Discurso durante a 157ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo ao governo federal para que empreenda ações concretas de combate à fome.

Autor
Iris Rezende (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Iris Rezende Machado
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL.:
  • Apelo ao governo federal para que empreenda ações concretas de combate à fome.
Aparteantes
Heloísa Helena, Lauro Campos, Maguito Vilela.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2001 - Página 28720
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, AMPLIAÇÃO, POBREZA, FOME, AMBITO INTERNACIONAL, CRITICA, ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMERCIO (OMC), FAVORECIMENTO, PAIS INDUSTRIALIZADO, AUMENTO, DESIGUALDADE SOCIAL, MISERIA, PAIS SUBDESENVOLVIDO, RESULTADO, VIOLENCIA, TERRORISMO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INCENTIVO, EMPRESARIO, REGIÃO SUL, REGIÃO SUDESTE, AUSENCIA, AUXILIO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO CENTRO OESTE, NECESSIDADE, REDUÇÃO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA, INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL.
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, AMBITO NACIONAL, PROGRAMA, DISTRIBUIÇÃO GRATUITA, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS, POPULAÇÃO CARENTE, AUTORIA, MAGUITO VILELA, EX GOVERNADOR, ESTADO DE GOIAS (GO).
  • DEFESA, APROVAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, OBRIGATORIEDADE, GOVERNO FEDERAL, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, CUMPRIMENTO, DETERMINAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, LIBERAÇÃO, VERBA, ORÇAMENTO, POLITICA SOCIAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, já é tempo de reconhecer que a fome e a pobreza acirram os ânimos e podem terminar em conflitos indesejáveis. O recrudescimento do terror deve também ser interpretado como uma resposta irracional a um cenário de injustiças que permanece vivo num mundo dividido entre países muito ricos e nações que amargam o cenário da extrema miséria.

            A fome, seja ela visível ou invisível, aguda ou crônica, é um dos mais graves problemas sociais do mundo nesta virada de século e está fundamentalmente enraizada na pobreza e nas estruturas socioeconômicas predatórias existentes em um grande número de países.

            Há mais de dois séculos, populações de países africanos, asiáticos e sul-americanos vivem na linha de pobreza de um dólar por dia.

            O número de miseráveis da Europa e da Ásia Central já atinge 24 milhões de pessoas. Na América Latina e no Caribe, chega a 15,6% da população. Na Ásia Meridional, 40%. Em termos percentuais, a pobreza mundial atinge a cifra de 24% de toda a população.

            Quando se trata de pobreza relativa, os dados tornam-se ainda mais dramáticos e revelam um cenário de extrema desigualdade social.

            Na América Latina, mais de 50% estão abaixo da linha de pobreza relativa.

            No início do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, em março de 1993, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea, publicou o chamado Mapa da Fome. O documento revelou que 32 milhões de brasileiros defrontavam-se, diariamente, com a escassez de alimentos. Depois de sete anos, essa realidade não se alterou.

            Na verdade, Sr. Presidente, com o advento da globalização, ampliaram-se as desigualdades sociais, e o Brasil insere-se nesse contexto de graves injustiças.

            A miséria e a fome não são privilégio de nenhuma região ou área do país. Ambas se alastram por todo o território nacional, prejudicando um enorme contingente da nossa população, tanto nas áreas rurais quanto nas urbanas.

            Nos últimos anos, é forçoso reconhecer que o Brasil não conseguiu avançar significativamente e suficientemente sob o ponto de vista social. Não obstante as ações empreendidas pelas autoridades governamentais e pela sociedade civil organizada, o País, lamentavelmente, continua a apresentar um sério quadro de fragmentação social às portas do século XXI.

            Sabemos que no ranking elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento o Brasil aparece em sexagésimo segundo lugar, posição muito abaixo de sua estrutura econômica, sendo considerado um país de capitalismo perverso e socialmente injusto, onde o crescimento econômico convive com uma pobreza lancinante e persistente.

            O Brasil é um dos mais injustos do mundo. Se tivesse um nível de desigualdade próximo ao da média mundial, nosso País, com a renda per capita que possui, deveria ter apenas 10% de pobres em sua população. Entretanto, possui cerca de 30%.

            Não faltam dados recentes para evidenciar nossa elevadíssima concentração de renda. No Brasil, os 20% mais ricos têm renda 26 vezes maior do que os 20% mais pobres. No Japão, essa diferença é de apenas 4,3%; na França, é de 6,5% e, nos Estados Unidos, é de 8,9%.

            Apesar de as autoridades brasileiras, nos últimos anos, considerarem o combate à fome como prioridade nacional, é preciso destacar que, até o presente momento, as intervenções realizadas para enfrentar o grave problema alimentar no País não conseguiram resolvê-lo a contento.

            É preciso fazer algo mais do que simplesmente melhorar a eficácia dos programas sociais já existentes ou acelerar o ritmo do crescimento econômico do País.

            Não podemos ficar postergando decisões. Milhões de cidadãos brasileiros estão passando fome. Quem não tem alimento suficiente para uma vida ativa e saudável não pode ficar sem comer, esperando que os problemas econômicos do País sejam resolvidos, que a distribuição da renda se torne menos desigual.

            O futuro de nosso País estará seriamente comprometido se o problema da fome não for atacado de frente, como prioridade, por todas as esferas de Governo. As carências alimentares causam danos a todas as faixas etárias da nossa população, mas são muito mais graves quando prejudicam as nossas crianças.

            Só o combate à pobreza e o estabelecimento definitivo de justiça social para as populações carentes poderão levar-nos à perspectiva de um mundo melhor, no momento em que estamos a um passo da recessão mundial. Precisamos de estadistas com visão do futuro, capazes de combater a pobreza e trabalhar pela inclusão social, se não quisermos viver em um mundo de conflitos constantes. A história mostra que um dos principais fatores responsáveis pelas guerras civis tem sido a miséria.

            Ações internacionais que visem à diminuição da pobreza, à justiça social, à redução das desigualdades de renda devem ser empreendidas. Um mutirão dos países desenvolvidos poderá minimizar os dolorosos problemas dos carentes, dos sem-teto, dos excluídos. É preciso lembrar que o crescimento da população mundial se dá principalmente nos países pobres, cujos habitantes não têm acesso a uma vida decente.

            Por outro lado, a mundialização é responsável por um comércio desastroso. A Organização Mundial do Comércio cuida atentamente do interesse das nações ricas, sem se preocupar com ações que reduzam a pobreza. São inúmeros os fatores que contribuem para o clima de pobreza mundial, como o narcotráfico, a lavagem de dinheiro, as doenças, isso sem falar no descaso dos países desenvolvidos pelas nações mais pobres.

            Só uma coalizão mundial coerente e generosa poderá dar fim à pobreza e, com isso, diminuir o terrorismo, que coloca em risco tantas vidas inocentes. A solidariedade e a generosidade internacionais nunca foram tão desejadas como no momento atual. Com elas, seremos capazes de estabelecer a paz mundial definitiva, alcançando um mundo melhor. Esperamos ansiosos o dia em que, ao ligar nossas televisões, em vez de ver os olhares úmidos e desesperançados de crianças afegãs, possamos compartilhar com essas mesmas crianças sorrisos de alegria e fé!

            A paz não será alcançada enquanto não for proclamada a justiça social. O caminho para a convivência harmoniosa entre as nações passa pelo estabelecimento de um novo pacto mundial baseado em gestos concretos de solidariedade e partilha. É disso que o mundo precisa.

            É claro que quando procuramos desta tribuna chamar a atenção principalmente dos países mais desenvolvidos, com os quais o Brasil mantém relações diplomáticas e comerciais, ela também está voltada para a situação interna. Eu bem disse que são mais de 32 milhões de brasileiros que se encontram abaixo da linha de pobreza. E o interessante é que também precisamos reagir. O Brasil, que é muito rico e tem potencialidades extraordinárias - terras férteis, subsolo abundante, clima especial e um vasto território -, tem tudo para ser modelo, mas é preciso que o Governo volte as suas atenções, de fato, para as regiões menos desenvolvidas.

            Observamos que as atenções do Governo, sobretudo da área econômica, estão voltadas para os grandes empresários, que se localizam no eixo Rio-São Paulo-Minas Gerais, já com uma incidência extraordinária no sul do País. Entretanto, a situação do Centro-Oeste, do Norte e do Nordeste deixa muito a desejar relativamente às ações do Governo.

            Sr. Presidente, conhecemos bem a luta dos produtores rurais, por exemplo. Tudo aquilo que beneficia a classe dos produtores rurais, como o alongamento das dívidas, ocorrido há poucos dias, é como se o Governos lhes tivesse fazendo um favor extraordinário. Ora, os produtores rurais eram, e poderiam ser até hoje, o segmento econômico que mais dava emprego, mas as políticas agrícolas e sociais desastrosas desenvolvidas nos últimos anos fizeram com que o homem se distanciasse da roça e fosse morar nos grandes centros urbanos em busca de educação, de saúde e de emprego. Hoje é esse o quadro que se observa. Ao chamar a atenção do mundo, especialmente a do Governo brasileiro, para a questão da fome, gostaria de dar como exemplo o que fez o Senador Maguito Vilela, quando Governador de Goiás. Lembro-me de ter ponderado, quando se discutia aquele projeto extraordinário, que o combate à fome se fazia buscando mais indústrias, alargando o espaço de trabalho na zona rural, proporcionando mais emprego para o nosso povo. O Governador Maguito Vilela nos deu a seguinte resposta: “Vamos continuar fazendo tudo isso, mas não podemos permitir que um Estado que se considera um dos celeiros do País conviva com a fome de milhares de goianos”. S. Exª falava de velhos, viúvas e desempregados. Lá, instalou-se um dos mais ambiciosos projetos de combate à fome de que este País tem noticia, o Projeto da Cesta Básica, para os idosos que recebem menos de um salário mínimo, viúvas sem renda e desempregados; para as famílias com filhos em idade escolar a exigência é que estejam matriculados na escola.

            Paralelamente à distribuição de 140 mil cestas básicas - o Senador Maguito Vilela está presente e poderá confirmar esse número -, eram distribuídos 90 mil litros de leite e 90 mil pães vitaminados diariamente. Durante o Governo de S. Exª, proclamávamos que Goiás era o Estado onde ninguém passava fome.

            Isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não trouxe problemas de ordem financeira ao Governo de Goiás, que gastava apenas 3% de sua renda para socorrer essa área. É possível fazer isso em todo o território nacional, sem provocar quaisquer desastres para a política econômica do Governo. É preciso determinação, vontade. Para banir a fome do Brasil durante um ano, gastaríamos o que se gastava em um minuto para acudir um ou dois bancos.

            O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Senador Iris Rezende, V. Exª concede-me um aparte?

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Com muita honra concedo o aparte ao querido Senador Lauro Campos, representante do Distrito Federal, e professor que respeitamos e admiramos.

            O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Senador Iris Rezende, o discurso de V. Exª, nesta tarde, revela o lado da sua personalidade que todos os goianos conhecem e as preocupações que sempre nortearam seu espírito público. Nobre Senador, seria muito bom se os números tivessem alma e chorassem, mas isso não acontece. Então, muitas pessoas tapam os ouvidos e criam um escudo - não um escudo antimíssil, como essa loucura está tentando criar no mundo - contra a verdade que está aí, tão castigada e apenada, manifestada nesses números que não choram. Apreciei demais o pronunciamento de V. Exª. Todo ele é principal; não há como separar algo de mais importante do menos importante. Apenas gostaria de enfatizar quando V. Exª relaciona a miséria, a pobreza e a marginalização, que também são impulsionados - como V. Exª disse - pela globalização, aos problemas da agressividade e do desespero que se manifestam sob diversas formas, inclusive sob a forma de terrorismo. A fome também é um terror, e permanente, que nos tem sido imposto por diversas formas de escravidão, desde as antigas até as modernas. Eu estava tentando fazer um pronunciamento hoje, para enfatizar os aspectos a que V. Exª se referiu e apontar minha crítica e sugestões no mesmo sentido dos de V. Exª nesta tarde. Parabéns. Não me surpreendi, porque conheço V. Exª, felizmente, há muitas décadas. Muito obrigado.

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Muito obrigado, Senador Lauro Campos. Seu aparte é motivo de honra para qualquer Senador, sobretudo para mim. Considero meu pronunciamento superenriquecido com a intervenção de V. Exª. Solicito que venha à tribuna, como era seu desejo, e enfatize ainda mais essa questão. Não podemos nos cansar de falar. Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura! Quem sabe se, falando, falando, falando, devagar sensibilizaremos aqueles que têm nos ombros a responsabilidade pela condução das questões econômicas e, conseqüentemente, sociais em nosso País.

            A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Concede-me V. Exª um aparte?

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Com muita honra e muita alegria, concedo um aparte à Senadora Heloísa Helena.

            A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Iris Rezende, como o Senador Lauro Campos, quero saudar V. Exª pelo pronunciamento. O tema que V. Exª aborda, em alguns momentos, ocupa as páginas dos jornais, os meios de comunicação e, com o mesmo assombro que às vezes toma conta do imaginário popular, também, com a mesma rapidez, some do debate nacional. Embora apareça ou suma do debate eleitoral, especialmente conforme as conveniências políticas, esse tema é uma realidade do cotidiano de milhões de pessoas neste País - segundo dados oficiais, 55 milhões de pessoas. Como bem disse o Senador Lauro Campos, por trás das frias estatísticas oficiais, existem histórias de vidas sendo destruídas. É justamente pela ausência de alternativas concretas, ágeis e eficazes, trazidas inclusive pelo discurso de V. Exª, que existem milhões de pessoas que vão à marginalidade como último recurso. Infelizmente, nós do Congresso Nacional, fazemos muita pose, mas viabilizamos pouco, especialmente num debate como este da questão orçamentária. Com certeza, várias pessoas que nos escutam, quando nos vêem ocupando a tribuna, promovendo debates, buscando alternativas, sempre ficam a pensar por que não se estabelecem agora, no debate do Orçamento, as alternativas viáveis, o montante financeiro a ser disponibilizado para isso ser feito. Infelizmente, não compreendem essas pessoas que ao Congresso Nacional - e o Senador Lauro Campos menciona muito o art. 166 da Constituição - é vedado algo que certamente não existe em qualquer outra legislação pelo fundo afora: o impedimento constitucional para retirar recursos do pagamento dos juros do serviço da dívida para investir na área social. Vejam que vergonha! Temos um País de dimensões continentais, que pode, sem dúvida nenhuma, dar os passos fundamentais para uma nova ordem internacional; que pode estabelecer uma nova correlação de forças na América Latina; um País com o maior potencial de áreas agricultáveis e recursos hídricos, onde apenas 20% dessas áreas agricultáveis são utilizadas. O Governo Federal, que não respeita os sem-terra porque não tem a coragem de cumprir a constituição e fazer a reforma agrária, também não respeita os que têm terra, porque a média de assentamento é de 400 mil ao ano. Dos que têm terras, 513 mil já as perderam. Portanto, há um déficit de mais de 100 mil famílias. Na verdade, são assentadas 400 mil famílias, mas não se faz a reforma agrária. O Governo está implementando um modelo de favelização rural, e 513 mil famílias detentoras de terras estão perdendo as suas propriedades. O Governo não faz nada pela educação, pela saúde, pela assistência social. Senador Iris Rezende, V. Exª é um homem experiente e sabe disso: qual é a justificativa de 77% no Orçamento? É simplesmente para viabilizar a rolagem, os juros e os serviços da dívida e a agiotagem internacional. Como um país pode sobreviver desse jeito? Setenta e sete por cento! Nós, quando queremos criar algum recurso para investimento na agricultura, na assistência social, na saúde, na ciência e tecnologia, fazemos garimpagem política e orçamentária. Muitas vezes, tira-se recurso das Forças Armadas e coloca-se na Agricultura, tira-se de um setor e coloca-se em outro, ou seja, faz-se garimpagem orçamentária e se diz que está mexendo no Orçamento. Creio que este é o momento de esta Casa possibilitar a alteração, com uma proposta de emenda constitucional - o Senador Lauro Campos, por várias vezes, tentou e não conseguiu as assinaturas necessárias -, para que possamos tirar essa armadilha gigantesca que impede que o Congresso Nacional estabeleça a mobilidade de recursos que não seja simplesmente aquela imposta pelo Fundo Monetário Internacional. Senador Iris Rezende, mais uma vez, cumprimento V. Exª por trazer um tema atual, freqüente e que faz parte da vida e do cotidiano de milhões de pessoas deste País, que, infelizmente, oscila no debate ou nas conveniências dos palanques eleitorais.

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Ilustre Senadora Heloísa Helena, estou extremamente sensibilizado com o honroso aparte de V. Exª, sem o qual o meu pronunciamento delineado ficaria muito estreito, muito pequeno para a dimensão dos problemas que abordamos. É um momento de reflexão para todos nós. A beleza do Parlamento é justamente isso, permitir a discussão de questões importantes. V. Exª denuncia à Nação o que se passa no miolo da Administração Federal. Setenta por cento dos recursos são destinados ao serviço da dívida, e o mais grave é que, embora se gaste tanto, a dívida - interna e externa - não se reduz; pelo contrário, está aumentando cada vez mais. Às vezes, fico a imaginar: será que o País conseguirá saldar a dívida, sobretudo a interna? Como conseguirá fazê-lo? É preciso enfrentar e discutir essas questões com responsabilidade e sinceridade, para que elas não fiquem a atormentar as futuras gerações de nosso País.

            O Sr. Maguito Vilela (PMDB - GO) - Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Iris Rezende?

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Com muita satisfação, Senador Maguito Vilela, querido companheiro de Goiás.

            O Sr. Maguito Vilela (PMDB - GO) - Muito obrigado, Senador Iris Rezende. Eu gostaria de participar desse belíssimo, extremamente correto e sensibilizante pronunciamento de V. Exª, que, aliás, já vinha ouvindo pela Rádio Senado. Digo a V. Exª, ao Brasil e ao mundo que tudo é possível quando se tem vontade e decisão política para resolver as questões. V. Exª lembrou Goiás. Espelhei-me nos seus exemplos. Lembro que, quando era seu Líder, no Governo, em torno das seis horas da manhã, chegávamos ao Palácio e havia cerca de 500 criancinhas pobres, tomando leite e comendo sanduíche para depois irem vender jornal ou retornarem às suas casas. V. Exª construiu milhares e milhares de casas para os pobres. Assumindo o Governo de Goiás, segui o seu exemplo. Na realidade, durante os quatro anos, eu desafiava quem me apontasse uma família sequer em Goiás que passasse fome. Eu, pessoalmente, fiz este desafio muitas vezes na televisão: “Aponte uma família passando fome em Goiás”. Eram 143 mil cestas de alimentos de 28 quilos, 92 mil litros de leite pasteurizado todos os dias, quando o sol raiava no horizonte. Não era só para as criancinhas pobres, não; era para a Vila São Cotolengo, em Trindade, para a Colônia Santa Marta, em Goiânia, e para todas as creches de Goiás. Todas as creches recebiam o leite pasteurizado e o pão vitaminado. Ainda mais: os pobrezinhos não pagavam nem energia elétrica nem água; era o Governo que pagava. Se a pessoa não tem dinheiro nem para comer, nem para pagar aluguel, nem para comprar remédio, ela ainda vai pagar energia elétrica e água, com os preços que esses serviços têm no nosso País? Era o Tesouro que pagava energia elétrica e água para os mais pobres, dos pobrezinhos desempregados, em Goiás. Quando se quer, quando se tem vontade política, faz-se. Gastávamos apenas 6% do Orçamento do Estado para matar a fome. Esses 6% eram intocáveis. Aqui, tentei incluir, no Orçamento da União, um percentual para matar a fome do povo brasileiro. Não há um percentual para a educação? Sim. Então, tem de se ter um percentual para matar a fome, porque matar a fome é mais importante, pois quem está com fome não vai à escola, quem está com fome não tem ânimo para viver. A fome come a vida das pessoas, matando de forma dolorosa. Para mim, é a morte mais humilhante. Por isso, Senador, há como se acabar com a fome em pouquíssimos meses. É só o Governo querer. Entretanto, enquanto tivermos Presidente da República e Ministros de Estado que apenas conhecem os aeroportos de Brasília, de Washington, de Nova Iorque e de Paris, não se resolverá o problema da fome. Quando tivermos Presidente da República e Ministros de Estado, Governadores de Estado que visitem as favelas, os bolsões de miséria, quando eles enxergarem gente morrendo de fome, gente couro e osso, talvez comecem a pensar nos pobres. Tomei uma decisão política, na minha vida, e V. Exª sabe disso. Em qualquer cidade que vou, em qualquer lugar que vou, visito primeiro o pobre. Quero ver como está vivendo o mais pobre. Conheço os mais pobres da Cidade Estrutural, conheço os mais pobres do Entorno de Brasília, conheço os mais pobres de São José da Tapera, em Alagoas, da nossa querida Senadora Heloísa Helena, onde tem um os maiores índices de mortalidade infantil. Fui visitar o trabalho da Madre Teresa de Calcutá; fui onde ela prestava assistência aos mais pobres, na Índia; fui a Bangladesh; visitei os países mais pobres do mundo e as cidades mais pobres do mundo. Em qualquer lugar que visito não quero conhecer apenas o prefeito, o secretário. Quero ver quem realmente precisa do Estado, da Prefeitura, da União, quem realmente precisa de Governo, que é o pobre, o humilde, o miserável, o faminto, o desempregado. O nosso País, como a maioria dos países, só governa para os ricos. Dinheiro para o Marka, para o FonteCindam tem; dinheiro para o Proer socorrer os bancos tem. Agora, dinheiro para matar a fome, construir casas para os pobres, consertar as estradas brasileiras não tem. Falta vontade política neste País. A partir do momento em que tivermos um Presidente da República ou Governadores realmente decididos a acabar com a fome e com a miséria, iremos banir essas que, para mim, são as maiores nódoas de qualquer País: a fome e a miséria. Parabenizo a V. Exª por ser um político que, na prática, ajudou a matar a fome, ajudou aos pobres. O importante não é o que o político fala, mas o que faz, ou seja, na prática, que procura resolver os problemas. E V. Exª fez isso milhares de vezes em sua vida pública. Parabéns.

            O SR. IRIS REZENDE (PMDB - GO) - Senador Maguito Vilela, agradeço a V. Exª a generosidade das afirmações dirigidas à minha atuação. Devo dizer que, realmente, na vida pública, V. Exª voltou as atenções, abriu o coração para as classes menos favorecidas. Isso é importante. Continuando assim, V. Exª será sempre uma pessoa abençoada pelo Criador. Quem folheia a Bíblia permanentemente se depara com recomendações para que se volte a atenção para as viúvas, os órfãos, os pobres e os desvalidos. V. Exª tem sido feliz. Continue agindo assim, para que proporcionemos uma situação digna de vida para o povo de Goiás e para todo o povo do Brasil.

            Reconheço que, durante minha vida política, contei com o respaldo da população do meu Estado em todos os momentos. Isso porque sempre procurei praticar a política com seriedade, amor e sobretudo atenção aos menos favorecidos.

            Assim como V. Exª, preocupei-me com o desenvolvimento econômico, com a implantação de uma infra-estrutura que pudesse proporcionar a Goiás progresso nas áreas de energia, transporte, educação e saúde. Conseguimos conter em Goiás o êxodo rural, levando energia rural a 95% das propriedades do Estado. Mantivemos a população no interior, instituindo cursos superiores em cidades estrategicamente situadas; ginásios de esporte em todas as cidades praticamente, para que a juventude pudesse crescer participando de diversões sadias; água tratada em todas as cidades e distritos e praticamente em todos os povoados. Paralelamente, construí milhares de casas para os pobres. V. Exª veio e completou o trabalho com glória, banindo a fome.

            Estou certo de que o Brasil chegará lá, desde que, como bem V. Exª afirmou, haja determinação e vontade, até porque não havendo vontade, com esse sistema de orçamento autorizativo, não adianta o Congresso Nacional brigar por verbas, por percentuais de recursos, para essa ou aquela finalidade social. Não querendo, o Poder Executivo não faz.

            Estou à vontade para dizer isso, porque, há mais de um ano, colhi assinaturas de Colegas Senadores para uma Emenda Constitucional, estabelecendo o orçamento determinativo. Se aprovado pelo Congresso, o Poder Executivo só terá um rumo: cumprir. 

            Lamentavelmente, não será fácil conseguir um orçamento determinativo em pouco tempo. É preciso primeiramente lutar por isso, para que depois façamos prevalecer no Congresso - Senado e Câmara - a vontade dos mais de seiscentos Parlamentares - Deputados e Senadores.

            Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, era o que gostaríamos de fazer nesta tarde: falar, falar e falar, até que os responsáveis pelas questões sociais sejam realmente sensibilizados. Muito obrigado.


            Modelo15/5/241:50



Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/2001 - Página 28720