Discurso durante a 163ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise retrospectiva do movimento grevista dos professores universitários.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • Análise retrospectiva do movimento grevista dos professores universitários.
Aparteantes
Bello Parga.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/2001 - Página 29621
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, CUSTO, GREVE, UNIVERSIDADE, ESTUDANTE, POPULAÇÃO, RESPONSABILIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • ANALISE, INJUSTIÇA, POLITICA SALARIAL, UNIVERSIDADE FEDERAL, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, PROFESSOR, DETALHAMENTO, NEGOCIAÇÃO, GREVE.
  • SOLICITAÇÃO, CONGRESSISTA, LIDERANÇA, APOIO, PROPOSTA, PROFESSOR UNIVERSITARIO, POSSIBILIDADE, CONCLUSÃO, GREVE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, neste momento, chamar a atenção especialmente dos Líderes partidários nesta Casa e daqueles, incluindo o Senador Ricardo Santos, que estão representando a Comissão de Educação do Senado Federal nas negociações entre o Governo e os professores universitários do Brasil na busca de uma solução para pôr fim à greve das nossas universidades públicas.

            Às vezes, Sr. Presidente, tenho a impressão de que a insensatez e a indiferença, diante do mal que essa greve tem causado a todo o povo brasileiro, especialmente aos universitários, dominam o Governo. Imaginem V. Exªs mais de quinhentos mil estudantes, incluindo aqueles que fazem o 2º Grau pelas universidades, sem aula há cem dias! Imaginem a situação aflitiva em que se encontram esses estudantes no Brasil inteiro! Imaginem a situação de milhares de pais que deslocam seus filhos de cidades do interior, que deslocam seu filhos de um Estado para outro, para que eles freqüentem a universidade, para que eles se formem, para que eles tenham um curso superior, a fim de terem melhores oportunidades na vida! Isso gera um custo para as famílias: o custo da pensão, o custo da manutenção do estudante. Enfim, trata-se de um sacrifício enorme para todos aqueles que almejam concluir um curso universitário.

            Imaginem o sacrifício dessa gente no período das férias, época em que os pais poderiam economizar recursos, época em que os filhos deveriam voltar ao convívio dos pais! Se for solucionada a questão da greve, provavelmente esses estudantes, nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, freqüentarão seus cursos nas cidades em que estudam, afastados dos seus pais. No mês de julho do ano seguinte, provavelmente acontecerá a mesma coisa.

            E tudo isso acontecerá por quê? Às vezes, a maioria de nós, Parlamentares, acompanha superficialmente os fatos, porque todos nós temos muitas tarefas, temos inúmeras coisas para estudar, para definir. Nós, Senadores, bem como os Deputados, temos de nos posicionar a respeito de várias matérias, mas não analisamos minuciosamente as situações que nos aparecem.

            Quero, Sr. Presidente, neste pronunciamento, descer às minúcias da razão dessa greve e mostrar que há uma absoluta irracionalidade na maneira de agir do Presidente Fernando Henrique Cardoso, do Ministro Paulo Renato e até das lideranças políticas do Congresso Nacional.

            A questão das universidades públicas brasileiras já vem de muito tempo. Basicamente desde que o Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu o Governo, o aumento do salário dos professores é extremamente insignificante. E, durante praticamente todos os anos do seu Governo, houve greves nas universidades públicas e prejuízos às próprias universidades e, especialmente, aos alunos.

            O Presidente da República sempre se manteve irredutível no processo de atender à reivindicação dos professores e até mesmo dos funcionários das universidades. E, durante muitos anos, Sua Excelência conseguiu, depois de um longo período de greve, fazer com que os professores retornassem às suas atividades quase sem ganho algum.

            De 1988 para 1999, o Governo não queria admitir reajuste salarial. E se passaram quase sete anos de Governo sem aumento salarial, num período em que a inflação já atingiu quase 90%. Em 1998, o Governo, para não conceder o aumento salarial, criou a chamada Gratificação de Estímulo à Docência - GED. Essa gratificação não foi evidentemente justa, pois foi concedida basicamente aos professores das universidades e não atingiu os professores que ensinam em escolas de segundo grau vinculadas às universidades públicas brasileiras, assim como os professores das antigas escolas técnicas e das escolas agrícolas federais, espalhadas por todo o Brasil e que estão sob a responsabilidade do Governo. Portanto, essa GED apenas amenizou a situação de um determinado número de professores.

            Neste ano, exatamente no dia 22 de agosto, iniciou-se a greve nas universidades públicas brasileiras. Em junho, a Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior - Andes - já havia apresentado uma pauta de reivindicações ao Ministro Paulo Renato. Entre as inúmeras reivindicações, como melhoria das condições de ensino e mais investimentos nas universidades, destacarei aquela que realmente provoca um grande problema para o Governo Fernando Henrique: a questão financeira.

            A reivindicação inicial dos professores universitários era a seguinte: que as duas gratificações já existentes - a Gratificação de Atividade Executiva (GAE), que representa dois terços do salário-base, e a Gratificação de Estímulo à Docência (GED), criada em decorrência da greve de 1998 - fossem incorporadas ao salário. Esta era a reivindicação no início da greve, em 22 de agosto: transformar em salário essas duas gratificações. Além disso, também reivindicavam um aumento de 63,68%, evidentemente descontando a própria GED e o aumento de 28% concedido pela Justiça.

            O Governo não quis negociar nem aceitar nenhuma condição apresentada pelos professores. E essa greve foi uma das mais consistentes havidas ao longo dos últimos sete anos. Foi uma greve que se sustentou, e alguns representantes no Congresso Nacional começaram a se manifestar a favor dela, apresentando uma proposta para que o Governo reabrisse a negociação e para que até mesmo que o Presidente da República recebesse os professores universitários para intermediar a negociação.

            Depois de um longo processo de negociação, chegou-se a um acordo, que quase foi assinado, nos seguintes termos: o Ministro Paulo Renato - portanto, o Governo Fernando Henrique - aceitaria incorporar a GAE ao salário. Com isso, os professores seriam beneficiados no futuro, ao receberem o qüinqüênio que seria calculado sobre o total do salário, incluindo a Gratificação de Atividade Executiva. O Governo também aceitou que a GED fosse estendida aos professores das escolas técnicas federais, das escolas agrícolas e das escolas de ensino médio que estão sob a responsabilidade das universidades públicas. Todos os professores passariam a receber essa Gratificação de Estímulo à Docência. Seria suprimida a Gratificação de Incentivo à Docência - GID, concedida a esses professores do ensino médio que tem a mesma graduação dos professores universitários. A GID, que é uma gratificação de menor valor, seria extinta e substituída pela GED. Todos os professores passariam a receber a GED: os professores em atividade a receberiam integralmente, e os professores aposentados receberiam 60% dessa gratificação. A novidade seria a inclusão dos professores das escolas de ensino médio comandadas pelas universidades públicas.

            Os professores mais graduados praticamente não teriam nenhum ganho com essa negociação; ganhariam apenas o aumento de 3,5% proposto pelo Governo e, futuramente, os qüinqüênios que seriam aumentados sobre o total de seu salário. Haveria, portanto, uma redistribuição dos recursos, uma distribuição mais justa do salário dos professores, e não mais essa proposta linear do Governo.

            Entendo que a proposta da Andes faz justiça inclusive àqueles que ganham menos e principalmente aos aposentados desse sistema de ensino brasileiro.

            Foi feito o entendimento, na presença do Ministro, e os termos do acordo foram encaminhados para preparação, a fim de que todos assinassem. Esse acordo envolvia um custo adicional da ordem de R$350 milhões ao ano. Desse valor, o MEC se disporia a participar com R$150 milhões por meio de alterações no destino de verbas de seus programas, e o Poder Executivo e o Congresso Nacional se responsabilizariam pelos R$200 milhões restantes.

            Surpreendentemente, no fim do dia da reunião, todos os Líderes do Congresso concordaram com a decisão, exceto o Líder do Governo na Câmara dos Deputados, Deputado Arnaldo Madeira - não se sabe falando em nome de quem, não se sabe se recebeu um recado indireto do Presidente Fernando Henrique, não se sabe se teve a intenção de prejudicar a candidatura de Paulo Renato, não se sabe de que lado está o Sr. Arnaldo Madeira -, que impediu a realização do acordo e, conseqüentemente, impediu que a greve fosse encerrada.

            A partir daí, criou-se um impasse. O Congresso chegou a admitir a possibilidade de arrumar mais R$100 milhões, totalizando R$250 milhões. Dessa forma, ficariam faltando R$100 milhões. De repente o Ministro Paulo Renato desfaz toda a negociação que havia sido feita, todo o entendimento que havia sido acordado, e diz o seguinte: “Não há mais negociação. Vou mandar um projeto de lei ao Congresso Nacional”. O Ministro Paulo Renato propôs que nenhuma gratificação fosse agregada ao salário. S. Exª propôs um aumento da ordem de 34% sobre a GED - Gratificação de Estímulo à Docência -, criada em 1998, para vigorar em 1999.

            Portanto, o que o Ministro propõe, o que o seu projeto que está tramitando no Congresso Nacional propõe é algo absolutamente injusto, é um aumento linear. Os que ganham mais continuarão ganhando mais; os que ganham menos terão um aumento insignificante. Os professores do Ensino Médio das escolas técnicas e das escolas agrícolas não terão direito à GED, continuarão com a GID, que é uma gratificação menor, para esse setor; e os aposentados continuarão sem receber essa gratificação.

            Ora, entendo que os professores, mais uma vez, estão abrindo mão dos seus direitos; entendo que os professores estão sendo absolutamente condescendentes, pacíficos ao aceitar algo que é incompreensível.

            Não dá para engolir, não dá para aceitar que o Governo Fernando Henrique Cardos tenha deixado as universidades públicas brasileiras paradas por cem dias por causa de R$350 milhões que serão gastos no ano que vem. Não dá para compreender isso na discussão de um Orçamento em que se prevêem R$141 bilhões -- R$141 bilhões! -- para o serviço da dívida pública do Governo. Cento e quarenta e um bilhões de reais significam 420 vezes mais do que os R$350 milhões pelos quais as nossas universidades ficaram paralisadas por cem dias. Cento e quarenta e um bilhões de reais significam R$12 bilhões/mês; significam aproximadamente R$450 milhões/dia.

            A quantia que o Governo Fernando Henrique está gastando em um dia para pagar os juros da dívida pública brasileira daria para resolver o problema dos professores universitários do Brasil em um ano, e não teríamos as nossas universidades paralisadas por cem dias.

            Senador Bello Parga, em um dia, o Governo brasileiro gasta R$450 milhões. Em um único dia do ano! São 365 dias/ano, e ele brigou tanto para chegarmos aonde chegamos.

            O Sr. Bello Parga (PFL - MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Um instante, Senador. Já concederei um aparte a V. Exª.

            Os professores universitários, no meu entendimento, são absolutamente pacíficos, são absolutamente condescendentes com essa política e fizeram uma contraproposta que deverá ser discutida hoje. A contraproposta dos professores, Senador Bello Parga, envolve o mesmo montante de recursos - ou menos até - do que o que foi aceito no acordo em que o Ministro havia entendido o assunto. Os professores recuaram na posição de que as gratificações fossem incorporadas ao salário. Recuaram! É inacreditável, mas recuaram. Os professores desejam que a GED, essa gratificação especial que foi criada pelo Governo para não conceder aumento e para que não fosse estendida aos aposentados, seja dada aos professores que ensinam nas escolas de 2º Grau comandadas pela universidade, seja dada às nossas escolas técnicas, seja dada às nossas escolas agrícolas; que os aposentados dessas escolas passem a receber 60% da GED; e que se acabe com a GID, que é uma gratificação menor concedida aos ativos dessas escolas.

            Portanto, os professores não estão ganhando quase nada. Eles estão propondo uma média de aumento - prestem bem atenção: uma média de aumento - de 14,5% sobre o salário-base dos professores.

            O SR. PRESIDENTE (Carlos Wilson) - Senador Ademir Andrade, infelizmente a Mesa tem que comunicar a V. Exª que o seu tempo está esgotado e que há muitos Colegas inscritos. Sei que V. Exª vai concluir e colaborar com a Mesa.

            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Já vou concluir, Sr. Presidente, peço-lhe apenas mais dois minutos, por obséquio.

            O SR. PRESIDENTE (Carlos Wilson) - Sei que V. Exª vai colaborar com a Mesa e concluir o seu pronunciamento.

            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - O que os professores estão propondo é algo muito mais justo: concede-se um aumento menor para quem ganha mais e um aumento maior para quem ganha menos; e os recursos são os mesmos. Eles não querem um centavo a mais do que aquilo que foi acertado, o que já considero um absurdo, mas é assim que os professores estão negociando.

            Lamento que o Presidente Fernando Henrique Cardoso se negue a conversar com os professores; lamento que o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Paulo Renato tenham desacatado o Poder Judiciário ao fazer essa manipulação, essa artimanha, para que a determinação judicial fosse dirigida ao Presidente e não ao Ministro. Lamento! Lamento profundamente que um Presidente da República não enxergue o mal que está fazendo ao País, o mal de permitir que as nossas universidades fiquem paralisadas por tanto tempo - cem dias! - por causa de uma quantidade de recursos que o Governo gastará em um ano, a partir do ano que vem, que é menor do que o que ele gasta em um dia com o serviço da dívida pública brasileira. Lamento profundamente que tenhamos no Brasil um Presidente dessa espécie, um Presidente que não tem espírito democrático, que não conversa com o povo. 

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, espero que, mais do que o Presidente, o Congresso Nacional assuma a sua responsabilidade nesta hora e que suas Lideranças acatem as propostas dos professores da Andes, para que possamos, dentro do menor espaço de tempo possível, viabilizar o funcionamento das universidades.

            Creio que os professores cederam muito mais do que poderiam, talvez porque o próprio povo não tenha compreensão dos detalhes dessa questão e talvez até porque muitos de nós, do Congresso Nacional, não percebamos a fundo as dificuldades que eles estão enfrentando.

            Concluo, Sr. Presidente, dizendo que existem hoje 4.500 professores universitários cujo salário-base é menor do que o salário mínimo de R$180.

            O SR. PRESIDENTE (Carlos Wilson) - Senador Ademir Andrade, V. Exª pediu dois minutos mais, e a Mesa mostra no painel que já foram ultrapassados quatro minutos. Além disso, há outros Colegas inscritos.

            Sei que o discurso de V. Exª é interessante, e o País inteiro o está acompanhando, mas outros Senadores também gostariam de usar da palavra.

            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Concluo, pedindo que os Congressistas, principalmente as Lideranças da Câmara e do Senado, assumam a responsabilidade que lamentavelmente o Presidente Fernando Henrique Cardoso não quis assumir. Coloco sobre Sua Excelência a total responsabilidade pela perda de mais de cem dias de aula dos 500 mil estudantes brasileiros nas universidades públicas.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


            Modelo14/29/248:07



Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/2001 - Página 29621