamento dos jovens envolvidos em programas de formação; a criação e ampliação de programas de formação profissional; o desenvolvimento de atividades que favoreçam a interação entre as famílias, os educadores, os políticos e os jovens; incentivo a programas comprovadamente eficientes no campo da educação a distância, a exemplo do Telecurso 2000.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há muito que fazer. E há espaço para fazer. Faço minha a observação do jornalista Márcio Moreira Alves: “Há muito o que fazer e uma das coisas que o Poder Público deve fazer é multiplicar os espaços coletivos, tanto culturais quanto esportivos, vergonhosamente raros no País inteiro”.

            É preciso propiciar à juventude a formação adequada, para que crie e cultive utopias, utopias como algo que não existe aqui e agora, mas que pode ser criado pela vontade de crescer e pelo vislumbre de horizontes novos, com área e campo de realização para todos. Zelar pela juventude é zelar pelo futuro do País. Do ponto de vista político, zelar pela juventude é plantar hoje a qualidade da ação pública e do valor da agremiação partidária do amanhã. É preparar o País para dias melhores, de liberdade e autonomia não tuteladas pelos outros.

            Muito obrigado.


            Modelo15/3/2411:23



Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/08/2001 - Página 19037