Discurso durante a 136ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo à Câmara de Gestão da Crise de Energia para que suspenda os cortes de energia previstos para as famílias de baixa renda e para as empresas que não se ajustarem às cotas de racionamento.

Autor
Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Iris Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENERGIA ELETRICA.:
  • Apelo à Câmara de Gestão da Crise de Energia para que suspenda os cortes de energia previstos para as famílias de baixa renda e para as empresas que não se ajustarem às cotas de racionamento.
Aparteantes
Paulo Souto.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/2001 - Página 25329
Assunto
Outros > ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, CORTE, ENERGIA ELETRICA, CONSUMIDOR, INSUCESSO, RACIONAMENTO, DESRESPEITO, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, REDUÇÃO, PRODUÇÃO, PEQUENA EMPRESA, MOTIVO, INTERRUPÇÃO, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, PREJUIZO, ECONOMIA, BRASIL.
  • SOLICITAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CAMARA DE GESTÃO, CRISE, ENERGIA ELETRICA, REFORMULAÇÃO, POLITICA, RACIONAMENTO, SUSPENSÃO, CORTE, FORNECIMENTO, OBJETIVO, REDUÇÃO, PREJUIZO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, PEQUENA EMPRESA.
  • DEFESA, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, DECISÃO, POLITICA, RACIONAMENTO, ENERGIA ELETRICA, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na segunda-feira, as companhias elétricas começaram a efetuar o corte no fornecimento de energia elétrica dos clientes que não conseguiram se ajustar às cotas de racionamento determinadas pelo Governo. As equipes estão nas ruas de todo o País, apenando donas de casa e empresários que, por motivos diversos, viram-se impossibilitados de economizar o suficiente para fugir da medida constrangedora. O apagão nas residências e empresas punidas dura três dias.

            Esses cortes, como se sabe, foram determinados pela Câmara de Gestão da Crise de Energia, órgão criado pelo Governo Federal para administrar esse período de escassez. Em Goiás, o meu Estado, as previsões oficiais são de que 70 mil pessoas poderão ser atingidas pelo apagão, somente nesta etapa. Sem dúvida, é um número bastante expressivo. São cidadãos que, de uma hora para outra, ficam privados de seus direitos básicos. São famílias que estão perdendo o alimento do dia-a-dia porque não podem mais conservá-los na geladeira. São crianças impossibilitadas de fazer o dever da escola porque simplesmente não existe iluminação à noite.

            O mais dramático, Sr. Presidente, é a realidade vivida hoje por centenas de pequenas empresas que já se encontram com o processo produtivo paralisado diante da interrupção do fornecimento de energia elétrica. São homens e mulheres que ganham o sustento através do trabalho honesto de seu comércio ou microindústria e agora se vêem diante de prejuízos que podem até mesmo inviabilizar os negócios. Essas pessoas estão tendo perdas incalculáveis com o apagão, os seus funcionários não podem exercer as atividades, fomentando um cenário que vai intensificar ainda mais os desajustes sociais.

            A situação, Sr. Presidente, é tão grave, embora o Centro-Oeste - e aí se inclui Goiás - contribuiu com aproximadamente 20% que buscava o Governo na economia de energia. Então, não ocorreu uma indiferença ou desrespeito por parte do povo ao chamamento do Governo e à imposição de uma política implantada emergencialmente para a economia de energia.

            Sr. Presidente, a situação é tão grave que o jornal O Popular, órgão da imprensa escrita de maior tiragem diária no Estado de Goiás, traz na sua primeira página a fotografia de uma microempresária da indústria de confecção que, auxiliada por seis funcionárias, deixa de produzir duas mil peças diárias, arcando com um prejuízo de R$2 mil. Como ela, há um número enorme de pessoas que neste momento estão desoladas.

            Os casos se repetem em todos os setores da economia de Goiás, do Centro-Oeste e - posso afirmar sem medo de erro - do Brasil. São proprietários de supermercados que não têm como abrigar carnes e produtos diversos que necessitam do freezer. São donos de lanchonetes impossibilitados de atender à demanda porque não podem servir bebidas geladas. É o marceneiro que não podem entregar a encomenda, correndo o risco de perder o cliente e o sustento de casa. Novamente, o povo está pagando a conta dos erros cometidos pelas autoridades públicas.

            Não há necessidade de se discutir aqui de quem é a responsabilidade pelo apagão que assaltou o País. Todos sabem que os setores governamentais, de uma forma ou de outra, falharam clamorosamente. O povo, que está sendo punido injustamente, não tem nenhuma culpa por essa situação. As empresas, grandes e pequenas, não contribuíram para jogar o País nesse estado de coisas. Mas, hoje, são elas que carregam o fardo da crise, mesmo porque os indicadores conjunturais já comprovam a desaceleração da economia.

            O que o País espera dos integrantes da Câmara de Gestão da Crise Energética, sob o comando do ilustre Ministro Pedro Parente, é a adoção de medidas criativas capazes de provocar os menores estragos possíveis no cotidiano da sociedade. Sabemos que precisamos continuar economizando energia. É verdade que o nível dos reservatórios continua baixo, apesar das primeiras chuvas. Estamos, na média, com apenas 12 por cento do volume de água necessário para mover as turbinas das hidrelétricas. É verdade também que teremos de manter o regime de contenção pelo menos até abril de 2002, quando o problema será reavaliado. Não temos outra saída.

            O que não pode acontecer é a dosagem errada das medidas de economia de energia. O povo, às custas de sacrifícios, tem colaborado de maneira surpreendente, dentro de um espírito coletivo de cidadania raras vezes visto no País.

            Por isso, providências polêmicas como a adoção de feriados extraordinários na Região Nordeste precisa ser debatida com a sociedade, assim como a imposição de cortes. Sem dúvida, necessitamos continuar economizando. Mas, igualmente, merecem atenção especial as famílias de baixa renda, as empresas, sejam grandes, médias, pequenas ou até microempresas, e, igualmente, as organizações cujo funcionamento atendem a fins humanitários. Numa palavra: precisamos evitar, a todo custo, o agravamento dos nossos problemas econômicos e sociais.

            Precisamos preservar o chamado país real, o país que produz, o país que pulsa nas ruas, o país que, mesmo sobrecarregado de impostos, encontra um jeito de oferecer empregos, de gerar riquezas e de resolver seus problemas práticos. É esse país real que muitas vezes é ignorado nos gabinetes refrigerados do poder, onde nunca falta energia, onde nem sequer se conhece o valor das contas de luz, onde as decisões são mais técnicas do que políticas. Esse Brasil, desafiando muitas vezes as suas próprias deficiências estruturais, sempre encontra soluções inteligentes e racionais para os seus problemas.

            Em alguns pontos, reconhecemos que a Câmara de Gestão da Crise Energética fez um bom trabalho. A intervenção pessoal do Presidente Fernando Henrique Cardoso, em determinados momentos, também ajudou na administração da crise. Obtivemos índices expressivos de redução do consumo, com o intenso engajamento da população e, principalmente, das classes produtoras. E sabemos, temos consciência de que não podemos relaxar na economia de energia.

            Mas ocorre que a implantação de propostas mais radicais, como os cortes punitivos e os feriadões anunciados para o Nordeste, têm obtido péssima repercussão junto à sociedade.

            Hoje, há um inegável clima de revolta. No Nordeste, até os governadores, segundo noticia a imprensa, se levantam contra as medidas que ameaçam comprometer ainda mais o giro da economia dos seus Estados. É até possível acreditar que enfrentamos o risco de perder a adesão popular ao programa de racionamento, tão espontânea no início, mas agora diminuindo diante da perplexidade causada pelas últimas providências.

            As autoridades responsáveis têm falhado, por exemplo, ao permitir o esvaziamento da campanha publicitária sobre as medidas de economia de energia. Não é mais tão intensa, também, a participação dos representantes da sociedade no encaminhamento das decisões sobre o racionamento. Além disso, o horário de verão foi mais uma vez implantado, este ano, sem uma audiência mais ampla do conjunto da nação. Por isso, precisamos mudar os rumos. A retomada do debate com os setores diretamente envolvidos na crise é o caminho para que venham surgir alternativas até agora inéditas, porém em condições de contribuir para amenizar as dificuldades criadas pelo racionamento.

            A tecnocracia de Brasília costuma ser acusada de frieza e insensibilidade diante dos nossos problemas humanos e sociais. Essa postura, infelizmente, pode ser identificada em alguns momentos da crise de energia que ora enfrentamos. É verdade. É preciso que o Governo tenha humildade para admitir. Ainda há tempo para uma correção da rota, garantindo, até onde for possível, a sustentação do nosso setor produtivo e das áreas que permitem o funcionamento do País.

            Desta forma, quero pessoalmente solicitar ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e ao Ministro Pedro Parente, que comanda a Câmara de Gestão da Crise Energética, para que definitivamente suspendam os cortes no fornecimento de energia elétrica para aquelas famílias ou empresas que não conseguiram atingir plenamente as metas do racionamento. Essa medida é exagerada, penaliza em demasia a sociedade, já submetida a pesadas multas pecuniárias, e não resolve os problemas cruciais do setor. Não é justo que o mesmo consumidor pague duas vezes: a primeira, a multa quando do pagamento da taxa de energia; e a segunda, o corte por três dias da energia na sua empresa ou em seu domicílio. Os apagões deflagrados agora fazem intensificar a crise social, geram perdas no processo produtivo e desemprego, trazem perturbação e anomalias dissociadas dos reais interesses do País.

            O povo não pode pagar sozinho a conta das improvisações que levaram o País a essa terrível crise no setor energético. É preciso que o Governo tenha discernimento suficiente para não exagerar na dosagem e abrir um novo flanco de dificuldades.

            Paralisar a produção do País é inadmissível em um momento em que tantos padecem a falta de emprego. É preciso insistir em obter a colaboração da sociedade para que cada um faça a sua parte, garantindo os 20% de economia necessários ao Brasil neste momento.

            Ao Presidente da República, reiteramos o pedido para que tenha cada vez mais presença ativa, como magistrado e como primeiro mandatário, na administração da crise energética, dirimindo os conflitos e decidindo em favor dos interesses das classes mais humildes, aos quais o Presidente é extremamente sensível, que são a maioria neste País.

            O momento, Srªs e Srs. Senadores, é de repensar o País, adotando posições firmes, mas sensatas que não prejudiquem o conjunto da sociedade. Priorizar os investimentos que recuperem a infra-estrutura, suspender as privatizações do setor energético, apostar no trabalho do povo e na sua permanente disposição em colaborar são atitudes fundamentais. É somente através dessa iniciativa que iremos construir um Brasil forte e próspero.

            O Sr. Paulo Souto (PFL - BA) - Quando V. Exª achar conveniente, Senador Iris Rezende, gostaria que me concedesse um aparte?

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Com muito prazer, ouço o ilustre representante da nossa querida Bahia.

            O Sr. Paulo Souto (PFL - BA) - Ilustre Senador Iris Rezende, V. Exª focaliza, sem dúvida, um assunto momentâneo da maior importância para toda a nossa sociedade, que são todos os problemas decorrentes do racionamento que o Brasil, neste momento, está exposto. V. Exª reconhece o esforço que o Governo fez, que está fazendo, ao mesmo tempo em que, com muita razão, coloca alguns problemas que têm trazido prejuízos sensíveis a nossa população. Gostaria de me referir, particularmente, à questão que, neste momento, preocupa a todos os Estados nordestinos: os feriadões que estão sendo decretados naquela região, onde a situação é mais grave. Não podemos imaginar que o Governo esteja fazendo isso apenas por fazer, mas porque está se considerando obrigado a isso. Entretanto, há alguns pontos que realmente merecem ser considerados. Durante a reunião que tivemos na semana passada com o Ministro Pedro Parente, na Comissão Mista de Energia que trata desse assunto, solicitamos um esforço adicional do Governo para que fossem analisadas todas as medidas que possibilitassem um aumento da oferta a curto prazo, mesmo porque sabemos que isso pode acontecer. Quando se fala em curto prazo a essa altura, temos que falar em 45, 60 dias, mas não podemos correr o risco, caso haja um atraso ou uma frustração na estação chuvosa, de vermos essa situação agravada na região nordestina. E há um outro aspecto fundamental: vamos ter, neste ano, no Nordeste, uma oportunidade como poucas de ter o fluxo turístico aumentado, crescente, porque há restrições às viagens ao exterior, tanto por motivos econômicos, como por esses problemas internacionais a que estamos assistindo. Haverá, portanto, um grande afluxo para aquela região. Nesse sentido, a região seria extremamente prejudicada se criassem a expectativa de que problemas com o fornecimento de energia poderiam acontecer em novembro, dezembro e janeiro, embora se espere que as chuvas àquela época já tenham retomado e recuperado os reservatórios. Não podemos, entretanto, correr mais riscos. Assim, toda medida no sentido de aumentar a oferta - acredito que há medidas desse tipo - deve ser tomada, ainda que se corra o risco de depois, com a chuva, ela não mais ser necessária. Portanto, como temos que recuperar os níveis dos reservatórios, qualquer capacidade instalada que permita, com geração térmica, poupar os reservatórios no início da estação chuvosa seria muito interessante para que tivéssemos mais segurança no ano de 2002. Como V. Exª está focalizando um problema muito interessante, eu, como Senador de um Estado nordestino, aproveito a intervenção extremamente oportuna que faz para fazer um apelo que já fizemos na Comissão Mista de Energia, ou seja, desejamos renovar esse apelo ao Ministro Pedro Parente, ao Ministro José Jorge, que têm se mostrado extremamente eficientes na condução dessa crise: é preciso envidar todos os esforços no sentido de aumentar a oferta de energia. Não podemos mais correr nenhum risco. Se, no futuro, isso se mostrar desnecessário, ninguém vai acusar o Governo de ter tomado uma medida segura para evitar um problema maior para toda essa região. Agradeço a V. Exª pela oportunidade deste aparte.

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Sou eu quem agradece a V. Exª, Senador Paulo Souto, pelo importante aparte que me fez e que indiscutivelmente legitima a preocupação que trago nesta tarde à tribuna do Senado, na expectativa de que o Presidente da República, sensível como tem sido aos clamores sociais e com a humildade própria dos estadistas - já disse isso aqui certa vez - revogue essa decisão de cortes de energia. Esses cortes referem-se a empresas, a pessoas que não têm culpa se exageraram no consumo, pois muitas dessas pessoas têm, em sua pequena indústria, em sua lanchonete, o único instrumento para o ganha-pão.

            De forma que essa medida de cortes não solucionaria o problema, uma vez que todos aqueles que excedem estão sujeitos às multas. Aliás, pode trazer mais problemas, tais como desemprego, falência de empresas e, com isso, um descontrole profundo na vida de milhares e milhares de pessoas.

            Trago aqui um testemunho do meu Estado: a população colaborou extraordinariamente com o Governo. Não se ouviu uma crítica no meio do povo. A cidade, de uma hora para outra, ficou às escuras. É comum chegar em uma residência, em um apartamento e se deparar com apenas uma lâmpada acesa. E todos entendem essa atitude como contribuição. Entretanto, essa simpatia, essa boa vontade, reafirmo aqui, pode desaparecer diante de uma atitude antipática, que atingirá uma parcela importante da nossa sociedade e não trará nenhuma solução.

            Portanto, esperamos que o Governo seja sensível a esse problema. Reitero a sugestão de V. Exª. Que providências estão sendo tomadas? Quantos conjuntos estão sendo instalados emergencialmente?

            Lembro-me bem que, quando assumi o Governo de Goiás, em 1983, mais de 50% das cidades eram servidas por conjuntos movidos a diesel, inclusive as cidades do Estado do Tocantins, exceto quatro ou cinco. Assim, defendo a idéia de que esses conjuntos poderiam ser aproveitados, num caso de emergência, para evitar esses pequenos castigos, que representam um golpe fatal para muitas famílias e não resolvem o problema.

            Muito obrigado, Senador. Estou certo de que o Governo do Presidente Fernando Henrique não ficará insensível a esses apelos que, para muitos, podem significar um fato simples, mas, para o povo, é algo muito importante.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


            Modelo15/24/246:53



Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/2001 - Página 25329