Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relatório de sua participação como observador parlamentar na Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas - ONU.

Autor
José Agripino (PFL - Partido da Frente Liberal/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Relatório de sua participação como observador parlamentar na Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas - ONU.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 06/11/2001 - Página 27574
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • RELATORIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, REPRESENTANTE, SENADO, ASSEMBLEIA GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DEBATE, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, COMBATE, PREVENÇÃO, TERRORISMO, AUXILIO, FINANCIAMENTO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, PAIS SUBDESENVOLVIDO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, designado pela Presidência desta Casa para acompanhar, como observador parlamentar, os trabalhos da Assembléia-Geral da ONU, ano 2001, e já de retorno dessa missão, ocupo a tribuna, nesta tarde, para apresentar relatório sucinto dos assuntos mais importantes que estão em discussão naquele órgão, apresentar minha observação pessoal sobre os fatos que lá vi e dar conhecimento à Casa das preocupações que, neste momento, norteiam os debates na Assembléia.

            Inicialmente, digo às Srªs e Srs. Senadores que, quando cheguei à Nova Iorque, cidade que visitei por tantas vezes, esperava um esquema de grande dificuldade para desembaraço de bagagem, migração, alfândega. Esperava encontrar uma cidade impactada, mas, a bem da verdade, devo dizer que nunca foi tão fácil entrar e sair de Nova Iorque como desta vez, em que estive para, como observador parlamentar, participar da Assembléia-Geral da ONU.

            Diria mais: a cidade está assustada -- em pânico, não; assustada, sim. Ela desenvolve atividade normal, com movimento nas ruas, bares, restaurantes e lugares de lazer. A Assembléia-Geral está concorrida como sempre, todos os países estavam presentes, houve discussões profícuas e participativas. A ONU está, portanto, cumprindo seu dever e a cidade de Nova Iorque, mesmo impactada e assustada, não está em pânico.

            Com essa observação - que é um comentário a latere -, diria que na Assembléia-Geral da ONU muitos assuntos estão em discussão, mas dois lideram os debates nas diversas comissões e subcomissões: o terrorismo e o financiamento para o desenvolvimento - que julgo ser correlato -, fato que abordarei logo após tecer comentários sobre o que está sendo feito na ONU acerca do combate ao terrorismo.

            No que diz respeito ao terrorismo, a Assembléia-Geral deste ano foi inaugurada com um discurso do Secretário-Geral do órgão, o Sr. Kofi Annan, abordando a questão do terrorismo, mas não de forma inédita, pois há anos debate-se na ONU a questão do terrorismo. O Secretário-Geral da ONU fez questão de abrir a Assembléia-Geral, abordando, em longo discurso, a questão do terrorismo e suas circunstâncias. Logo após o discurso do Sr. Kofi Annan, 177, dos 189 países integrantes da ONU, se manifestaram sobre o mesmo tema ao longo das reuniões plenárias da Assembléia-Geral. Isso dá uma dimensão de como o assunto está motivando as atenções do mundo inteiro.

            É preciso que se diga que na ONU a questão do terrorismo já há muito tempo é debatida e discutida, mas não com a ênfase que se dá no momento atual ao tema.

            Ao longo de muito anos, a questão do terrorismo produziu, na Assembléia-Geral da ONU, diversos acordos ou convenções setoriais, que foram objeto ou produto de consensos, acordos, tratados, fatos que transitaram em julgado e que se encontram sob a forma de resoluções consensuais da ONU, tais como: tratamento dado a atentados a bomba, seqüestro de aeronaves e coisas correlatas.

            O que a Assembléia-Geral está, neste momento, recomendando é que os 189 países membros cuidem de adequar as suas legislações locais às convenções setoriais já aprovadas.

            O que aconteceu com o Brasil recentemente, quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso, em recente decreto do dia 18 de outubro, já incorporou a recomendação da ONU, colocando, através de decreto, em vigência uma série de recomendações que dão tratamento à questão do terrorismo na legislação interna da República Federativa do Brasil.

            O que a Assembléia-Geral está, portanto, neste momento, recomendando aos países membros é que se transformem em leis de cada país as convenções setoriais já aprovadas por consenso nas Assembléias-Gerais da ONU de anos anteriores.

            Um fato que está em discussão febril é o conceito do que é terrorismo. Porque é preciso que se entenda que existem dois lados da moeda. O Afeganistão e o Iraque têm assento na ONU. A Palestina, Israel, todos os países têm assento na ONU. E vai-se discutir uma legislação que pode atingir um ou outro país.

            Na medida em que isso possa acontecer, é profunda a discussão sobre o conceito real do que é terrorismo. Se é terrorismo o que possa ser interpretado como luta de libertação nacional, ou luta por autodeterminação de povos? É ato terrorismo apenas ato ou fato praticado por Estado, ou é terrorismo ato ou fato praticado por uma instituição ou organismo? Aí se relembram os contras. A própria CIA, é acusada de ações que poderiam ser julgadas como terroristas, que poderiam ser interpretadas como terroristas por algumas vozes, em movimentos no Panamá, na Nicarágua, no Irã.

            Essa é a discussão que vai tomar e está tomando bom tempo da Assembléia-Geral da ONU, mas ela tem que ser profunda e precisa chegar a uma conclusão para que não se pratiquem injustiças e o combate ao terrorismo possa ser levado a efeito com eficiência.

            A Assembléia-Geral da ONU está, portanto, discutindo o que é terrorismo e recomendando que os países membros transformem em legislação doméstica aquilo que já foi transformado, na Assembléia-Geral, por consenso, em convenção setorial.

            O segundo fórum, que eu diria é o mais atual, o mais atuante, o mais dedicado, é o Conselho de Segurança; e é preciso que esta Casa reconheça que é mandatório. O que o Conselho de Segurança, composto por 15 países membros, delibera, tem que ser aceito por 187 países membros da ONU. Portanto, esse Conselho dispõe de um poder muito forte. Neste momento, está discutindo pragmaticamente, porque já editou duas resoluções no curto espaço de tempo em que a Assembléia Geral da ONU está desenvolvendo os seus trabalhos, a partir de setembro deste ano. Uma delas é a Resolução nº 1.368 que recomenda a necessidade de levar culpados, acusados de terrorismo, à Justiça, recomenda a necessidade de que sejam punidos os que abrigam ou apóiam células ou núcleos terroristas e reafirma condenação ao terrorismo internacional.

            Mais recentemente, foi editada a Resolução nº1.373, adotada - diga-se de passagem - por consenso, por unanimidade dos 15 Estados membros, e é mais pragmática e prospectiva; trata o assunto do terrorismo de forma mais abrangente.

            O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN) - Com muito prazer, nobre Senador Bernardo Cabral.

            O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador José Agripino, o relato de V. Exª não deve causar nenhuma admiração aos seus colegas - e posso dar o meu testemunho, porque ambos já estivemos certa feita na Assembléia Geral da ONU -, sobretudo quando aborda o terrorismo e se reporta à legislação doméstica. Observe como o nosso Constituinte foi sábio ao ter, no art. 5º, inciso XLIII, declarado, com todas as letras, que o terrorismo é crime inafiançável e insusceptível de graça ou anistia. Agora mesmo V. Exª citou o trabalho da administração do Presidente Fernando Henrique Cardoso e outras que vão desenvolver-se. A minha interrupção ao seu discurso é apenas para apresentar-lhe a minha solidariedade. O terrorismo, de fato, é um crime que não tem pátria, nem bandeira, nem rosto, mas traduz seu significado exato: inquietação mundial. Meus cumprimentos, Senador José Agripino.

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN) - Agradeço a V. Exª pela contribuição dada no seu aparte, colocando, com muita propriedade, que o terrorismo está produzindo, fundamentalmente, a inquietação. Não diria que a Nação americana esteja apavorada, mas está inquieta, o que acarreta desarranjos de toda natureza: social, econômica e até política. Por isso, a Assembléia Geral e o Conselho de Segurança da ONU estão debatendo, febrilmente, este assunto, a fim de que se possa estabelecer balizamento legal, para que os países do mundo possam exercer uma ação no combate eficaz ao terrorismo e voltar à paz mundial. Em última análise, é isso que se objetiva.

            Retomando o que eu falava, Senador Bernardo Cabral, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Resolução nº 1.373, que - repito - foi adotada por consenso, trata mais pragmaticamente do combate ao financiamento do terrorismo, que é a questão basilar, o calcanhar de Aquiles, e, de forma muito objetiva, trata do reforço da cooperação entre Estados para esse fim, para o combate ao terrorismo.

            Foi criado o chamado “Comitê Antiterrorismo”, curiosamente, composto pelos 15 membros titulares do Comitê ou do Conselho de Segurança, e, sob a Presidência do Embaixador da Inglaterra, Sir Jeremy, vem se reunindo quase diariamente para produzir uma legislação específica sobre o combate ao terrorismo, baseada em sete pontos principais.

            Devo esclarecer que esses sete pontos em discussão - eu os registrarei para o conhecimento do Senado Federal do Brasil - têm de ser objeto de consenso até o dia 27 de dezembro deste ano, quando se deverá produzir um documento final sobre eles, que irão se constituir na bíblia internacional de combate ao terrorismo. Vou expô-los.

            O primeiro deles é sobre a legislação bancária com vistas ao combate ao terrorismo. O que significaria isso? Significa uma legislação bancária que evite ou preveja a lavagem de dinheiro, ou seja, matar a iniciativa terrorista no seu nascedouro, na sua fonte ou no seu suporte logístico.

            A segunda trata de legislação de migração e de sua prática. À medida em que se seja mais diligente na questão da imigração, começa-se a dificultar a ação do terrorismo.

            Uma legislação de alfândega voltada para o combate ao terrorismo.

            Uma legislação de extradição que favoreça a relação entre países para melhor combater ações de terrorismo, pela prática mais fácil da extradição de terroristas claramente culpados e condenados.

            Ação de polícia e de agentes aplicadores da lei.

            Apoio à legislação antiterrorismo para países sem experiência no assunto. Aí, está se cuidando da contratação de peritos ou de experts para que países de menor expressão, países pobres - que, até pelo fato de serem pobres, podem ser amparo de células terroristas, por não disporem de estrutura institucional para se equiparem e se prepararem a fim de combater o terrorismo - tenham os instrumentos legais, institucionais e logísticos a fim de que, por meio desses peritos e experts colocados à disposição pela ONU, possam também contribuir para o combate ao terrorismo.

            Repito que toda essa ação de legislação precisará estar consolidada até o dia 27 de dezembro. Essa é a tarefa do Comitê Antiterrorismo do Conselho de Segurança da ONU que, neste momento, está reunido para produzir esse documento que reputo de fundamental importância para o objetivo final de combate ao terrorismo.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN) - Com prazer, Senador Pedro Simon.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Senador José Agripino, considero da mais alta importância o pronunciamento que está sendo feito por V. Exª, principalmente por se tratar da ONU. E é tremendamente importante que ela se dê conta de que é responsável por essa questão. Sou daqueles que pensam que o Prêmio Nobel foi entregue à ONU este ano não pelo que ela fez - cá entre nós, pelo que ela fez no ano anterior, ela não merecia -, mas pelo que ela deverá fazer. Aliás, a imprensa comentou desta forma: de que foi um chamativo à ONU para que ela percebesse a sua importância quanto à questão dos Direitos Humanos e na questão da sociedade mundial. Vejo aqui uma manchete da maior importância do jornal Folha de S.Paulo: “Anistia vê ameaça a direitos humanos. Há um perigo de que o mundo tenha mudado para pior”, diz a Secretária-Geral da ONG Anistia Internacional, Irene Khan. Vejo nesse debate uma preocupação muito grande, porque, repare V. Exª, que o conceito de jurídico e de ilegal varia muito de acordo com as circunstâncias. Os americanos tiveram fábrica de terrorismo na América Latina. Eles preparavam pessoas para a luta no Brasil, no Chile, no Paraguai, na Argentina. Hoje isso está provado; e há coisas dramáticas como ensinar os policiais a cobrarem confissão mediante tortura. Isso aconteceu no Brasil e em vários lugares. Perguntou-se: onde eles aprenderam uma barbárie como essa? Foi nas escolas que os americanos preparam para a América Latina, para garantir as ditaduras militares aqui. Não era para restabelecer a democracia ou coisa que o valha. Não. Era para manter as ditaduras, ou para derrubar regimes democráticos e instalar a ditadura, como aconteceu no Chile. Esse conceito é muito delicado, porque, geralmente, vale o pensamento do vitorioso. V. Exª fala sobre o assunto com brilhantismo e eu apenas espero dizer alguma coisa. Na verdade, estão divulgando na imprensa apenas a versão dos vencedores. Já disseram que, um dia, escreverão o total da Segunda Grande Guerra mundial, divulgando também a versão dos alemães e dos japoneses - até agora conhecemos apenas a versão dos vitoriosos. Em toda essa questão que estamos a debater, penso haver apenas um fato concreto: o que ocorreu em Nova Iorque e em Washington, fato sem precedentes nem tanto pelo alcance da barbárie, porque, cá entre nós, nunca vi nada semelhante ao que está ocorrendo no Afeganistão, pelo menos não me lembro. Lançaram algumas bombas em um ponto determinado do Iraque para ameaçar; bombardearam o Vietnã, onde morreram 60.000 soldados americanos numa guerra. Mas o que está ocorrendo numa região que não tem nada, dizem que não tem nem Governo, é bombardeio e mais bombardeio. Bombardeiam de um lado e lançam caixas de comida do outro. Bombardeiam postos da ONU que distribuem comida e lançam caixas de comida do outro lado. Nesse contexto geral, não sabemos o que está ocorrendo. Agora estão falando que a fronteira Brasil, Argentina, Paraguai há um foco muito delicado de terrorismo. Falam em desenvolver um esquema para a região de Foz do Iguaçu. Penso estar havendo histeria nesse sentido. O americano é assim; é deus. O cidadão americano para o mundo de hoje é muitas vezes superior aos romanos da época do Império Romano. Às vezes se fala em Império Romano, dizendo que os romanos mandavam. Não mandavam nem 10% do que mandam os americanos. Os americanos não precisam de tropa. Há a televisão, a cultura, a língua, o avanço tecnológico e tudo o mais. Para dominar um país, não precisam manter um soldado lá dentro. Esses países giram em torno dos Estados Unidos. Percebo, nesse contexto, a importância de uma voz sonora. Gostei daquilo que disse o Presidente Fernando Henrique em Paris sobre os Estados Unidos; aliás foi um belo discurso. Se eu for Presidente da República penso em convidá-lo para o Itamaraty, porque ele entende desse assunto e seria um excepcional Ministro das Relações Exteriores. O Presidente disse que, assim como devemos ver, combater e questionar o terrorismo, devemos também verificar as decisões unilaterais dos que se consideram os donos do poder: no caso, os americanos. Ele foi aplaudido de pé pelos franceses que pensam o mesmo. Está na hora de tentarmos fazer algo. É preciso surgir uma voz com mais tranqüilidade, com mais serenidade. A Europa, de certa forma, está tentando agir dessa maneira. É muito importante, além de batermos palmas para os americanos pelos atos de defesa de seu País, combatermos radicalmente o terrorismo - eu combato de todas as formas o terrorismo, que considero uma brutalidade, uma monstruosidade. Entretanto, vamos devagar com o andor. Meus cumprimentos a V. Exª pelo seu pronunciamento. Desculpe-me. Espero não ter atrapalhado o seu pronunciamento com o meu aparte meio atabalhoado.

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN) - O pronunciamento de V. Exª nunca atrapalha, apenas contribui, até pelas luzes da sua inteligência e do seu preparo. V. Exª, que não estava presente no começo do meu discurso, captou um fato que eu já havia exposto e que cabe como uma luva em seu raciocínio: como a ONU está sendo importante neste momento no contexto do mundo, que deseja paz!

            Fui todos os dias à ONU durante o período em que estive em Nova Iorque, designado pelo Senado para desempenhar as funções de observador parlamentar. Ora estava na comissão ora no plenário. Em nenhuma oportunidade, no plenário ou em comissão qualquer, vi o representante do Afeganistão ocupando o seu assento. No entanto, as questões mais febrilmente discutidas eram as relativas ao conceito de terrorismo. Talvez os afegãos fossem os mais interessados em defender essa concepção, alegando que aquilo não seria terrorismo, mas uma luta de sobrevivência nacional, de autodeterminação ou mesmo religiosa - talvez até uma ação de Estado. Sem a presença dos afegãos no debate, o tema que presidia as discussões, mais do que as recomendações, era o conceito de terrorismo.

            O mundo tem consciência - até porque a imprensa é livre - do que aconteceu no Panamá com o Sr. Manoel Antonio Noriega, que, segundo dizem atualmente, foi treinado e subsidiado pela CIA, tendo terminado Presidente de um país acusado de narcotráfico e de toda sorte de desmando. Os Irã-Contras também são outro fato. Palestinos versus Israel é outro fato passível de reflexão. Tudo isso está sendo discutido em pé de igualdade, onde a voz de cada país é levada, no ponto democrático, por igual, para que se considere a legislação antiterrorismo, considerando-se todos os pontos do contexto e não apenas a prevalência do mais forte, que é o agredido do mundo, o país de que todos gostamos, cujas Twins Towers foram destruídas, sede do seu Ministério do Exército atingido, a dignidade e a honra nacional atingidas.

            Mas não, a ONU está, de forma democrática e autônoma, discutindo o problema por inteiro. Ainda bem que a ONU existe. As considerações que V. Exª tece a respeito, Senador Pedro Simon, vão ao encontro do segundo ponto, que, no meu julgamento é tão importante quanto o primeiro, em discussão hoje na ONU: o financiamento para o desenvolvimento.

            Onde estão as células do movimento terrorista do Sr. Osama Bin Laden? Nos países mais pobres do mundo, em alguns países da África, como o Sudão, Somália. Dizem que estão também no Iraque, até escondidas em alguns países da Europa, mas fundamentalmente elas se enclausuram onde a pobreza existe, porque lá, elas podem comprar a proteção com pão, que aqueles que o acolhem não têm como comprar, numa injustiça profunda e que tem que ser objeto da atenção dos ricos do mundo antes que seja tarde.

            Daí a discussão que se processa atualmente na ONU e que deveria ter ocorrido há mais tempo. Que ocorreu sim, é verdade, na Assembléia do Milênio no ano 2000, quando, por consenso, os 187 países deliberaram que até o ano 2015 dever-se-ia providenciar 50% de erradicação da pobreza do mundo. Mas nenhuma providência efetiva foi tomada. Agora, urge, até porque a questão do terrorismo está, em minha visão, umbilicalmente ligada à pobreza mundial.

            A ONU está tomando a iniciativa, é verdade, que depois das crises do México, da Rússia, do Brasil, da Argentina, da Ásia, porque reconhece que organismos tipo a OMC - Organização Mundial do Comércio -, FMI, Banco Mundial, ou Banco Interamericano de Desenvolvimento são organismos ou entidades que têm cuidado da pobreza, mas de forma tópica. Essas organizações têm agido na questão comercial de prejudicados, na questão de rolagem de dívida de países endividados, mas nesses organismos o peso dos países mais fortes é muito maior do que o dos países que deles precisam. O debate, portanto neles não é democrático. Na ONU o debate é democrático e se pode encontrar caminhos de combate à pobreza.

            Graças a Deus, nos debates deste ano a questão do financiamento do desenvolvimento está ocupando lugar de destaque.

            O SR. PRESIDENTE (Ramez Tebet) - Senador José Agripino, o Plenário, com justa razão, está ouvindo atentamente o seu pronunciamento, dada a sua importância. Mas queremos dizer que V. Exª já está com dez minutos de seu tempo ultrapassado. A Mesa pede que V. Exª conclua.

            O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL - RN) - Agradeço a V. Exª a condescendência e prometo ser breve na minha conclusão.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, neste momento, o que existe em discussão na ONU para que se elabore um plano de financiamento para o desenvolvimento? Existe um comitê preparatório que reuniu uma série de propostas densas, boas, elaboradas por países em desenvolvimento. Esse comitê, ao qual estive presente várias vezes, presidido pelo representante da Suécia e secretariado pelo representante do Paquistão, ou seja, uma nação desenvolvida e outra em desenvolvimento, está debatendo diversas propostas que tratam de seis temas diferentes. Passo a abordar tais temas rapidamente:

            1) mobilização de recursos para o desenvolvimento. É a pedra de toque. O que se pensa? E o que está em discussão? Duas propostas: a instituição da tolbin tax e a instituição da carbon tax. O que é a tolbin tax, que Fernando Henrique Cardoso, aqui mencionado pelo Senador Pedro Simon, defende? A tolbin tax é uma taxa que se aplicaria às operações financeiras feitas entre os países mais ricos. O Presidente Fernando Henrique propõe que seja aplicada sobre os dez mais ricos países. Cada operação financeira feita por cada um desses dez países pagaria uma taxa que seria recolhida a um fundo para investimento dos países pobres. A segunda, a carbon tax, seria paga pelos países poluidores. Uma ou outra, ou as duas, comporiam um fundo de recursos expressivos a serem aplicados no combate à pobreza em diversos países que detêm parcela de sua população em regime de pobreza absoluta;

            2) um programa de investimentos diretos, verificando quais as oportunidades eficazes, efetivas, competitivas e de investimento para ser aplicado na relação de emprego e renda para países pobres;

            3) a relação do comércio internacional. E aí cabe uma questão muito brasileira, a dos subsídios à agricultura. As exportações brasileiras são prejudicadas pelos subsídios que a Europa e os Estados Unidos concedem à sua agricultura, impedindo que nós, que somos competitivos na área, vendamos o produto de nosso trabalho e conquistemos os dólares de que precisamos para construir o futuro do País. É, portanto, tema importante, ao lado de investimentos diretos, o comércio internacional.

            4) a ajuda oficial ao desenvolvimento. Alguns países já o fazem, como a Suécia, que reserva 0,7% de seu PIB para aplicação em empreendimentos ou investimentos em países pobres, numa atitude ainda pouco eficaz. Pois os países que aplicam dinheiro em países pobres obrigam, em regime de financiamento, a que a compra de equipamentos ou serviços seja feita de empresas ou de empresários do país que concede a ajuda;

            5) tratamento da dívida externa, e, finalmente, as questões institucionais, que dariam melhor posição aos países menos desenvolvidos em organismos como o FMI, como o Bird, etc., uma rediscussão, um rearranjo da posição dos países nesses órgãos internacionais de modo a possibilitar uma voz mais atuante de países que precisam desses órgãos que podem ajudar.

            Essa discussão terá que ter conseqüência pragmática até março de 2002, porque, nessa data, na cidade do México, estará se realizando uma reunião para aprovação do texto final das proposições da ONU que, democraticamente, terão sido debatidas, discutidas e produzidas para que seja a bíblia do mundo coordenada pela ONU para investimentos e para a correção de pobreza nos países pobres, e para que os ricos possam, com o seu potencial, ajudar a equilibrar o mundo, para que pobreza de menos signifique antro de menos para o terrorismo internacional.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, era o relato que eu tinha a fazer da minha participação, designado que fui observador parlamentar representando o Senado da República na Assembléia Geral da ONU do ano de 2001.

            Muito obrigado.


            Modelo15/2/2412:40



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/11/2001 - Página 27574