Pronunciamento de Carlos Wilson em 23/08/2001
Discurso durante a 99ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Críticas ao índice de reajuste proposto aos servidores públicos federais.
- Autor
- Carlos Wilson (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
- Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
POLITICA SALARIAL.:
- Críticas ao índice de reajuste proposto aos servidores públicos federais.
- Publicação
- Publicação no DSF de 24/08/2001 - Página 18343
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL.
- Indexação
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- ANALISE, CRITICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, LIBERALISMO, ECONOMIA, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA, PREJUIZO, PAIS.
- CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, REAJUSTE, SALARIO, SERVIDOR, MOTIVO, DESVIO, VERBA, ORÇAMENTO, OBJETIVO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA, IMPOSIÇÃO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).
- ANALISE, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), RECONHECIMENTO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OMISSÃO, DESCUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REAJUSTE, SALARIO.
O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quando Fernando Henrique Cardoso assumiu a Presidência da República, em 1995, declarou em seu discurso de posse que estava empenhado em promover o fim da Era Vargas.
Sua Excelência, dotado de notável formação acadêmica, sabe melhor do que ninguém, que foi o Presidente Getúlio Vargas que pavimentou tardiamente o acesso do Brasil à era da modernidade implícita ao séc XX.
Mesmo adversários históricos de Getúlio reconhecem que foi no seu Governo que se edificou o Estado brasileiro. Criaram-se os institutos de pensão, instituiu-se a aposentadoria dos trabalhadores, o salário mínimo e todas as conquistas regidas pela CLT, que malgrado sua superação, ainda se constituem na maior vitória dos trabalhadores brasileiros.
Mais que isso, Getúlio criou o Estado soberano, capaz de intervir com sucesso no domínio econômico por meio de empresas como a Vale do Rio Doce ou a Petrobras.
Mas, quem sou eu para pontear sobre Getúlio Vargas em um Parlamento onde desponta o talento de um Pedro Simon. Um entusiasta do trabalhismo, estudioso do varguismo e de seus desdobramentos.
Cabe-me sim denunciar que foi contra essa dimensão progressista da Era Vargas que se voltou a fúria privatizante do Governo Fernando Henrique Cardoso, com a desnacionalização indiscriminada e lesiva ao patrimônio público e a queda vertiginosa na qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias privadas, além de gravíssimos problemas de desabastecimento, expressos no colapso de energia elétrica, em curso no País.
Mas, o golpe mais mortal e certeiro que se desfere contra uma máquina estatal apta a atender as necessidades básicas dos cidadãos e contribuintes é a extinção lenta, asfixiante e inexorável do serviço público, por meio de um arrocho salarial desumano.
Há sete anos, os servidores públicos federais são mantidos sem qualquer reajuste salarial. Acumulam uma perda do poder de compra de 75,48% de janeiro de 1995 até dezembro passado, segundo o Dieese. Ou seja, dois terços dos salários dos servidores simplesmente foram corroídos pelo desgaste da moeda.
Isso equivale a dizer que todos os servidores estão condenados a viver com menos de 25% do que recebiam por seu trabalho há seis anos e meio.
Ao defenderem sua sobrevivência, os servidores estão defendendo o próprio Estado da volúpia liberal dos governantes.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dos quase 500 mil servidores da União na ativa, cerca de 370 mil (74% deles) estão fora das carreiras consideradas prioritárias ou beneficiadas com reajustes diferenciados desde 1995.
Assim, com tal política discriminatória e elitista, o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso priva três quartos dos servidores federais do reajuste linear, ou seja, da mera reposição do seu poder de compra. E o que pretende com isso?
Dizer à sociedade que a configuração de sua estrutura estatal ideal é de 25% da atual. E que portanto, os demais servidores, não estão inseridos nas atividades consideradas essenciais ao Estado.
Convém ressaltar, Srªs e Srs. Senadores, que profissionais de saúde e educação não estão incluídos neste rol. Ou seja, estão entre os que o Governo considera dispensáveis ao Estado, não integram carreiras típicas de Estado, como procuradores e fiscais, por exemplo.
Um dos pretextos para a ausência de aumentos diferenciados seria a adequação dos salários à oferta do mercado. Ou seja, uma maneira de prover os cargos essenciais com pessoas mais qualificadas para cada função.
A quem o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o seu Governo querem enganar?
São justamente os profissionais que exercem atividades que ele considera não típicas do Estado, médicos e professores por exemplo, que sofrem violenta pressão do mercado privado. E não fiscais e procuradores, cujas funções inexistem na iniciativa privada.
O que o Governo Fernando Henrique faz é empurrar o funcionalismo até a fronteira do extermínio pela fome, pelo desprezo e pela auto-estima. Trata-se de uma guerra declarada ao Estado e à própria sociedade, na essência destinatária do trabalho desses servidores.
Esta é a receita de desmonte do projeto de Estado de bem-estar social concebido por Vargas; a cruel combinação de duas operações simultâneas: de um lado, a penúria e a desmoralização dos servidores públicos e, de outro, a sanha privatizante governamental. Ambas, porém, coerentes e articuladas para um fim comum - o desvio de verbas públicas dos investimentos sociais indispensáveis ao desenvolvimento para a única real prioridade: saldar compromissos financeiros internacionais e cumprir metas fiscais ajustadas com o FMI à custa do interesse nacional.
E, para atingir seus objetivos o Governo Federal não respeita sequer os limites da ordem jurídica vigente.
O Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Marco Aurélio Mello, veio a público, em nome do poder que representa, lembrar a todos que desde 24 de abril passado, o Governo Federal está em mora em relação ao seu dever de assegurar revisão anual da remuneração aos servidores públicos.
Julgando ação de inconstitucionalidade por omissão proposta pelo PDT, pelo PT e pela Confederação dos Servidores Públicos do Brasil contra o Presidente Fernando Henrique Cardoso, a Suprema Corte decidiu pelo reconhecimento judicial do estado de inércia do Poder Pública Federal, afastando qualquer dúvida sobre a necessidade de o executivo enviar projeto de lei ao Congresso Nacional contendo revisão dos vencimentos do funcionalismo, decisão com eficácia a partir da entrada em vigor da Emenda Constitucional 19/98.
Assim, o Presidente da República foi declarado inadimplente e omisso com seus deveres constitucionais para com os servidores públicos, por acórdão da mais alta Corte de Justiça do País, no uso de sua competência originária, em decisão de única instância, irrecorrível e transitada em julgado.
Premido por questões jurídicas, o Presidente Fernando Henrique Cardoso e sua equipe econômica enviaram a proposta de 3,5% de aumento para o funcionalismo para ser incluída no Projeto de Lei Orçamentária da União.
A frieza dos tecnocratas do Governo chegou ao absurdo de considerar a hipótese de não conceder qualquer reajuste aos funcionários aposentados.
É bom lembrar que, qualquer que seja o aumento dado ao funcionalismo, ele deve ser retroativo a 4 de junho de 1998 (data da promulgação da emenda constitucional 19/98), caso contrário estará afrontando a Constituição Federal e infringindo o seu art. 85, inciso VII.
Fernando Henrique fez o mínimo, para fugir da lei. Moralmente, entretanto, está condenado.
Um triste fim para um orgulhoso Presidente que teve a pretensão de destruir a Era Vargas e que vai terminar o seu longo, longuíssimo mandato, como aquele que destruiu o Estado.
Era o que tinha a dizer.