Pronunciamento de Waldeck Ornelas em 22/11/2001
Discurso durante a 160ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Comentários à situação do negro no Brasil, por ocasião do transcurso do Dia Nacional da Consciência Negra.
- Autor
- Waldeck Ornelas (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
- Nome completo: Waldeck Vieira Ornelas
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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HOMENAGEM.
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
- Comentários à situação do negro no Brasil, por ocasião do transcurso do Dia Nacional da Consciência Negra.
- Publicação
- Publicação no DSF de 23/11/2001 - Página 29270
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
- Indexação
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- REGISTRO, DIA NACIONAL, CONSCIENTIZAÇÃO, RAÇA, NEGRO, HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, LIDER, QUILOMBOS.
- ANALISE, APRESENTAÇÃO, DADOS, INFERIORIDADE, EDUCAÇÃO, SITUAÇÃO SOCIAL, NEGRO, NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO, POLITICA SOCIAL, IGUALDADE, OPORTUNIDADE, MERCADO DE TRABALHO, CRESCIMENTO ECONOMICO.
- SOLICITAÇÃO, APOIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, ESCOLA PARTICULAR, BENEFICIARIO, COTA PATRONAL, PRIORIDADE, NEGRO, AQUISIÇÃO, BOLSA DE ESTUDO, BENEFICIO, AMPLIAÇÃO, ACESSO, EDUCAÇÃO.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. WALDECK ORNÉLAS (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última terça-feira completou mais um ano a morte de Zumbi dos Palmares, líder dos quilombos formados pelos negros fugidos da escravidão. Essa data, 20 de novembro, foi instituída como o Dia Nacional da Consciência Negra em nosso País, o que nos leva a tecer alguns comentários a respeito da situação do negro no Brasil.
Abolida a escravatura há somente 113 anos, os negros declarados livres não tinham condições de viver em igualdade com os demais habitantes do nosso País. Hoje os afro-descendentes, nada menos do que 43,5% da população brasileira somam cerca de 70 milhões de pessoas.
Temos a segunda maior população de origem africana no mundo. Somente a população da Nigéria supera a população brasileira descendente de africanos. Isso nos faz considerar essa condição essencial para nossa nacionalidade. Contudo, a situação social dessa população continua extremamente preocupante.
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar nos revelam que, entre os analfabetos, 44,4% são negros; entre os brancos, 9%. Entre os brasileiros com mais de dez anos de escolaridade, os brancos são 9,2%; os negros, apenas 2,1%. O rendimento médio do trabalhador negro é de 63% do rendimento do trabalhador branco para o mesmo cargo e com a mesma escolaridade. Entre os que ganham até um salário mínimo, os brancos são 18,6%; os negros, 73,1%, segundo dados do Índice de Desenvolvimento Humano de 1996. Entre os que percebem mais de dez salários mínimos, os brancos são 9,3%; os negros, apenas 3,7%. Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há dúvida de que os diferenciais de escolaridade influem decisivamente e respondem por essa questão.
No emprego, a população negra se concentra na atividade agrícola, na construção civil e na prestação de serviços, especialmente nos trabalhos domésticos, com empregos precários.
Cem anos antes, em 1901, logo após a Abolição da Escravatura, de cada cem trabalhadores na indústria, noventa eram imigrantes europeus que vieram substituir o negro escravo no trabalho livre.
Há, por conseguinte, uma questão racial no Brasil, que precisa ser tratada, cuidada e enfrentada. Tem havido um tratamento, geralmente, penal da questão.
Em 1952, a Lei Afonso Arinos tratou a discriminação como contravenção, impondo como punição para os casos de discriminação a multa, que, diante de todo o processo inflacionário, perdeu valor, significância e importância como instrumento de punição e combate ao racismo e à discriminação racial.
Em 1989, a Lei Caó, decorrente da nova Constituição, criminalizou a discriminação racial e o racismo, dando-lhe caráter de crime imprescritível e inafiançável. Não se trata, contudo, apenas e tão-somente, de combater o racismo e a discriminação do ponto de vista criminal. É preciso criar oportunidades iguais para todos os brasileiros, com ações específicas em favor das parcelas mais vulneráveis do ponto de vista social. Entre essas parcelas, sem dúvida alguma, os afro-descendentes constituem um segmento o qual, pelo seu número e por sua quantidade, requer uma atenção e um tratamento diferenciados.
Um grande baiano, Rui Barbosa, já nos ensinou há bastante tempo que a verdadeira lei da igualdade consiste em tratar desigualmente os desiguais, aquinhoar desigualmente aos desiguais na medida em que se desigualam para, assim, igualar as oportunidades. É preciso, por isso, estabelecer ações afirmativas, para proporcionar a chamada discriminação positiva, assim como políticas compensatórias para beneficiar essa população e, assim, criar condições de igualdade.
As políticas sociais de caráter universalista em nosso País não estão alcançando toda a população e, dessa forma, congelam as desigualdades, projetando no tempo a trágica herança do passado.
O Brasil, ainda recentemente, teve uma participação relevante na Conferência de Durban, na África do Sul, promovida pelas Nações Unidas para discutir a discriminação, da xenofobia e do preconceito racial.
É preciso, por conseguinte, dar conseqüência objetiva e prática às posições que o nosso País tem defendido e sustentado, inclusive, no concerto internacional.
Como baiano, venho do Estado que é o maior depositário da herança cultural africana em nosso País pelo acarajé, pela baiana, pelo Candomblé, pela Capoeira, pelo axé music. Sinto-me, portanto, no dever de contribuir para uma nova situação, uma nova realidade para a população negra afro-descendente em nosso País.
Por esse motivo, apresentei a esta Casa - e peço a atenção e o apoio dos Srs. Senadores - o Projeto de Lei do Senado nº 212, de 2001. Trata-se, na verdade, de dar prioridade absoluta para a população afro-descendente nas bolsas de estudo que as entidades e instituições particulares de ensino que gozam da isenção da cota patronal previdenciária, a título de filantropia, ou seja, para prestar assistência social, devam dar à população.
Esse projeto não tem qualquer custo adicional para o Tesouro. A isenção já existe, é uma benesse que está em vigor há muito tempo e, a rigor, tem sido muito mal utilizada, gerando muitas vezes o que se tem chamado de “pilantropia”, ou seja o desvio da filantropia com a má utilização dos recursos.
Por conseguinte, há disponível um potencial muito grande de recursos de cerca de R$800 milhões ao ano que podem e devem ser revertidos, segundo a minha proposta, em favor da população afro-descendente, possibilitando bolsas de estudos para o Nível Superior, o 3º Grau, as universidades e para o 2º Grau.
O Ensino Fundamental está praticamente universalizado, hoje, em nosso País. A matrícula é da ordem de 96% para as crianças entre 7 e 14 anos. No 2º Grau, e sobretudo na universidade, há, ainda, uma forte limitação. O acesso se torna mais restrito à população afro-descendente, que não tem a oportunidade de pagar as anuidades das universidades e faculdades particulares, em face de seus baixos níveis de renda.
Dessa forma, temos de aproveitar melhor esse incentivo que já existe, direcionando-o, para que possamos fazer justiça social, promover oportunidades iguais para essa parcela da população brasileira tão significativa, relevante do ponto de vista histórico, pela contribuição cultural que deu para a construção da nacionalidade.
Precisamos construir um País cada vez mais justo, solidário, mais igualitário para todos os filhos desta terra. Por isso venho a esta tribuna a fim de pleitear o apoio das Srªs e dos Srs. Senadores a esse Projeto de Lei nº 212, de 2001, que objetiva fazer a promoção social mediante um mecanismo que, como disse, é perfeitamente compatível com os tempos rígidos de ajuste fiscal. Não cria gasto adicional, mas uma política social objetiva na área de educação em favor dos afro-descendentes. Muito obrigado.
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