Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Questionamentos ao veto do presidente da República ao projeto que inclui a Sociologia e a Filosofia entre as matérias do currículo do ensino médio.

Autor
Alvaro Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Questionamentos ao veto do presidente da República ao projeto que inclui a Sociologia e a Filosofia entre as matérias do currículo do ensino médio.
Aparteantes
Lauro Campos, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/2001 - Página 24621
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • REPUDIO, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO DE LEI, IMPLANTAÇÃO, FILOSOFIA, SOCIOLOGIA, ENSINO MEDIO, NECESSIDADE, MODERNIZAÇÃO, EDUCAÇÃO.
  • ESCLARECIMENTOS, ARTUR DA TAVOLA, SENADOR, IMPORTANCIA, AUTONOMIA, FILOSOFIA, SOCIOLOGIA, ANALISE, RESULTADO, INVESTIMENTO, POSTERIORIDADE, COMENTARIO, EXISTENCIA, PROFESSOR, ENSINO MEDIO, DISCIPLINA ESCOLAR.
  • SOLICITAÇÃO, CONGRESSISTA, DERRUBADA, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, BENEFICIO, MODERNIZAÇÃO, EDUCAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ÁLVARO DIAS (Bloco/PDT - PR) - Sei disso, Sr. Presidente.

            Gostaria de abordar o veto do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que pretende incluir Sociologia e Filosofia no currículo do ensino médio brasileiro.

            É para nós uma enorme surpresa a decisão do Presidente. Fosse o seu Governo autoritário e fosse ele um déspota, não um Presidente eleito, não nos surpreenderia o veto. No entanto, em se tratando de um Governo democrático, presidido por um sociólogo eleito por milhões de votos dos brasileiros, é evidente que causa surpresa o veto a uma proposta que significaria um salto de qualidade no ensino do País.

            Trata-se, na verdade, de discutir o conceito de escola que desejamos para os nossos filhos: se queremos a escola retrógrada, superada, única e exclusivamente acumulando informações, ou se queremos a escola moderna, avançada, que, além de acumular informações, possibilita a reflexão, a análise crítica, a visão adequada do mundo em que se vive.

            Na verdade, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o currículo escolar não contribui para que a escola brasileira alcance os objetivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que são os objetivos da verdadeira formação. A Filosofia e a Sociologia são territórios indispensáveis para a formação da personalidade humana. Os ensinamentos básicos proporcionados pela Filosofia e pela Sociologia são fundamentais para estimular a consciência crítica da juventude. Estimulando a capacidade de reflexão e de análise, contribuem para que aqueles que se formam nas escolas do País sejam agentes transformadores da sociedade. Por isso é natural - repito - que governos autoritários não desejem esse modelo de formação educacional; mas seria de se esperar de um Governo democrático medidas no sentido de promover um avanço indispensável para que a formação seja adequada, especialmente quando se exige, no mundo moderno e globalizado, a capacidade de analisar criticamente as movimentações naturais da sociedade universal.

            Confesso que sou um admirador do Senador Artur da Távola. Sem dúvida, uma das figuras mais cultas, esclarecidas e bem formadas da República. E nós percebemos o seu constrangimento. E S. Exª, que é um mestre da comunicação, tem uma facilidade ímpar de se comunicar, encontrou dificuldades, no dia de hoje, para defender, por obrigação de Líder do Governo, as posições do Ministro e do Presidente da República, estabelecendo até uma comparação que não faz jus à sua inteligência e ao seu preparo.

            Eu poderia dizer, ao mesmo tempo em que S. Exª afirmou, que é importante também no currículo a educação sexual ou a educação no trânsito, e que como não se pode ter no currículo educação sexual, educação no trânsito e outras matérias, também não se pode ter, pelas mesmas razões, Filosofia e Sociologia. Eu diria: porque não podemos ter educação sexual, deveríamos retirar do currículo a Matemática ou o Português? Creio que se vale favoravelmente a comparação, vale também contrariamente a comparação que faço.

            Não há, na verdade, justificativa, econômica ou financeira, que isto acrescentaria despesa. Até porque o próprio Presidente da República, nos seus tempos de magistério, certamente afirmou que educação não é despesa, é investimento. O Governo não estaria aumentando despesas. Estaria, isto sim, aumentando investimentos altamente rentáveis, que proporcionam um retorno extraordinariamente significativo em benefício do futuro do País.

            Antes de partir para o outro tema, vejo que o Senador Lauro Campos, meu companheiro de Partido, deseja fazer um aparte. Com a maior satisfação, eu o concedo ao Senador Lauro Campos.

            O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Nobre Senador Álvaro Dias, eu, neste aparte, gostaria de solidarizar-me e mostrar a minha concordância com as colocações que V. Exª faz. Rapidamente, digo que também admiro muito, como V. Exª acabou de expressar, o nosso companheiro Senador Artur da Távola. Além da inteligência privilegiada, o Senador Artur da Távola possuiu uma sensibilidade que faz com que a sua forma de expressão seja também uma forma musical, uma forma artística, que caracteriza a delicadeza de sua inteligência. Mas, do meu ponto de vista, o mundo tem sido tão duro, tão bélico, tão agressivo, tão desesperado nessa nossa era que não há como deixar de permitir que essa agressividade do mundo se transforme em agressividade verbal, que S. Exª condenou no nosso companheiro Ademir Andrade. O que eu gostaria de dizer é que nem sempre se pode usar da palavra com o tom, com a delicadeza que o eminente Senador Artur da Távola costuma fazer. Agora, por exemplo, se eu não falar alto não serei escutado. De modo que as questões são muito conjunturais e situacionais. A última reunião da Fiesp mostra o desespero em que se encontram os industriais paulistas. Um dos diretores da Fiesp diz o seguinte: os empresários deveriam tirar o paletó e sair em passeata na Avenida Paulista para protestar contra o Governo. E eu, ainda corroborando com o pronunciamento de V. Exª, gostaria apenas de dizer que não fica bem para um Presidente sociólogo vetar a Sociologia. Fica parecendo que ou a Sociologia não vale nada ou que Sua Excelência conseguiu chegar aonde chegou apesar da Sociologia, que Sua Excelência agora quer acabar com ela. De modo que realmente me parece que, numa conjuntura tão violenta, não há como usar palavras, termos e formas delicadas e poéticas de expressão. Muito obrigado a V. Exª.

            O SR. ÁLVARO DIAS (Bloco/PDT - PR) - Senador Lauro Campos, eu é que agradeço a V. Exª pelo aparte, como sempre, brilhante.

            Além desse argumento utilizado, da economia, há um outro de que não teríamos profissionais suficientes no País para ministrar aulas de Sociologia e Filosofia. Isso também não é verdade. Já há sólidas argumentações de lideranças do Magistério brasileiro, com dados estatísticos, a respeito de profissionais especializados e habilitados para lecionar as matérias Filosofia e Sociologia.

            A outra argumentação do Governo é de que já temos noções básicas de Filosofia e Sociologia em outras matérias constantes do currículo escolar. Também essa justificativa não pode prevalecer em momento algum, já que essas matérias são fundamentais para a formação humana e exigem profissionais especializados para que elas possam ser ministradas com maior profundidade e sabedoria.

            A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Senador Álvaro Dias, V. Exª me concede um aparte?

            O SR. ÁLVARO DIAS (Bloco/PDT- PR) - Com prazer, Senadora Marina Silva.

            O Sr. Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Louvo V. Exª pelo pronunciamento no sentido de fazer a defesa da Sociologia e da Filosofia como disciplinas a serem disponibilizadas para os nossos jovens e lamento que o Presidente Fernando Henrique Cardoso não tenha a sensibilidade ou não esteja devidamente afinado com as necessidades daquilo que tanto o seu Governo fala e com palavras defende, que é a modernização, a atualização dos conhecimentos, a capacidade diversificada que as pessoas precisam ter para poder enfrentar as exigências desse mundo globalizado, que a todo tempo está renovando as necessidades das oportunidades de trabalho, de ocupação. Com certeza, se não formos capazes de formar jovens que, além de aprender a fazer, aprendam a pensar e a questionar, aprendam como devemos agir em determinadas circunstâncias, em diferentes oportunidades, não estaremos contribuindo para que os nossos jovens acompanhem a velocidade em que o mundo está vivendo. E hoje não estamos mais vivendo o mundo da informação, pois esse mundo já está organizado, buscando os que detêm o conhecimento. Não adianta sermos apenas um celeiro de informações; precisamos aprender a processar essas informações. E só se consegue fazer isso com o exercício do pensamento, do questionamento, da forma viva de interagir com os acontecimentos. Com certeza, muito embora as ciências exatas e outras possam contribuir também com essa característica importante no ser humano, a Sociologia, a Filosofia, a Antropologia e muitas outras ciências sociais são aquelas que alavancam melhor essa capacidade no ser humano. Lamento que o nosso Presidente sociólogo não queira disponibilizar para os jovens aquele instrumento que o tornou famoso em todo o País e na América Latina, porque ele se tornou uma pessoa famosa, do ponto de vista intelectual e acadêmico, graças à Sociologia. Talvez seja uma atitude um pouco egocêntrica não querer repassar essas informações àqueles que, na primavera da sua existência, poderão ter acesso a uma ciência, a uma forma de conhecimento que lhes possibilitará uma série de avanços do ponto de vista da sua formação como pessoa e da sua formação acadêmica. Sua Excelência não está querendo partilhar essa ciência com os nossos jovens. Cumprimento V. Exª e lamento que o meu Colega Senador Artur da Távola, que é um brilhante orador e também um humanista, tenha que, na condição de Líder, ser obrigado a remar contra a maré do seu coração, pois, com certeza, não fosse a posição que ocupa, estaria a defender na tribuna, como V. Exª, esse instrumento fundamental que nos ensina a analisar a realidade e a pensar. Tudo se aprende, nada acontece de forma espontânea. O ser humano é diferente dos demais animais porque não nasce com as informações acopladas à sua forma de agir. Ele as apreende e, se não as apreende, não é capaz de realizá-las.

            O SR. ÁLVARO DIAS (Bloco/PDT - PR) - Muito obrigado, Senadora Marina Silva, pela contribuição sempre lúcida e competente.

            Sem dúvida, a Filosofia e Sociologia são alimentos indispensáveis às liberdades fundamentais do pensamento e da opinião, que se constituem, nos territórios indevassáveis da nossa alma, virtudes sagradas do ser humano.

            Tive a oportunidade de relatar o projeto de autoria do Deputado Padre Roque e lamento profundamente que o Presidente da República o tenha vetado. É claro que nossas esperanças com relação à rejeição do veto são limitadas. Conhecemos bem a força da base de sustentação do Governo neste Congresso. Não temos grandes esperanças, mas nos resta o dever de, desta tribuna, apelar à consciência dos Parlamentares, para que permitam esse avanço modernizador, a fim de que a escola no Brasil possa alcançar um estágio de maior competência.

            Sr. Presidente, atendo o apelo de V. Exª e encerro meu pronunciamento.


            Modelo15/1/249:06



Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/2001 - Página 24621