Pronunciamento de José Fogaça em 25/09/2001
Discurso durante a 120ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Comemoração ao centenário de nascimento do ex-Senador Alberto Pasqualini.
- Autor
- José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Comemoração ao centenário de nascimento do ex-Senador Alberto Pasqualini.
- Publicação
- Publicação no DSF de 26/09/2001 - Página 22676
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, ALBERTO PASQUALINI, EX SENADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ELOGIO, VIDA PUBLICA, IMPORTANCIA, OBRA INTELECTUAL, IDEOLOGIA, POLITICA.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Ramez Tebet, Sr. Ministro Nelson Jobim, representando o Supremo Tribunal Federal, Sr. Ministro de Estado Eliseu Padilha, Srªs e Srs. Deputados, Srªs e Srs. Senadores, amigos e familiares de Alberto Pasqualini, o dia de hoje não é exatamente o dia do centenário do nascimento de Alberto Pasqualini, que nasceu no dia 23 de setembro, no distrito de Ivorá, então distrito do Município de Júlio de Castilhos. Hoje, Ivorá é um Município emancipado, é uma cidade com a sua autonomia social e política. Mas lá, naquela pequena cidade, nasceu talvez aquele que tenha marcado a sua passagem na política e na história do Rio Grande do Sul como um dos mais inspirados autores de literatura política, um dos mais criativos pensadores e doutrinadores que o nosso Estado teve no século passado, e a vida de Alberto Pasqualini marcou a primeira metade do Século XX - nasceu em 1901 e morreu em 1960. Viveu breves 59 anos; breves, mas fulgurantes do ponto de vista da sua criação intelectual e do ponto de vista da sua notável intervenção política na vida e na história do nosso Estado.
Meus pais sempre falavam, na minha infância, da famosa enchente de 1941, que fez o rio Guaíba subir pela Avenida Borges de Medeiros e chegar quase até a Rua da Praia. Esse era um dos fenômenos e dos fatos marcantes do início da década de 40. Um dos outros fatos marcantes do início da década de 40 era, sem dúvida, a grande movimentação feita para que o Brasil apoiasse as forças democráticas na guerra contra o Eixo. Esse cenário todo, de uma cidade conflagrada, abatida por uma catástrofe, o Brasil decidindo constituir a Força Expedicionária Brasileira e rumando para a Europa, em defesa da democracia, foi o cenário no qual emergiu a figura maiúscula de Alberto Pasqualini.
Vigorava o Estado Novo - estava em plena vigência o regime autoritário. O Presidente da República era Getúlio Vargas e, nesse período, houve uma interessante mudança na Interventoria que governava o Estado do Rio Grande do Sul. O Interventor era o carismático e notável General Cordeiro de Farias, homem remanescente da Revolução de 1924, da Revolta dos Tenentes na Guarnição de Santo Ângelo, que deu início à caminhada de Luiz Carlos Prestes pelo Brasil. E a extraordinária figura de Cordeiro de Farias estava, naquele momento, sentado na cadeira de Interventor, no Estado do Rio Grande do Sul.
Mas o fato de o Brasil preparar-se para ir à Guerra, fez com que esse homem, dado à aventura, dado aos momentos grandiloqüentes, às ações políticas ostensivas, o grande Cordeiro de Farias pediu a Getúlio Vargas que o licenciasse da Interventoria, que o liberasse da responsabilidade de continuar governando o Estado do Rio Grande do Sul como Interventor do regime do Estado Novo, para que ele pudesse integrar a Força Expedicionária Brasileira iria à Europa. Isso deu margem para que um coronel, o Coronel Ernesto Dorneles, assumisse na condição de Interventor. E Ernesto Dorneles gostava muito de um vereador de Porto Alegre chamado Alberto Pasqualini. São as coincidências históricas, são as condições singulares, são os fatos surpreendentes, inesperados, que fazem produzir as conseqüências e o processo histórico.
Ali, na Interventoria, o então Tenente-Coronel Ernesto Dorneles chamou para trabalhar com ele um jovem advogado, vereador de Porto Alegre, chamado Alberto Pasqualini, para ser o seu Secretário do Interior e Justiça. E a pasta de Secretaria de Interior era uma pasta de coordenação política, portanto tinha um papel importante.
Mas, estranhamente, também chamou, de volta, porque havia saído e agora voltava, uma figura respeitada por todas as razões, por sua enorme capacidade administrativa, o Dr. Walter Jobim, que também foi exercer funções no secretariado do Tenente-Coronel Ernesto Dornelles.
Esses dois secretários de Estado brilharam tanto no exercício do cargo que, já ao final do mandato, em 1947, quando o Brasil começa a emergir do regime autoritário do Estado Novo - escreve-se a nova Constituição em 1946 -, ambos, Walter Jobim e Alberto Pasqualini, disputam o Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Pasqualini não venceu. Venceu Walter Jobim. Formou uma coalizão que lhe deu um apoio mais amplo de votos.
Mas isso não fez de Pasqualini uma figura menor na política do Rio Grande do Sul; não fez de Pasqualini um homem omisso, não o tornou menos importante. Ele começa a escrever, a produzir a sua literatura política, principalmente nas páginas do jornal Correio do Povo, e começa, de maneira gradativa, a crescer no conceito e no interior do trabalhismo, que recém-começava a se formar no Rio Grande do Sul.
Pasqualini demonstrou sempre que não precisava de um mandato para exercer influência política, nem de um status para poder conduzir os destinos do povo gaúcho, para poder apontar rumos, abrir caminhos, janelas, alternativas. E essa marca de Pasqualini parece-me a marca mais indelével do seu caráter como político. Foi vereador, foi senador e perdeu duas eleições para o governo do Estado. Mas dificilmente se vai encontrar na história do nosso Estado alguém que tenha tido um papel tão marcante, tão significativo na conformação de uma doutrina política como ele teve em prol do trabalhismo.
Tudo o que se vai encontrar mais tarde no discurso de Leonel Brizola, como Governador, a partir de 1958, na linguagem adotada por João Goulart, como Presidente da República, ao encaminhar convictamente as reformas de base, tudo isso se alimenta do pensamento básico, da doutrina, dos conceitos emitidos na obra de Alberto Pasqualini.
Creio que essa marca de Pasqualini é o que devemos, neste momento, lembrar. Nosso colega conterrâneo, Senador Pedro Simon, fez um registro magnífico, irreparável, da vida e da obra de Pasqualini. A Senadora Emilia Fernandes também traçou aqui claramente os contornos da sua ideologia.
Mas eu quero, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. convidados, salientar este papel: o do intelectual, o do doutrinador, o do construtor de conceitos, o do definidor, o do idealizador, o do homem que edificou uma doutrina que teve larga influência, por mais de cinqüenta anos, na vida política do Rio Grande do Sul, quiçá do Brasil.
Creio que a vida e a obra de Alberto Pasqualini são simbolizadas por um livro que não é propriamente uma obra de sua autoria, mas um conjunto de trabalhos publicados ao final de sua vida, em 1958. Esse livro, importante, marcou também a vida de muitos políticos, fez a cabeça, formou a base de convicções dos mais importantes políticos do Rio Grande do Sul que palmilharam os caminhos da socialdemocracia: Bases e Sugestões para uma Política Social.
Ocorre que, em 1950, depois do Governo Walter Jobim, o ex-Tenente-Coronel Ernesto Dornelles é guindado à condição de candidato a governador do Rio Grande do Sul pelo Partido Trabalhista Brasileiro. Havia morrido em desastre aéreo o ex-Ministro da Aeronáutica, Senador Salgado Filho, que era o candidato, e o substituiu o já Coronel Ernesto Dornelles, que vence a eleição. Com ele, elege-se para o Senado Alberto Pasqualini. O Governador Ernesto Dornelles nomeia diversos secretários de Estado e, entre eles, o Dr. Júlio Marino de Carvalho é guindado à condição de Secretário de Educação.
Como o Dr. Júlio Marino de Carvalho veio a ser tornar mais tarde o avô dos meus filhos mais velhos, ou melhor, como eu me tornei o pai de seus netos, pude, um dia, no longínquo ano de 1968, na sua biblioteca de professor de Direito Penal, ter às mãos Bases e Sugestões para uma Política Social, de autoria de Alberto Pasqualini. Era 1968 e estávamos nas ruas para proclamar que a revolução não aceitaria reformas e que o reformismo era um caminho de obstrução do processo revolucionário. O grupo político ao qual eu pertencia e no qual atuava recusava o pensamento reformista, a socialdemocracia, por entendê-la tão-somente uma forma de fazer segurar a história, de impedir o avanço da revolução e da verdadeira transformação, que era a instalação da ditadura do proletariado.
Caiu-me às mãos, naquela biblioteca alentada, rica, imensa e estimulante do Dr. Júlio Marino de Carvalho, Secretário de Educação de Ernesto Dornelles, o livro de Alberto Pasqualini. Pela densidade do seu texto, pela sua enorme preocupação com todas as contradições da economia capitalista e pelo seu desejo se não de criar uma terceira via pelo menos de buscar um caminho intermediário, pouco a pouco fui desenvolvendo um enorme respeito e uma profunda admiração pela figura de Alberto Pasqualini.
Devo dizer que Pasqualini me ensinou, naquele momento, que um programa de reformas sociais, um programa de reformas de base, um programa de transformação estrutural da sociedade, mesmo da sociedade capitalista, mesmo sem desapropriar os meios de produção, poderia ser não um obstáculo, mas, quem sabe, um caminho para a verdadeira transformação social. Foi Pasqualini quem me ensinou e quem ensinou a minha geração que as reformas de base não eram um fator impediente, mas um fator que determinaria ou que concorreria para, quem sabe, um dia, o mundo mudar para melhor.
Esta equação e esta mudança me veio após a leitura preocupada e ao mesmo tempo interessada da publicação de 1958, nos anos finais da sua vida, de Bases e Sugestões para uma Política Social. Tornei-me mais condescendente com a idéia de que o mundo pode avançar gradualmente ao invés de haver uma ruptura única na história em um determinado momento. E que esse talvez seja o caminho mais conseqüente para fazer justiça social.
Por isso, Sr. Presidente, ilustre Senador Ramez Tebet, nesta tarde, a partir do requerimento do ilustre Senador Pedro Simon, associo-me à homenagem a essa figura marcante, inesquecível, que delineou o caráter da política do Rio Grande do Sul, que delineou bases doutrinárias, que definiu conceitos, que formou homens e mulheres que acabaram por, mais tarde, dar o contorno do que é a política no Rio Grande do Sul.
Seus adversários reconhecem sua grandeza, sua lhaneza, sua inteligência, seu profundo labor intelectual. E aqueles que nele se abeberaram, aqueles que da sua inteligência se serviram para se tornarem um pouco melhores do que eram só podem dizer para Alberto Pasqualini: muito obrigado pelo seu legado, pela sua inteligência, pela sua doutrina, pela sua verdade, pela sua história!
O Rio Grande se orgulha da memória de Alberto Pasqualini. O Brasil se orgulha da memória de Alberto Pasqualini.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas!)
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