Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca do relatório da Unicef intitulado "Situação Mundial da Infância 2002", sobre os resultados das ações propostas pela Cúpula Mundial pela Criança, realizada em 1990.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Considerações acerca do relatório da Unicef intitulado "Situação Mundial da Infância 2002", sobre os resultados das ações propostas pela Cúpula Mundial pela Criança, realizada em 1990.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/2001 - Página 25603
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DOCUMENTO, FUNDO INTERNACIONAL DE EMERGENCIA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFANCIA (UNICEF), ANALISE, SITUAÇÃO, INFANCIA, MUNDO, AVALIAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, PROPOSTA, CAMPANHA, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, MORTALIDADE INFANTIL, AUMENTO, IMUNIZAÇÃO, ATENDIMENTO, GESTANTE, COMBATE, DESNUTRIÇÃO, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS), AMPLIAÇÃO, ACESSO, EDUCAÇÃO, OPOSIÇÃO, CONFLITO, GUERRA, REGISTRO, DADOS, ESTATISTICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE ) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, acabo de receber o documento “Situação Mundial da Infância 2002”, do Fundo das Nações Unidas para a Infância - Unicef. Trata-se de uma publicação que relata os resultados obtidos nas mais diversas partes do mundo como resposta às propostas da Cúpula Mundial pela Criança, realizada em setembro de 1990, quando foi deflagrada a campanha “Diga sim pela Criança”; e que noticia, também, os encontros regionais de alto nível, realizados no ano passado e no ano em curso, preparatórios à Sessão Especial da Assembléia das Nações Unidas sobre a Criança.

            No prólogo da edição, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annam, destaca a importância de proporcionar às crianças o melhor começo de vida possível, assegurando-lhes o ensino básico e, especialmente ao segmento adolescente, a oportunidade de participar das decisões básicas que afetam suas vidas.

            Annam salienta os progressos alcançados desde a realização da Cúpula Mundial da Criança, em 1990: três milhões de crianças menores de cinco anos deixaram de morrer, todos os anos, graças, em larga escala, aos programas de imunização e esforços empreendidos pelas famílias e comunidades; 28 milhões de crianças, na mesma faixa etária, sofreram menos as graves conseqüências da desnutrição; em 175 países, a poliomielite foi erradicada; e em 104, o tétano neonatal foi eliminado.

            A redução das taxas de mortalidade infantil foi um dos resultados mais significativos desse esforço que mobilizou governantes e comunidades de todas as partes do mundo. A taxa de mortalidade infantil e de menores de cinco anos (TMM5), que era de 94 por mil crianças nascidas vivas, em 1990, reduziu-se a 81 no ano 2000. Sessenta e três países alcançaram a meta de redução fixada em 33%, e, em mais de 100 países, essas mortes foram reduzidas em 20%. A meta para 2010 é de continuar reduzindo a mortalidade nessa faixa etária em 33%, conforme o documento.

            Para melhorar a saúde da criança se fazia necessário, também, melhorar o atendimento às mulheres gestantes, o que, por si, constitui também relevante tarefa de caráter humanitário. Embora os dados de 1990 não sejam disponíveis, as estatísticas mencionam a morte de 400 mulheres em 100 mil partos de crianças nascidas vivas. A meta para o ano 2010 é de redução de 33% dessas mortes, cabendo aqui salientar a disparidade dos índices entre os países ricos e pobres.

            Na região africana ao sul do Saara, as chances de morte durante a gravidez ou parto são de 1 em 13; na Ásia meridional, de 1 em 54; no Oriente Médio e na África, de 1 em 55; na América Latina e no Caribe, de 1 em 157; no leste da Ásia e no Pacífico, de 1 em 283; e nos países da Europa Central e do Oeste, na Comunidade dos Estados Independentes e nos Estados bálticos, de 1 em 797.

            Uma outra estatística, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, nos dá a exata dimensão dessa disparidade: nos países subdesenvolvidos - ou menos desenvolvidos, conforme a terminologia da ONU - esse índice é de uma morte em 16 gravidezes ou partos; nos países industrializados, é de 1 por 4085.

            Outra vertente da atuação dos países representados na Cúpula Mundial pela Criança foi o combate à subnutrição. Entre 1990 e 2000 o número total de crianças subnutridas nos países em desenvolvimento caiu de 177 milhões para 149 milhões - o que ainda é muito pouco. Nesse campo, as estatísticas, de fato, são pouco animadoras: na Ásia, onde vivem dois terços de todas as crianças subnutridas do planeta, essa redução foi pequena, de 36% para 29%; e nos países ao sul do Saara, o número absoluto de crianças subnutridas aumentou.

            Esses dados trazem de volta a advertência do Secretário-Geral das Nações Unidas, que, em seu relatório sobre a Cúpula do Milênio, assinalou:

      Nenhuma alteração na forma de pensar ou agir pode ser mais importante do que isto: nós devemos colocar o ser humano no centro de tudo o que nós fazemos. Não há clamor mais nobre ou responsabilidade maior do que oferecer condições para que homens, mulheres e crianças, nas cidades e aldeias ao redor do mundo, possam tornar suas vidas melhores.

            Essa advertência permanece válida e vigorosa para os dias que vivemos, notadamente no que respeita à situação de fome e desnutrição nos países periféricos, apesar de alguns progressos terem sido alcançados em determinadas áreas.

            É o caso, por exemplo, da educação. Uma das metas fixadas pela Cúpula, em 1990, visava à universalização do acesso ao ensino fundamental e conclusão da educação primária por 80% das crianças. Esse índice, que era de 78% em 1990, subiu a 82% no ano passado. Para 2010, pretende-se reduzir em 50% o número de crianças fora da escola e elevar a 90% a taxa de matrículas.

            O Unicef observa que a taxa de matrículas vem crescendo mais do que a população, mas que ainda existem 100 milhões de crianças em idade escolar fora das salas de aula - na maioria, crianças que trabalham, portadoras de deficiências, moradoras de áreas rurais ou oriundas de famílias pobres ou de minorias éticas. A essas, somam-se as portadores do vírus HIV e as que habitam regiões de conflito.

            Outra meta, na área da educação, referia-se à alfabetização de adultos, em que onde ocorreu uma redução de 16%. No ano passado, constatou-se a existência de 875 milhões de adultos analfabetos, contra 895 milhões em 1990. De acordo com o Unicef, o analfabetismo se concentra na Ásia Meridional e nos países africanos; no que respeita ao gênero, é predominante entre as mulheres.

            A propagação da Aids foi um dos temas mais discutidos por ocasião da Cúpula Mundial pela Criança. O relatório do Unicef acentua que, no cenário internacional, os países industrializados não assumiram a devida responsabilidade na batalha contra o vírus. “Ao constatar que a epidemia fora contida dentro de seus próprios países - assinala o documento - muitos governantes olharam com indiferença ao que ocorria em outros países. (...) Somente ao despontar o novo milênio, é que eles compreenderam que nessa luta as fronteiras nacionais são insignificantes e que, ou se luta lado a lado, ou caem todos juntos”.

            A porcentagem de mortalidade de crianças menores de cinco anos de idade em conseqüência da Aids, para o período 2000/2005, é estimada em 48% na Namíbia, 50% na África do Sul e no Zimbábue e 64% em Botsuana, segundo o Unicef. Embora a epidemia seja mais devastadora no sul e no leste da África, os números são motivo de preocupação em todas as partes do mundo. Na América Latina e no Caribe, estima-se que 210 mil adultos e crianças contraíram o vírus dessa moléstia durante o ano passado.

            Hoje, sabe-se que metade dos novos casos de infecção pelo HIV ocorre em jovens entre 15 e 24 anos; que 1 milhão e 400 mil crianças com idade abaixo de 15 anos convivem com o HIV em todo o mundo; que 80% das crianças nessa faixa etária vivem na África; que 4 milhões e 300 mil crianças de até 15 anos morreram de Aids desde o início dessa epidemia; e que mais de 13 milhões de crianças com até 14 anos ficaram órfãos em conseqüência da Aids.

            Outro ponto que tem sido exaustivamente debatido no âmbito do Unicef se refere aos conflitos, sejam eles regionalizados ou mais amplos, em diversas partes do planeta. Essa discussão, que ganha maior atualidade com o bombardeio do território afegão pelos Estados Unidos, em represália a atos terroristas, põe em evidência números aterradores: existem, em todo o mundo, nada menos que 35 milhões de pessoas refugiadas ou asiladas, sendo 80% desse contingente de crianças e de mulheres; entre 1990 e o ano passado, 2 milhões de crianças foram massacradas, 6 milhões foram feridas ou ficaram permanentemente inválidas e 12 milhões ficaram sem teto.

            As estatísticas demonstram ainda, Sras. e Srs. Senadores, que entre 80 e 90% das pessoas que morrem em conflitos são civis; e que os conflitos transformaram em órfãos, ou separaram de suas famílias, mais de 1 milhão de crianças, no período entre 1990 e 2000.

            Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, o documento “Situação Mundial da Infância 2002” é um relatório realista, que, ao noticiar os progressos obtidos desde a Cúpula Mundial da Criança, ressalva as oportunidades desperdiçadas na proposta de tornar o planeta mais fraterno e mais humano para milhões de crianças e adolescentes.

            “Quando líderes governamentais falam em milhões de pessoas, os indivíduos envolvidos são facilmente reduzidos a cifras, seus sofrimentos transformados em estatísticas e tendências” - enfatiza o relatório. Tomando como base a situação existente em 1990, quando aconteceu a Cúpula Mundial pela Criança, o documento questiona: por que os direitos da criança continuam a ser desrespeitados? A pobreza infantil e as condições de saúde serão monstros imbatíveis e invencíveis que continuarão entre nós? A exploração de crianças deve continuar para sempre?

            Ao relatar os extraordinários progressos conquistados pela humanidade nesse curto período de uma década - a Internet, que representa a comunicação instantânea para milhões de pessoas, a clonagem de um mamífero, que deu à luz filhotes saudáveis e a compreensão do código genético humano - o relatório especula: “Haverá alguém que possa afirmar com seriedade que as declarações dos líderes em benefício das crianças, feitas em 1990, representam um sonho impossível?”.

            Sabemos que não, Sr. Presidente. Sabemos que esse sonho é possível, e que para se tornar realidade exige, mais do que palavras bonitas e documentos timbrados, a efetiva vontade dos governos, dos educadores, dos líderes comunitários e religiosos, empresários e acadêmicos, de toda a sociedade, enfim, de investir no desenvolvimento sustentável, de acreditar na paz e de lutar para transmitir um mundo melhor às novas gerações.

            Muito obrigado.


            Modelo16/1/2411:28



Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/2001 - Página 25603