Pronunciamento de Alvaro Dias em 27/09/2001
Discurso durante a 122ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Questionamento à posição do PSDB diante da corrupção no País. Referências à entrevista do Sr. Peter Eigen, presidente da Transparência Internacional, publicada na revista Veja.
- Autor
- Alvaro Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
- Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA PARTIDARIA.
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.:
- Questionamento à posição do PSDB diante da corrupção no País. Referências à entrevista do Sr. Peter Eigen, presidente da Transparência Internacional, publicada na revista Veja.
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/09/2001 - Página 23107
- Assunto
- Outros > POLITICA PARTIDARIA. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.
- Indexação
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- QUESTIONAMENTO, MOTIVO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERRUPÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO, EXPULSÃO, SENADOR.
- REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, PETER EIGEN, PRESIDENTE, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), ANALISE, CORRUPÇÃO, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO, DANOS, SOCIEDADE, AUMENTO, POBREZA, FOME, BRASIL.
- DEFESA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), OBJETIVO, COMBATE, CORRUPÇÃO, RECUPERAÇÃO, ETICA, POLITICA.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. ÁLVARO DIAS (Bloco/PDT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem ocupei esta tribuna para justificar nossa filiação ao PDT e dissertar sobre o impasse surgido quando assinamos o requerimento que propunha a instalação da CPI da Corrupção no Congresso Nacional.
Propomos duas discussões fundamentais: uma delas, procuramos desenvolver ontem, dizendo respeito à liberdade de convicção pessoal. A afronta a esta liberdade é afronta a liberdades fundamentais, como do pensamento e da opinião.
A segunda discussão me traz à tribuna hoje. O que levaria um governo e um partido ou dirigentes de um partido detestarem tanto aqueles que pretendem contribuir para que a corrupção seja investigada, combatida, condenada e julgada em nosso País?
Trago, em socorro às posições que assumimos nesta Casa, uma opinião fundamental, a opinião de Peter Eigen, fundador de uma ONG que monitora a roubalheira no mundo e diz que já há consenso mundial de que esta corrupção é muito danosa à sociedade. Este alemão preside a Transparência Internacional, devotada à causa que, em tese, todos aplaudem: a promoção da honestidade. Diz ele numa entrevista publicada nas páginas amarelas da revista Veja:
O ranking mundial da corrupção, elaborado pela instituição, é uma respeitadíssima fonte de referência. Não apenas influi em decisões governamentais, como também é levado em conta pelas grandes corporações na hora de fazerem investimentos no Terceiro Mundo. (Veja - 25/04/01)
Embasado nessa opinião, Sr. Presidente, reitero a importância desta discussão sobre o comportamento do Presidente da República, do Governo e de dirigentes do PSDB, relativamente à instalação de uma CPI da corrupção no Senado Federal.
Diz o alemão: “o Brasil poderia ser mais rico e poderoso se não fosse pela ladroagem”.
Registra ainda que - e essa afirmativa deve levar os integrantes do PSDB à reflexão:
Partidos que encobrem corruptos propagam a idéia de que o roubo é imbatível. Assim, o cidadão comum passa a achar que também pode roubar. Esses partidos fazem um grande desserviço à democracia.
E afirma o Presidente da Transparência Internacional:
A população certamente passa a associar o partido a falcatruas. O mais grave é que isso cria a impressão de que nada pode ser feito contra a corrupção. Se um político rouba descaradamente, não responde às acusações e fica tudo como era antes, o que o cidadão irá pensar? Vou roubar também. Esse partido está fazendo um grande desserviço à democracia.
E diz mais:
Não gosto de fazer estimativas gerais, porque são todas incorretas. O importante é perceber que o custo para a sociedade é muito maior que as cifras que geralmente aparecem. Por exemplo: determinado governante é pego recebendo 1 milhão de dólares para aprovar uma obra. Na verdade, o povo perde muito mais que esse milhão. Se a empresa recorreu ao suborno, muito provavelmente a obra está superfaturada. Em alguns casos, a obra nem é necessária. O custo é de bilhões de dólares. O Brasil, assim como o restante da América Latina, está cheio de elefantes brancos.
E continua o alemão:
Há cálculos feitos por gente de respeito que apontam um número terrivelmente triste: um terço da dívida externa foi para o bolso de políticos e funcionários públicos corruptos. Essa estimativa é provavelmente bastante conservadora. Pense bem. Um país com recursos naturais inigualáveis, em muitos aspectos até mais rico que os Estados Unidos, com um povo amável, um potencial tremendo, mas mergulhado em uma situação infernal por causa da corrupção. Isso é o que se diz da Nigéria, que é riquíssima em petróleo, mas em parte também serve ao Brasil. Corrupção causa incríveis sofrimentos para as pessoas mais pobres. É mortal e monstruosa. O Brasil poderia ser um país muito mais rico e poderoso.
E diz mais:
Dá para dizer que a corrupção surgiu com Adão e Eva. A Bíblia, o Corão, o livro sagrado dos muçulmanos, e os escritos religiosos mais importantes do mundo relatam episódios. O filósofo chinês Confúcio, que viveu cinco séculos antes de Jesus Cristo, reclamava de funcionários corruptos. A corrupção começou quando o homem pela primeira vez conseguiu abocanhar poder no agrupamento no qual vivia. A tentação de usar o poder delegado em benefício econômico nasceu com o homem.
E prossegue:
De maneira geral, as pessoas que coordenam grandes teias de corrupção são extremamente ricas. Faço grande esforço, mas não consigo entender por que elas continuam roubando, por que precisam de mais dinheiro. Estamos falando de gente com fortunas de 10 milhões de dólares no banco.
São afirmações importantes, sem dúvida nenhuma, porque partem de alguém que se dedica em tempo integral a uma ONG que tem como objetivo combater a corrupção.
E ele conclui:
Infelizmente, não há fórmulas mágicas [para se acabar com a corrupção]. É um processo lento e cheio de avanços e retrocessos. Não podemos ter só uma bala na agulha. É uma guerra, não uma batalha.
Sr. Presidente, o que faríamos nós, nesta Casa, se não assumíssemos a nossa responsabilidade de participar dessa guerra? Não há dúvida de que, embora as estatísticas sejam sempre pouco confiáveis, aquilo que se revela por meio da transparência internacional é absolutamente verdadeiro. A corrupção tem sido, sim, uma das causas principais da fome, da pobreza, da falta de oportunidades, do desemprego, do subdesenvolvimento econômico, cultural e social do nosso País.
Em pesquisas efetuadas pela Vox Populi, pelo Ibope e pela Transparência Internacional, a ONG que me referi, dedicada a medir e denunciar desvios de recursos públicos, constatou-se que os casos de irregularidades estão aumentando e que o combate à corrupção se tornou uma das prioridades da sociedade para a ação de governo, já suplantando em importância o controle da inflação.
Há muito tempo, Sr. Presidente, que o combate à corrupção, na ótica popular, suplantou o controle da inflação, já que chegamos, neste País, em função do Plano Real, à estabilidade econômica.
Os principais focos de fraudes do serviço público, já identificados, são o INSS, com falsos benefícios, o DNER e o DNOCS, com obras superfaturadas e precatórios irregulares, a Sudam e a Sudene, com incentivos fiscais desviados e o Incra e a Terracap (do GDF, mas com 49% de capital da União), com desapropriações fraudulentas. Isso é pesquisa, não é opinião.
A licitação do MEC para a compra de computadores e programas para as escolas de todo o País está sob investigação pela Corregedoria, em função da denúncia de favorecimento à Microsoft.
Estamos citando alguns fatos.
De forma ampla, pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas, Marcos Fernandes, Fernando Garcia e Andréa Bandeira, divulgaram estudo sobre a forma como a corrupção afeta o crescimento econômico nacional, mensurando o impacto dos desvios na produtividade e na renda de diversos países.
O estudo afirma que a corrupção caminha lado a lado com estruturas institucionais ineficientes e possui intensa interferência na qualidade dos investimentos públicos e privados, além de afastar investidores estrangeiros e criar incerteza em relação ao comportamento dos agentes perante os órgãos oficiais.
Referimo-nos, há pouco, à importância do ranking dos países corruptos relativamente a investimentos internacionais.
A corrupção, tanto quanto um desvio de conduta social, se apresenta como um custo de produção altamente influente na formulação dos contratos dos entes privados com o setor público, o que conduz a um aumento de orçamento indevido para sua compensação.
A garantia de rentabilidade, que é um dos pilares teóricos das relações econômicas, é definidora da forma quantitativa e qualitativa de equacionamento de qualquer projeto, e a parcela destinada a sustentar a corrupção diminui a efetividade do gasto com o mesmo, pois os agentes privados não vão abrir mão de seu lucro.
Agentes, corruptores e corruptos, envolvidos nos gastos públicos constituem uma sobrecarga de improdutividade que é paga pela sociedade, por meio de orçamentos superestimados. Deve-se acrescentar que tais agentes são normalmente de alto nível, o que aumenta a perda global de eficiência do processo de relacionamento.
Num ranking de 81 países analisados, o Brasil ocupa a 36ª posição, com um índice de corrupção percebida pelo menos duas vezes mais presente do que na Dinamarca, país considerado de menor corrupção no mundo.
Caso o Brasil - vejam, Srs. Senadores, como é importante este dado - apresentasse o mesmo índice de corrupção percebido na Dinamarca, os investimentos nacionais gerariam um maior Produto Interno Bruto, que redundaria em um aumento estimado em cerca de US$2.850 na renda per capita nacional (aproximadamente um acréscimo de 70% em relação à atual).
Vejam como é importante combater a corrupção e como se torna cada vez mais inexplicável a posição do Presidente Fernando Henrique Cardoso, do seu Governo e dos dirigentes do seu Partido. Ao combater a corrupção, nós estaríamos reduzindo a fome e a pobreza no nosso País. Por isso, é bom repetir sempre: tentar alternativas de combate à pobreza no Poder Legislativo mediante a idealização de projetos de lei, emendas à Constituição, será sempre uma farsa se não combatermos eficazmente a corrupção, que é responsável pelo desvio de bilhões de dólares no nosso País.
O risco, associado às incertezas decorrentes da corrupção, medido nesse estudo mostra que, enquanto a taxa de financiamento de longo prazo era de 28,8% ao ano no Brasil, a taxa na Dinamarca esteve em 12,7% (dados de 1998), mostrando a clara influência no comportamento dos agentes financiadores, sejam públicos ou privados, em relação aos projetos financiados.
Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nós poderíamos continuar aqui dissertando sobre fatos, números, estatísticas que nos levam a concluir que a corrupção é, sem sombra de dúvidas, uma das causas maiores, para não dizer a causa fundamental, do sofrimento do povo brasileiro, que vive a angústia de um País de injustiças sociais incríveis, sempre alimentando a esperança de uma vida melhor.
Daí, Sr. Presidente, esse confronto a que fomos levados com o Governo Federal e com o nosso Partido. Esse confronto nos desperta ainda mais para a necessidade de elegermos o combate à corrupção como prioridade do nosso mandato nesta Casa. Aliás, se nós não soubermos estabelecer com competência prioridades, não estaremos cumprindo com eficiência o nosso mandato; não estaremos exercendo com eficiência o nosso mandato e cumprindo o nosso dever.
A população do Brasil exige essa postura ética no trato da coisa pública, esperançosa de que seja possível, um dia, realmente passar a limpo esta Nação, para que possamos recolocar os valores éticos fundamentais como parâmetro para a atividade pública brasileira, ressuscitando a credibilidade das instituições públicas deste País, que foi sepultada diante de tantos escândalos nacionais, que levam a população a uma explosão de indignação sem precedentes.
Por isso, Sr. Presidente, creio que há compreensão para esse gesto de mudança partidária. Anarquizam a estrutura partidária brasileira porque querem, lamentavelmente, algemar aqueles que militam na base de sustentação do Governo. É evidente que não estava nos nossos planos a mudança partidária. A construção de verdadeiros partidos políticos é uma exigência nacional para se erigir um modelo político compatível com as aspirações da nossa sociedade. Obviamente, essas mudanças constantes não contribuem; pedagogicamente, constituem-se em péssima lição; e, pragmaticamente, destroem, anarquizam a estrutura partidária nacional, afastando-nos cada vez mais da realidade de partidos fortes, programáticos e destinados, realmente, a promover mudanças no País, de conformidade com as aspirações populares.
Não estou encerrando o debate sobre corrupção. Estou encerrando, hoje, o debate sobre a mudança de Partido. Mas quanto ao combate à corrupção, especialmente depois desse episódio lamentável - em que um Governo agiu despoticamente, impondo a sua vontade de impedir a instalação de uma CPI para investigar a corrupção, indo às últimas conseqüências, ao desatino de explodir uma estrutura partidária no meu Estado -, nós temos ainda clareza maior da importância de colocarmos como prioridade absoluta, no nosso mandato de Senador, o combate à corrupção.
Sr. Presidente, nós sempre procuramos agir em sintonia com as aspirações da sociedade. Já apresentei aqui pesquisas do Ibope sobre a opinião pública no que diz respeito a esse episódio de expulsão do Partido, de CPI da Corrupção, e trago hoje mais uma pesquisa realizada pelo jornal Folha do Paraná, de Londrina, um dos principais jornais do meu Estado. Esse jornal perguntou, pela Internet, aos seus leitores se eles concordariam ou não com intervenção no PSDB do Paraná. E diz, aqui, o analista Délio César:
O tamanho da burrice do comando nacional tucano pode ser medido pelas respostas apuradas: apenas 20% dos que responderam disseram que concordam e acham que o Partido vai melhorar, mas 80% não concordam e têm certeza de que vai piorar.
Essa é a opinião da população do Paraná sobre o comportamento de lideranças nacionais do PSDB, que desrespeitaram direitos adquiridos e afrontaram programa e estatuto; desmancharam uma organização partidária eficiente, num desserviço à democracia; e, principalmente, num desserviço à construção de verdadeiros partidos políticos no Brasil.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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