Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre o pronunciamento do Senador Roberto Requião, no que diz respeito à vulnerabilidade do processo eleitoral eletrônico no País.

Autor
Carlos Patrocínio (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Considerações sobre o pronunciamento do Senador Roberto Requião, no que diz respeito à vulnerabilidade do processo eleitoral eletrônico no País.
Publicação
Publicação no DSF de 06/11/2001 - Página 27579
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ROBERTO REQUIÃO, SENADOR, NECESSIDADE, SENADO, NEGOCIAÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), ALTERAÇÃO, SISTEMA ELEITORAL, IMPEDIMENTO, FRAUDE, ELEIÇÃO.
  • REPUDIO, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, FIDELIDADE PARTIDARIA, NECESSIDADE, ESTUDO, MOTIVO, AUMENTO, ALTERAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PREJUIZO, OPINIÃO PUBLICA, ETICA, POLITICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CARLOS PATROCÍNIO (Bloco/PTB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, reabre-se mais uma vez, no Senado Federal, a discussão em torno de uma reforma política que propicie melhores condições para o aperfeiçoamento das instituições democráticas em nosso País. É evidente a importância do assunto, aliás, objeto de várias proposições em tramitação nos órgãos técnicos desta Casa e da Câmara dos Deputados.

            A esse propósito, Sr. Presidente, há pouco, ouvimos a pregação do eminente Senador Roberto Requião no que diz respeito à violabilidade do processo eleitoral eletrônico em nosso País. O Senado Federal e o Congresso Nacional têm que esgotar, junto ao órgão competente, ao Tribunal Superior Eleitoral, as negociações para que efetivamente se possam introduzir modificações para que não haja fraudes nas próximas eleições. Evidentemente que a questão tão falada da anualidade não pode estar implícita.

            De imediato, ganha dimensões o debate sobre o polêmico tema da fidelidade partidária, tão necessária ao funcionamento e à boa reputação dos partidos. A troca de legendas constitui lastimável espetáculo entre nós, a ponto de quase ter-se tornado tradição. Compreensível, assim, que a opinião pública revele especial interesse pelo problema, que tanto contribui para o enfraquecimento dos partidos.

            Expresso, desta tribuna, minha concordância com o propósito de melhorar nossa legislação política, mas confesso minha perplexidade em face da ênfase com que tantos clamam pela imediata imposição, por meio de lei, da fidelidade partidária. À perplexidade se soma o temor, uma vez que o País encontra-se envolto em crises sucessivas, o que nos deve impor maiores cautelas para que o debate ocorra com prudente serenidade.

            Igual perplexidade senti em pronunciamento feito nesta Casa pelo eminente Senador Artur da Távola, cuja autoridade na matéria é acrescida por décadas de intensa militância na imprensa carioca. Se o problema tivesse a simplicidade que muitos lhe atribuem, bastaria que retornássemos ao tempo da Arena e do MDB, agremiações cuja desmoralização nacional resultou, em grande parte, da imposição da fidelidade partidária - disposição característica dos regimes totalitários. Nada nos espanta, Sr. Presidente, que o regime militar tenha sucumbido, entre tantas outras, à tentação da fidelidade obrigatória, fator que apressou sua extinção após cair em descrédito. Os que se derem ao trabalho de ler os jornais da época constatarão que parlamentares que muito louvaram a fidelidade adiante a combateram com extremo vigor, como os então Deputados Paulo Maluf, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães.

            Essa conduta contraditória constitui, pode-se dizer, uma fatalidade decorrente de disposições legais de conseqüências antidemocráticas. Acredito poder expressar o sentimento que comungamos: o anseio de fidelidade partidária simultâneo ao temor de que o busquemos por vias impróprias e, assim, mais danosas à democracia.

            A fidelidade partidária, imposta aos Partidos pelo regime militar, veio a ser unanimemente estigmatizada como inconstitucional por todos os nossos juristas, com entusiástico apoio da mídia. Inconstitucionalidade proclamada em Constituição de inspiração que pouco possuía de democrática! Este, um convite à reflexão!

            Sr. Presidente, sobreponho o bom-senso à erudição, tão do gosto de muitos, em rápida lembrança desse passado ainda tão próximo. No Jornal do Brasil, de 8 de outubro de 1978, o ex-Governador, ex-Deputado e saudoso jornalista Barbosa Lima Sobrinho publicava artigo intitulado: “Mandato Imperativo e Fidelidade Partidária”, admirável retrospecto da evolução da democracia, a partir da Revolução Francesa, e do decorrer da nossa própria história, demonstrando que os Deputados são representantes do povo e não de Partidos. A Câmara dos Deputados é constituída de representantes do povo brasileiro, como nós o somos dos Estados - perdoe-me o uso desse lugar-comum, Sr. Presidente.

            E o articulista prossegue dizendo que “a perda do mandato é uma decorrência da ênfase que se procura atribuir à disciplina, num regime que não procura dissimular as suas origens militares”. Acrescentando que a sanção então cabível “seria a exclusão do Partido, nunca a perda do mandato, que foi conferido pelo povo, e não pelos Partidos, meros coordenadores do processo eleitoral”. Repele a argumentação dos que buscam apoio externo, sobretudo nos Estados Unidos e Inglaterra, mostrando o despropósito em que incorrem. E conclui, com copioso apoio de tratadistas, nacionais ou não: “A fidelidade é uma regra interna dos Partidos políticos, nunca uma obrigação que limite a liberdade dos mandatos”. E enfatiza: “O mandato imperativo repugna ao Direito Público universal e também ao Direito Público brasileiro, através da tradição de todas as Constituições políticas que até hoje vigoraram no país”.

            Em periódico patrocinado pela Fundação Milton Campos, da então Arena, um artigo de David Gueiros Vieira abordava, naquela época, questões diversas relacionadas com Partidos políticos e fidelidade, à luz das tradições inglesas e americanas, mostrando, a despeito das diferenças, concordância e apoio às afirmativas feitas no já mencionado texto de Barbosa Lima Sobrinho. Aconselha, Sr. Presidente, o máximo cuidado aos que procuram, no exterior, fundamento para decisões que não encontram amparo em nossas próprias e ricas tradições políticas e jurídicas.

            Permita-me, Sr. Presidente, insistir na lembrança de que, mesmo ainda em plena vigência do regime militar, a fidelidade partidária então estabelecida foi declarada inconstitucional pela unanimidade de nossos juristas e mestres de Direito.

            Sr. Presidente, prefiro a expressão “lealdade partidária” à usual “fidelidade”. O ponto de partida para a melhoria da situação brasileira está na elaboração de lei que determine a nossas agremiações serem realmente éticas e democráticas. Hão de ser constituídas a partir da base sociopolítica, isto é, dos Municípios, passando pelos Estados para, afinal, alcançar a União. Todos os órgãos partidários deverão ter a mesma transparência democrática, fruto de livres decisões de homens livres. Sua direção deverá ser renovada a prazos curtos, pelos mesmos processos decisórios, sempre democráticos.

            A lei há de dispor para que a liberdade esteja sempre presente nos Partidos, impedindo desvirtuamentos que tornem as agremiações propriedade de minorias. E, aqui, há muito a se acautelar no tocante às Comissões Executivas, passíveis de fácil manejo, que podem ser transformadas em instrumentos de poder de pequenos grupos, com menosprezo à ética, sem a qual não há nobreza na política.

            Finalmente, Sr. Presidente, a infidelidade só poderá ocorrer após decisão democrática legitimamente adotada pelos órgãos adequados do Partido. A desobediência à determinação partidária, que jamais poderá implicar questão de consciência, poderá sofrer ampla variedade de punições, desde a perda de postos, cargos de natureza partidária e participação de eventos em viagem à expulsão dos quadros partidários, preservando-se a integridade do mandato conferido pelos eleitores.

            Não poderia calar o receio de que o combate à infidelidade partidária, que hoje atinge nossas agremiações, resulte dano maior para a democracia, como tantas vezes, infelizmente, tem ocorrido no Brasil. Vê-se, Sr. Presidente, a deploração, sem comentários, sem aprofundar com a questão, sobre a troca desmesurada de Partido nas diversas Casas Legislativas e Executivas em nosso País. É necessário que se aprofunde um estudo que procure as causas mais comuns da mudança de partido. Muitas vezes um político troca de partido não por uma questão pessoal ou porque tirará vantagem, mas porque, inexoravelmente, se ele almejar um futuro político, será obrigado a mudar de Partido, como temos visto também aqui no Senado Federal.

            Ao concluir, Sr. Presidente, reafirmo minha preocupação com a freqüência de certos atos, como a troca rotineira de Partidos, condenando à desmoralização pública o que é essencial à sobrevivência democrática.

            A correção há de ser alcançada no exercício da democracia, dentro dos próprios Partidos, em suas Bancadas, e finalmente em um relacionamento com os demais Poderes, especialmente o Poder Executivo, no qual podem se originar muitos dos males que hoje nos atingem, de tão fácil contaminação.

            Desse relacionamento entre os Poderes depende, de maneira substancial, o respeito à ética, sem a qual a política se corrompe e se desqualifica perante a Nação.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            


            Modelo112/26/2411:10



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/11/2001 - Página 27579