Discurso durante a 168ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Inconveniência da construção de usina termelétrica movida à carvão no município de Itaguaí, no Estado do Rio de Janeiro.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. ENERGIA ELETRICA.:
  • Inconveniência da construção de usina termelétrica movida à carvão no município de Itaguaí, no Estado do Rio de Janeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2001 - Página 30271
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. ENERGIA ELETRICA.
Indexação
  • DENUNCIA, CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE, HABITANTE, MUNICIPIO, ITAGUAI (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CONSTRUÇÃO, USINA TERMOELETRICA, SOLUÇÃO, CRISE, SISTEMA ELETRICO.
  • CRITICA, EFEITO, CONSTRUÇÃO, CUSTO, USINA TERMOELETRICA, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, ECONOMIA, PESCA, AGRICULTURA, RISCOS, ACIDENTES, COMPROMETIMENTO, REGIÃO, POLUIÇÃO, BENEFICIO, EMPREITEIRO, EMPRESA CARBONIFERA, EMPRESARIO, RELACIONAMENTO, PROJETO.
  • COMENTARIO, OPOSIÇÃO, SINDICATO, MOVIMENTO ESTUDANTIL, IGREJA CATOLICA, IGREJA EVANGELICA, CONSTRUÇÃO, USINA TERMOELETRICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • SOLICITAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, POPULAÇÃO, OPOSIÇÃO, CONSTRUÇÃO, USINA TERMOELETRICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Estado do Rio de Janeiro tem sofrido muitas agressões em relação à sua qualidade de vida, devido à poluição ambiental, além da violência urbana e outras coisas mais. Muitas das praias da nossa baía de Guanabara, que recebe diariamente uma carga muito grande de dejetos industriais, esgoto in natura, enfim, uma série de coisas indesejáveis, ficam impossibilitadas de serem utilizadas em função da poluição.

            Porém, *quero daqui denunciar a agressão contra o meio ambiente e os habitantes do Município de Itaguaí/RJ, que significará a construção de uma usina termelétrica movida a carvão naquela área. Trata-se de um investimento de US$830 milhões em uma tecnologia obsoleta, ao qual está associado a estatal Eletrobrás, a partir da criação de um consórcio que formará a política de preços da energia elétrica para inúmeros consumidores.

            Essa discussão nos remete à crise do sistema energético brasileiro, do modelo energético adotado no País e, também, das alternativas a serem construídas. Mas não se pode admitir, Sr. Presidente, alternativa ou modelo que desconheça ou prejudique a qualidade de vida do cidadão e a preservação do meio ambiente. Neste caso específico, da construção de uma usina termelétrica movida a carvão, não há explicação razoável do ponto vista econômico que sustente uma defesa, com o agravante de colocar em risco e ecossistema de toda uma região.

            Do ponto de vista ambiental, esse empreendimento não interessa aos habitantes, pois afeta diretamente a sua qualidade de vida, e, do ponto de vista econômico, é prejudicial ao Município, pois os efeitos poluentes decorrentes dessa usina afetarão diretamente pescadores e agricultores.

            Sr. Presidente, a crise energética do País evidencia uma crise do modelo e, por isso, colocam-se discussões novas sobre novas matrizes, mas ela se dá também principalmente pela política do Governo Federal para o setor, o qual fez a opção pela privatização.

            Não devemos permitir que espertalhões e oportunistas tirem proveito da situação. Portanto, não podemos permitir que nos empurrem um projeto inadequado de usina, repudiado mundo afora e aqui mesmo no Brasil, em plebiscitos realizados em dois Municípios paranaenses, Pontal do Paraná e Paranaguá. Está claro que, se a população for suficientemente bem-informada sobre projetos dessa natureza, tendo a oportunidade de opinar, será contrária a ele.

            Se observarmos os contras, todos ligados à qualidade de vida dos habitantes e do meio ambiente da região, percebe-se que a razão de ser desse empreendimento é a sanha em obter recursos do setor de energia a partir da associação entre a Eletrobrás, empresa estatal, e a empresa paranaense Inepar Energia e a Enelpower, italiana. E essa não é uma solução séria para a crise.

            Além do mais, por que construir uma usina poluidora na contramão das intenções aprovadas, diga-se de passagem, com o apoio da delegação brasileira na Convenção Internacional sobre o Clima, que resultou no Protocolo de Kyoto? Por que uma usina a carvão, que terá de ser importado? Por que escolheram uma área que combina um rico ecossistema com a proximidade de áreas densamente povoadas? E mais, quem será beneficiado com esses contratos?

            Certamente, não será a população do Município de Itaguaí, nem de grande parte do litoral, da Serra do Mar e das cidades de Mangaratiba, Angra dos Reis, Rio de Janeiro (em particular na região de Sepetiba), Seropédica, Paracambi, Rio Claro e Nova Iguaçu, que sofrerão as conseqüências caso essa agressão ambiental se consume.

            O setor elétrico não será o grande beneficiado e poderá obter melhores resultados, aproveitando esses pequenos recursos da água, utilizando energia eólica, solar ou mesmo do recurso ao gás natural, que temos em abundância e é menos poluente. Não será beneficiado o Erário Público, que alocará divisas por intermédio da estatal. Nem será a balança comercial, que deverá ser onerada com a importação do carvão. Também não será a economia popular que estará sujeita à política de preços das empresas privadas associadas ao investimento.

            Além disso, perde também a economia local, pois, se a construção da termoelétrica e das obras de infra-estrutura podem gerar 4 mil empregos temporários, em sua grande maioria, serão trazidos de fora para empreiteiras e, depois de construída, oferecerá apenas cerca de cem vagas, com níveis diversos de especialização. E vale repetir que os setores agrícola, pesqueiro e ecoturístico da região serão afetados.

            Como ocorre em todos os grandes contratos neste País irão se beneficiar os que controlam os recursos envolvidos no projeto, os empreiteiros que o construirão, os agenciadores da mão-de-obra e as companhias de frete marítimo de carga, os importadores de carvão. E o consórcio de empresas que receberá as tarifas, após a pretendida realização e conclusão das obras e o funcionamento das usinas.

            Os habitantes e o ecossistema daquela região, aliás, muito próxima da cidade do Rio de Janeiro, receberão todos os anos os impactos de cerca de 320 mil toneladas de cinzas, que irão diretamente para o ar; 100 mil toneladas de cinzas pesadas e quase 500 mil toneladas de lama. Sem contar com o risco de acidentes ambientais, muito comuns em nosso País.

            Estudo da Coppe/UFRJ sobre os Impactos Ambientais da Usina Termoelétrica a Carvão revela que serão lançados, por dia, cerca de 120 toneladas de óxido de enxofre, e 5 toneladas de particulados e outros poluentes.

            Sr. Presidente, para produzir 10 mil gigawatts, por ano, essa usina, se for construída, consumirá 3,5 milhões de toneladas de carvão importado, 23 mil toneladas de calcário, anualmente, e 2,8 milhões de litros de água doce por hora.

              O projeto é de uma usina de grande porte, com custo de US$ 830 milhões. Pretende uma potência instalada de 1.320 megawatts e um funcionamento regular de 1.250 megawatts. Seu prazo de construção é superior a quatro anos, o que faz da construção da usina uma opção desvinculada da solução dos atuais problemas energéticos do País.

              Nesse prazo, recursos destinados a novas linhas de transmissão, medidas de combate ao desperdício e maior eficiência em nossos projetos hidrelétricos, termelétricas a gás natural, bagaço de cana, plantas eólicas e outras podem oferecer maior capacidade de geração e atendimento da demanda de energia elétrica.

            Além disso, o sistema proposto não utiliza as melhores tecnologias disponíveis e, como termelétrica de grande porte, irá trabalhar na base do sistema e não na sua complementação, a um custo mais elevado que a geração hidráulica, hoje predominante no Brasil.

            Sr. Presidente, se o mesmo projeto fosse apresentado na Itália, não seria aprovado, dado o seu impacto ambiental. O equipamento da empresa italiana Enelpower, que será importado para o Brasil, está fabricado e estocado naquele país há anos.

            E quero denunciar outro absurdo, Sr. Presidente, que o Estudo de Impacto Ambiental da usina não apresenta a carga total de lançamento de poluentes e desconsidera os riscos de chuva ácida na região. Questões sérias como as emissões totais de dióxido de carbono não são tratadas, além do impacto cumulativo dos empreendimentos na região e o agravamento de problemas já existentes, como o de captação de água doce.

            Poderosos interesses movimentam-se para tornar irreversível a implantação da termelétrica. Escaldados pela recusa ao projeto da usina, feita por plebiscito pela população dos dois Municípios paranaenses, conseguiram alterar dia 7 de agosto do corrente ano, por 17 votos a 2, o art. 305 da Lei Orgânica do Município de Itaguaí. Nele era exigida a aprovação por plebiscito, convocado pelo Poder Legislativo ou por 5% do eleitorado, nos termos do art. 14 da Constituição Federal, de qualquer atividade que pudesse significar alteração do meio ambiente.

            A supressão desse direito democrático se deu após o parecer do Ministério Público sobre a análise técnica do EIA/RIMA, referente à implantação da usina, e o relatório da audiência pública realizada em Itaguaí, dia 11 de maio. Doze pontos obscuros e não esclarecidos foram apontados pelos peritos técnicos do órgão.

            O comparecimento da Feema à nova audiência pública no Município foi recusado. Mas, com o apoio das Pastorais Sociais da Igreja Católica de Itaguaí, da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, da Igreja Nova Vida de Itaguaí, do Sepe (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), SindiPetro, MOP, Apedema e do Movimento Estudantil de Itaguaí, a Comissão de Meio Ambiente da Alerj, presidida pelo Deputado Estadual do PT Carlos Minc, aprovou a realização de uma audiência pública na Assembléia Legislativa, no dia 7 de dezembro.

            Sr. Presidente, o esclarecimento público do crime econômico e ambiental que está para ser cometido será instrumento de fundamental importância para que a sociedade se mobilize e barre a construção da termelétrica a carvão. Essa luta é um passo decisivo para a discussão sobre uma matriz energética que vise o desenvolvimento humano integrado e que seja justa do ponto de vista social, econômico e ecológico, que só será possível no nosso País com um governo democrático e popular.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


            Modelo112/1/241:55



Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2001 - Página 30271