Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Contradições nas ações do presidente Fernando Henrique Cardoso com o pronunciamento proferido na Assembléia Nacional da França.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Contradições nas ações do presidente Fernando Henrique Cardoso com o pronunciamento proferido na Assembléia Nacional da França.
Aparteantes
Geraldo Melo.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2001 - Página 26966
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VISITA OFICIAL, PARLAMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, IGUALDADE, PRONUNCIAMENTO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), COMBATE, PROTECIONISMO.
  • CONTRADIÇÃO, DISCURSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SUBSIDIOS, PRODUTO AGRICOLA, APOIO, ACORDO INTERNACIONAL, AMERICA, PREJUIZO, BRASIL.
  • CONTRADIÇÃO, DISCURSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AMBITO INTERNACIONAL, DIFERENÇA, ATUAÇÃO, BRASIL.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu também gostaria de fazer alguns comentários a respeito do pronunciamento que o Presidente da República do Brasil fez na Assembléia Nacional da França. Realmente é um belo discurso; temos que reconhecer que é um belo discurso. O que nos surpreende é que ao compararmos algumas das partes desse discurso com algumas coisas que falamos aqui no Brasil e que são classificadas como obra de retrógrados, vemos que não há muita diferença.

O Lula esteve na França e fez alguns comentários a respeito de protecionismo e foi classificado como quinta coluna dos interesses franceses aqui, por alguns Ministros do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

E vejam o que disse o Presidente na Assembléia Nacional Francesa:

Se acreditarmos de fato no livre comércio, cabe ao Mercosul e à União Européia a adoção de medidas efetivas contra o protecionismo.

Aí vem o parágrafo seguinte:

Entretanto, o preço desta mudança não deveria ser pago apenas pela França, uma vez que outros países mais poderosos continuam a subsidiar fortemente seus produtos agrícolas.

            Sinceramente, não vejo muita diferença entre essa afirmação e aquilo que realmente o Lula disse lá na França.

O Presidente da República opta por criticar os Estados Unidos.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Permito.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - É que há uma diferença muito grande pelo menos em relação...

O SR. PRESIDENTE (Ramez Tebet) - Senador Geraldo Melo, o Senador José Eduardo Dutra está falando em comunicação de Liderança, pelo prazo de cinco minutos.

O Sr. Geraldo Melo (Bloco/PSDB - RN) - Eu agradeço ao Senador José Eduardo Dutra pela gentileza e peço desculpas à Mesa.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Eu acho que o Senador Geraldo Melo, sem querer ser leitor de mentes, iria fazer uma comparação, iria dizer que há uma diferença muito grande entre isto que está aqui e aquilo que o Lula disse. Realmente há uma diferença muito grande entre aquilo que está aqui e aquilo que foi publicado como dito pelo Lula nas manchetes. Até porque quando líamos a matéria ela expressava aquilo que Lula havia dito e não a manchete que foi a justificativa para classificação de quinta-coluna.

Mas eu fazia referência às críticas aos Estados Unidos.

Ora, se realmente aquilo que pensa o Presidente da República é o que Sua Excelência disse na França, então o Presidente deveria encerrar ou pelo menos suspender as reuniões que vêm sendo feitas entre os representantes dos Estados Unidos, do Brasil, da Argentina e do Uruguai, no âmbito do chamado Acordo Rose Garden, ou quatro mais um, assinado em 1991 e que até hoje, não sei por que cargas d’água, não foi submetido ao crivo do Congresso Nacional. Tal acordo contradiz radicalmente aquilo que o Presidente da República diz no seu discurso em relação aos Estados Unidos. E vou citar alguns dos itens:

7 - Reconhecendo o papel de apoio que a Iniciativa para as Américas está destinada a exercer nas Américas ao encorajar a integração econômica regional e a ampla redução das barreiras intra-regionais ao comércio e ao investimento;

8 - Reconhecendo que um objetivo de longo prazo da Iniciativa para as Américas é a implantação de um sistema de livre comércio nas Américas; reconhecendo a relevante contribuição que o Mercosul trará ao reduzir barreiras ao comércio e ao investimento nas Américas;

9 - Reconhecendo o desejo dos Estados Unidos da América de manter uma relação produtiva com as quatro Partes Sul-Americanas em seus esforços para criar o mercado comum;

10 - Reconhecendo o desejo das Partes Sul-Americanas e dos Estados Unidos da América de reduzir as barreiras ao comércio e ao investimento, inclusive aquelas que limitam o fluxo comercial de tecnologia.

            Portanto, se realmente o Presidente da República pensa e age de acordo com o seu discurso na Assembléia Nacional Francesa devia pelo menos sustar as iniciativas que já vêm sendo desenvolvidas no âmbito desse acordo.

O Presidente foi elogiado, inclusive pela esquerda francesa, e deve ter passado por um certo constrangimento até porque um deputado francês cometeu uma gafe ao listar entre as iniciativas do Presidente da República brasileiro a promoção do Fórum Social Mundial, quando todos sabemos qual foi o comportamento do nosso Presidente em relação a esse evento.

Mas, concluindo, Sr. Presidente, sem querer fazer qualquer comparação entre regimes ou entre períodos históricos, esse comportamento do Presidente da República fora do Brasil me lembra muito de uma charge feita pelo grande Henfil por ocasião de um discurso do ex-Presidente João Baptista Figueiredo perante a Organização das Nações Unidas.

Na época, o Presidente Figueiredo foi às Nações Unidas e fez um pronunciamento defendendo a democracia, dizendo que a democracia era o futuro da América Latina etc. Henfil, com a sua genialidade, fez uma charge que, por si só, resumia aquilo que pensava: Figueiredo na tribuna, discursando na condição de Presidente do Brasil, sendo aplaudido por todo mundo; e, ao mesmo tempo, na bancada dos países, estava lá Figueiredo sentado, representando o Brasil e vaiando o discurso que era feito por ele próprio na tribuna da ONU.

Resguardadas as diferenças - quero deixar bastante claro que não estou fazendo comparação entre regimes - é uma situação muito semelhante. O Presidente da República que atua no Brasil, com certeza, vaiaria e criticaria o discurso do Presidente da República do Brasil que atua fora do País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2001 - Página 26966