Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE QUE ABALA A UNIVERSIDADE BRASILEIRA, EM PARTICULAR A UNIVERSIDADE DE RONDONIA.

Autor
Amir Lando (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Amir Francisco Lando
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA. ENSINO SUPERIOR.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE QUE ABALA A UNIVERSIDADE BRASILEIRA, EM PARTICULAR A UNIVERSIDADE DE RONDONIA.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2001 - Página 27029
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA. ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, CRISE, GREVE, UNIVERSIDADE FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO).
  • CRITICA, REDUÇÃO, PARTICIPAÇÃO, ESTADO, POLITICA SOCIAL, EDUCAÇÃO, QUESTIONAMENTO, FUTURO, UNIVERSIDADE FEDERAL, APREENSÃO, QUALIDADE, ENSINO.
  • ANALISE, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO, FALTA, CONDIÇÕES DE TRABALHO, PROFESSOR UNIVERSITARIO, AUSENCIA, DIGNIDADE, SALARIO, CARENCIA, INVESTIMENTO, ENSINO, REDUÇÃO, QUADRO DE PESSOAL.

O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a repercussão do meu discurso do último dia 25 de outubro inspira-me o retorno ao assunto da grave crise da universidade brasileira, em particular da Universidade de Rondônia. Tenho a convicção de que essa crise se insere em um contexto maior, do desmonte do Estado brasileiro, que inclui a privatização das estatais. Defendi, entretanto, que o esvaziamento das universidades é, ainda, mais contundente, para um projeto de país independente, que a alienação dos ativos das empresas estatais, porque aniquila o mais importante reduto do processo criativo que se coloca, verdadeiramente, a serviço da maioria da população.

A greve das universidades públicas federais permanece no impasse. É bem provável que, nas próximas horas, desatem-se os nós mais apertados desse desagradável imbróglio, que tanto tem afetado o ensino e a pesquisa no País. Enquanto o acordo não surge e se efetiva, cumpre aqui promovermos uma discussão sintética sobre as precárias e distorcidas condições em que os professores das universidades federais trabalham por todo o Brasil.

Em primeiro lugar, é bom que se esclareça de vez que, há muito, a sociedade brasileira tem consciência dos baixos salários que grassam em nossas universidades públicas. Mais da metade dos quase 70 mil professores das universidades federais ganha menos de três mil reais mensais. Segundo dados do próprio MEC sobre o perfil salarial nas universidades públicas, quase 15% dos docentes recebem salários inferiores a um terço deste montante. Aposentados à parte, essa parcela chega a quase 17%. Em uma divisão por faixas salariais de mil em mil reais, a fatia mais numerosa é a dos professores que ganham entre dois e três mil reais, compreendendo quase 25% do conjunto de professores.

Isso significa que, nem de longe, a declaração do Ministério da Educação sobre uma suposta eqüivalência do nível de remuneração entre o mercado e o Estado, para o setor de ensino universitário, pode ser levada a sério. Como se não bastassem as drásticas reduções orçamentárias no campo do investimento em pesquisa e ciência, bem como no campo da infra-estrutura em geral, o arrocho remuneratório imposto aos docentes se revela como um artifício ainda mais fulminante para liqüidar, de vez, as instituições públicas brasileiras de nível superior. 

O Estado brasileiro tem atravessado uma austera fase de enxugamento da máquina administrativa, sem que se tenha atentado para seus inegáveis efeitos deletérios. O programa de redução da participação estatal na sociedade, adotado pela política econômica do Governo nos últimos anos, produziu impactos devastadores em diversos setores tradicionalmente considerados da esfera exclusiva do Estado. Nesse contexto, a situação acirrou-se ainda mais se levarmos em consideração a distribuição desses impactos dentro do já distorcido e, deliberadamente frágil, sistema federativo brasileiro. Como já me referi no discurso anterior, os problemas brasileiros refletem-se com mais intensidade em determinadas regiões e Estados. 

Por exemplo, a Universidade Federal de Rondônia (UNIR), que foi fundada há quase vinte anos, que não suporta mais ser submetida a novos ciclos de arrocho financeiro. Operando em Porto Velho e em mais cinco outras cidades do Estado, a graduação da UNIR reúne, no total, mais de duzentos professores efetivos que se ocupam de quase 5 mil estudantes ingressados pelo vestibular somente nesse ano. Na capital, são oferecidos quatorze cursos, para os quais 207 docentes exercem o poder da cátedra.

Em números mais específicos, a UNIR possui 338 professores desempenhando funções permanentes e provisórias na instituição. São 27 doutores, 109 mestres, 108 especialistas e 94 graduados para quase 9 mil alunos matriculados em 2000, que estudam com o auxílio indispensável de 328 técnicos administrativos e acadêmicos. Ao lado disso, a biblioteca da universidade possui um acervo de quase 60 mil livros, além dos quase 2 mil periódicos que se prestam a atualizar os profissionais com o que de mais moderno tem sido produzido nas diversas áreas de ensino e pesquisa.

Do ponto de vista dos indicadores institucionais que medem o desempenho da UNIR, sobressaem-se pelo menos três itens que merecem ser comentados. O primeiro diz respeito ao aumento expressivo do percentual que afere a relação aluno por docente efetivo, que, em 1998, consistia em 16,7%, e que, em 2000 subiu para nada menos que 33,2%. O segundo refere-se ao igual aumento do percentual que mede a relação alunos por técnicos administrativos e acadêmicos, que, hoje, já alcança a casa dos 26%, em contraste visível com os 15,8% verificado em 98. Por fim, de 1998 a 2000, enquanto o número de professores com dedicação exclusiva permanecia inalterado, o número de mestres e doutores na instituição disparou, contabilizando um aumento na faixa dos 25%. 

Apesar de todo o hercúleo esforço em manter a UNIR de pé e em intenso movimento, não podemos nos furtar à lúgubre realidade que desponta no horizonte das universidades públicas. Nos últimos anos, nas Instituições Federais de Ensino, diversos pontos de trabalho foram desativados e múltiplos outros, de caráter permanente, convertidos em postos ocupados por pessoal terceirizado. Atualmente, mais de 20% dos cargos referentes ao domínio técnico-administrativo do sistema federal de ensino superior se encontram literalmente vagos.

Pior que isso é tomar conhecimento de que a folha de pagamentos referente à carreira técnica-administrativa simplesmente estagnou, com fortes tendências à redução. Isso se explica porque o quadro de pessoal vem sofrendo uma compressão maior que o eventual impacto do crescimento vegetativo da mesma, provocado pelas promoções por mérito, tempo de serviço e titulação, previstos no plano de cargos e salários da categoria.

Segundo dados publicados recentemente na imprensa, o percentual relativo à redução do poder de compra dos pisos salariais da categoria, entre maio de 87 e maio de 2001, foi em torno de 90%. Tal compressão salarial se deve a dezenas de fatores, conjunturais e estruturais, que terminaram, ao longo desses anos, por dilapidar o Plano de Cargos dos técnico-administrativos.

No âmbito dos docentes, a análise mais séria não deixa dúvidas sobre igual processo de dilapidação dos salários. Com quase 500 mil matriculados, 49 mil professores e 85 mil funcionários, as Instituições Federais de Ensino Superior admitem cerca de 100 mil novos alunos anualmente. Isso implica, em termos de investimento, quase 700 milhões de reais que o Governo despende mensalmente para bancar o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural do País. Acontece que, embora colossais, tais números perdem poder de convencimento quando comparados com gastos governamentais relacionados à área de política financeira e monetária. Como é sabido, a ordem de gastos do Erário quando, por exemplo, o assunto é segurar a cotação “real” do dólar no mercado interno eleva-se, com freqüência, às camadas estratosféicas, sem que ninguém questione sua legitimidade, ou mesmo, sua legalidade.

Nesse contexto, e para concluir, espero que prevaleça o bom senso entre representantes do Governo, dos docentes e dos servidores, substancialmente nas negociações ora em curso no MEC. Todavia, mais que esperança, o Senado deve oferecer uma contribuição política efetiva, articulando um relacionamento menos tenso entre as partes, visando a obtenção de um resultado a contento para todos. Com isso, tenho a convicção de que a vocação legitimamente pública do ensino e da pesquisa ficará, de fato, resguardada de toda ameaça.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2001 - Página 27029