Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Dificuldades experimentadas pelos revendedores Ford, em virtude da política adotada pela Ford do Brasil.

Autor
Lindberg Cury (PFL - Partido da Frente Liberal/DF)
Nome completo: Lindberg Aziz Cury
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO COMERCIAL. POLITICA INDUSTRIAL.:
  • Dificuldades experimentadas pelos revendedores Ford, em virtude da política adotada pela Ford do Brasil.
Aparteantes
Alvaro Dias, Casildo Maldaner, Emília Fernandes, Marina Silva, Romeu Tuma.
Publicação
Republicação no DSF de 17/10/2001 - Página 24906
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO COMERCIAL. POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, CRISE, EMPRESA MULTINACIONAL, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA, PREJUIZO, REVENDEDOR, CONCESSIONARIA, IMPOSSIBILIDADE, PAGAMENTO, DIVIDA, MOTIVO, ARBITRARIEDADE, FORMAÇÃO, CONTRATO, AUMENTO, LUCRO, MATRIZ, EMPRESA.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, JOÃO ZARIFE, REVENDEDOR, NECESSIDADE, APOIO, ACOMPANHAMENTO, AÇÃO DE INDENIZAÇÃO, RECUPERAÇÃO, RESTABELECIMENTO, EMPRESA, CONCESSIONARIA.
  • SUGESTÃO, EMPRESA MULTINACIONAL, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, ABATIMENTO, PREÇO, APOIO, COMERCIO, REVENDEDOR, RETOMADA, LIDERANÇA, VENDA, AUTOMOVEL.

  SENADO FEDERAL SF -

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DISCURSO PRONUNCIADO PELO SR. SENADOR LINDBERG CURY, NA SESSÃO DELIBERATIVA ORDINÁRIA DE 11-10-2001, QUE SE REPUBLICA PARA SANAR INCORREÇÕES.

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            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna para me pronunciar em nome de cerca de 312 ex-revendedores Ford, distribuídos por este Brasil, os quais, na verdade, receberam uma séria punição por parte daquela montadora.

            A Ford anunciou, para o dia 12 de outubro, a inauguração da sua fábrica em Camaçari, na Bahia. A data coincide com o feriado, santificado pelo Papa João Paulo II quando de sua primeira visita ao Brasil. No calendário da Igreja Católica é o dia dedicado à Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil.

            A Ford, pioneira no mercado automobilístico nacional, instalando-se em solo brasileiro desde 1919 e por mais de meio século líder absoluta na preferência do público consumidor, negligenciou sua atuação e perdeu espaço, detendo hoje parcos 3,93% da participação no mercado. Prestem bem atenção: 3,93% da participação no mercado de uma fatia que outrora fora generosa.

            Com a unidade de Camaçari, a montadora norte-americana tentará recuperar espaço no mercado brasileiro. Para isso, já anunciou que manterá seu modelo Fiesta na linha de produção. Mas não pense o consumidor brasileiro, ávido por novidades, que será o modelo europeu apresentado no Salão de Frankfurt. O que a Ford chama de Projeto Amazon na verdade é o mesmo Fiesta que circula no mercado hoje.

            Ou seja, a Ford continua a mesma, com seu estilo de tentar enganar o consumidor, maquiando produtos saturados. O tal Projeto Amazon, que incluirá quatro modelos, só deve ser lançado no ano que vem. Por enquanto o consumidor fica na expectativa e o revendedor - que ainda sobrevive em algumas partes de nosso País, vendendo propriedades para colocar mais dinheiro no negócio, com muitas dificuldades - terá, naturalmente, que se armar de muito jogo de cintura para empurrar goela abaixo do consumidor modelos sem nenhum apelo comercial, nem no preço

            A realidade que a Ford não mostra para o grande público é que com sua política de interesses que visa tão-somente o lucro unilateral aos poucos foi esmagando os seus revendedores e destruindo uma rede até então sólida e tradicional, tão tradicional que ainda persistem alguns clientes fiéis ou saudosistas, apegados à antiga imagem de luxo e conforto dos veículos da marca. Marca que não aparece mais como uma "imagem" para o consumidor. Hoje, os apelos de "mais baratos, modernos, fáceis de dirigir, potentes e econômicos", estão divididos entre as montadoras Volkswagen, Fiat e General Motors. Apontem - isso é um desafio que faço a todos - um veículo Ford de fabricação nacional que seja realmente objeto de desejo ou desperte comentário no mercado!

            Isto porque, ao longo dos anos, a Ford perdeu a sua característica principal de fabricante de produtos de consumo e se fixou numa gestão unilateral onde, a qualquer custo, o lucro é a sua meta.

            Utilizando-se de uma política de abuso de poder, que não admitia o diálogo puro e simples, apesar de proclamar-se parceira, a Ford foi impondo contratos aviltantes, em que as exigências acabavam por sufocar a liberdade comercial e a igualdade entre as partes.

            O Sr. Álvaro Dias (Bloco/PDT - PR) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Álvaro Dias.

            O Sr. Álvaro Dias (Bloco/PDT - PR) - Senador Lindberg Cury, meus cumprimentos a V. Exª pelo pronunciamento que faz desta tribuna em defesa do consumidor brasileiro. Tem razão V. Exª. As montadoras, a indústria automobilística, têm recebido benefícios extraordinários no nosso País e nem sempre há a contrapartida, no exercício, de forma eficiente da função social que se exige de qualquer empresa num capitalismo que não seja selvagem. Creio que o pronunciamento de V. Exª vem em boa hora, porque a Ford no Brasil pode começar a viver um novo momento. E explico por quê. Não faz muito, assumiu a Presidência da Ford o Dr. Antonio Maciel Filho, um paranaense que passou pela Petrobrás como funcionário e esteve no Governo Federal como Secretário no Ministério da Indústria e Comércio; depois, foi convocado a recuperar empresas insolventes, em função de sua competência. É um jovem executivo, cuja ação é modernizadora. Temos esperanças de que ele possa revolucionar a Ford em nosso País, em benefício também do consumidor e da nossa população. Creio que o pronunciamento de V. Exª é um alerta oportuno e chega no momento adequado, exatamente porque temos esperanças de que, tendo à frente um executivo competente e moderno como Antonio Maciel Filho, a Ford possa rever a sua prática e alterar seus procedimentos, a fim de que beneficie também o consumidor de nosso País. Antonio Maciel Filho é filho do ex-Deputado do Paraná, Antonio Maciel, tem formação política e consciência crítica dos problemas sociais deste País. É um modelo de executivo capaz de ter essa sensibilidade necessária para mudar a postura dessa empresa multinacional em nosso País. Evidentemente, não depende apenas dele, mas quero daqui depositar confiança em sua ação, sobretudo ouvindo o pronunciamento de V. Exª. Peço a V. Exª que remeta esse pronunciamento ao Presidente da Ford, como uma contribuição crítica, a fim de que os procedimentos possam ser alterados e a Ford possa atender à necessidade imprescindível de se exercitar a função social como empresa beneficiada pelas concessões incríveis que o Governo brasileiro oferece.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Agradeço a participação de V. Exª, Senador Álvaro Dias, que conhece bem de perto o problema, principalmente no Paraná. Lá, mais de 50 empresas foram descredenciadas, estão na rua da miséria, pagando caro essa ação de um dia terem sido nomeadas, escolhidas entre todas as revendas principais da cidade. Nomearam e credenciaram revendedores e estes perderam todos os seus recursos.

            Com referência ao Presidente, houve uma expectativa muito grande com a entrada dele, mas o desastre já havia sido feito anteriormente. No Brasil, cerca de 312, conforme vou comprovar adiante, caíram na rua da miséria - revendedores altamente credenciados e capacitados.

            É uma tarefa muito árdua. A matriz americana não investe no Brasil. Ainda na gestão do Antônio Maciel Filho, em que houve essa expectativa de reversão, caiu de 10% para 7,9% e, atualmente, está com 3,93%. Alguns revendedores que sobrevivem por este Brasil estavam nessa expectativa de reversão.

            Citarei um dado muito importante a V. Exª, Senador Álvaro Dias. E, no momento, agradeço a brilhante participação de V. Exª.

            Com a criação da Auto Latina, a empresa chegou ao topo das suas intenções de aniquilamento dos concessionários.

            Sob o pretexto de criar as chamadas mega dealers , a Ford foi eliminando do seu caminho os seus concessionários. Só que, no caso da matriz norte-americana, que, cumprindo a legislação que lá funciona, indenizou todos os seus concessionários. Aqui, no Brasil, a situação foi bem diferente. Confiando na impunidade, a Ford simplesmente cortava o cordão umbilical e valia-se de toda sorte de expedientes sujos para se refazer de seus desafetos.

            O resultado disso, Senador Álvaro Dias, foi o descredenciamento abrupto e sumário de mais de 312 concessionários, desde 1995, num universo de 427 distribuidores existentes em 1994, todos com patrimônio aniquilado à custa de pressões. Alguns deles com dívidas impossíveis de serem liqüidadas junto ao Banco Ford.

            Prestem bem a atenção. Oitenta e cinco por cento da rede, desde 1995, foram aniquiladas. Deve existir algo de errado, Srªs e Srs. Senadores.

            A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PT - RS) - Senador Lindberg Cury, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Pois não, Senadora Emilia Fernandes.

            A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PT - RS) - Senador Lindberg Cury, quero dizer que, tão logo cheguei a Brasília, conheci V. Exª como um empresário respeitado, de renome, um batalhador pelos interesses da Capital do Brasil. Logo em seguida, tive a oportunidade de conhecer a sua família, por quem tenho o maior respeito. A esposa de V. Exª é uma mulher batalhadora, destacada também na sociedade brasiliense. Depois, um assunto comum, de certa forma, nos uniu e aproximou um pouco mais - a questão da Ford, que V. Exª está abordando da tribuna. Essa empresa multinacional, já há algum tempo, veio para o Brasil e se estabeleceu. Conforme os números dados fornecidos por V. Exª, apenas em número de distribuidoras, havia mais de 400 concessionárias, que faziam esse trabalho, empregando e prestando um serviço social dentro do País.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - São mais de 30 mil empregos diretos que foram perdidos. Fora os indiretos, que correspondem a mais 45 mil.

            A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PT - RS) - Exatamente. É importante que se preste a atenção a esses dados e números. Em todos os Estados brasileiros, inclusive na minha cidade de Santana do Livramento, havia uma concessionária, que também foi totalmente desrespeitada, dentro da visão de equilíbrio da economia e da produção de emprego. Por outro lado, nesses últimos anos, o Rio Grande do Sul também teve que olhar nos olhos da empresa Ford e perguntar qual era realmente o interesse dela ao vir para o Brasil. Estávamos lá com a possibilidade de um acordo com o Governo anterior para ver a viabilidade de a Ford se estabelecer no Rio Grande do Sul. Mas, quando nos sentamos à mesa para analisar o acordo, ficamos simplesmente horrorizados, porque nunca se ofereceu tanto a uma empresa multinacional como estava sendo oferecido à Ford. Vimos um acordo de milhões de dólares, de milhões de reais, toda uma infra-estrutura que deveria correr por conta do Governo do Estado, em detrimento, inclusive, de uma economia sacrificada, como estava a do Rio Grande - e ainda se encontra - pois sabemos bem a situação do setor primário, a base fundamental da nossa economia. Sabemos também do interesse e do esforço em negociar do nosso Governo do Estado, que, ao contrário do que se procurou divulgar, não foi intransigente. Ao contrário, houve diálogo, chamou-se a empresa, pediu-se uma revisão do acordo. Agora, construir até a creche dentro de uma empresa da Ford, construir estrada e estacionamento, seria realmente abusar da boa vontade da nossa capacidade produtora, dos nossos empresários, que estavam, às vezes, clamando por um pequeno empréstimo para sobreviver. A Ford foi intransigente, sim, no Rio Grande do Sul e as interferências políticas ocorreram para massacrar e tentar condenar previamente o nosso Governo. Solidarizo-me com V. Exª porque vi em V. Exª um defensor que levantou a voz e está trazendo às claras o prejuízo que a Ford trouxe ao País em relação ao desemprego e à desestabilização do setor. Posso, inclusive, oportunamente, passar todos os dados do acordo, das exigências e da contrapartida a que o Governo do Rio Grande do Sul se propôs a fazer, à qual a Ford virou as costas, retirando-se do Estado sem diálogo. Não perdemos nada porque se trata de uma empresa multinacional que não se responsabiliza pelo desenvolvimento brasileiro, que não tem a sensibilidade de garantir empregos - desempregando milhares de pessoas, como V. Exª está agora registrando - e não deveria ficar no Rio Grande do Sul, aquele gigante Estado, que progredirá com sua classe produtora e empresarial. Cumprimento V. Exª pela coragem, pela coerência e pela determinação de trazer o assunto para que o Brasil fique sabendo desses fatos.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Agradeço o brilhante aparte de V. Exª, Senadora Emilia Fernandes.

            Só no Rio Grande do Sul, perto de 60 concessionárias foram descredenciadas. Cheguei a trocar idéias, com o Governo do Rio Grande do Sul, sobre o que significava a Ford no mercado nacional, e o Governo foi muito lúcido ao desistir na última hora, salvou de uma gafe esse investimento no Rio Grande do Sul e afastou de lá a Ford, graças a Deus. Hoje, o Estado aplicou em obras esse valor que seria concentrado em cima de uma multinacional. Por que essa multinacional não traz seu capital de fora para investir no Brasil? É preciso incentivo do Governo, renúncia de milhões de reais e isenção de impostos, como o IPTU. O Rio Grande do Sul aplicou esse dinheiro em mais de 40 mil microindústrias e microempresas e fez uma distribuição na sua economia. Parabéns ao Rio Grande do Sul e parabéns a V. Exª por estar sempre atento a essas ocorrências.

            O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Lindberg Cury?

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Pois não, ilustre Senador Casildo Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Cumprimento-o por abordar essa questão e pela sua coragem, que, aliás, não é de hoje. Mesmo antes de vir a esta Casa - não só o Distrito Federal, mas também o Brasil sabe -, V. Exª tem não só protegido como representado - e muito bem - muitos que estão com suas famílias lutando, que têm representações, que têm uma vida de caminhada, e que muitas vezes ficam à mercê de atos dessa ordem. Tiram-lhes as representações desestabilizando as lutas empenhadas, as horas e horas de dedicação ao trabalho, os empregos, que se perdem de um momento para o outro, repentinamente. Caso semelhante ao da Ford - lembro a V. Exª - e que também está causando um tremendo desemprego e problemas sérios no Brasil inteiro é a junção das cervejarias Antarctica e Brahma, formando a Ambev.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - É a mesma situação. Temos de fazer uma revisão geral, Senador.

            O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Sei de representantes comerciais de Santa Catarina que haviam expandido as suas representações, investido a pedido dessas produtoras de cerveja e que, anos e anos, têm-se dedicado às suas atividades com 20, 30, 50 caminhões, pequenos ou grandes, gerando 500, 600 ou mil empregos, estão todos à mercê dessa situação agora. De uma hora para outra, foram dispensados. Apesar de toda uma vida de luta, não têm mais como representar. Quer dizer, resolvem fazer uma junção, concedem para quem quiser essa representação. Está havendo muito corre-corre, muito desemprego; os possíveis direitos de muitos anos de trabalho desses distribuidores são retirados. Conhecemos isso no meu Estado - e não é só lá, creio que isso ocorre no Brasil todo. A sorte é que agora, na Comissão de Assuntos Econômicos, se não estou equivocado, houve um pedido de audiência pública para ouvir os representantes da Ambev e esses distribuidores no Brasil, será realizado um debate para ver se o Cade pode interferir porque, ao lado de direitos, estão os prejuízos de milhares e milhares de trabalhadores e famílias. É mais ou menos no sentido dessa tese que V. Exª está a analisar. Quero me associar a V. Exª nesse momento porque há um clamor nacional, Senador Lindberg Cury. Esses que muitas vezes vêm para cá, usufruem, tiram os incentivos, os direitos de muitos que constróem uma vida lutando, passando o investimento de pai para filho, e depois os deixam à mercê, abandonados. A empresa vai embora, não investe no País; ao contrário, só leva as vantagens, usufrui da bondade do povo brasileiro. Por isso quero me associar, mais uma vez, ao pronunciamento de V. Exª.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Agradeço à participação de V. Exª.

            Srªs e Srs. Senadores, por gentileza, isso não foi dito por mim, está publicado na revista Exame, na última edição, dito pelo Presidente da Ford. "A Ford, com a inauguração de uma fábrica na Bahia e prestes a lançar uma nova família de carros, tenta reverter sua queda no mercado nacional". Vejam também que aqui apresentam dados estatísticos da queda violenta da Ford no Brasil. Agora, quem paga por isso? São os revendedores, aqueles que acreditaram nessa multinacional. Estão sofrendo, estão à míngua e não têm amparo legal nenhum. Porque quando entram no mercado, participam como revendedores, eles assinam um contrato de adesão que não dá direito a quem quer que seja. Basta executá-lo e centenas de revendedores são colocados na rua da miséria, da amargura.

            Está aqui também a palavra - não é minha, Sr. Presidente, - mas de John K. Bucker, Vice-Presidente do Conselho de Administração da montadora: "A Ford precisa recuperar a confiança do consumidor". E assim por diante. Está aqui na revista Exame, sob o título "A Queda da Ford no Mercado". Só gostaria de mostrar ao Brasil os desmandos e falcatruas de uma empresa que já teve o seu passado de glórias e hoje chafurda na lama da desonestidade. Os concessionários atingidos criaram, no início de 2000, a Abedif, Associação Brasileira de ex-Distribuidores Ford. E observe, Senador Romeu Tuma, o número de ex-revendedores hoje é muito maior do que os atuais distribuidores. O objetivo dos associados é lutar junto à Justiça para que a Ford devolva aos seus ex-concessionários o que lhes é de direito, ou seja, o patrimônio que empenharam, acreditando no potencial de uma empresa cuja marca ainda é respeitada em seu país de origem.

            A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Permita-me V. Exª um aparte?

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Concedo a palavra à Senadora Marina Silva.

            A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Muito rapidamente, Senador Lindberg Cury, e já vou também dar o espaço para que o Senador Romeu Tuma possa aparteá-lo. Quero cumprimentar V. Exª pela coragem, pelo pronunciamento e sobretudo pela visão crítica e conhecedora da atuação dessa multinacional. Quisera os empresários, os investidores brasileiros de boa-fé contassem com um suporte de recurso que essa multinacional, rentável no seu país de origem, que tem capital, que poderia muito bem estar se instalando, não para sugar a nossa frágil economia, mas para contribuir com o seu fortalecimento. Mas o mundo desenvolvido tem uma política de não permitir a entrada dos investidores de outros países nas suas economias. Por outro lado, querem entrar na nossa economia com todo o respaldo, com todo o tipo de benevolência e com toda a sorte de privilégios dos nossos governantes sempre muito ávidos por acenar com o chapéu dos outros - e quando digo outros é o povo brasileiro -, por oferecer meios para que essas empresas possam se instalar, com renúncia fiscal, em detrimento do interesse dos investidores nacionais, inclusive com prejuízo, como V. Exª acaba de mencionar, para aqueles que tinham as concessões e a revenda da Ford. Parabenizo V. Exª. No dia da aprovação do projeto que iria beneficiar a multinacional Ford, o Senador Gerson Camata fez um pronunciamento segundo o qual, nos países desenvolvidos, as pessoas não entendiam como nós tínhamos crianças de rua, como tínhamos crianças abandonadas e dávamos milhões e milhões de reais a uma multinacional altamente rentável, que poderia estar contribuindo com a nossa economia para diminuir a população de crianças de rua. Realmente ficávamos numa situação constrangedora porque não sabíamos como responder a essa pergunta. Quero aqui parabenizar V. Exª pelo pronunciamento que faz.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Agradeço à Senadora Marina Silva por esse brilhante e esclarecedor aparte.

            O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Concedo a palavra ao Senador Romeu Tuma.

            O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Lindberg, pouco eu teria a falar visto a eloqüência do seu depoimento e o seu conhecimento do assunto. Fiz, ainda esta semana, depois de receber pedido dos pequenos acionistas e dos proprietários de depósitos das companhias Brahma e Antarctica, solicitação quanto à postura da Ambev, que tem um compromisso fixado no Cade de manter pelo menos os empregos e a situação econômica daqueles que há algumas dezenas de anos trabalham com a empresa. A maioria está fechando, a maioria não consegue fazer concorrência com a própria indústria, que elimina o aspecto do revendedor. Se V. Exª me permitisse, eu queria prestar homenagem a um homem que, durante décadas, foi o representante da Ford em São Paulo, um dos grandes revendedores na área automobilística do País que era a Companhia Santo Amaro Distribuidora, o Sr. João Zarife. Emociona-me lembrar o seu trabalho, a sua ousadia e os seus investimentos, criando uma grande organização que fez o nome da Ford em São Paulo, no Rio de Janeiro e em outros Estados; hoje está alugando os seus armazéns para poder sobreviver. De quem é a culpa? É dele, que a administrou mal? Não. Foi porque ele tinha que vender o carro, modelo Ka, que não dava para manter porque não tinha renovação de produtos para concorrer com as outras indústrias que, a todo ano, estão realmente mobilizando aqueles que gostam de trocar de carro permanentemente e não encontraram opções na Ford. Então, se V. Exª me permitir, quero fazer esta homenagem que, para mim, representa provavelmente a situação daqueles que V. Exª traz, mais de 350 em igual situação. Obrigado.

            O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Senador Romeu Tuma, V. Exª foi de uma habilidade muito grande, foi diretamente ao âmago da questão. O João Zarife foi o maior revendedor da Ford na América do Sul. Tinha propriedades e agências espalhadas pelos diversos Estados do nosso País, e esse homem hoje está passando por dificuldades, com um enfarte provocado por essa má gestão que a Ford imprimiu, não apenas a ele mas a todos os revendedores do nosso País. Quero também, do plenário do Senado, prestar esta homenagem ao grande investidor, ao grande empreendedor João Zarife, que representa e espelha a situação dos demais revendedores da Ford neste País.

            Senador Romeu Tuma, também fui dono, durante 37 anos, de uma das maiores empresas da Ford no Brasil e, por esses desmandos, tive que encerrar as atividades, colocando na rua perto de 500 funcionários. Esse é o motivo pelo qual represento aqui a Abedif - Associação Brasileira dos ex-distribuidores da Ford - e pediria, neste final, mais uma observação de um jurista.

            Em um estudo sobre a situação da Ford em relação aos concessionários alijados, o jurista Waldírio Bulgarelli reconheceu que cabe aos concessionários oprimidos e prejudicados pela concedente, a Ford, adequar os procedimentos cabíveis em termos de representação aos órgãos federais contra o abuso do poder econômico. Essa ação está na Secretaria de Defesa Econômica, no Cade, e lá, aprovado pela maioria absoluta dos ex-revendedores da Ford e dos atuais revendedores, corre na Justiça. As ações judiciais de rescisão contratual, com pedido de reparação de danos e, ainda, as de mera reparação de prejuízos e indenização pelos lucros cessantes, além da devolução, do que entenderem, que pagaram a maior indevidamente.

            Está na hora de a Ford redirecionar suas atividades para a produção e não para o seu Banco Ford. E garantir aos distribuidores, a preços e produtos adequados, não apenas a retomada do mercado, como a efetivação de uma margem mínima de comercialização.

            Sr. Presidente, ao encerrar esta minha participação, gostaria de fazer duas observações. Quero dar um recado a todos os ex-revendedores de carro no Brasil que acompanhem atentamente a atividade da Abedif, que se unam em torno de um ideal, que é restabelecer suas empresas e fazer com que se pague pelo alto custo imprimido às empresas nacionais, que foram massacradas.

            Vou um pouco além. Hoje não é preciso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para quem quiser saber qual é a situação da Ford, gastar recursos altos para fazer uma pesquisa, basta olhar pela janela que se estará diante de uma realidade.

            Sr. Presidente, muito obrigado.


            Modelo15/19/242:50



Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/10/2001 - Página 24906