Discurso durante a 115ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Pronunciamento de renúncia ao cargo de Presidente do Senado Federal.

Autor
Jader Barbalho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PA)
Nome completo: Jader Fontenelle Barbalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Pronunciamento de renúncia ao cargo de Presidente do Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 19/09/2001 - Página 22256
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • DEFESA, PROBIDADE, INTEGRIDADE, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, VIDA PUBLICA, ORADOR, ELOGIO, REPRESENTANTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), CONFIANÇA, AUTOR, DISCURSO.
  • ANALISE, GRAVIDADE, RESULTADO, CONFLITO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, EX SENADOR, DENUNCIA, FRAUDE, VOTAÇÃO, APARELHO ELETRONICO, SENADO.
  • DENUNCIA, DESVIO, ACUSAÇÃO, FRAUDE, NATUREZA ECONOMICA, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DA AMAZONIA (SUDAM), BANCO ESTADUAL, ESTADO DO PARA (PA).
  • COMENTARIO, CONFIANÇA, ATUAÇÃO, CONSELHO, ETICA, DECORO PARLAMENTAR, NEUTRALIDADE, JULGAMENTO, INOCENCIA, ORADOR, MANDATO PARLAMENTAR, SENADOR, ESTADO DO PARA (PA).
  • COMENTARIO, RELATORIO, AUTORIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), INSUFICIENCIA, PROVA, INQUERITO JUDICIAL, PUNIÇÃO, ORADOR.
  • JUSTIFICAÇÃO, MOTIVO, RENUNCIA, ORADOR, PRESIDENCIA, SENADO, PRESERVAÇÃO, CARGO DE NATUREZA ESPECIAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), CARGO PUBLICO, SENADOR, RECONHECIMENTO, EMPENHO, FUNCIONARIO PUBLICO, LEGISLATIVO, DESENVOLVIMENTO, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JADER BARBALHO (PMDB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, assumi a Presidência do Senado Federal após um processo eleitoral extremamente sofrido, perpassado de paixões, envolvendo desde interesses partidários a idiossincrasias pessoais, em clima de passionalidade sem similar na história do Senado Federal.

            Fui escolhido pela maioria absoluta dos meus Pares: 41 votos, aos quais devo a responsabilidade de conduzir-me à frente do Senado de forma confiável, com habilidade, equanimidade de temperamento e, sobretudo, disposição sóbria, desprovida de precipitação. Repito o que afirmei no dia de minha eleição ao assentar-me na cadeira da Presidência: “entendo a função de presidir o Senado Federal como um ato de exercício democrático e o seu Presidente deve ter como norte a responsabilidade compartilhada”.

            Orgulho-me de ter sido escolhido Presidente desta Casa após nela estar exercendo o meu mandato parlamentar há seis anos. Registro que, ao tomar posse como representante do Pará, em 1995, na mesma data fui escolhido pelos meus companheiros integrantes do PMDB como Líder da nossa Bancada neste Senado. Por duas vezes fui reconduzido à Liderança da Bancada do PMDB e também no exercício do meu mandato de Senador fui eleito Presidente Nacional do meu Partido.

            Em toda essa trajetória não me faltou a generosidade dos meus companheiros do PMDB, que em mim confiam e em função dos quais procurei aprimorar, exercitar e harmonizar não só a negociação político-partidária interna, mas o sentido de justiça e a visão do futuro do PMDB voltada para o bem-estar do povo brasileiro, expressa neste Parlamento e em encontros regionais por todo o Brasil.

            Tive e tenho tido o privilégio de conviver, no Senado, com as lideranças mais ilustres do Brasil: um ex-Presidente da República, ex-Governadores de Estado, ex-Ministros, de currículos pessoais e políticos extraordinários, empresários e profissionais de atuação destacada no cenário econômico e social do Brasil. Travei debates entusiasmados, enfrentei polêmicas, mas, acima de tudo, conquistei e solidifiquei grandes amizades nesta Casa.

            Tenho a consciência tranqüila de que, nesses seis anos, bem servi ao Senado Federal e, por conseqüência, ao País, ao meu querido Pará e ao meu Partido.

            Em muitas questões políticas, enfrentei problemas, sempre considerando a precedência do benefício público, por vezes contrariando sentimentos pessoais, mas o fiz na certeza de que o papel que devemos desempenhar contribui para o benefício de todos os brasileiros.

            Nessa delicada e intrincada tarefa, tão criticada e incompreendida que é a construção político-legislativa, orgulho-me de ter agido sempre com integridade, dignidade e moderação, juntamente com os meus pares, em favor do País, durante esses seis anos em que venho exercendo o meu mandato de Senador da República.

            Entretanto, a partir do momento em que me envolvi no episódio de desinteligência política com o ex-Presidente da Casa, do qual o Senado e o País inteiro foram e são testemunhas, em que enfrentei na tribuna o político considerado, à época, como a maior força político-pessoal do Brasil, desencadeou-se sobre mim uma enxurrada de acusações infamantes, nunca comprovadas, mas repetidas, à exaustão, pelos meios de comunicação.

            Não obstante as aleivosias e agressões de que fui alvo, minha Bancada indicou meu nome para concorrer à Presidência do Senado. E, após dez meses de perlenga política e pessoal, a maioria absoluta dos integrantes desta Casa julgou-me digno e à altura de exercer a tarefa, confiando-me suas esperanças e a crença de que conduziria com moderação, afastando a arrogância e a irascibilidade da Administração da Casa.

            Ao assumir a Presidência do Senado Federal, pedi a Deus que me desse sabedoria e virtude para bem desempenhar o meu papel. Entretanto, o fato de ter derrotado o político, à época, repito, mais influente da República, consumando minha vitória pela maioria absoluta dos integrantes desta Casa, ao invés de abrandar os ataques, deu lugar à sede de vingança, à guerra suja por intermédio da imprensa, buscando atingir-me com as inverídicas e reiteradas acusações, em nome de falsa e farisaica ética, procurando transformar-me em símbolo do erro nacional, seguramente a serviço de desviar, também, a atenção da opinião pública de problemas e mazelas que efetivamente preocupam o povo brasileiro.

            Com o episódio da violação do painel eletrônico do plenário, cuja apuração redundou na renúncia de dois Senadores, ampliou-se o ódio, cresceram os ataques, especialmente dos bajuladores e comprometidos oportunistas, que vislumbraram a oportunidade de dar vazão a sua sede de vingança. Preestabeleceu-se de imediato como sentença o meu afastamento da Presidência do Senado e até mesmo do mandato, a mim concedido pelo povo do Pará.

            Hoje faço questão de tornar público episódio que se passou durante os procedimentos de apuração da violação do painel eletrônico, no qual mantive equilíbrio e justeza, sem, por nenhum instante ou por qualquer modo ou meio, tentar atingir o meu desafeto.

            Instado naquele momento, atendi a apelo do Senador José Roberto Arruda e falei ao telefone com o ex-presidente Antonio Carlos Magalhães. Malgrado os agravos que ele me havia imposto para assegurar-lhe minha imparcialidade na condução do assunto, o que foi reconhecido expressamente por ele, em seu discurso de renúncia, quando falou a propósito de que o desate de seu processo chegasse à Mesa Diretora do Senado, disse ele: “Não que eu acreditasse no seu espírito de vingança, nunca acreditei, mas não me ficaria bem, depois de tantas acusações que fiz contra V. Exª, depender da sua benesse para continuar Senador.”

            Isso porque, publicamente, declarei ser contrário à condução do processo com a intempestividade e a precipitação que lhe caracterizaram, fato para o qual invoco alguns testemunhos, como os dos Senadores Edison Lobão, Amir Lando e Ney Suassuna. O primeiro como interlocutor permanente de todo o episódio atestará a minha correção, e os outros dois, que ouviram como representantes do meu Partido no Conselho de Ética, minha manifestação pessoal de que não se admitisse prejulgamento e apenação com perda de mandato.

            Não houve, Sr. Presidente, em tal gesto nenhum favor pessoal ou barganha em relação ao meu adversário, mas simplesmente a observância de elementar critério de respeito ao direito de defender-se, cláusula pétrea das constituições dos países civilizados, após regular contraditório processual, onde a sentença deve ser o último ato e não o primeiro em julgamento de qualquer natureza.

            Ao longo da via-crúcis política a que tenho sido submetido, em que não foram poupados meus familiares, meus amigos e até meus colaboradores, que desenvolvem suas atividades profissionais, não conseguiram encontrar provas que legitimassem as torpes acusações, sempre, diariamente, reiteradas na mídia, em campanha jamais vista para destruir um homem público neste País.

            Em junho deste ano, foi divulgada matéria escandalosa, na qual me atribuiu recebimento de cheque de US$4 milhões no hall de um hotel em São Paulo, há treze anos, de acordo com gravações clandestinas, publicadas em revista semanal, com estardalhaço e constituindo matéria de capa.

            Em julho, nova fita de gravação telefônica, desta feita no Estado do Amazonas, atribuía-me a falta de pedir propina de US$5 milhões por intermédio de um Deputado Estadual para facilitar a tramitação de interesse na Sudam, tudo em noticiário o mais escandaloso possível.

            As acusações eram irresponsavelmente repercutidas, repetidas, de tal forma impactantes que parecesse uma enxurrada incontrolável de ilícitos por mim praticados, sempre com o maior estrépito com vistas a causar indignação junto à opinião pública em face de tantas denúncias acumuladas.

            Cabe razão a Baltasar Gracián, quando escreveu: “É muito fácil adquirir má fama, porque o mal sempre é crível e custa muito a apagar-se”.

            Meus desafetos superaram Maquiavel, que afirma: “As injúrias devem, pois, fazer-se todas de uma só vez para que, durando menos, ofendam menos; e os benefícios, aos poucos, para durarem mais.”

            Contra mim, as injúrias se alongam por 1 ano e 5 meses, causando constrangimento pessoal e político de tal ordem que solicitei, em medida inusitada, licença de 60 dias da Presidência do Senado, para que essas e outras acusações pudessem ser apuradas, sem que me fosse imputado tentar influenciar ou obstruir procedimentos apuratórios.

            Durante o interregno da minha licença, foram desmentidas as graves acusações sobre recebimento de cheque de US$4 milhões, num hotel em São Paulo, pelos próprios autores da infâmia, em depoimentos prestados à Polícia Federal e à Corregedoria do Senado Federal. E foi também desmontada a farsa criminosa da falsa gravação de Manaus que, em verdade, jamais existiu.

            Enfim, mais uma vez ficou demonstrado claramente o ânimo exacerbado e passional de acusar levianamente, sempre com muita repercussão, pretendendo, não a investigação responsável, mas buscando desonrar-me perante a sociedade brasileira, de forma a desgastar minha imagem também perante meus pares, que em mim confiaram a Presidência do Senado Federal, tentando impor um clima de destruição antecipada mediante linchamento moral sem limites, constrangendo a todas as senhoras e todos os senhores a esta campanha infamante.

            Por que tantas ofensas? Mais uma vez, recorro a Maquiavel: “Na verdade, os homens ofendem por medo ou por ódio”.

            Entretanto, tenho certeza, Sr. Presidente, que os integrantes do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar analisarão com independência, imparcialidade e justiça, as infâmias e misérias contra mim levantadas reconhecendo que tenho cumprido os meus deveres e exercido meus direitos no mandato de Senador da República. Não permiti que prosperasse com a minha indiferença a conduta que Rui Barbosa tão bem definiu e fixou: “no julgamento político, antes de a vítima ser levada a julgamento há que se desonrá-la”. No meu caso, não há pessoas de boa fé que não vejam, sem nenhuma dúvida, que sofro um julgamento meramente político, adredemente montado como conseqüência da minha eleição para a Presidência do Senado Federal

            Enfim, do que pretendiam se constituíssem acusações provadas contra mim, como de forma lamentável foi exaustivamente divulgado pela mídia, certo é que no relatório de parte da Comissão de Sindicância do Conselho de Ética, apenas remanescem o chamado episódio do Banpará, que já remonta há 17 anos e a tramitação legislativa do Requerimento nº 53, de 2001, apenas esses dois assuntos.

            O episódio Banpará, porque refuto, Sr. Presidente, as acusações e nego ter-me beneficiado de aplicações de tais recursos, sou acusado de faltar com a verdade. Considero uma ignomínia a acusação de que menti somente por recusar a assumir ato que não pratiquei, que dele não fui responsável. Ao proclamar minha inocência, não fui além do direito que a Constituição brasileira assegura a qualquer cidadão, a quem se garante em depoimento até o direito ao silêncio.

            Hipóteses, ilações, probabilidades são instrumentos de manipulação para a elaboração de teorias indutivas. Mas o que está em jogo não são métodos ou procedimentos acusatórios unilaterais, e, sim, a minha honra pessoal. Por isso não me quedo calado sem que se me anteponham provas incontroversas, as quais não existem e nem nunca existirão.

            Sou eu, Sr. Presidente, que desde 1996, tenho insistido em esclarecer e investigar o assunto, e assim coligi provas expressas, escritas, que demonstram não só minha inocência como o ânimo que “orientava” a devassa que se fez com “esmero” em minhas contas bancárias.

            E não se alegue que o que se escreveu à época - 1992 - não é um atestado da inocência, felizmente a escrita fica, não para livres interpretações conjunturais ou de conveniências, mas para demonstrar expressamente a verdade real, diferente das palavras ditas, que estas o vento leva, ao passo que na sabedoria popular, “vale o que está escrito”.

            É o relatório final e conclusivo do Banco Central do Brasil que afirma - repito que não se trata de outro relatório -: “Muito embora os inspetores do Banco Central tenham se esmerado na busca de documentação, com vistas a individualizar os infratores, não conseguimos detectar provas suficientes, robustas e convincentes no sentido de, juridicamente, indiciar o Sr. JADER FONTENELE BARBALHO”. Esse documento, Sr. Presidente, foi assinado pela hierarquia jurídica até o Presidente do Banco Central do Brasil.

            Sou eu que tenho não só os documentos e pareceres que me isentam, mas também busquei o Poder Judiciário, para que todos os documentos sejam estudados e analisados por peritos judiciais. A iniciativa foi minha. Esses trarão o suporte técnico incontraditável às minhas afirmações, que contestam peça unilateral por alguns considerada equivocadamente como dogma.

            Vale registrar, Sr. Presidente, que o Ministério Público, tanto Federal como do Estado do Pará, não formalizou nenhuma acusação contra mim. E nenhum deles o fez porque cada qual apurou não possuir elementos probatórios para tanto. Preferiram ambos, Sr. Presidente, requerer diligências que pudessem melhor elucidar os fatos, apesar de já haverem, em seis manifestações anteriores, proclamado a minha não responsabilização no episódio em causa, determinando seis vezes o arquivamento.

            Como então, Sr. Presidente, acusar-me de mentir por negar a acusação? Minto, porque nego a acusação no exercício das minhas garantias constitucionais, entre as quais estão a presunção da inocência e a ampla defesa? Como cogitar de mentira se a Justiça ainda não decidiu sobre esses fatos?

            Ensina Norberto Bobbio, em Batalhas Políticas: “O significado fundamental de uma constituição democrática é afirmar que o poder sobre os homens, seja ele exercido por determinado grupo ou pessoa, deve ter limites juridicamente estabelecidos”.

            O Poder Judiciário manifestou-se, exclusivamente, para permitir investigações no Supremo Tribunal Federal, e para autorizar a produção antecipada de provas no Pará. Ora, se o Ministério Público e o Poder Judiciário afirmam que é preciso investigar, obviamente não há provas e são necessários esclarecimentos. É uma questão de lógica e de mínimo bom senso.

            Então, como afirmar que estou a mentir quando nego a incriminação que pretendem me atribuir? Disse e repito: não usei nenhum recurso do Banpará em minhas contas pessoais e em minha movimentação financeira, há 17 anos.

            Destaco ainda que as acusações da inspeção não foram, em momento algum, recepcionadas pela autoridade monetária, tal sua inconsistência probante.

            Esta é a verdade! Tenho convicção ao negar a prática de que sou acusado e me está sendo negada a expressão do dissenso, sob o argumento de que falto com a verdade.

            Peço a atenção de V. Ex.ª e do Plenário da Casa. Recorro às palavras de um dos Membros da Comissão de Sindicância, o Senador Jefferson Péres, que no dia 29 de agosto, ao inquirir-me, manifestou-se desta forma: “Senador Jader Barbalho, não vou fazer nenhuma pergunta sobre o Relatório Patruni, porque acho que isso só vai ser esclarecido devidamente pela perícia e julgado definitivamente pela Justiça. Saberemos mais adiante se V. Ex.ª é inocente ou culpado”. (Ata da reunião de Comissão de Inquérito - depoimento do Senador Jader Barbalho).

            Quem fez tal afirmação, portanto, foi o Senador Jefferson Péres.

            Com relação à imputação de procurar dificultar tramitação do Requerimento que pedia informações ao Banco Central sobre o Banpará, minha resposta, Sr. Presidente, são fatos:

1-     Quem oficiou ao Banco Central, em 06 de março de 2001, requerendo a remessa imediata dos documentos ao Ministério Público fui eu; que também solicitei cópia para mim;

2-     Quem pediu Certidão de documentos contidos nos autos de inspeção fui eu;

3-     Quem recorreu à Justiça, através de habeas data, para obter a cópia integral do processo do Banco Central fui eu;

4-     Quem ofereceu espontaneamente ao Senado Federal os extratos das contas bancárias no período de 1984 a 1988 fui eu;

5-     Quem requereu formalmente, desde 1996, o procedimento investigatório junto ao Ministério Público do Pará, para esclarecer os fatos que só apareciam na imprensa e que estavam sob a suposta guarda do sigilo bancário do Banco Central também fui eu, Sr. Presidente;

6-     Finalmente, quem se afastou espontaneamente por 60 dias, para facilitar a apuração dos fatos também fui eu, Sr. Presidente.

            Como se pode afirmar, portanto, que a minha conduta é de obstrução ou de dificultar a apuração?

            Em que momento, portanto, Srªs e Srs. Senadores, nos dois episódios, infringi eu o decoro parlamentar no exercício do mandato de Senador da República?

            Permitam-me raciocinar com o absurdo, contrario sensu minha concordância com as acusações consistiria no adequado comportamento de decoro parlamentar? Isto é, se eu concordasse, se eu dissesse que era procedente, a Comissão não consideraria que eu havia mentido e, portanto, eu não haveria infringido o decoro parlamentar. Recusar a acusação? Aí, sim, minto! Aí infrinjo o decoro parlamentar!

            A busca da verdade é mentir? Já o meu assentimento às levianas acusações seria conduta ética e de decoro parlamentar? Bastaria aceitar a acusação e não teria infringido o decoro parlamentar. Aí seria o absurdo.

            Para atender ao Código de Ética e Decoro Parlamentar, Sr. Presidente, devo comportar-me como Galileu Galilei, ao enfrentar o Tribunal da Inquisição? Para escapar da pena de morte, teve que negar sua crença de que “o Sol é o centro do universo e de que a Terra se move”. Foi poupado da morte por dizer o que os inquisidores queriam, como Voltaire em carta a Rousseau, em 1755, descreveu. Diz Voltaire: “Os inimigos de Tasso transformaram sua vida numa malha de amarguras, os de Galileu fizeram-no gemer nas prisões aos 70 anos por saber o movimento da Terra, e o mais vergonhoso é que o obrigaram a retratar-se” (dessa verdade).

            Talvez no meu caso, para livrar-me da acusação de faltar com a verdade e infringir o Código de Ética e Decoro Parlamentar, eu também deva concordar com todas as acusações que me atribuem. Se concordar, Srªs e Srs. Senadores, deixarei de infringir o decoro parlamentar. Como as refuto e contesto documentalmente, aí infrinjo, Sr. Presidente.

            E mais uma vez pergunto: Que infração, Sr. Presidente, terei eu, então, cometido para infringir o decoro parlamentar do Senado Federal?

            Respondo sem qualquer dúvida, Srªs e Srs. Senadores: ter sido Presidente e Líder do PMDB e haver sido eleito Presidente do Senado Federal, o que colocou a mim e ao meu Partido em posição fundamental no jogo do Poder, particularmente com vistas à sucessão presidencial. Estávamos inconvenientemente fortalecidos e, portanto, era necessário destruir-me e, por conseqüência, atingir o PMDB. Este foi seguramente o meu crime, Srªs e Srs. Senadores: ser eleito o Presidente do Senado Federal e colocar o meu Partido em posição destacada no jogo do Poder do Brasil.

            Sr. Presidente, e essa certeza me vem quando relembro o diálogo havido com o meu amigo ex-Presidente José Sarney, quando fui à sua casa, às vésperas da reunião do PMDB, que me indicou como candidato do Partido à Presidência do Senado.

            Naquela oportunidade, ele me alertou ter chegado a seu conhecimento que a minha insistência em concorrer à Presidência do Senado redundaria em ampla campanha pela imprensa e que posteriormente seria encampada por setores de dentro e de fora do Congresso Nacional. E, se fosse eleito, tentariam inviabilizar a minha permanência na Presidência do Senado Federal.

            Sr. Presidente, na ocasião eu poderia ter recuado, adotando a Arte da Prudência do aragonês Baltazar Gracián, que recomendava: “Nunca competir. A emulação descobre defeitos que a cortesia esqueceu; muitos viveram acreditados enquanto não tiveram adversários. O calor da contestação aviva e ressuscita infâmias mortas, desenterra hediondezas passadas e antepassadas”.

            Entretanto, Sr. Presidente, preferi sugestionar-me com a leitura do sevilhano Miguel de Cervantes.

            Srªs e Srs. Senadores, Erasmo, em releitura de Homero sobre a sabedoria, escreveu que quem exerce o Poder tem que “saber o máximo que é possível, olhando para trás, para o que já aconteceu, e para a frente, para o futuro, e, então, se usar tudo que souber para o bem de seu país e não para o seu próprio bem”.

            Sr. Presidente, tenho a exata compreensão de que a mim foi destinada esta campanha, na qual alguns desejam que esteja previamente condenado, e mais, de que a luta que estou travando há que se limitar a minha pessoa, apesar de entender que também tem como alvo o meu Partido, PMDB, com o objetivo de enfraquecê-lo politicamente neste momento pré-eleitoral.

            Por isso, constato que a grandeza desta Casa não merece que ela seja consumida nesta batalha. É um preço excessivamente elevado a pagar o Senado da República.

            E é em respeito à instituição, que presido por livre escolha e pela maioria absoluta dos meus companheiros de Senado, que em mim reconheceram qualidades para o cargo, que tanto me honro de exercer, e em retribuição à confiança que em mim depositaram, que me afasto hoje da Presidência do Senado Federal. A esta renuncio para preservá-lo e servi-lo, mas não abdico da resistência à injustiça e à infâmia de que sou objeto.

            Meu gesto é precedido de acordo político garantindo ao meu Partido, o PMDB, a manutenção do cargo que lhe pertence.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, prega o Livro dos Eclesiastes, dentre outras verdades, estas:

Todas as coisas têm seu tempo e todas elas passam debaixo do céu segundo o termo que a cada uma foi prescrito. Há tempo de nascer e tempo de morrer. Há tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou. Há tempo de matar e tempo de sarar. Há tempo de destruir e tempo de edificar. Há tempo de chorar e tempo de rir. Há tempo de se afligir e tempo de saltar de gosto. Há tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las. Há tempo de dar abraços e tempo de se pôr longe deles. Há tempo de adquirir e tempo de perder. Há tempo de guardar e tempo de lançar fora. Há tempo de rasgar e tempo de coser. Há tempo de calar e tempo de falar. Há tempo de amor e tempo de ódio. Há tempo de guerra e tempo de paz.

            Sr. Presidente, esses tempos se sucedem como uma lição implacável aos homens.

            Dirijo-me, agora, ao meu querido povo do Pará, a quem servi e a quem devo os sucessivos cargos que tenho exercido e que em nenhum momento faltou com sua solidariedade e confiança neste “caboco” paraense que ousou chegar ao mais alto cargo do Poder Legislativo, desafiando preconceitos e paixões políticas.

            O Pará, cujas riquezas contribuem decisivamente para o Brasil, não tem tido a retribuição à altura por esse desempenho, em grande parte por falta de força política no cenário nacional. Por isso, paraenses, lamento que o nosso Estado seja privado do privilégio do cargo de Presidente do Senado Federal.

            Que o povo do Pará compreenda que o meu crime, Sr. Presidente, foi apenas ter ousado politicamente, e estar à altura das melhores tradições da Cabanagem.

            Aos servidores do Senado Federal o meu renovado testemunho de apreço por sua competência e dedicação à instituição, exortando-os a ela empenharem a continuidade e a lealdade. Srs. funcionários, os políticos passamos, inclusive pela Presidência, mas a instituição é permanente.

            Encerro, repetindo a lição de Hannah Arendt que transcrevi em meu discurso ao assumir a Presidência do Congresso Nacional: “A política é feita por amor ao mundo. O que impele os homens e mulheres à cena pública, a esta alta exposição, não é o ímpeto da destruição - sempre alimentado pelo ódio -, mas o espírito da construção, de comunhão, de compartilhamento das responsabilidades comuns”.

            Srªs e Srs. Senadores, que sejamos dignos dos mais nobres ideais que alimentamos em favor do Brasil.


            Modelo14/19/249:54



Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/09/2001 - Página 22256