Discurso durante a 162ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Alerta aos políticos para o processo de despolitização da sociedade brasileira, sobretudo nas campanhas políticas.

Autor
Artur da Tavola (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RJ)
Nome completo: Paulo Alberto Artur da Tavola Moretzsonh Monteiro de Barros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • Alerta aos políticos para o processo de despolitização da sociedade brasileira, sobretudo nas campanhas políticas.
Aparteantes
Edison Lobão, Lauro Campos, Pedro Simon, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 27/11/2001 - Página 29562
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • ANALISE, ALTERAÇÃO, PROCESSO ELEITORAL, PERDA, IMPORTANCIA, PARTIDO POLITICO, CLASSE POLITICA, REFORÇO, ATUAÇÃO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO.
  • ANALISE, PROGRAMA, HORARIO GRATUITO, TELEVISÃO, AUSENCIA, DISCUSSÃO, PROPOSTA, PARTIDO POLITICO, REDUÇÃO, CONTEUDO, PROPAGANDA ELEITORAL, AUMENTO, TECNOLOGIA, VIDEO, PERDA, IDEOLOGIA, ATIVIDADE POLITICA.
  • APOIO, DISCURSO, PEDRO SIMON, SENADOR, MANIPULAÇÃO, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, DADOS, OPINIÃO PUBLICA, ELEIÇÕES.
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, ALTERAÇÃO, HORARIO GRATUITO, TELEVISÃO, RESTRIÇÃO, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna dirigir um alerta à classe política. Em parte, fui inspirado nessa minha fala por um discurso do Senador Pedro Simon, na sexta-feira, no qual S. Exª se apresentava como candidato e fazia um justo reclamo sobre o fato de que não aparece em nenhuma das pesquisas de opinião.

            A classe política está abrindo mão, gradativamente, passo a passo, do controle sobre candidaturas e avanço dos partidos políticos. É claro que há uma tensão participante, um dialética, um conjunto de conflitos entre a mídia e a classe política. A mídia, de certa forma, deprecia a classe política e, por outro lado, ocupa espaços que deveriam ser ocupados pela classe política, a qual, porque os espaços são generosos, abre mão de suas posições. Falo mais claro: tomemos o caso dos horários de televisão, que são um mínimo que as empresas que recebem a concessão para o uso de um serviço público -- repito: para o uso de um serviço público --, o que quase nunca acontece, dão para que a opinião pública brasileira possa ser informada, independentemente de poder econômico e de qualquer intervenção, pelos partidos políticos, que são os organismos encarregados de gerir a coisa pública. É, portanto, um assunto sério.

            Sobre o argumento de que os programas de televisão - permitam-me uma expressão chula - são “chatos”, gradativamente começaram a surgir alguns fenômenos que merecem nossa análise. Primeiro, o crescimento desordenado da presença de especialistas, chamados hoje de “marketeiros” ou de “marketólogos”, no sentido de vestir o programa político eleitoral com aquelas atrações televisuais que não transformam o horário em “chato”. Depois, surgiu uma fórmula habilmente levada pelos canais e que a classe política aceitou, supondo-se esperta, mas, ao meu juízo, de maneira ingênua. Acreditar mais nos spots de 20 ou 30 segundos do que propriamente no horário determinado e trocar o horário determinado por uma quantidade maior de spots, ou seja, de flagrante de 20 segundos, onde sua mensagem, seus candidatos, seus mitos e seus nomes apareçam. Por que ingênua? Dizem os políticos que é muito mais importante aparecer no spot do que num programa grande, porque o spot se repete várias vezes e o programa grande vai ao ar uma vez e nem todo mundo vê.

            Isso é verdade, mas também é verdade que o spot é a forma mais completa de despolitização possível na vida brasileira. Ali, não se discute idéia ou o programa; ali, não se apresentam as pessoas com o que elas são; ali, entra um produto tal e qual um sabonete ou um supermercado.

            E a classe política, de bom grado, aceitando a troca do seu espaço pela presença disseminada de spots, vai vendo dia a dia o processo político transformar-se num processo de aparências, tocado pelas mesmas regras do espetáculo televisual que regem todas as transmissões televisuais.

            Isso determina, primeiro, dentro dos Partidos, quando não há unanimidade, uma briga de foice para o domínio do spot. Segundo, isso faz com que a política se apresente sem nenhuma carga doutrinária, que é o que é sua base.

            Verifiquemos agora, um ano antes das eleições: quem, a não ser nos Parlamentos ou em lugares fechados, está a discutir programas de governo? Muito pouca gente, muito poucos Partidos.

            O País não se divide entre a honrada escolha de propostas para governar; o País se divide entre figuras de comunicação que apareçam melhor na televisão; e, em torno de figuras de comunicação vestidas e tratadas por hábeis mecanismos de domínio da imagem, quem passa a representar um papel político-eleitoral significativo. Não estou me referindo especificamente a ninguém, estou analisando um processo que já vem há muitos anos, no Brasil, para o qual a classe política não atenta e, ao contrário, aceita, porque é um processo político no qual as regras do jogo não são determinadas por ela; são determinadas ou pelos especialistas de marketing ou pelas estações de televisão que, com isso, conseguem, à guisa de ajudar, um grave processo de despolitização da vida brasileira.

            O Senador Pedro Simon, no seu discurso, na sexta-feira passada, lembrou inúmeros episódios. Citou, com aquele seu modo ao mesmo tempo alegre e arguto, inteligente e simpático, nomes de pessoas que se transformaram nas grandes figuras do pleito eleitoral. Com isso, a classe política vê o debate desaparecer, o jogo das idéias esmaecer-se, ficando reduzido a pequenos grupos capazes de enfrentá-lo. A população pode continuar perfeitamente alienada do processo político. Pode votar pela simpatia, pelo close up, pelo bom uso, jamais por idéias.

            Eu poderia dizer também - e o digo, embora não seja esse o objetivo do meu discurso; tenho medo de escapar do objetivo do meu discurso - que isso é uma falácia do Presidencialismo. No parlamentarismo, tal não aconteceria, porque no parlamentarismo é a classe política como um todo, é a experiência de homens que vivem anos no trabalho parlamentar - porque Parlamentar conhece quem é quem na política. É isso que gera o Governo, fruto de profundas articulações. Nenhum Primeiro-Ministro é aprovado no Parlamentarismo sem que seja aprovado também o seu programa de Governo.

            Eu poderia dizer que isso também é um dos males do presidencialismo. Porém, não me afasto, nesse particular, do meu discurso, porque o objetivo é alertar a classe política - se é que tenho esse poder e essa possibilidade - para um tipo de processo que, vindo da natureza intrínseca da comunicação de massas, hoje invade o processo político, ocupa o processo político e faz com que até a roupa que os candidatos passam a usar, um ano antes, já comecem a ser diferentes, no pleito, por determinação desses senhores. Aliás, está entrando em moda aquela camisa azul-clara com gola branca, tão bonita e tão bem-feita. Ora, política não é isso! A política não se resume a vinte segundos bem apresentados pela televisão. O momento vivido pelo mundo, pelo Brasil, as dificuldades de governar não são uma aparência a ser levada por aqueles que mais simpaticamente se apresentam diante da população. Inevitavelmente, esse processo conduz ao populismo, a formas novas do populismo, que são as de conseguir, em 20 segundos, um tipo de simpatia que pouco ou nada tem a ver com as idéias, mas muito tem com a percepção, pelo eleitor, do rosto da figura de comunicação de quem o faz. E aí, vem a grande falácia. O Senador Pedro Simon aludia também a isso em seu importante discurso de sexta-feira passada. A falácia vem nas pesquisas, que são elas outra forma, às vezes, indireta e, muitas vezes, direta de manipulação. Por quê? Uma vez apresentada a figura de comunicação, dentro dos modelos da televisão, sem nenhuma necessidade de passado, de história ou de discussão política, a pesquisa vem o quê? Confirmar aquilo que o próprio sistema, dominado pela televisão, engendrou.

            Inicia-se, então, um jogo dentro do qual passa a ser absolutamente impossível existir com idéias, existir com projetos, discutir a sério com essa nação os seus problemas e utilizar aquele escasso espaço de tempo, que é dado como uma concessão. E olhe lá, porque as emissoras de televisão, gradativamente, convenceram a classe política de que os spots de 20 segundos são mais importantes, abandonando a idéia original do uso do rádio e da televisão, que é, primeiro: impedir a presença do poder econômico nas eleições; segundo: dar aos candidatos igualdade de oportunidade diante do público eleitor.

            E estou entre os que defendem essa idéia. Há muito tempo, tenho dado pronunciamentos nesta direção e tenho ouvido outros companheiros que também defendem a idéia de que programa de televisão, de natureza eleitoral, deve ser feito com o candidato a falar - ele pode gravar, não é preciso que seja ao vivo - sozinho, diante de um fundo neutro, por mais cansativo e aborrecido que seja, porque o País, com isso, ganhará, ao ver a efetiva condição, o efetivo preparo dos candidatos. Talvez possa haver um debate com os jornalistas em certas circunstâncias, mas não pode haver a montagem em que - tomo as palavras do Senador Pedro Simon - o candidato é quem menos aparece. Quanto mais ele aparece, menos a montagem em torno dele pode ser feita.

            Faço esse alerta à classe política muito além da minha condição de Líder do Governo. Sei que o próximo pleito já está marcado pela eiva desse processo - e será difícil -. mas estamos a votar a reforma política. Temos condições de levar adiante alguma reação diante desse fato. Se ficarmos na posição defensiva de aceitar o modelo como está, cada vez mais - e já é muito - o comando do processo político desaparecerá dos Partidos políticos.

            Já hoje quem pauta a imprensa não é o Parlamento; é a imprensa que pauta o Parlamento. Discutimos os assuntos e os temas que a imprensa abordou. Encontra-se, no Parlamento, quem prefira aderir a esse processo a criar, no próprio Parlamento, as condições para que ele se imponha pelas qualidades de seus membros, pelo trabalho, pela capacidade de lutar e de trazer temas à tribuna. Que temas sérios votados nas comissões são levados ao conhecimento da opinião pública?

            O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Com muito prazer, concedo um aparte ao Senador Roberto Requião.

            O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Senador Artur da Távola, o tema é dos mais interessantes. A idéia inicial do espaço de 20 minutos e do espaço de 40 minutos para propaganda divididos em breaks de 30 segundos ou um minuto não é de todo má. Esse processo de comunicação divide-se no tempo da publicidade: período de doutrinação das idéias, explicadas com profundidade e cuidado, acompanhado com um tempo de sustentação, com a utilização dos breaks e dos pequenos spots para manter a presença da imagem originalmente colocada. Mas é evidente que isso não está acontecendo. Por exemplo, na última eleição municipal, na capital do meu Estado em Curitiba, um partido político gastou R$10,5 milhões em rádio e televisão. Montou uma cidade cênica! Mas vamos admitir que partíssemos para a sua sugestão: o candidato na frente da câmera de televisão. Dependeria muito o resultado da comunicação da capacidade histriônica do candidato. Um bom ator conseguiria, com o recurso da gravação antecipada, um desempenho formidável. E as redes de televisão continuariam fulminando candidaturas ao sabor dos seus interesses. Outro dia assistia eu ao Jornal Nacional, quando o Alexandre Garcia, com a boca cheia, numa satisfação tremenda, anunciou que eu me teria envolvido num acidente de automóvel com o sentido de tirar um dos motoristas do flagrante. Mentira absoluta! Mentira que jamais conseguirei desmentir. Ao lado das singelas e inocentes idéias do financiamento de campanha e do isolamento do candidato na frente da tela, há o poder monumental de comunicação da televisão nos espaços dos telejornais e das novelas, utilizadas também para marketing, proliferação e divulgação de idéias. Estamos diante de um grande impasse. Já pensei muito na hipótese de o candidato solitário falar na televisão. Mas considero mais interessante a segunda hipótese aventada por V. Exª, ou seja, a de que haja um colégio de entrevistadores, selecionados com independência. Seriam representantes de vários Partidos. Numa espécie de roda-viva, os candidatos majoritários seriam sabatinados e responderiam a perguntas de várias naturezas. Assim, não haveria apenas o solilóquio de um especialista em comunicação, um intérprete de idéias que não são suas, um ator a representar um papel que não escreveu. Realmente estamos diante de grande dificuldade. Não consigo entender como burlam a legislação a ponto de fazer com que o espaço de vinte minutos destinado ao horário eleitoral na televisão seja um espaço dividido com spots. No Paraná, onde existe manifesta má-vontade do Judiciário para com meu Partido, há dois semestres perdemos os spots. Retiraram-nos do ar sem mais esta nem aquela. Na verdade, os spots, que entram no meio da programação, acabam sendo mais efetivos porque são assistidos por todos. E acaba havendo uma predisposição por parte do público, assim instruído e condicionado, a não assistir aos programas eleitorais, que são criticados nas novelas e nos jornais. Há realmente um problema que não se limita apenas à televisão, mas a todo o pacote democrático, passando também pelo financiamento das campanhas. Senador Artur da Távola, tenho muito medo dos condicionamentos que nos impomos: “Não vamos permitir imagens externas”. “Não vamos deixar que o candidato se utilize desses ou daqueles recursos”. E a tal televisão privada, ligada a interesses, empregará todos os recursos disponíveis para o bem ou para o mal.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Obrigado, Senador Roberto Requião. Concordo com V. Exª em vários pontos.

            O programa eleitoral longo, aquele de 20 a 40 minutos de duração - passível de ser dividido em dois - pode ser cansativo e aborrecido e determinar queda de audiência. Porém, se essa queda ocorrer de 60 pontos de audiência para 20 pontos, significará falar para 30 milhões de pessoas.

            Trata-se de um argumento falacioso contra o uso do horário eleitoral, exatamente para provocar o uso do spot, principal instrumento de despolitização, embora tenha um aspecto - como lembrou equilibradamente V. Exª - puramente propagandístico. .

            O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Ou propagação.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Exatamente. Menciono propaganda no sentido amplo da palavra.

            Portanto, não importa que a audiência caia. Mesmo nos países ditos evoluídos, os processos eleitorais, em que não há voto obrigatório, não atingem, às vezes, nem 50% do eleitorado. Mas interessam àquelas pessoas que librarão o debate político nas esquinas, nos sindicatos, nos colégios, nos clubes, enfim, nos locais onde a sociedade se encontra. Politizam!

            O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Serei breve, nobre Senador Artur da Távola. Eu estava pensando se, deste espaço etéreo onde subimos, é permitido algum acordo entre Oposição e Governo, chegou a hora. Pedi a palavra para manifestar a minha inteira concordância com o pronunciamento de V. Exª. Darei apenas uma pequena pitada de oposição - nem será tanta. Há cerca de um ano, escrevi um trabalho chamado Entre a mentira e o silêncio, prevendo que esta campanha não teria mensagens ou conteúdo político. Receio, por exemplo, que sejam elaborados programas em que os candidatos a Presidente da República comecem a apresentar receitas de doces, de bolos, de quitutes e de outras guloseimas, na falta da possibilidade de tornar séria a mensagem. Agradeço muito a oportunidade e concordo com o essencial do que foi dito por V. Exª.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Obrigado, Senador Lauro Campos. V. Exª fala muito bem. O que chama de doces e quitutes é o que alimenta o populismo. Impossibilitados de defender idéias num espaço de tempo reduzido, os candidatos, inevitavelmente, caem em formas de populismo. E o que é, basicamente, o populismo? É o que os outros querem ouvir, nada mais do que isso, que é, aliás, o próprio processo da televisão. Na medida em que ela é acompanhada pela chamada pesquisa do Ibope, ela está, permanentemente, medindo o que a maioria quer ouvir, quando a política é exatamente a atividade de dizer, muitas vezes, o que as pessoas devem ouvir, propostas que as pessoas necessitam conhecer.

            Vou citar um exemplo de que V. Exª fala. Os canais transmitem, além dos programas obrigatórios, os debates. Quem já participou, nesta Casa, de debate majoritário - e acredito que vários Srs. Senadores já tenham participado - sabe muito bem que o debate é um terror. São feitas perguntas, para as quais há somente dois minutos de resposta, um minuto para a réplica. O candidato, diante de problemas magnos, gravíssimos, complexos, cambiais, econômicos, nacionais, internacionais, enfim, culturais, tem que dar uma resposta em dois minutos. Ele se desespera e acaba vindo com uma fórmula.

            Assim, trata-se de um resultado também pseudodemocrático, embora ainda seja a melhor forma de os candidatos, de alguma maneira, apresentarem-se, mas não num espaço reduzido de uma hora e meia ou duas horas, em que os candidatos são obrigados a responder perguntas, com uma campainha implacável, que soa em dois minutos. Muitas vezes, um candidato qualificado, eventualmente incapaz de uma síntese em dois minutos, não responde, até porque conhece mais o problema.

            Vejam como tudo isso é uma transformação. A meu ver, a classe política tem que pensar muito seriamente nessas novas formas, que, evidentemente, não devem deixar de ser usadas, para que elas não se aprisionem nos seus mecanismos. Quando McLuhan dizia que o meio é a mensagem, ele não estava a fazer uma frase. Conforme a característica da tecnologia que divulga uma idéia, a mensagem se ajusta à tecnologia. E é da natureza da tecnologia da televisão a urgência. V. Exªs vêem nos próprios telejornais matérias internacionais ou nacionais de importância concentradas em noticiários de vinte segundos. O que se pode transmitir em vinte segundos senão clichês ou formas superficiais? Assim acontece com a política.

            Ora, a política - não tenho a solução, estou fazendo um jogo de idéias - precisa libertar-se dessas prisões, e não o contrário, como está acontecendo hoje. É só assistirmos ao noticiário para constatarmos que estamos vivendo como servos da relação mídia/pesquisa. E ela determina até candidaturas em torno de figuras de comunicação, que podem ou não corresponder àquilo que “aparece” ou como “aparece” na mídia. O País já teve exemplos disso na Presidência da República.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Senador Artur da Távola, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Felicito V. Exª por abordar este assunto, a respeito do que tentei dizer algo na sexta-feira. V. Exª, com a sua autoridade, competência e capacidade, como profundo conhecedor dos meios de comunicação, com muito mais profundidade, está abordando-o neste momento. Solidarizo-me integralmente com V. Exª. Penso que V. Exª conseguiu colocar os pontos nos “is” e esclarecer devidamente a matéria. Tenho dito, meu querido Líder, que, se analisarmos tudo o que se fala sobre corrupção na política brasileira, veremos que ela começa na campanha eleitoral. É aí que vamos ver as bandalheiras começarem.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - V. Exª falou isso sexta-feira.

            O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - E, muitas vezes, não são nem bandalheiras. O coitado do prefeito, um homem de bem, um homem sério, está em campanha, assumem compromissos em seu nome e, depois, quando é preciso fazer uma licitação, vem um outro e diz: “Não, temos compromisso com essa empresa, porque ela nos deu tanto para a campanha!” Ele quer fazer uma licitação para a coleta do lixo, mas lhe dizem: “Não, temos o compromisso com aquela empresa, porque foi ela que nos ajudou na campanha!” Então, o início da corrupção está na campanha política. Por isso, defendo, com paixão, a tese alemã do dinheiro público na campanha. Essa é a primeira tese. A segunda tese, Senador, é: se analisarmos os gastos de campanha, verificaremos que 80% deles são com programas de televisão, que é gratuito. Mas para montar um programa de televisão gasta-se o grosso da campanha eleitoral. Por quê? Porque eles contratam os profissionais mais competentes, os mais capazes, a fim de superar as novelas da Globo e fazer qualquer coisa de espetacular. E conseguem fazer! Ultimamente, os programas de televisão dos partidos políticos são grandes produções. O do PT é bonito, porque o Sr. Duda Mendonça conseguiu dar uma feição simpática, sentimental, romântica ao PT. Aparece uma criança e o locutor diz: Se você sente comoção olhando para essa criança, você já é um pouco PT. Mas o dinheiro da campanha não é para ser gasto assim, na propaganda eleitoral. Quando criamos os espaços gratuitos, que foi uma das últimas leis do Presidente João Goulart - naquela época, era uma hora: meia hora para o MDB e meia hora para a Arena, embora a Arena fosse muito maior do que o MDB -, tinha que aparecer o candidato falando. O candidato falando expõe o seu pensamento, expõe a sua idéia. Ele diz o que é, mostra a sua cara. O que fizeram com o Pitta foi esconder a cara dele. O povo de São Paulo votou em uma figura fantástica: um negro vitorioso, capaz, competente, sério, dinâmico, extraordinário, um super-homem, que tinha revolucionado as finanças de São Paulo. Votaram nesse homem. E quando ganhou, viu-se que era um coitado. Um funcionário subalterno, que estava nas empresas do Maluf e que foi levado para a Secretaria da Fazenda, que não era o seu metiê. V. Exª foi muito mais profundo. O que estamos vendo hoje é a mídia e as empresas de pesquisas querendo, pela primeira vez no Brasil, dizer quem são os candidatos dos partidos. Até a eleição passada isso não acontecia. O PSDB se reunia e escolhia seu candidato, assim como o PDT e todos os outros Partidos. Escolhidos os candidatos, contratavam uma empresa de publicidade para fazer sua propaganda eleitoral. Agora, não. Agora, a mídia, as empresas de publicidade e as empresas que fazem o levantamento de pesquisa querem dizer quem é o candidato. No caso da aliança PMDB, PSDB e PFL, escolhem a Srª Governadora do Maranhão. Em outro partido, escolhem fulano. Só não fazem com o PT porque há o interesse, embora eles possam se enganar, de que o Lula seja o candidato, porque acham que ele é um candidato que perde no segundo turno. Nos demais, eles levantam, baixam. O Sr. Ciro era um candidato que, no início, tinha a mídia toda a seu lado, com páginas e mais páginas, e ele estava feliz da vida. Agora, quando parece que a mídia descobriu a candidata Roseana, ele está acusando: “Denuncio que os números da pesquisa são um absurdo, estão caindo, isso é fórmula feita”. Isso era antes, quando ele ganhava, ou agora, quando ele está perdendo? Portanto, creio que, se não tomarmos providência, se não fizermos alguma coisa, sinceramente, não sei aonde vamos chegar. E concordo com V. Exª: no parlamentarismo não teríamos isso, porque nenhum duda mendonça, nenhum nizan guanaes poderia fazer propaganda do Primeiro-Ministro. Eles teriam que fazer propaganda de todos os Parlamentares, porque dependeria da decisão da maioria do Congresso a escolha do Primeiro-Ministro. Então, esse individualismo, esse endeusamento, essa invenção em torno de um nome não existiria. Mas, lamentavelmente, no presidencialismo existe. Quando digo que a propaganda teria que ser ao vivo, isso não significa que ele tenha que falar ao vivo, ele pode gravar, mas ele deve aparecer falando. Com toda sinceridade, meu querido Líder, acho que o dinheiro público na campanha e as propagandas são as duas grandes saídas pelas quais devemos caminhar.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Muito obrigado, Senador. Concordo com V. Exª e até lembro que o meu Partido, no momento, passa por um outro efeito desse, citado por V. Exª. Os meios de pesquisa e a mídia estão querendo que o nosso Partido decida agora a escolha de seu candidato, quando tem dois candidatos para passar por um processo de escolha. Ele está sendo compelido a fazer isso agora, para facilitar as pesquisas, os programas de televisão.

            Solidarizo-me com V. Exª pelo seu discurso de sexta-feira, belíssimo, aliás, quando diz do absurdo que é o nome de V. Exª não estar nas pesquisas. V Exª é candidato pelo PMDB há mais tempo, tem uma história política neste País, tem que ter o seu nome na pesquisa. Tem que ter pesquisa com o seu nome e o do ex-Presidente Itamar Franco, mas o que não pode é tirar o nome de V. Exª, porque isso significa escoimar uma candidatura legítima da possibilidade de se apresentar, o que também é muito grave.

            O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - O meu aparte será breve e é apenas para dizer que o que V. Exª propõe é um aperfeiçoamento da lei, com que estamos todos absolutamente de acordo. Porém não sei de candidato algum, tenha sido ele eleito ou não, que não tivesse se servido dessa mesma lei, com os mesmos procedimentos. A proposta de V. Exª, a sugestão, que já não valerá para o próximo ano, e sim para eleição posterior, creio ser inteiramente válida e conte com a minha solidariedade.

            O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Muito obrigado, Senador.

            Estou apenas procurando alertar um pouco a classe política, as pessoas que acompanham a política no sentido de que não aceitemos que o grau de despolitização da vida brasileira, que já é tão elevado, seja também conduzido por um facilitário, no qual a classe política entra supondo ser melhor sob o ponto de vista eleitoral.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

            Agradeço pela atenção.


            Modelo112/2/249:12



Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/11/2001 - Página 29562