Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração ao "Dia do Aviador"

Autor
Emília Fernandes (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Comemoração ao "Dia do Aviador"
Publicação
Publicação no DSF de 14/11/2001 - Página 28422
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, AVIADOR, ELOGIO, TRABALHADOR, TRANSPORTE AEREO.
  • HOMENAGEM, MULHER, ATUAÇÃO, AERONAUTICA, ESPECIFICAÇÃO, ANESIA PINHEIRO MACHADO, PILOTO CIVIL.
  • COMENTARIO, TRATADO, ASSINATURA, BRASIL, LIBERALISMO, AVIAÇÃO, EFEITO, ABERTURA, MERCADO, APREENSÃO, CRIAÇÃO, MONOPOLIO.
  • ANALISE, DIFICULDADE, SITUAÇÃO FINANCEIRA, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, BRASIL, SUPERIORIDADE, TRIBUTAÇÃO, APREENSÃO, DESEMPREGO, SETOR, CONCORRENCIA DESLEAL, SUBSIDIOS, EMPRESA ESTRANGEIRA.
  • LEITURA, MANIFESTO, SINDICATO, AEROVIARIO, DEFESA, TRANSPORTE AEREO, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores; Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro Carlos de Almeida Baptista; Chefe do Estado Maior da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro Henrique Marine e Souza; Sr. Ministro, Srs. Oficiais, Srªs e Srs. convidados, nesta sessão especial, dedicada ao Dia do Aviador, nacionalmente comemorado no dia 23 de outubro, não poderia deixar de me congratular com toda a categoria de trabalhadores, civis e militares, da aviação brasileira, pela excelência dos serviços prestados ao País. Mais do que aeronaves e seus mecanismos de segurança e conforto, são os pilotos, engenheiros de vôo e comissários que, de fato, garantem aos usuários dessa modalidade de serviço um ambiente de tranqüilidade e segurança diante do desafio do transporte aéreo.

            O Senador Romeu Tuma registrou, com muita propriedade, o pioneirismo de Santos Dumont, no início do século XX, e sua importância para o desenvolvimento e aproximação dos povos. Fez, também, justa homenagem à Aeronáutica brasileira, ressaltando a bravura dos nossos pilotos militares, inclusive deixando transparecer seus sentimentos.

            Associo-me ao reconhecimento e às considerações feitas por S. Exª.

            Sr. Presidente, também gostaria de ressaltar algumas inquietações que me afligem neste exato momento. O cenário de guerra que hoje se delineia no horizonte não esconde a direta repercussão no agravamento das esferas política e econômica das relações mundiais. Não casualmente, o trágico episódio do dia 11 de setembro último, envolvendo as quatro aeronaves norte-americanas civis, juntamente com mais um grave acidente ocorrido ontem, instaurou um pânico generalizado no setor aeronáutico, comprometendo a segurança física e econômica dos aeronautas.

            É indispensável que as autoridades competentes e os mercados resgatem, a curto prazo, um ambiente de normalidade social, capaz de neutralizar a neurose que, atualmente, assola principalmente os cidadãos do Hemisfério Norte, com relação às viagens aéreas e serviços prestados nos aeroportos.

            A promessa de um sistema de segurança mais eficaz contra as artimanhas do terrorismo deve ser concretamente cumprida para que se demonstre o zelo sincero com as vidas humanas, quiçá retomando uma atmosfera de segurança e tranqüilidade como a que reinava nos ares do mundo há bem pouco tempo.

            Colho a oportunidade desta comemoração não somente para saudar toda a categoria, mas também para realçar a especial atenção devida às mulheres aeronautas, cuja importância cresce paulatinamente na aviação comercial brasileira.

            Senhoras e senhores, quero deixar expresso aqui meu sentimento de orgulho e gratidão à primeira aviadora do Brasil, Anésia Pinheiro Machado.

            Paulista, aos dezesseis anos de idade, no início do século passado, desafiando toda a carga de preconceitos contra a mulher - muito mais intensa naquela época, mas não totalmente apagada nesta -, decidiu ela inscrever-se na Escola de Aviação de São Paulo. No ano seguinte, realizou o primeiro vôo solo no Brasil, marcando sua condição, meses depois, de primeira aviadora a conduzir passageiros nos céus do Brasil.

            Em 1922, em meio às comemorações do Centenário da Independência, Anésia desafiou o que parecia impossível, pilotando, de São Paulo ao Rio de Janeiro, um Caudron G-3, avião de fabricação francesa. Dessa forma, tornou-se a primeira aviadora brasileira a realizar um vôo interestadual, num momento histórico em que a mulher sequer tinha o direito ao voto. Morreu há bem pouco tempo, aos 95 anos, no Rio de Janeiro, carregando em sua biografia o pioneirismo de ter sido a primeira mulher não somente a fazer vôo acrobático mas também a realizar vôo transcontinental ligando as três Américas, pela costa do Pacífico. Mais que isso, foi a primeira mulher a conduzir um monomotor pelo Passo do Aconcágua, nos Andes.

            Admiradores de Anésia costumam lembrar que a moça de Itapetininga chegou a ser especialmente convidada pelo Governo dos Estados Unidos, em abril de 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, a freqüentar um curso avançado de aviação, no qual recebeu as licenças de piloto comercial, instrutor de vôo e instrutor de vôo por instrumento. Nos cursos, obteve as mais altas classificações, tanto na parte prática de vôo quanto nos exames escritos.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cumpre, por outro lado, recordar que o Dia do Aviador serve, em larga medida, para refletirmos, por exemplo, sobre a assinatura do Tratado Sobre Céus Abertos, que completou nove anos no último mês de março. Trata-se de um documento que pretende promover a abertura e a transparência nas atividades militares por meio de sobrevôos, recíprocos e desarmados, de observação.

            Criado para fortalecer a segurança da navegação aérea, o tratado confere a cada país signatário o direito de colher informações sobre as forças armadas e atividades dos que firmaram o tratado.

            Foi ratificado por vinte países, que devem apresentar seus pedidos de sobrevôo para cada ano vindouro a todos os outros signatários e à Comissão Consultiva dos Céus Abertos - organização estabelecida pelo tratado para facilitar sua implementação. Os Estados Unidos vieram a assiná-lo em novembro de 1993.

            Inspirada nesse movimento de liberdade no ar, a indústria de aviação civil está se organizando rapidamente em mercados regionais integrados. Não por acaso, paralelamente ao desenvolvimento do Nafta, estão sendo assinados acordos de “céus abertos” entre os Estados Unidos, Canadá e um crescente número de países da América Latina e Caribe.

            Tal integração regional e a expansão da indústria estão ocorrendo dentro de um cenário, na nossa avaliação, de desregulamentação e liberalização. A liberalização tem sido internacionalizada gradualmente, mediante acordos de “céus abertos” entre países da região, política energicamente promovida pelo Departamento de Transportes dos Estados Unidos.

            Embora a política dos “céus abertos” potencialmente possa abrir novos mercados, estimula, simultaneamente, a criação de novos monopólios.

            As enormes disparidades existentes entre as companhias aéreas em relação ao tamanho da frota, por exemplo, põem em perigo a própria existência das companhias nacionais de vários países, ameaçando reduzi-las, na melhor das hipóteses, a companhias aéreas de ligação, servas das grandes companhias aéreas.

            Alguns governos, principalmente na América Latina, aceitaram, sem maiores considerações, um papel subalterno em um sistema aéreo cada vez mais dominado por megacompanhias globais.

            O caso brasileiro é emblemático. Com novas companhias nacionais operando internamente, a competitividade no setor tem resultado em favorecimento momentâneo da clientela, convivendo com a desestabilização das companhias antigas.

            Bilhetes mais baratos exigem uma reestruturação interna radical, o que resulta em cortes nos custos, nos investimentos de formação e preparo de pessoal técnico e, também, em demissões e redução no número de linhas servidas.

            Diversas empresas brasileiras vivem momentos preocupantes: a Varig, Viação Aérea Riograndense, empresa gaúcha - por isso a cito como exemplo - com mais de setenta anos de operação no espaço aéreo brasileiro, atravessa, hoje, um processo de retração extrema ao passar por adequação forçada aos novos tempos do mercado global.

            Sem descuidar da importância da Transbrasil e demais empresas congêneres, a menção da Varig é obrigatória, vez tratar-se de ativo de uma fundação cujos beneficiários são seus trabalhadores e que se submete à zelosa cura dos Ministérios Públicos Estaduais.

            Em recentes manchetes, a imprensa internacional estampa que o Governo norte-americano destina US$15 bilhões em subsídios a suas empresas aéreas, algumas das quais operam na rota do Brasil. A Suíça está injetando algo em torno de US$2,3 bilhões na Swissair, e o Canadá está prestes a liberar US$2,6 bilhões para a Air Canada.

            Detectaram-se, ainda recentemente, fortes evidências de dumping por parte de governos do Hemisfério Norte, com a imposição de tarifas artificiais em rotas para o Brasil.

            A Varig está seriamente ameaçada de perder 24 aviões porque, pressionada, dentre outros fatores, pela incúria fiscal que onera os bilhetes aéreos das empresas nacionais em até 35% de seu valor e pela aventura cambial por que enveredou o Governo brasileiro, não consegue renegociar o leasing de suas aeronaves.

            Devemos realçar que a carga tributária, no nosso País, onera os bilhetes aéreos das empresas nacionais em até 35% de seu valor, enquanto nas empresas aéreas americanas a tributação se estabiliza no patamar de 8 a 10%, e, nas empresas européias, entre 15 e 17%.

            Todas essas dificuldades têm por conseqüência imediata o desemprego de centenas de aeronautas e aeroviários, com reflexos danosos em toda a economia, já havendo a Varig anunciado a demissão de 1.700 funcionários, dentre os quais 150 pilotos, cuja especialização, sabemos, dificulta o seu aproveitamento em outra atividade econômica.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ilustres convidados, temos dialogado com todos os segmentos da Aeronáutica brasileira, civil e militar. Na área civil, temos buscado a informação por intermédio das entidades que representam os trabalhadores do setor, estratégico e importante para o desenvolvimento e integração do Brasil com o mundo.

            Temos dialogado e apoiado a Conttmaf, por exemplo, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos, órgão sindical de cúpula que congrega todos os trabalhadores em transporte por ar e água.

            Temos dialogado também com todas as organizações de representação dos aviadores nacionais que, legal e legitimamente, lutam por uma autêntica e soberana Aviação Comercial Brasileira, nessa difícil e aguerrida missão que vêm travando em defesa da aviação civil.

            É nesse sentido, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que gostaria de registrar aqui parte de um manifesto divulgado pelos Sindicatos Nacionais dos Aeroviários, Aeronautas e Aeroportuários, juntamente com o Sindicato dos Aeroviários de Guarulhos, Porto Alegre - capital do meu Estado - e Pernambuco, Central Única dos Trabalhadores, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Federação Nacional dos Aeronautas e Aeroviários.

            Esse manifesto está sendo tornado público nos aeroportos. Tem inclusive havido manifestação nos aeroportos, além da distribuição do manifesto, para que as pessoas tomem conhecimento da situação.

            Sob o título “Queremos nossas empresas voando - Queremos nossos empregos com dignidade e segurança”, o manifesto diz:

      A Aviação Civil Brasileira vive mais uma crise em sua história.

      Empresas reduzem frotas, cancelam vôos na hora do embarque sem nenhuma consideração e explicação aos passageiros, fazem contraproposta de reajuste zero para a categoria, pretendem suspender as diárias de alimentação dos tripulantes e tomam medidas que afrontam a legislação trabalhista e as conquistas da categoria.

      Decidimos protestar contra:

      1 - A postura das empresas, que tentam se beneficiar da crise conjuntural do setor e justificar, com isso, a não concessão de reajuste salarial para a categoria. Além disso, as empresas nunca se dispuseram a discutir os problemas estruturais do setor, que são históricos;

      2 - A posição do Governo, que não trata o setor de aviação como estratégico, não cria uma política de incentivo ao turismo, não se preocupa com a integração nacional e não dá condições de competitividade às empresas brasileiras.

            Diz ainda o manifesto dos sindicatos:

      O que estamos propondo é uma urgente discussão do setor como um todo. O Governo tem a responsabilidade de debater esta questão e, principalmente, criar políticas para a preservação das empresas brasileiras e dos empregos, sob pena de entregar a aviação brasileira às empresas estrangeiras, que não dão garantia nenhuma nos aspectos de investimentos, atendimento e preço.

      3 - Já perdemos cerca de 15 mil postos de trabalho nos últimos dez anos. E, deste modo, são os trabalhadores que estão pagando a conta, quando na verdade a culpa é do Governo, que impõe ao País uma política neoliberal inteiramente dissociada dos interesses e anseios do povo brasileiro.

      Nossa maior preocupação é a eficiência, além de sua segurança e tranqüilidade durante um vôo, que podem vir a ser atingidas com a precarização das condições de trabalho.

      A aviação é estratégica para a soberania e o desenvolvimento nacional.

            Srªs e Srs. Senadores, malgrado toda esta conjuntura, socorro-me da sabedoria do povo do meu Rio Grande, expressa no ditado “não está morto quem peleia”, para conclamar os patriotas de todos os matizes políticos a se engajarem na luta pela preservação dos valores da nossa gente.

            É com o espírito da determinada resistência que nos legaram os antepassados que sobrevive a fé, a esperança, o ânimo para levar a todos os aviadores civis e militares do Brasil, apesar dos desafios do setor, meus votos de perseverança, felicidade e alegria no desempenho da fascinante profissão de navegar os céus, não obstante as turbulências deste difícil momento de nossa História.

            À Aeronáutica, em particular, o nosso reconhecimento e admiração pela coragem e amor ao Brasil, não apenas nos momentos de guerra, mas principalmente pelo compromisso na construção da paz, do bem-estar social e da afirmação da nossa soberania.

            Nutro a sincera convicção de que melhores dias viveremos neste País, afastando as nuvens do entreguismo e do servilismo para vislumbrar um horizonte de maior justiça e intenso desenvolvimento político, social e econômico: os aviadores do Brasil haverão de continuar mostrando ao mundo a cortesia, a capacidade e o preparo técnico de nossa gente, tripulando galhardamente aeronaves de auriverde bandeira e, queira Deus, construídas no Brasil, pelos brasileiros, para os brasileiros, para orgulho e glória de toda a Pátria.

            Parabéns ao Aviador pelo seu dia. 


            Modelo15/19/2410:11



Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/11/2001 - Página 28422