Discurso durante a 128ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Esclarecimentos sobre reportagem publicada pelo Jornal do Brasil no último domingo, que aponta S. Exa. como um dos senadores com processos em andamento no Supremo Tribunal Federal. Justificativas à apresentação de projeto de lei que cria programa nacional de bolsa de estudo para estudantes pobres em universidades privadas.

Autor
Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Iris Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. ENSINO SUPERIOR.:
  • Esclarecimentos sobre reportagem publicada pelo Jornal do Brasil no último domingo, que aponta S. Exa. como um dos senadores com processos em andamento no Supremo Tribunal Federal. Justificativas à apresentação de projeto de lei que cria programa nacional de bolsa de estudo para estudantes pobres em universidades privadas.
Publicação
Publicação no DSF de 05/10/2001 - Página 24020
Assunto
Outros > IMPRENSA. ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • LEITURA, CARTA, DESTINATARIO, DIRETOR, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESCLARECIMENTOS, CARACTERISTICA, PROCESSO JUDICIAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REU, ORADOR, AUSENCIA, ACUSAÇÃO, CORRUPÇÃO.
  • ANALISE, DADOS, ENSINO SUPERIOR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, DESISTENCIA, ESTUDANTE CARENTE, CURSO SUPERIOR, UNIVERSIDADE FEDERAL, ESCOLA PARTICULAR, MOTIVO, NECESSIDADE, TRABALHO, AUXILIO, FAMILIA.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, BOLSA DE ESTUDO, ENSINO SUPERIOR, ESTUDANTE CARENTE, IMPOSSIBILIDADE, PAGAMENTO, MENSALIDADE.
  • COMENTARIO, GESTÃO, ORADOR, QUALIDADE, EX GOVERNADOR, ESTADO DE GOIAS (GO), AUMENTO, OFERTA, CURSO SUPERIOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em respeito a esta Casa, trago ao conhecimento das Srªs e dos Srs. Senadores cópia de uma carta que encaminhei ao Diretor da Editoria Brasil, do Jornal do Brasil, a respeito de matéria publicada por aquele jornal relativa aos Senadores - em torno de 20 - que respondem a processos na Justiça.

            É a seguinte a carta:

Sr. Diretor, com relação à matéria publicada pelo Jornal do Brasil, edição do último domingo, na qual o meu nome foi relacionado entre os senadores da República eventualmente objeto de processos em andamento no Supremo Tribunal Federal, venho solicitar a publicação dos seguintes esclarecimentos:

1) Não sou réu em nenhum procedimento judicial, muito menos qualquer um que trate da prática de corrupção, de qualquer natureza.

2) Estão em curso no Supremo Tribunal Federal três inquéritos que apuram possíveis crimes eleitorais, o que não significa, em hipótese alguma, ser eu responsável pela prática de qualquer ilícito, mas apenas que se buscam esclarecimentos. Aliás, é do meu interesse que esses inquéritos tenham o mais rápido andamento, para que resulte comprovada a mais absoluta ausência de culpabilidade, ainda que tratem de fatos da esfera eleitoral que são passíveis de interpretações as mais diversas. Nenhum desses inquéritos trata de desvio de dinheiro público ou de qualquer outra conduta envolvendo manipulação de instrumentos da administração pública. A propósito, o próprio Jornal do Brasil comenta, no texto da matéria, que se trata de “acusações leves”.

3) Como Senador da República, exerço de cabeça erguida o mandato que a mim foi conferido pelo povo de Goiás, sempre tendo como princípios fundamentais da minha ação parlamentar a honestidade, a austeridade e a responsabilidade para com a coisa pública, características que sempre pautaram o meu comportamento em todos os cargos pelos quais passei.

Para que não pairem dúvidas a meu respeito, provocadas por uma leitura equivocada do que possa significar “problemas judiciais” tal como pode induzir a matéria do JB, é que faço o presente esclarecimento.

Atenciosamente,

Iris Rezende Machado

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já por duas vezes tenho abordado desta tribuna a questão do ensino superior em nosso País, que é territorialmente imenso e traz no seu bojo muitas realidades. Entendemos que a luta dos jovens que buscam uma vaga numa faculdade tem sido desigual.

            Buscamos alguns dados no Ministério da Educação e concluímos que o Brasil tem hoje 50 milhões de estudantes, desde o primeiro até o terceiro grau, que freqüentam aulas em aproximadamente 230 mil escolas públicas e privadas espalhadas em 5.500 Municípios brasileiros.

            Dos 50 milhões de estudantes existentes no País, apenas 9,5 milhões concluem o segundo grau. São, portanto, teoricamente, candidatos a um vaga na universidade. Mas as oportunidades são poucas. Aproximadamente 3,4 milhões de estudantes concorrem anualmente ao vestibular, disputando 900 mil vagas, sendo 220 mil nas universidades públicas e 680 mil nas universidades particulares.

            É claro o domínio do ensino pago no País no nível superior. Veja bem, Sr. Presidente: 680 mil estudantes nas universidades particulares e apenas 220 mil nas universidades públicas. Conclui-se que menos de um terço das vagas disponibilizadas são das universidades públicas. No total, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, são 2,4 milhões de alunos matriculados no ensino superior.

            São 780 mil os alunos que freqüentam as universidades públicas federais, faculdades estaduais ou municipais. Já os que pagam mensalidades nas universidades particulares chegam a 1 milhão e 560 mil.

            Do total de 2,4 milhões de universitários existentes no País, 1 milhão e 330 mil estão matriculados no curso noturno. Desse montante, apenas 300 mil freqüentam instituições públicas. A grande maioria, 1 milhão e 30 mil, está nas universidades privadas.

            O ensino superior no País, Sr. Presidente, permanece extremamente elitista. Dos 3 milhões e 360 mil estudantes que fazem o vestibular, apenas 750 mil conseguem o passaporte para a universidade. Ficam de fora 2 milhões e 610 mil alunos.

            As instituições de nível superior no País oferecem 905 mil vagas por ano. As instituições pagas são responsáveis pela grande maioria das ofertas: 685 mil vagas. As públicas - volto a repetir - só oferecem 220 mil vagas.

            Os índices a respeito da evasão escolar, ou seja, o contingente de alunos do curso superior que começam mas não terminam a faculdade, são preocupantes.

            De acordo com os dados do Ministério da Educação, nas universidades públicas, 29% dos alunos matriculados inicialmente não concluem o curso. Nas universidades pagas, esse índice aumenta para 36%.

            Sr. Presidente, por que, nas universidades públicas, 29% dos alunos não concluem o curso? Pelos levantamentos, conclui-se que a maior parte desses que não concluem o curso são estudantes mais pobres, que conseguiram uma vaga na universidade pública quase que por um milagre, e, em um determinado momento, precisam conseguir um emprego ou melhorar de emprego para ajudar os pais ou garantir a manutenção da sua própria família, se casados. Assim, não conseguem dar continuidade aos estudos devido à incompatibilidade entre o horário do trabalho e o horário do curso que a universidade pública ministra.

            Isso é cruel, mas é a realidade, Sr. Presidente, sobretudo porque, como vamos demonstrar aqui, a maior parte dos cursos das universidades federais e estaduais funcionam durante o dia. É até interessante salientar que temos de aplaudir o Governo do Presidente Fernando Henrique - e devemos incluir o Ministro Paulo Renato - pela atenção dedicada ao ensino básico. Nunca neste País houve tanta preocupação com o ensino básico. Isso, naturalmente, vem provocando mudanças no comportamento do ensino, da educação, em nosso País. Daí a procura ainda maior, pela juventude, de vagas nas faculdades.

            Mas voltemos àquela realidade que eu dizia cruel. No curso básico, a maior parte dos estudantes procura as escolas públicas. Por quê? Pelo índice de famílias pobres no Brasil. Uma família de operário não consegue, jamais, manter o seu filho em uma escola primária particular. Muitas vezes o seu salário é suficiente apenas para atender às necessidades de alimentação. Então, ele busca as escolas públicas, que são, hoje, as piores. O ensino primário público leva uma desvantagem tremenda em relação ao ensino primário particular. Começa aí, desde o ensino básico, o filho de uma família mais rica a levar vantagem sobre o filho de uma família mais pobre.

            Vem o vestibular. As universidades públicas mantêm a maior parte dos seus cursos durante o dia. Nessa hora, o estudante pobre não tem vez, porque ele precisa trabalhar para a manutenção da família, e esse trabalho, normalmente, é durante o dia. Então, a sua presença na universidade pública torna-se impossível, e ele procura a universidade particular. Mas esses 29% que conseguem uma vaga na universidade pública e desistem são aqueles pobres lutadores que, concorrendo com os afortunados, conseguem aprovação, mas, normalmente, têm que deixar a universidade pública por causa do trabalho, da obrigação que têm de manter a família.

            Mas, Sr. Presidente, nas faculdades particulares, nas universidades pagas, o índice não é de 29, mas de 36%. São aqueles que trabalham durante o dia, que se preparam às altas horas da madrugada, enfrentam o vestibular nas faculdades particulares e conseguem aprovação. Mas, dali a um ano ou mais do que isso, às vezes já no segundo ano, chegam à conclusão de que não dão conta de pagar as anuidades - que são altas -, que o seu salário não dá para manter a família e custear os seus estudos. Então, desistem da universidade. O índice é de 36%, Sr. Presidente. É aquela realidade que eu dizia cruel, enfrentada pela juventude de nosso País.

            Hoje, é quase que impraticável, em uma formatura dos cursos de Medicina, de Odontologia, de Engenharia, cursos que, normalmente, exigem dedicação integral, se deparar com estudante de família pobre recebendo diploma. É muito difícil. Normalmente as universidades particulares procuram os cursos mais fáceis e que não exigem tanto investimento. São justamente nesses cursos que os jovens pobres têm uma pequena oportunidade de ingressar.

            Quantas inteligências este País têm perdido! Quantos jovens com um QI extraordinário, superior não vão para frente porque não têm condições de buscar os cursos mais sofisticados das universidades públicas, pois são pobres e precisam trabalhar.

            Dados do Ipea revelam que no Brasil as diferenças de renda estão diretamente associadas às diferenças de escolaridade. Quanto menor o acesso à educação superior, diminui também a chance de ascensão social. Passar no vestibular não é garantia de diploma, principalmente se a universidade for particular - é o que eu dizia há poucos instantes.

            Os custos exorbitantes das mensalidades são o fator principal que leva milhares de jovens à desistência, porque simplesmente - eu dizia e repito - não possuem recursos financeiros para quitar as suas obrigações escolares. Esses alunos são geralmente trabalhadores assalariados que acabam sendo obrigados a sacrificar o seu futuro diante das imensas dificuldades para manter os estudos.

            Surge, então, um segmento de revoltados neste País. São aqueles que tentaram, lutaram e, em um determinado momento, até venceram, mas depois fracassaram por causa dessa grande injustiça.

            Hoje, o que se gasta com o ensino superior, por parte dos poderes públicos, não é brincadeira, mas não se gasta com os pobres. Gasta-se, sobretudo, com aqueles que poderiam pagar. O poder público precisa tomar uma atitude a esse respeito.

            Assim, Sr. Presidente, diante dessas considerações e dessa realidade com a qual não nos conformamos, trago à apreciação desta Casa um projeto de lei autorizando o Poder Executivo a instituir o programa nacional de bolsa de estudo para alunos do ensino superior privado. O texto do projeto determina “para alunos reconhecidamente pobres”, para alunos que, aprovados no vestibular, não tenham recursos suficientes para continuar seus estudos nas faculdades particulares. É o caminho. Essa poderia ser, também, uma possibilidade de as universidades particulares investirem em cursos mais complexos, como os da área da ciência médica.

            Venho a esta tribuna apresentar este projeto, já antecipando que tenho, como homem público, autoridade para fazê-lo, porque sinto essa realidade não só de agora. Quando assumi o Governo de Goiás, em 1983, ele mantinha apenas dois cursos superiores. Criamos mais de quarenta cursos durante os nossos dois mandatos no Governo do Estado. Criamos faculdades nas principais cidades do interior, sobretudo para dar oportunidade aos jovens de famílias que não tinham condições de mantê-los em Goiânia, ou em Anápolis, ou em Brasília, estudantes do nordeste de Goiás ou do entorno.

            O Estado de Goiás passou a gastar o que, constitucionalmente, é dever do Governo Federal, investindo substancialmente na área do ensino superior, justamente por entender que o Brasil não pode perder essas inteligências.

            Fizemos mais: transformamos, sobretudo na capital do Estado, todas as classes do terceiro ano colegial em cursos especiais, em que os estudantes concluíam o curso colegial e já se preparavam para o vestibular.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, até o ano anterior da instituição desse sistema de melhoramento do terceiro ano colegial, nenhum estudante das escolas públicas estaduais ingressava nas faculdades. No ano seguinte, foram quatrocentos estudantes que, diretamente das escolas estaduais da capital do Estado, ingressavam na Universidade Federal, na Universidade Católica, no Objetivo, na Anhanguera e assim por diante. Goiânia transformou-se em um verdadeiro centro universitário neste País, pela sua localização geográfica, atendendo grande parte dos Estados do norte e do centro-oeste brasileiros.

            Sr. Presidente, quero ser correto, atendendo à determinação de V. Exª quanto ao tempo. Termino o meu pronunciamento na certeza de que os Srs. Senadores se debruçarão sobre essa questão, e, quem sabe, em tempo recorde, possamos aprovar esse projeto que institui a bolsa universitária neste País.

            Obrigado.


            Modelo112/2/2412:09



Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/10/2001 - Página 24020