Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a queda nos negócios realizados com a Argentina. Defesa da retomada do diálogo entre Brasil e Argentina na busca de solução para os problemas enfrentados por aquele país.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Preocupação com a queda nos negócios realizados com a Argentina. Defesa da retomada do diálogo entre Brasil e Argentina na busca de solução para os problemas enfrentados por aquele país.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2001 - Página 26950
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ANALISE, EFEITO, CRISE, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, PREJUIZO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC).
  • REGISTRO, NECESSIDADE, UNIÃO, MEMBROS, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), APREENSÃO, RETROCESSÃO, RELACIONAMENTO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, PREJUIZO, INTEGRAÇÃO, ECONOMIA, INSERÇÃO, MERCADO INTERNACIONAL.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, DETERIORAÇÃO, COMERCIO, COOPERAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, PARCERIA, BRASIL.
  • DEFESA, DIALOGO, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, BRASIL, OBJETIVO, BUSCA, SOLUÇÃO, CRISE, MELHORIA, SITUAÇÃO, COMERCIO, INTEGRAÇÃO, ECONOMIA, AMERICA DO SUL.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB - SC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres Colegas, quero trazer nesta tarde uma preocupação de diversos setores da produção nacional em relação ao país vizinho, a Argentina. Não só o Brasil, mas em especial o meu Estado, Santa Catarina, por fazer fronteira com a Argentina, começa a sentir sérios transtornos em relação à economia, a negócios realizados, a empregos. Vários outros desdobramentos poderão advir - e já estão surgindo -, em virtude do estremecimento entre o Brasil e a Argentina, demonstrado nas últimas declarações do governo daquele país.

Quando criamos o Mercosul, pensamos que seria possível aos quatro países - Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai - darem-se as mãos. Esse seria um gesto inicial para depois buscarmos a união com os países dos Andes, com vistas à formação de um bloco. Dessa forma, teríamos mais condições de conversar com outros blocos já existentes. Pelo menos essa era a intenção no início da formação do Mercosul. Assim, teríamos mais vez e mais voz no mundo - como se diz na gíria.

Contudo, tudo isso ficou mais difícil diante do estremecimento das relações entre os dois maiores países do Mercosul - a Argentina e o Brasil. Isso nos preocupa, porque esse quadro acontece justamente quando estávamos nos aglutinando para conversar com mais força perante o Nafta e o Mercado Comum Europeu. Com nossa parceria, estávamos quase em condições de colocar no mercado internacional uma produção conjunta, principalmente de produtos agropecuários, o que tornaria as relações de nosso bloco semelhantes às de outros blocos com presença destacada na OMC. E sentaríamos à mesa das grandes discussões internacionais.

Diante dos últimos acontecimentos, nossas relações com a Argentina começam a esfriar e os setores dos dois países que mantinham relações comerciais entre si, com negócios já pautados, com pactos celebrados, começam a se preocupar. Segundo noticia a imprensa, tomando-se como exemplo apenas o Estado de Santa Catarina e analisando-se os negócios realizados neste ano, o comércio já caiu quase que 47%, Sr. Presidente, em função das declarações do Ministro da Economia da Argentina. E os argentinos alegam que não podem competir conosco diante da desvalorização cambial do real em relação à moeda deles. Por outro lado, eles querem o protecionismo total, o que também não podemos admitir.

Infelizmente, esse abalo nas relações bilaterais ocorre quando já se buscava, por meio de compensações para o desequilíbrio cambial, a manutenção dos negócios firmados, dos pactos celebrados; quando pensávamos em aprofundar o intercâmbio não só no campo da amizade, mas também do comércio e em outros setores. Os dois países estavam avançando nesse objetivo, que nos permitiria conversar em igualdade com o mundo, quando tudo começa a estremecer.

No que diz respeito aos negócios de Santa Catarina com a Argentina, o setor cerâmico caiu quase que 50% - e somos fortes nesse segmento industrial. O setor calçadista corre riscos, como também o setor de frangos. Em geral, teme-se que os negócios não sejam cumpridos em função das últimas declarações de rompimento ou quase rompimento. A queda nos negócios já atingiu mais de 40% neste ano, sendo 11% somente no último mês.

Sr. Presidente, isso nos preocupa, mas é claro que não podemos nos dobrar, não podemos aceitar as declarações unilaterais do governo da Argentina, em absoluto. Neste momento, precisamos estabelecer um diálogo. Quando eu era Governador do meu Estado, enfrentava vários problemas, como as greves, por exemplo - quem não as enfrentou? -, e repetia o dito popular: “É melhor duas horas de diálogo do que cinco minutos de tiroteio”. Isso também serviria para as nossas relações com a Argentina.

Vamos conversar, vamos sentar e dialogar. Não adianta nos digladiarmos, não adianta nós, irmãos da América do Sul, tomarmos atitudes que resultarão em perda de força, de parcerias, em prejuízo para nossa competitividade mundial. Precisamos engendrar esforços para resolver o impasse. O Itamaraty deveria ou autorizar o Embaixador José Botafogo Gonçalves a voltar a Buenos Aires, ou chamar autoridades do governo argentino para dialogar. Não só o Itamaraty, mas também o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior deveria participar disso. Precisamos buscar o melhor para que não haja queda nas transações comerciais, gerando desemprego em ambos os países.

Assim, Sr. Presidente, trago ao Plenário a preocupação dos setores produtivos do meu Estado. Sem dúvida alguma, essa preocupação não é só do meu Estado, mas de todo o Brasil. E o diálogo é o melhor caminho para chegarmos ao entendimento - o Governo brasileiro não pode se esquecer disso.

O Presidente da República, o Itamaraty, o Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior devem voltar sua atenção para a América do Sul. Sei que é preciso olhar os Estados Unidos, o Norte, o Oriente, a Europa, mas não podemos deixar os vizinhos de lado. Claro que devemos defender a nossa produção, mas buscando o diálogo, como cidadãos de maioridade, com países que querem encontrar saídas nas parcerias e conversações, a fim de termos melhores condições de competir com o mundo. Temos que ser maduros neste momento.

Esse é o apelo que deixo a quem tem não só o direito mas o dever de representar o País e levar em conta essas preocupações. Não podemos fugir desse debate. Embora alguns defendam que devamos virar as costas à Argentina, penso que esse não é o caminho. Vamos tentar esgotar todas as possibilidades de diálogo, como disse antes, pois é melhor duas horas de diálogo do que cinco minutos de tiroteio - pois, nessa última opção, quem sabe, talvez seja tarde para retomarmos o diálogo, depois dos prejuízos causados.

Por isso, reafirmo a necessidade de o Presidente Fernando Henrique, agora em sua volta da Europa, reunir-se com os responsáveis pelas Pastas que tratam dessas matérias para tentarem encontrar saídas para os problemas. De nada adianta a Argentina ir mal, quebrar. Isso não vai nos ajudar. Pelo contrário, vai nos prejudicar.

Trago até o exemplo de um determinado produtor que produzia cereais da melhor qualidade mas não queria que os vizinhos também melhorassem sua produção. Ele queria sobressair aos demais. No entanto, com o tempo, as sementes dos seus vizinhos, que produziam cereais de pior qualidade, foram sendo levadas pelos ventos para o terreno desse que produzia os melhores cereais, e ele não conseguia limpá-lo. Com isso, ele, que queria ser o único e o melhor em tudo, não conseguiu sobrepujar os vizinhos.

Trago esse exemplo figurado, Sr. Presidente e nobres Colegas, porque de nada adianta ficarmos sozinhos na América do Sul, de nada adianta termos os nossos vizinhos em situação inferior à nossa. Se quisermos competir com o mundo, precisamos, com esforço e diálogo, fazer com que os nossos irmãos também tenham saídas. Creio que esse é o melhor caminho para termos condições de nos firmarmos e vencermos as barreiras, os problemas e as peripécias que se nos apresentam. E temos que tentar buscar isso sem nos dobrarmos, sem entregarmos aquilo que é nosso, sem perdermos a soberania, sem prejudicarmos a produção nacional, o emprego nacional. Temos que tentar conversar com os nossos irmãos e superar tudo isso para, a partir daí, perante o mundo, termos condições de melhor competir.

Sr. Presidente, nobres Colegas, são essas as preocupações que trago hoje em relação ao que vem ocorrendo, principalmente com a Argentina e o Brasil. Essa situação não pode continuar. Não podemos virar as costas e esquecer tudo isso, até porque vários negócios estão em andamento. Inúmeros empresários brasileiros, acreditando que a questão do Mercosul iria ter seqüência ou vislumbrando um pacto duradouro, confiando no entendimento do Governo brasileiro e no chamamento das autoridades brasileiras, investiram na Argentina, assumiram compromissos empresariais e estabelecendo-se naquele país. E vice-versa. A Argentina também acreditou no pacto, na constituição do Mercosul, e vários empresários também investiram no Brasil. Agora, de uma hora para outra, diz-se que o pacto está rompido e que não existe mais nada. Não pode ser assim! O Governo brasileiro tem a obrigação de analisar essa questão. Inúmeras empresas aceitaram o chamamento e investiram de boa-fé, porque acreditavam num pacto duradouro. Então, não se pode simplesmente dizer: “Não deu. Até logo!”, e aqueles que investiram, que acreditaram no chamamento dos negócios que “se lasquem” - como se diz na gíria.

Temos, inclusive, uma Comissão no Congresso Nacional - do Senado Federal e da Câmara dos Deputados - que trata do Mercosul no âmbito legislativo. Será que não seria o momento de essa Comissão do Mercosul se reunir - talvez na próxima semana - e ouvir os representantes dos quatro países, principalmente do Brasil e da Argentina? Será que não seria o momento de nos sentarmos e buscarmos uma solução para os inúmeros negócios em andamento e os negócios comerciais que já se realizaram e que implicam inúmeros empregos aqui e lá?

Não podemos virar as costas neste momento e dizer que tudo deve ficar como está, que não temos nada a ver com isso. Não. Deve haver uma palavra de quem coordena o Brasil, de quem tem o compromisso de dirigir os destinos do País, aos investidores, aos empresários nacionais - uns com mais experiência, outros com menos - que, acreditando nessas versões, buscaram assumir compromissos externos, empréstimos, investiram aqui e lá, inclusive gerando empregos.

Para finalizar, Sr. Presidente - sei que meu tempo já está-se esgotando -, trago e deixo essa preocupação. Mesmo com o feriado que se aproxima - e temos que ter respeito pelos nossos entes queridos que já se foram -, não pode o Governo deixar de se preocupar com o que vem ocorrendo com a Argentina e o Brasil. Precisamos estar a postos e buscar, por meio do diálogo, as saídas para o que está aí colocado. Isso não é bom para nós e não nos ajuda em relação a outros mercados internacionais. Há outros blocos querendo vir conversar conosco, com o Mercosul. A própria Comunidade Econômica Européia e o Nafta querem conversar conosco, mas se não estamos nos entendendo praticamente dentro de casa, na América do Sul, que exemplo daremos?

Deixo essa preocupação no Senado, para que reflitamos bem sobre esse assunto.

Eram essas as considerações que queria fazer, Sr. Presidente e nobres Colegas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2001 - Página 26950