Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à privatização das empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica no País.

Autor
Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Iris Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • Posicionamento contrário à privatização das empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica no País.
Publicação
Publicação no DSF de 14/11/2001 - Página 28482
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, CONJUNTURA ECONOMICA, AMBITO NACIONAL, AMBITO INTERNACIONAL, PREJUIZO, PRIVATIZAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, SETOR, ENERGIA ELETRICA, COMENTARIO, CANCELAMENTO, LEILÃO, COMPANHIA PARANAENSE DE ENERGIA ELETRICA (COPEL), VITORIA, REIVINDICAÇÃO, POLITICO, POPULAÇÃO, ESTADO DO PARANA (PR).
  • CRITICA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DE GOIAS (GO), TENTATIVA, PRIVATIZAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DE GOIAS S/A (CELG), AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, REGISTRO, REJEIÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.
  • ANALISE, AUSENCIA, EXPANSÃO, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA, POSTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA, DEFESA, MANUTENÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DE GOIAS S/A (CELG), COMPROMISSO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, INCLUSÃO, PAUTA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ROBERTO FREIRE, SENADOR, PROIBIÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, TRANSMISSÃO, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA.

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            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, inicialmente, agradeço a gentileza do Senador Jefferson Péres em ceder o seu horário para que eu pudesse assomar a esta tribuna e proferir este pronunciamento, que considero da mais alta importância para os interesses do meu Estado e do meu País.

            Sr. Presidente, nunca, em toda a história recente da economia brasileira, um momento pôde ser definido como tão inconveniente e tão inoportuno para a privatização de uma empresa estatal, principalmente do setor elétrico, como o atual. Vivemos hoje uma rara combinação de fatores, a começar pela instabilidade no quadro internacional, com reflexos no equilíbrio cambial do Brasil, juntando-se a isso a crise de abastecimento dos reservatórios, com racionamento e falta de clareza quanto ao modelo que o País deve adotar para a geração e distribuição de energia.

            Ainda recentemente, o Ministro Pedro Parente, Presidente da Comissão encarregada de gerir a escassez experimentada pelo País na área energética, deixou bem claro, aprofundando-se nessa questão, que o momento não é para pensar em privatizar, vender as empresas geradoras ou distribuidoras de energia em nosso País, justamente pela falta de uma política clara nessa área.

            É de tal gravidade a situação que, no Estado do Paraná, tivemos um surpreendente desfecho para a tentativa do Governo local de privatizar a Companhia Paranaense de Energia. Levando-se em consideração que a Copel é uma das empresas de maior destaque do setor elétrico nacional, esperava-se até que houvesse uma disputa entre os mais de 10 compradores, que, a princípio, interessaram-se pelo negócio. Porém, à medida que o mercado foi se conscientizando das dificuldades enfrentadas pela economia e pela firme oposição do povo do Paraná, esses compradores foram se afastando, até que o leilão foi cancelado por absoluta falta de interessados.

            O episódio teve repercussão mundial. A grande imprensa dos Estados Unidos e da Europa, antes mesmo que o Governo do Paraná admitisse o fracasso do leilão, chegou a advertir para os riscos de novas privatizações no setor elétrico brasileiro sem que o panorama da economia - interno e externo - possa ser observado com maior nitidez. E tanto foi assim que as primeiras empresas a desistir da disputa pela Copel foram os oito grupos multinacionais que inicialmente haviam declarado o seu interesse. Posteriormente, antes da data marcada para o depósito das garantias, os grupos nacionais também apresentaram sua desistência.

            O cancelamento do leilão da Copel, finalmente, foi formalizado pelo próprio Governo do Paraná, mostrando, assim, que a razão estava - como sempre esteve - com os bravos políticos daquele Estado que se opuseram a essa privatização intempestiva e imprudente, dentre os quais, por justa razão, devo destacar os Colegas Senadores Álvaro Dias e Osmar Dias. Ao mesmo tempo, ficou evidenciado que cobertos de razão estão também os Governadores de Minas Gerais, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, que assumiram publicamente posição contrária à venda das companhias de energia elétrica dos seus Estados, dando uma lição ao resto do País.

            Em Goiás, o Governo do Estado continua insistindo na tentativa de vender a Celg, uma empresa de distribuição de energia que sempre teve uma participação decisiva no desenvolvimento da economia goiana. O exemplo do Paraná, onde a reação popular e as dificuldades conjunturais levaram a privatização da Copel ao fracasso, não está sendo analisado com a cautela necessária. Em Goiás, as pesquisas também mostram que mais de 85% da população é contra a venda da Celg.

            Em Goiás, assim como aconteceu no Paraná, foram ajuizadas inúmeras ações postulando a suspensão do leilão, sendo que pelo menos uma já recebeu decisão liminar favorável. Em Goiás, as empresas a princípio interessadas em adquirir a Celg também estão, uma a uma, anunciando a sua desistência, alegando as mesmas razões invocadas no Paraná, ou seja, as incertezas de caráter político e institucional e a instabilidade no cenário macroeconômico.

            A tentativa de vender a Celg é um crime que a história nunca perdoará. O Governo do Estado montou um operação de privatização de pouca transparência, cometendo falhas graves que vão desde a avaliação equivocada da empresa até a definição apressada do seu passivo em valores discrepantes com os números reais. Além disso, voltou as costas para a população goiana, deixando de prestar contas sobre a condução do processo de privatização, não conseguindo esconder que os verdadeiros motivos são mesmo de ordem política, com vistas a levantar recursos para a construção de obras no último ano do Governo. Não existem justificativas para a venda da Celg, a não ser a preocupação em viabilizar a qualquer custo a reeleição do atual Governador, ainda que comprometendo o futuro do Estado de Goiás.

            Não vou repetir aqui as dezenas e dezenas de argumentos, todos consistentes, que recomendam a manutenção do controle público da Celg ou, no mínimo, apontam para a insensatez de se tentar privatizar neste momento uma das maiores e melhores companhias de energia do País. Apenas quero lembrar mais uma vez que os interesses do povo goiano não podem ser substituídos pela perseguição fria do lucro, que é a mola mestra de toda empresa privada. A Celg é um monopólio que sempre foi administrado sob o primado do seu compromisso social, funcionando como uma arma poderosa para melhorar a qualidade de vida nos mais longínquos recantos do Estado. Não é um simples negócio em que se vende uma mercadoria, mas, sim, um serviço público que cuida de um dos setores mais importantes para a vida da sociedade moderna. Sua finalidade não é gerar lucro. É atender às necessidades da população.

            Além da conjuntura negativa, a privatização da Celg esbarra também na falta de regulação da política nacional de energia elétrica. O Governo Federal, colhido de surpresa pelo esgotamento dos reservatórios, não conseguiu ainda definir um novo modelo de gestão para o setor elétrico, condizente com o crescimento do país. No Paraná, esse foi um dos principais motivos apresentados pelas mais de dez empresas inicialmente interessadas para desistir do leilão da Copel. E quando os possíveis investidores reclamam da falta de regulação, todos sabem que, na verdade, estão se referindo à fixação de regras sobre o retorno do dinheiro aplicado, isto é, o lucro que poderão ter no futuro. Não existe a menor preocupação com o consumidor, com as comunidades carentes ou com a preservação do papel das companhias elétricas na indução do crescimento econômico.

            Um dos argumentos do Governo de Goiás para a privatização da Celg é a falta de recursos para investir na expansão da empresa. Hoje, depois que mais de 20 empresas estaduais de energia foram vendidas para a iniciativa privada, os fatos mostram que os novos donos, no afã de cortar despesas e maximizar os lucros, nada fizeram para aumentar a oferta de energia. E mais: lideradas pelas empresas privatizadas, as distribuidoras de energia elétrica reivindicam agora uma moratória das taxas e tributos devidos ao Governo. Pressionadas pela queda de receita provocada pelo racionamento, algumas empresas privatizadas anunciaram a desistência de investimentos programados para 2001 e 2002, num valor que pode chegar a US$2 bilhões. Enquanto isso, exigem novos aumentos reais nas contas de luz, a título de “recomposição tarifária”, penalizando impiedosamente o consumidor residencial e mais ainda a indústria e o comércio, esquecendo-se de que, nos últimos dois anos, foram privilegiadas com reajustes acima dos índices de inflação.

            Sr. Presidente, a privatização do setor elétrico no Brasil, até onde chegou, não trouxe ainda os proclamados recursos para ampliar a nossa capacidade de geração e transmissão. O setor público continua arcando com o grosso dos investimentos, inclusive, agora, sendo chamado para garantir o ganho das empresas por meio não só de artifícios como moratória e reajuste de tarifas, mas também de empréstimos em condições vantajosas no BNDES.

            A proximidade das eleições, preparando o Brasil e os Estados para a transição do poder, indica a necessidade de que os atuais governantes saibam se pautar pelo senso de responsabilidade. No caso de Goiás, já é notório que o leilão da Celg foi inviabilizado pela veto da opinião pública, pelas dificuldades da conjuntura e pela ação da Justiça. A esses fatores, agora, acrescenta-se a desistência dos compradores, que, em sua maioria, estão sacramentando a sua retirada por considerar a privatização inoportuna. Falta apenas a conscientização das autoridades do Governo do Estado, reconhecendo o erro e garantindo a inviolabilidade da Celg - com toda a sua equipe de competentes funcionários - como legítimo patrimônio do povo goiano.

            Não se trata de uma questão ideológica ou política. É uma questão de fato. As privatizações brasileiras, em todos os setores, estão a exigir uma nova discussão, antes de serem ou não retomadas, mas jamais em final de Governo. Essa tarefa deve ficar para os próximos governantes, a quem competirá avaliar as circunstâncias da época para decidir sobre os rumos adequados para a sociedade. A partir das eleições do ano que vem, teremos inclusive a chance de repensar o modelo econômico do País, no qual as empresas estatais poderão vir a ter um papel ainda mais importante do que hoje, principalmente no caso das companhias de energia elétrica.

            A Celg não tem preço. É propriedade intocável da população de Goiás, a quem prestou e presta serviços relevantes desde a sua fundação, quando se iniciou a grande arrancada de desenvolvimento do Estado. O comando da empresa deve continuar nas mãos do Poder Público, o único capaz de direcionar as suas ações para atender prioritariamente aos interesses goianos, por meio do trabalho do seu competente corpo de funcionários. Por isso, reafirmo dessa tribuna o compromisso de continuar a luta em defesa da Celg, convicto de que a sua privatização será prejudicial e negativa para Goiás, aproveitando também o momento que me encontro na tribuna para fazer um apelo ao Presidente do Senado Federal, Senador Ramez Tebet, no sentido de que coloque imediatamente em pauta o projeto do ilustre Senador Roberto Freire, já aprovado nas Comissões, proibindo a privatização das operações de transmissão e geração das empresas estatais de energia elétrica. Somente a aprovação deste projeto é que evitará que os Governos Estaduais insistam na venda das suas estatais elétricas com objetivos puramente eleitoreiros, dando tranqüilidade à população e impedindo o assalto que está sendo armado ao patrimônio público.

            É o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


            Modelo15/18/2411:58



Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/11/2001 - Página 28482