Pronunciamento de Iris Rezende em 15/10/2001
Discurso durante a 134ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Comentários sobre o atentado terrorista aos Estados Unidos e às ações bélicas empreendidas contra o Afeganistão. Necessidade de uma conscientização mundial para a extinção dos paraísos fiscais.
- Autor
- Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
- Nome completo: Iris Rezende Machado
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA INTERNACIONAL.
POLITICA EXTERNA.:
- Comentários sobre o atentado terrorista aos Estados Unidos e às ações bélicas empreendidas contra o Afeganistão. Necessidade de uma conscientização mundial para a extinção dos paraísos fiscais.
- Publicação
- Publicação no DSF de 16/10/2001 - Página 24761
- Assunto
- Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
- Indexação
-
- ANALISE, POLITICA INTERNACIONAL, POSTERIORIDADE, ATENTADO, TERRORISMO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ORIGEM, FALTA, JUSTIÇA SOCIAL, TERCEIRO MUNDO, AUSENCIA, PROVIDENCIA, PRIMEIRO MUNDO.
- ELOGIO, POLITICA EXTERNA, BRASIL, COBRANÇA, RESPONSABILIDADE, PRIMEIRO MUNDO, SITUAÇÃO, AUSENCIA, JUSTIÇA SOCIAL, AMBITO INTERNACIONAL.
- DENUNCIA, OMISSÃO, AUTORIDADE, AMBITO INTERNACIONAL, SONEGAÇÃO FISCAL, LAVAGEM DE DINHEIRO, ORIGEM, CORRUPÇÃO, CONTRABANDO, ARMA, DROGA, FINANCIAMENTO, TERRORISMO, REGISTRO, IMPUNIDADE, CRIME DO COLARINHO BRANCO, PROVOCAÇÃO, REVOLTA.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, é obrigação de toda pessoa que milita na vida pública estar com suas atenções voltadas para todos os acontecimentos que falam diretamente aos interesses do povo.
Tudo aquilo que pode abalar a sensibilidade popular, fazendo com que a população se sinta insegura quanto ao seu futuro, deve ser motivo para que o bom político comece a pensar, a meditar, a buscar idéias que a conduza a caminhos mais seguros.
Sr. Presidente, o Senado Federal é uma Casa constituída, na sua maioria, por lideranças calejadas na vida pública, pessoas que vêm de baixo no exercício político; alguns ocuparam as mais variadas posições na Administração Pública, outros passaram pelas Câmaras Municipais, Prefeituras, Governos Estaduais e há, ainda, os que ocuparam os mais elevados cargos no Governo Federal.
Essa trajetória de cada um faz com que procuremos analisar os últimos acontecimentos na busca de luzes. Não apenas os políticos, mas a humanidade inteira está ainda perplexa, estarrecida com os atos praticados por terroristas nos últimos tempos, sobretudo aqueles ocorridos há pouco mais de um mês nas cidades de Nova York e de Washington. De imediato, houve aquela reação generalizada contra os possíveis terroristas. Hoje a população mundial está perplexa, porque jamais pensou que um dia a maior potência mundial se defrontaria com um inimigo suicida; até então, as grandes potências contavam com o temor, com o receio e, sobretudo, com o sentimento de preservação de vida de seus adversários. Agora surgem, para espanto da humanidade, aqueles que se dispõem à guerra pelo suicídio.
Vemos a população mundial, em sua maioria, dando apoio às ações dos Estados Unidos, da Inglaterra e dos países associados a essa ação contra os que são apresentados como os responsáveis diretos por aqueles atos.
Mas, Sr. Presidente, entendo que a ação desses países não pode ficar, em hipótese nenhuma, limitada à prisão ou destruição dos responsáveis pelos atentados terroristas, que levaram à morte milhares de inocentes. Tenho procurado, dentro das minhas limitações de raciocínio, refletir muito sobre o que tem acontecido e cheguei à conclusão de que essas criaturas - psiquicamente loucos, porque apenas os loucos se prestam a ações dessa natureza - surgem e surgirão ao longo dos tempos por causa da injustiça que se observa em todos os países: a injustiça social. Na verdade, existe injustiça social nos Estados Unidos e nos outros países do Primeiro Mundo em menor proporção; mas se dá mais acentuadamente nos países da África, da América Latina, da Ásia, pelo mundo afora. Uma injustiça social gritante: milhões de criaturas vivem como animais irracionais, sem as mínimas condições de dignidade que se requer para uma vida humana. Quem visita países da África, da Ásia, do Oriente Médio, da América Latina, chega à conclusão de que milhões de criaturas humanas hoje não têm muito sentido de preservação de vida porque, para elas, quem sabe, a morte seria um descanso. Daí surgem essas criaturas que se entregam a tudo sem a mínima condição de raciocínio.
Sr. Presidente, as grandes potências mundiais estão voltadas para conter os terroristas, estejam eles onde estiverem, a fim de capturá-los e puni-los. E depois, qual é a solução encontrada para deter esse sentimento de revolta no subconsciente de milhões de criaturas mundo afora?
Não vejo nenhuma preocupação, paralelamente aos atos de guerra, em reverter essa situação preocupante que vive a humanidade. Uma elite se organizou e se organiza a cada dia, esquecendo ou procurando desconhecer aquilo que se passa ao seu lado - essa é a realidade. Os países do Primeiro Mundo se organizam. Em cada país, por mais pobre que seja, uma pequena elite se forma, e a vida vai passando sem que as grandes lideranças mundiais voltem suas atenções para uma solução geral na busca de condições melhores de vida.
A Folha de S.Paulo, em seu editorial de hoje, faz referência elogiosa à posição adotada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso diante deste quadro. O Brasil apoiou o governo americano, emprestou sua solidariedade ao povo americano, mas não se jogou de corpo e alma nas primeiras ações de guerra. Pelo contrário, aproveitou o momento para chamar a atenção para as ações envolvidas nestes atos de guerra, para a busca mais abrangente de discussão dessas questões, não apenas ao Grupo dos Sete, mas pelo menos ao Grupo dos Vinte, em que há países capazes de salientar as condições precárias de vida de seus habitantes - como é o caso do Brasil, da Índia e de outros países que já apresentam grande destaque na área econômica, mas com profundos problemas sociais.
Sr. Presidente, ocorre atualmente uma situação sobre a qual a cada dia se fala, mas em que ninguém atentou nos últimos dias. Trata-se da questão dos países denominados paraísos fiscais, que são em torno de 40. Na introdução do seu artigo intitulado “Os paraísos fiscais e o planejamento tributário internacional”, Daniel Takaki diz:
Os paraísos fiscais representam uma determinada região isenta de intervenção estatal na economia de mercado, onde se operam as transações comerciais, industriais e financeiras de caráter internacional conforme a economia de mercado.
Devido à inexistência de uma definição legal ou conjunto de critérios para se caracterizar um paraíso fiscal, a sua identificação se torna bastante complexa e difícil.
Mais à frente, em seu artigo, quanto a “Critérios para escolha de um paraíso fiscal”:
Diversos são os fatores a serem considerados ao se instalar numa jurisdição com incentivos fiscais. Existem cerca de trinta critérios que são utilizados por investidores bem pelos governos ansiosos em atrair investimentos externos.
No entanto, a ordem de importância de cada um dos fatores tem-se alterado ao longo dos anos. Durante os anos 1950-60, os principais fatores se concentravam na isenção fiscal e no incentivo de investimentos estrangeiros. Atualmente, os fatores mais importantes são, em ordem decrescente: garantias contra expropriação ou nacionalização de bens pertencentes aos estrangeiros; tratamento eqüitativo aos estrangeiros; incentivos de investimentos; baixa carga tributária; estabilidade política - para citar apenas alguns exemplos.
As principais condições de existência de um paraíso fiscal são as seguintes, quais sejam:
· estabilidade política;
· eqüidade no tratamento aos estrangeiros;
· isenção de controle cambial;
· existência de zonas francas de comércio; confidencialidade e sigilo bancário;
· serviços financeiros e profissionais.
E vai por aí afora.
Mas, na verdade, Sr. Presidente, paraísos fiscais são aqueles que, ao longo dos anos, principalmente nos últimos tempos, têm servido aos sonegadores internacionais de impostos, o que significa dizer guardar dinheiro resultado de ilícito penal. Os paraísos fiscais têm servido, sobretudo, àqueles que vivem do contrabando de armas e do tráfico de drogas. São bilhões e bilhões de dólares que circulam pelo mundo afora, utilizando-se dos paraísos fiscais, e isso tem aumentado o índice de criminalidade internacional. E as autoridades, na sua maioria, com raríssimas e honrosas exceções, têm fechado os olhos para essa realidade. Os paraísos fiscais têm servido também para que os ladrões das repúblicas, os ladrões do povo, de dezenas e dezenas de países, guardem o produto de seus atos de corrupção. Tudo isso gera poder para os criminosos e bandidos internacionais e provoca uma revolta no sentimento de milhões e milhões de pessoas.
Não tenham dúvida de que essa revolta de tantas pessoas, que chegam a perder até o sentido de vida, deve-se a isso. E contra isso, a elite internacional não tem reagido suficientemente. E ela sabe para que servem tantos paraísos fiscais por aí afora: para "esquentar" o dinheiro resultante do crime, da corrupção, do tráfico de drogas, do contrabando de armas, enfim, de crimes praticados pelo mundo afora. Ali, eles procuram o "esquentamento" do dinheiro, a legalização do dinheiro, mas quanto a isso as autoridades estão indiferentes.
É necessário que, aproveitando este momento de perplexidade da humanidade, de preocupação de todas as autoridades responsáveis pelo mundo afora, aproveitando inclusive a serenidade e a competência do Presidente Fernando Henrique Cardoso, aproveitando esse momento complexo que presenciamos, essas nações coloquem um paradeiro na instalação, a cada dia mais exuberante, de paraísos fiscais. Alguns países mudam do dia para a noite a sua legislação para atrair os recursos criminosos, buscando com isso lucros mediante suas instituições de crédito.
Temos que dificultar, Sr. Presidente! O mundo precisa dificultar a ação dos criminosos.
Fala-se da superlotação das cadeias de ninguém pode pagar advogado, dos autores de crimes considerados mais simples, mas os grandes criminosos continuam soltos. Isso ocorre no âmbito internacional. E, para isso, o Governo do Presidente Bush, assim como o Governo da Inglaterra, da França, o Governo das grandes potências, como Alemanha e Japão, precisam aproveitar este momento para aplicar um corretivo à altura aos países que dão garantia aos autores de atos terroristas. Também devem aproveitar essa oportunidade para acabar com esses paraísos fiscais que são, na verdade, grande instrumento para a consolidação dos grandes criminosos internacionais, antes que seja tarde, antes que experimentemos outros atos criminosos oriundos da revolta daqueles que realmente não aceitam dois mundos diferentes: um, o de uma elite que se organiza e contra a qual não acontece nada; o outro, o dos miseráveis.
Clamamos por justiça. Justiça contra aqueles que têm ceifado, ao longo dos anos, milhares de vidas inocentes, nos mais variados atos de terrorismo. Mas devemos procurar corrigir também a sanha daqueles que se aproveitam de regalias legais de países que considero inconseqüentes, criando meios e modos para que os grandes criminosos internacionais encontrem uma muralha a sua frente, a partir dessas lições que temos recebido.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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