Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS QUINHENTOS ANOS DO RIO SÃO FRANCISCO, REGISTRADO POR OCASIÃO DA PASSAGEM PELO RIO DO NAVEGADOR AMERICO VESPUCIO, EM 04 DE OUTUBRO DE 1501.

Autor
Waldeck Ornelas (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Waldeck Vieira Ornelas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Outros:
  • COMEMORAÇÃO DOS QUINHENTOS ANOS DO RIO SÃO FRANCISCO, REGISTRADO POR OCASIÃO DA PASSAGEM PELO RIO DO NAVEGADOR AMERICO VESPUCIO, EM 04 DE OUTUBRO DE 1501.
Aparteantes
Paulo Souto.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2001 - Página 23664
Assunto
Outros
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DESCOBERTA, RIO SÃO FRANCISCO, NECESSIDADE, URGENCIA, PROVIDENCIA, RECUPERAÇÃO, VOLUME, AGUA, ATENÇÃO, AFLUENTE, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ESTADO DA BAHIA (BA), PROTEÇÃO, NASCENTE, LIMPEZA, VIA FLUVIAL, REFLORESTAMENTO, MARGEM.
  • DEFESA, URGENCIA, IMPLANTAÇÃO, COMITE, BACIA DO SÃO FRANCISCO, DEFINIÇÃO, PLANO, RECURSOS HIDRICOS, PRIORIDADE, EMPREGO, RENDA, POPULAÇÃO, NAVEGAÇÃO.
  • ANALISE, ATRASO, GOVERNO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, IRRIGAÇÃO, COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO DO VALE DO SÃO FRANCISCO (CODEVASF).
  • INFORMAÇÃO, INICIATIVA, ORADOR, CRIAÇÃO, COMISSÃO ESPECIAL, SENADO, ACOMPANHAMENTO, RECUPERAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, REGISTRO, CAMPANHA, MUNICIPIOS, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. WALDECK ORNELAS (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, comemoramos os 500 anos do rio São Francisco. Não desejo, contudo, falar-lhes da História, não desejo voltar-me para o passado. Venho aqui cuidar do presente e, sobretudo, do futuro do Vale do São Francisco. E isso tem a sua razão de ser. Esse é um rio estratégico para o nosso País, porque é o principal curso d’água do semi-árido nordestino. Preservá-lo, portanto, é um imperativo nacional.

            O Brasil, contudo, não tem experiência em recuperação de cursos d’água, mas a falta de uma ação ampla e eficaz pode ter como conseqüência, neste caso, a morte do rio.

            O que fazer? Sempre que se fala em política ambiental em relação a recursos hídricos, a ênfase é posta na qualidade da água. Automaticamente, associa-se meio ambiente e controle de poluição. É o caso do rio Tietê, do rio Paraíba do Sul, da baía de Guanabara, mas, certamente, não é o caso do rio São Francisco. É importante despoluir. Há focos de poluição no rio São Francisco. Há despejos dos esgotos urbanos, há a mineração, principalmente no rio das Velhas, que é um dos afluentes importantes, mas o problema principal diz respeito à recuperação do volume de água da bacia.

            A degradação tem feito com que o rio perca sua força, seu vigor. O São Francisco, que sempre foi um rio caudaloso, imponente, vigoroso, está, neste momento, definhando, doente, enfraquecido, degradado.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esses dados se assemelham ao que aconteceu nos últimos sete anos, em que o volume de água do rio esteve sempre abaixo da média histórica. Neste ano, estamos enfrentando uma seca mais crítica, mais violenta. Queira Deus essa seca não dobre de um ano para outro, sob pena de se perder todo o esforço de irrigação feito até agora, comprometendo os mercados, as marcas, os produtos, a tecnologia, os empregos, a renda, enfim, tudo o que se incorporou ao longo dos últimos 25 anos em termos de irrigação na bacia do São Francisco!

            No caso do rio São Francisco, é preciso cuidar, de forma prioritária, da quantidade da água, ou seja, é preciso recuperar o volume do rio, não opondo qualidade com quantidade, mas havendo quantidade com qualidade. É preciso que a política ambiental em nosso País trabalhe com esses dois conceitos aliados.

            O objetivo prioritário, portanto, há de ser o de recuperar o volume de água do rio. As prioridades gerais envolvem a construção de novos represamentos que sejam capazes de regularizar a vazão do rio ao longo de todo o ano. Sabemos que 70% das águas do rio São Francisco vêm dos afluentes mineiros. É preciso, então, que esse tipo de ação se concentre fundamentalmente no Estado de Minas Gerais, sem prejuízo do que puder ser feito nas bacias do Carinhanha, do Corrente e do Rio Grande, afluentes baianos da margem esquerda, de onde provêm os outros 20% da água do São Francisco.

            É preciso fazer o desassoreamento do leito, recuperar as matas ciliares, controlar o desbarrancamento, preservar as veredas para proteger as nascentes dos afluentes da margem esquerda, sobretudo nos cerrados de Minas Gerais e da Bahia - o que pode ocorrer com um programa de microbacias hidrográficas que venha, efetivamente, a reter a água, enriquecer e fortalecer as veredas, em vez do processo que estamos tendo hoje de assoreamento e de mortes dessas veredas. Também é preciso pensar, trabalhar e atuar na perenização dos afluentes da margem direita, que se tornaram rios temporários.

            Há várias prioridades locais, porque a crise do rio se manifesta de forma diferente em cada localidade, em cada cidade, em cada Município ao longo da bacia. É o caso, por exemplo, do desassoreamento dos canais que se situam entre as ilhas e a margem do rio - como o canal de Guaxinim, em Xique-Xique, e do canal que liga a ilha de Paratinga à cidade; da perenização dos rios Jacaré e Verde, no platô de Irecê; da perenização do rio das Rãs, do rio Paramirim, do rio Santo Onofre; o cuidado com as bacias hidrográficas. Sobretudo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso pensar na preservação do rio para fazer bem à população, para fazer a incorporação social das populações ribeirinhas, dos barranqueiros são-franciscanos. Dentre essas medidas, incluem-se o seguro-desemprego para os pescadores na época do defeso, que nunca é pago com pontualidade e que precisa ser estendido por um prazo maior; e a incorporação da população das ilhas do São Francisco, que requerem um projeto especial, para citar apenas alguns exemplos.

            De outro lado, há uma questão fundamental a ser enfrentada: a implantação imediata e urgente do Comitê da Bacia do Rio São Francisco, que definirá o futuro do rio. Existem, hoje, várias siglas federais que usam as águas do rio. A essas se agregam as siglas estaduais, mas não há uma única sigla voltada para a defesa e para a preservação do rio. Não existe um único órgão, uma única unidade destinada a proteger e a defender o rio. A implantação do Comitê da Bacia é, por isso, uma questão essencial, fundamental, urgente, imperiosa. Será o Comitê que, por meio do Plano de Recursos Hídricos, definirá o que deve ocorrer com o rio e criará as condições para que possamos ter a perenidade da sua existência.

            Portanto, é preciso preservar para desenvolver, para que se possa executar uma política de desenvolvimento ao longo de toda a Bacia. A água do São Francisco deve ser usada, prioritarimente, para gerar empregos e para elevar o nível de renda da população são-franciscana.

            Por isso, proponho um grande debate para redefinir a prioridade no uso da água. Trata-se do mais importante rio brasileiro do semi-árido nordestino, motivo por que requer cuidados adicionais e política específica. Até agora, tem prevalecido a prioridade para a geração de energia, mas o sistema elétrico brasileiro é, hoje, integrado e a energia pode ser transferida de uma região para outra. É preciso, portanto, que se transfira mais energia da Região Norte e do Centro-Oeste para o Nordeste, de modo que as águas do rio São Francisco, que correm pelo semi-árido nordestino, sejam destinadas, fundamentalmente, à irrigação e à navegação, a fim de gerar empregos, elevar o nível de renda da população e produzir alimentos. A navegação pode integrar a economia e só há navegabilidade com muita água. A hidrovia é uma aliada da causa ambiental.

            Esse debate deve acontecer no sentido de se redefinirem as prioridades no uso da água do rio São Francisco. Não tenho feito apenas discursos; também tenho me dedicado à ação. Em 1995, desde que cheguei a esta Casa, promovi a criação de uma Comissão Especial para o Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco. Desde então, levantamos as pautas para as políticas de desenvolvimento e exigíamos uma política de recuperação e de preservação ambiental do rio São Francisco. Estabelecemos uma agenda para o São Francisco e agora, recentemente, propusemos e aprovamos a criação, nesta Casa, de uma Comissão Especial para acompanhar, monitorar e fiscalizar o projeto de conservação e revitalização do rio São Francisco.

            Não quero que aconteça com ele o que se vem passando com a hidrovia. Incluída no “Brasil em Ação”, no “Avança Brasil”, no PPA, está sempre nos programas do Governo Federal, nas prioridades, mas nem por isso conseguiu sair do papel. Até perdôo a omissão, mas não pode haver a paralisação em um projeto de recuperação, de conservação e de revitalização de um rio.

            Isso é inadiável. É inteiramente inegociável. É preciso ser feito.

            O Sr. Paulo Souto (PFL - BA) - Senador Waldeck Ornelas, V. Ex.ª me permite um aparte?

            O SR. WALDECK ORNELAS (PFL - BA) - Ouço V. Ex.ª, Senador Paulo Souto.

            O Sr. Paulo Souto (PFL - BA) - Senador Waldeck Ornelas, todos nós consideramos que ninguém melhor do que V. Ex.ª poderia representar o pensamento do Estado da Bahia com relação a essa questão do São Francisco. Como estudioso do assunto há muitos anos, como Parlamentar dedicado - desde a época de Deputado Federal e também como Senador -, como nordestino e baiano, V. Ex.ª tem tido posições lúcidas. O pronunciamento de V. Ex.ª hoje - o qual tenho certeza de que toda a Bahia incorpora - é, mais uma vez, lúcido, demonstrando o seu conhecimento sobre a matéria. O assunto que V. Ex.ª acaba de abordar, da necessidade de se pensar, a médio prazo, no novo sistema de utilização das águas do São Francisco, é sério e tem que ser necessariamente encarado por todos nós. É preciso também que saiamos do imobilismo com relação ao financiamento dos programas de irrigação. Há sete anos, o Governo Federal estuda o chamado novo modelo de irrigação. Entretanto, até hoje, ninguém o conhece, e os projetos ficam dependendo apenas de recursos do Tesouro, que são insuficientes, como é o caso de dois grandes projetos de irrigação na Bahia. Precisamos voltar às agências internacionais para financiar projetos de irrigação para todo o Nordeste, porque essa é uma atividade importantíssima para o desenvolvimento da Região. Era apenas isso que eu queria acrescentar, mas dizendo que todos nós estamos muito bem representados pelo pronunciamento lúcido que V. Ex.ª faz neste momento, por ocasião desta sessão comemorativa aos 500 anos do rio São Francisco. Muito obrigado.

            O SR. WALDECK ORNELAS (PFL - BA) - Agradeço e incorporo, com muita satisfação, o seu aparte ao meu pronunciamento, Senador. V. Ex.ª tem razão. Como Governador, confiou, acreditou no projeto da hidrovia do São Francisco, construiu o novo Porto de Juazeiro e, até hoje, o canal de navegação não foi dragado. As medidas não foram tomadas para que a hidrovia pudesse funcionar. Continua-se com um sistema precário, ultrapassado, de navegação no rio São Francisco.

            V. Ex.ª levanta um outro aspecto fundamental, que é o do financiamento dos projetos de irrigação. Também tenho acompanhado de perto essa questão junto com V. Ex.ª. Sabemos os prejuízos que têm sido causados à população são franciscana, a morosidade com que projetos como o Salitre, em Juazeiro, e o Baixio de Irecê, em Xique-Xique, têm sido conduzidos. Projetos como o do Vale Tuiú, em Malhada, ou o de Casa Nova até hoje não saíram do papel, não começaram a ser executados, embora estejam prontos, realizados pela Codevasf.

            Houve efetivamente um retrocesso na política de irrigação do Brasil, se compararmos com o que chegou a ser feito no Governo do Presidente Sarney. Naquela época, foi criado um Ministério Extraordinário para cuidar da irrigação e da formação de recursos humanos de todo o conjunto da política necessária a esse trabalho, que é imperioso e fundamental para o semi-árido nordestino.

            Temos também, estranhamente, o projeto do Proago a semi-árido, com mais de R$300 milhões financiados pelo Banco Mundial, cujos recursos não são utilizados pelo Governo Federal. Pagam taxa de permanência, pagam taxa de abertura de crédito, desperdiçam dinheiro, mas não o aplicam em favor da população nordestina.

            Por isso também, além dessa Comissão Especial no Senado, lancei recentemente uma campanha, o SOS Velho Chico. Estamos criando comitês locais em cada Município da bacia do São Francisco. Realizamos um trabalho de sensibilização, de mobilização e de conscientização da população em relação às medidas que precisam ser tomadas para a troca de experiências e informações, para o intercâmbio e para uma integração com essa comissão, que, na próxima semana, esperamos ver instalada aqui, no Senado, para recebermos os subsídios das populações e das comunidades locais sobre o que deve ser feito no vale do São Francisco.

            Como mostrei, existem linhas de ação de ordem geral que devem ser aplicadas necessariamente em toda a bacia; mas existem, por outro lado, ações locais, medidas que devem ser adotadas no âmbito de cada Município, muitas vezes pelo Governo Federal, outras tantas pelos próprios governos locais, para que haja o desenvolvimento dessa bacia.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho hoje uma grande preocupação em relação às chuvas que aguardamos e esperamos que cheguem em novembro: ao encherem o lago de Sobradinho, ao regularizarem a produção de energia, espero que Brasília não pense que os problemas do São Francisco estão resolvidos.

            Que a comemoração desses 500 anos do Velho Chico sirva para a largada de um grande e permanente programa de recuperação e conservação do rio, porque o País e as novas gerações precisarão ainda mais do São Francisco do que precisaram os índios que aqui habitavam, os colonizadores que aqui chegaram e nós, que hoje aqui vivemos.

            Como adverte a música do SOS Velho Chico:

Passou o tempo

E o rio, entregue à própria sorte,

Vai lutando contra a morte

E desse jeito vai perder.

O nosso rio

Tá secando, tá morrendo.

Acorda, povo, vem correndo

O Chico conta com você.

E o refrão convoca:

O Velho Chico tá sozinho, tá doente

Vamos cuidar de quem cuidou da nossa gente

A hora é essa, o Chico pede a sua ajuda

Vem, sertanejo, que essa história a gente muda.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros, vamos juntos lutar pelo São Francisco!

 

            


            Modelo15/6/244:02



Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2001 - Página 23664