Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a decisão do TSE a respeito das coligações para as eleições deste ano, insistindo para que a Câmara dos Deputados se posicione em relação à emenda constitucional apresentada no Senado, que visa dirimir a questão. (Como Líder)

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Comentários sobre a decisão do TSE a respeito das coligações para as eleições deste ano, insistindo para que a Câmara dos Deputados se posicione em relação à emenda constitucional apresentada no Senado, que visa dirimir a questão. (Como Líder)
Aparteantes
José Fogaça, Roberto Freire, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 01/03/2002 - Página 1250
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), CONSOLIDAÇÃO, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, AMBITO NACIONAL, POSSIBILIDADE, PARTIDO POLITICO, IRREGULARIDADE, FORMAÇÃO, COLIGAÇÃO, AMBITO ESTADUAL.
  • APOIO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, TRANSFERENCIA, CONGRESSO NACIONAL, PODER, DECISÃO, CONSOLIDAÇÃO, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, AMBITO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, SENADO, CONSULTA, CAMARA DOS DEPUTADOS, EXISTENCIA, VONTADE, URGENCIA, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, MOTIVO, PROXIMIDADE, ELEIÇÕES.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECLARAÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), INICIATIVA, REFORMA POLITICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, na reunião de ontem, fez uma análise bastante ponderada, desapaixonada, sem levar em consideração interesses partidários e sem fazer contas aritméticas para verificar quem era mais ou menos beneficiado ou prejudicado nos Estados. Fez tudo isso para tomar uma posição a respeito da decisão do Tribunal Superior Eleitoral. Atualmente, esse é o grande assunto político no Brasil, que, com certeza, em virtude das grandes repercussões, terá conseqüências no pleito de outubro deste ano.

            Os membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, na sua totalidade, entenderam que a posição deveria partir do Senado Federal, do Congresso Nacional, como instituição, para despartidarizar a discussão e retirá-la dos caminhos mesquinhos dos interesses localizados.

            No início, a proposta apresentada por mim era no sentido de a Mesa do Senado, consoante sua competência constitucional, apresentar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal contra essa decisão do Tribunal Superior Eleitoral. Os debates prolongaram-se. O Senador José Fogaça, em sua proposição, de forma correta, apontou que a Ação Direta de Inconstitucionalidade, embora pudesse vir a ser interposta pela Mesa do Senado Federal ou por qualquer Partido político, deixava nas mãos do Poder Judiciário a palavra final a respeito deste assunto. Entende S. Exª que o único remédio realmente eficaz para a resolução do problema seria a elaboração de uma proposta de emenda constitucional. A partir da intervenção do Senador José Fogaça, todos os Senadores da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania convergiram para esse entendimento, criando-se uma Comissão para elaborar uma proposta. Tal proposição foi apresentada ontem, entregue à Mesa do Senado Federal, com mais de 50 assinaturas. Todos os Líderes presentes na reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e também no Plenário acenavam com a necessidade e a possibilidade de que o Senado Federal propiciasse a agilidade necessária para a tramitação dessa emenda constitucional, a exemplo do que fez em outras ocasiões; e eu cito como exemplo a votação, em uma semana, no fim do ano passado, de uma emenda constitucional que limitava o conceito de imunidade parlamentar.

            A emenda foi apresentada, e marcou-se para hoje uma reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania para votá-la. O fato é que hoje o noticiário dos jornais mostra que há um posicionamento diferente por parte de lideranças formais e também não-formais, mas importantes, de diversos partidos na Câmara dos Deputados.

            Alguns dizem que não dá tempo; outros, que a emenda constitucional seria um casuísmo; e há os que não conseguem disfarçar a satisfação com a resolução do TSE, por resolver problemas regionais ou de interesses de candidatura à Presidência da República, utilizando-se dos mais diversos argumentos para detonar a proposta.

            Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, hoje, ponderei sobre a necessidade de uma reunião, semana que vem, dos diversos líderes partidários no Senado e na Câmara, para deixar muito bem explicitada a vontade política do Congresso Nacional; para esclarecer se há ou não vontade política por parte do Congresso Nacional no sentido de que a decisão e a palavra final sobre a questão de coligação fique em suas mãos ou se será remetida ao Poder Judiciário.

            O fato é que, se não ficar demonstrada a vontade política por parte das lideranças na Câmara dos Deputados, não adiantará o Senado votar essa PEC em regime de urgência, porque o processo de tramitação de uma emenda constitucional na Câmara é ainda mais demorado que no Senado. Naquela Casa, a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação vota a admissibilidade da proposta e, a seguir, instala-se uma comissão especial para a sua tramitação, abrindo-se um prazo de dez sessões para a apresentação de emendas e mais um prazo de várias sessões para a votação na comissão. Entendo, portanto, ser fundamental o esclarecimento da questão.

            O debate que deveria nortear o tema não deveria ser a quem favorece ou desfavorece a medida do Tribunal, nem as contas que estão sendo feitas nesses momentos pelos diversos partidos em todos os Estados para verificar se a emenda é correta ou não.

            O debate que deveria nortear o tema, e que, infelizmente, parece estar permeando todos os partidos em função de interesses localizados, é se entendemos que o fortalecimento dos partidos políticos brasileiros será feito a partir de uma tutela do Tribunal Superior Eleitoral.

            Quero aqui abrir um parêntese para lamentar uma declaração do Presidente da República no exterior. O nosso Presidente é uma pessoa muito inteligente e faz declarações brilhantes, independentemente de concordarmos ou não com elas, mas sempre que vai ao exterior diz uma bobagem. Ele disse que o Tribunal Superior Eleitoral iniciou uma reforma política. Como se fosse tarefa do TSE fazer reforma política no País; como se fosse justificativa plausível o Congresso Nacional não ter feito a reforma política e isso significasse uma autorização para que o Tribunal a fizesse. Aliás, surpreende-me que o Ministro Nelson Jobim, que quando Deputado criticava a Oposição dizendo que essa, sempre que recorria aos tribunais, tentava jurisdicionar a política, após deixar o Parlamento e ocupar o cargo de Ministro do Tribunal, seja o primeiro a defender que a política seja jurisdicionada.

            O que deveria estar norteando essa discussão é a constatação de que a decisão do Tribunal Superior Eleitoral fortalecerá os partidos políticos, que esse discurso é uma falácia. Mesmo abstraindo aquilo a que me referi anteriormente de que o fortalecimento não pode se dar a partir de um ato de tutela do Tribunal Superior Eleitoral, o fato é que, mesmo com essa tutela, a decisão não significará fortalecimento de partido político. Ao contrário, incentivará o comércio de legendas e a figura espúria do candidato laranja aqui ou acolá, estabelecendo uma situação em que os partidos políticos que não possuam candidato a presidente da República serão incentivados a não fazer coligação na eleição nacional e ficarem livres para fazer coligações em seus Estados. Na verdade, essa resolução que está sendo apresentada erradamente como um fortalecimento dos partidos políticos vai contribuir para esse ainda maior esfacelamento.

            Alguns dizem, inclusive meu próprio companheiro de partido Walter Pinheiro, que a emenda constitucional seria um casuísmo. Ora, casuísmo é se introduzirem regras diferentes daquelas que já estavam sendo conhecidas e acatadas por todos num tempo inferior a um ano. Essa emenda constitucional, na verdade, visa revogar um casuísmo do TSE e restabelecer as regras que todos nós já conhecemos e que norteiam todas as conversas nos diversos Estados.

            Mas, infelizmente, minhas companheiras e meus companheiros, o que estamos vendo na verdade é muito discurso da boca para fora, muita gente condenando a medida, mas regozijando-se internamente, seja porque a medida vai impedir o debate político em termos de alianças pela decisão do Tribunal Superior Eleitoral; seja porque a medida favorecerá partidos, candidatos a deputado, a governador; seja porque a medida beneficiará esse ou aquele candidato a presidente da República. O Tribunal Superior Eleitoral de forma nenhuma poderia estar exercendo a sua tutela sobre um assunto que, mal ou bem, foi discutido no Congresso, foi deliberado nessa direção e foi aplicado nas eleições de 1998. Essa lei que regerá as eleições de 2002 não é uma lei nova. É a mesma que valeu para 1998, quando houve coligações diferentes no âmbito federal e estadual e ninguém contestou! E mesmo que o tribunal possa ter razões do ponto de vista estritamente jurídico para dizer que essa não é uma mudança na legislação, é uma mudança nas regras do jogo. Estabelece-se uma tutela por parte do tribunal em relação àquilo que deveria ser um assunto interno dos diversos partidos.

            Seria ideal, sim, que tivéssemos alianças nacionais e iguais em todos os Estados, em todo o País. Aliás, isso seria justificável se tivéssemos eleições para presidente da República, deputado federal e senador num ano - portanto eleições nacionais; e aí se poderia estabelecer a necessidade de uma mesma aliança, já que estaríamos elegendo presidente e a sua bancada, a bancada de aceitação ou não no Congresso Nacional -, e em outro ano eleições estaduais. Vivemos em uma Federação, e as relações de poder nos Estados muitas vezes são diferenciadas em relação à União até porque se existem na própria estrutura de partidos diretórios nacional e estaduais é porque se reconhece que há especificidades em cada Estado que devem ser levadas em consideração pelos diversos diretórios.

            O Sr. Roberto Freire (Bloco/PPS - PE) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Roberto Freire (Bloco/PPS - PE) - Senador José Eduardo Dutra, é uma pena que essa discussão se faça sem que tenhamos muita clareza de como vamos resolvê-la. Em função da premência do tempo, talvez tenhamos que trabalhar, pelo menos nós do PPS - estou imaginando isso -, em duas vertentes: uma, apoiando qualquer medida que se discuta inclusive no Judiciário a eficácia e a vigência dessa resolução. Outra, assumindo que pode não haver mudança, ela objetivamente regulamente as eleições, e teremos que a ela nos subordinar. E o PPS então com a frente trabalhista, PDT e PTB, terá que discutir como andaremos nos Estados, tentando replicar essa aliança nacional nas Unidades da Federação brasileira. Mas a discussão é importante no sentido de vermos como a sociedade brasileira é autoritária. Ela corresponde, inclusive, àquilo que se diz: o escravismo só ocorreu porque os que eram escravos admitiam a ideologia dominante. O autoritarismo só existe porque a sociedade toda admite esse autoritarismo e acha que é bom. Ela não consegue perceber que a liberdade não é só a liberdade individual. A liberdade dos partidos, a liberdade das forças políticas, a liberdade da sociedade civil fica manietada por uma decisão de sete juízes que interpretam a lei equivocadamente porque não há Senador em circunscrição nacional; os Deputados Federais também são de circunscrição estadual, não há Deputado Federal nacional. As definições se dão na circunscrição eleitoral que são os Estados. E é isto que a lei determina: a vinculação, na majoritária, deverá ter coerência com a proporcional. Não há uma eleição nacional nem para Deputado, nem para Senador, mas há a dos Estados. Trata-se de uma extrapolação. É evidente que o Tribunal invadiu uma seara que não era sua. Competência de regular uma eleição ele tem, mas de criar uma nova norma, uma nova lei, é claro que não tem. Estamos com dificuldades. O autoritarismo está tão presente que é fácil encontrar na sociedade aqueles que dizem: “Vamos dar coerência aos partidos”. Recordo-me - e seria bom que todos também tivessem memória disso - que passamos 20 anos numa ditadura que dizia só poder haver dois partidos no País. Criou-se uma lei de fidelidade, que, num primeiro momento, caiu porque a vida é muito mais forte do que essas imposições. No momento em que avançou, a sociedade brasileira derrotou a ditadura na vinculação do pacote de abril. E, mais ainda, o colégio eleitoral e a fidelidade partidária para eleger e reproduzir a ditadura foi por nós derrotados, porque a vida derrotou a ditadura. Lembro a quem imaginar que pode inventar um casuísmo e com isso se beneficiar que, num regime democrático, isso pode virar bumerangue porque a vida lá fora é muito mais forte do que as idéias de bem-intencionados ou mal-intencionados juízes ou de lideranças políticas que pensam poder com isso beneficiar-se. Isso é uma impertinência! O Brasil não é homogêneo. Não se pode pensar que um Estado industrial, urbano como São Paulo tem a mesma realidade política de um Estado agrícola do Norte do País. Forças políticas que lá estão juntas muitas vezes estão separadas num Estado industrial mais avançado. É normal que isso ocorra. Deve haver tolerância democrática pelo pluralismo e pela realidade, que é muito mais complexa do que alguém imaginar que, num esquema, impor de cima para baixo o que o Brasil tem que pensar é o que está correto. Não! Não seria importante termos a rebeldia de dizer que não podemos engessar este País, que é muito mais complexo do que pensa a vã filosofia de sete juízes de um Tribunal qualquer de Brasília? Nós, do PPS, não seremos nem prejudicados por essa decisão. Talvez, dentre os partidos políticos e os candidatos, sejamos os mais bem instrumentalizados para enfrentar essa realidade, porque já tínhamos uma aliança nacional, não estamos em busca de alianças. No entanto, por princípio, como democrata que sou, posiciono-me contra essa decisão, mesmo que beneficiado possa ser. Até porque sei muito bem que, pelo benefício vindo de casuísmo, no final todos vamos pagar, e a conta é amarga. Assim, solidarizo-me com V. Exª. É importante analisar politicamente e aprender que não se pode engessar, impedir o pluralismo democrático de uma sociedade como, inclusive, a que nós pretendemos. Esta Casa discutiu a proibição de coligação, a questão do domicílio e da filiação. Estabeleceu uma filiação de um ano antes das eleições, sem que a sociedade percebesse, por exemplo, que no dia 6 de outubro de 2001 estávamos definindo quem poderia participar da eleição de 2002. Estávamos ali cassando aproximadamente 110 milhões de brasileiros, que não eram filiados a nenhum partido até o dia 6 de outubro e que agora não podem mais se filiar para ser candidatos porque foram cassados no seu direito. E ainda dizemos que isso é democrático. É esse autoritarismo da sociedade que está na raiz dessa decisão dos juízes que acreditam que podem, eles, substituir o pluralismo, a diversidade, a individualidade que cada um de nós, na nossa consciência, tem de ter ao votar, e a autonomia dos partidos, que são entidades de direito privado e, portanto, não podem ser tutelados por quem quer que seja. Tudo isso está em jogo. Infelizmente, não temos capacidade de discutir o assunto facilmente porque a sociedade brasileira é impregnada de autoritarismo e grande parte dela está, inclusive aplaudindo essa decisão.

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Muito obrigado, Senador Roberto Freire.

            O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Senador José Eduardo Dutra, V. Exª me concede um aparte?

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Ouço V. Exª e depois farei um comentário em conjunto sobre os dois apartes.

            O Sr. José Fogaça (Bloco/PPS - RS) - Muito obrigado, Senador José Eduardo Dutra. V. Exª traz a esta Casa um debate que é momentoso, talvez o mais atual que devemos fazer, porque está em jogo, como disse o Senador Roberto Freire, um princípio - mais do que um princípio de caráter político - constitucional. A informação que se tem pelos jornais e assessorias que acompanharam a decisão do Tribunal Superior Eleitoral é a de que a decisão foi tomada com base no que diz a Constituição e não na Lei Eleitoral, que, aliás, não tem sequer um só elemento, por mínimo que seja, não há nenhuma base que possa assegurar a conclusão de que as alianças feitas em âmbito nacional têm que se reproduzir compulsoriamente em âmbito estadual. V. Exª já demonstrou isso, o Senador Roberto Freire acaba de fazer também uma demonstração que é inequívoca, que não deixa pedra sobre pedra. Não há, nacionalmente, coligação proporcional; portanto, não pode haver a mesma vinculação em âmbito estadual. Ou seja, a decisão tomada pelo Tribunal Superior Eleitoral baseou-se no art. 17, inciso I, da Constituição, que dispõe que os partidos devem ter caráter nacional. Sabemos, todavia, que esta expressão “caráter nacional” significa que os partidos devem ter uma fisionomia nacional, ou seja, devem estar presentes em todo o território nacional, ter uma existência legal que se expresse em todo o território brasileiro ou, conforme diz a Lei Orgânica dos Partidos Políticos, devem ter os seus diretórios regionais registrados em pelo menos nove Estados para poder constituir o diretório nacional. Essa é a intenção, essa é a natureza da expressão “caráter nacional”. Agora, imagine-se que o fato de um partido ter caráter nacional significa um engessamento vertical de cima a baixo, daqui até a eternidade. Isso é desconhecer o dinamismo da história, da sociedade, das populações e o próprio dinamismo histórico dos partidos. Então, a interpretação que sempre demos à Constituição de que aos partidos cabe uma inteira autonomia para decidir seus estatutos, sua organização, sua estrutura e, obviamente, o seu destino eleitoral, parece agora que, com essa resolução do TSE, isso não estava tão claro, tão explícito assim. Propusemos, então, como V. Exª já citou no pronunciamento, a emenda constitucional, que já está sendo submetida à apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Há quem diga que isso também seria um casuísmo. Veja bem: a Constituição tem uma vigência de 14 anos. Nesse período, vigorou o princípio da liberdade de opção, da liberdade de escolha dos critérios de coligação. Suprimir essa liberdade é casuísmo, é realmente mudar a regra do jogo. O que estamos fazendo na emenda constitucional, o que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania está pretendendo, praticamente na sua totalidade, é tentar manter a regra do jogo, regra que vigorou por 14 anos, embora só tivéssemos eleição presidencial direta que coincidisse com as eleições estaduais em 1994. A eleição de 1989, que elegeu o Presidente Fernando Collor, não era concomitante com os Estados. Portanto, a primeira foi em 1994. De qualquer maneira, são 14 anos. Queremos assegurar a permanência e a continuidade dessa regra do jogo. Tenho impressão, Senador, de que há outro equívoco em supor que uniformidade partidária dependa tão-somente do episódio eleitoral, ou seja, uma circunstância eleitoral deve ser transformada em camisa-de-força para obrigar os partidos a serem coerentes. Durante quatro anos, nas suas atividades parlamentares e gerais, os partidos podem-se transformar em birutas de aeroporto, podem ir aonde quiserem sem problema. Na eleição, têm que estar embaixo de uma camisa-de-força rígida, que não permite nenhuma flexibilidade. Estou, da mesma forma que o Senador Roberto Freire, nessa posição simplesmente em defesa de princípio. No meu Estado, a coligação que está sendo feita nacionalmente é aquela que interessa ao meu Estado, do ponto de vista do meu Partido. Portanto, não me afetam pessoalmente a coligação nacional e a coligação regional. Apenas acredito que, por uma questão de princípio, a liberdade, o direito que têm os partidos à sua autonomia devem ser preservado na Constituição. Se o TSE entendeu que isso não estava tão claro, vamos deixar isso claro e explícito, como deveria ser. Obrigado a V. Exª.

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Muito obrigado, Senador José Fogaça.

            O SR. PRESIDENTE (José Coêlho) - Assumindo a Presidência dos trabalhos, lembro ao Senador José Eduardo Dutra que o seu tempo já está esgotado.

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Concluindo, Sr. Presidente, em linhas gerais, concordo plenamente com os dois aparteantes. O Senador José Fogaça lembra bem outra questão: a lei que estabeleceu as regras para a eleição de 1994 não foi a mesma em 1998. Especificamente, com relação à questão da coligação, o princípio foi exatamente o mesmo. Em 1994 predominavam as coligações nacionais que não se repetiram nas eleições estaduais. Em Sergipe, por exemplo, em 1994, em um palanque estavam dois candidatos à Presidência da República, Leonel Brizola e Lula.

            O Sr. Roberto Freire (Bloco/PPS - PE) - Nós tivemos isso em Pernambuco, quando fui eleito Senador. O meu companheiro na chapa com o Governador Miguel Arraes era Armando Monteiro, defendendo Leonel Brizola. Eu, à época, dentro da Frente Brasil Popular, defendia a candidatura de Lula, em 1994. Em 1998, em alguns Estados tivemos Ciro Gomes e Lula. Em Mato Grosso do Sul, Zeca do PT.

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Exato. O que confirma e dá embasamento para essa diferença de coligação nos âmbitos nacional e estadual não é a atual Lei Eleitoral, e sim a Constituição, como já disse o Senador José Fogaça.

            Concordo plenamente, portanto, que a emenda constitucional ou qualquer outro instrumento jurídico que venhamos a desenvolver no Congresso Nacional visa a restabelecer as regras anteriores, que eram do conhecimento e aceita por todos. Portanto, não é casuísmo. Isso visa a restabelecer e revogar um casuísmo que foi introduzido pelo TSE.

            Sr. Presidente, eu pretendia entrar em uma outra linha do meu pronunciamento, mas não vou poder desenvolvê-la em função do tempo. Voltarei à tribuna para fazê-lo. Talvez essa medida tomada pelo TSE possa contribuir para que os Partidos venham a caminhar nessa direção. Eu me socorro, também, de parte do pronunciamento final do Senador José Fogaça.

            É verdade que nos Estados se tem uma prática partidária, durante 4 anos, que não pode ser revogada apenas porque há o instituto da eleição. Não é possível que um candidato, um partido que durante 4 anos se alinhou, criticou um governo ou esteve ao lado dele, de repente, artificialmente, seja colocado no mesmo balaio porque houve uma imposição eleitoral.

            Mas usando esse argumento, eu pretendo fazer um pronunciamento - quero somente adiantá-lo aqui - do ponto de vista político. Acredito ser exatamente esta convivência ao longo de 4 anos entre partidos políticos ou ao longo de uma história, é o que aponta para a necessidade - se não conclusiva -, nesse momento, que não é em função da decisão do TSE, mas pode ser facilitada pela adesão do TSE, que aponta para a necessidade dos Partidos de Oposição com seus diversos candidatos à Presidência da República, do PPS, do PSB, do PT e de outros Partidos. Levando em consideração essa trajetória no Congresso Nacional nesses quatro anos, onde nós estivemos juntos, onde nós, no Senado, durante mais de quatro ano formamos um Bloco com o PT, o PDT, o PSB, o PPS. Portanto, tivemos histórias conjuntas ao longo desse período. Na Câmara, embora o Bloco não tenha se formado formalmente, mas ele atua de forma coerente, com divergências aqui e acolá, mas que demonstra que os projetos políticos e os programas políticos desses candidatos que citei têm divergências, mas há muito mais convergências do que divergências. E, portanto, não tem sentido nós continuarmos nessa beligerância entre os diversos candidatos da Oposição, como se o inimigo principal, o adversário principal esteja entre nós, na falsa imaginação de que o Governo é fraco - as outras pesquisas vêm demonstrando que não é - e que seria possível até termos dois candidatos de Oposição no segundo turno, quando nós sabemos que isso não é verdade.

            O Sr. Roberto Saturnino (Sem Partido - RJ) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Com muito prazer, Senador Roberto Saturnino.

            O Sr. Roberto Saturnino (Sem Partido - RJ) - Serei muito breve, Sr. Presidente, atendendo ao apelo que V. Exª já fez ao orador. Eu não podia deixar de manifestar o meu regozijo, o meu anseio. Espero ansioso o novo pronunciamento do Senador José Eduardo Dutra nessa linha que considero mais fértil e de mais fácil entendimento da população, da opinião pública, do País. A população realmente tem dificuldade para entender os pontos de vista que são especializados, digamos assim, por parte da classe política, a respeito do comportamento dos Partidos. O que a opinião pública compreende é exatamente o comportamento dos Partidos ao longo da trajetória, não apenas eleitoral, mas ao longo dos anos de embate, de atuação dos seus representantes na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. E esse comportamento aponta para uma unidade, que é uma exigência da população, a qual almeja que se unam os Partidos que assumiram posição contrária ao Governo por condenarem a política neoliberal, os Partidos que obtiveram vitórias expressivas em vários Estados, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, no Amapá, no Acre, em Alagoas, Mato Grosso do Sul, exatamente por força dessa convergência política num momento eleitoral, confirmando as suas posições ao longo das atuações durante os governos. Expresso o meu regozijo, a minha concordância com as considerações de V. Exª e, sobretudo, com a expressão final do seu pronunciamento, que promete ser um discurso especial que o tema merece e que é extremamente oportuno, mais oportuno do que nunca.

            O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT - SE) - Muito obrigado, Senador Roberto Saturnino. Inclusive um pronunciamento recente de V. Exª que contou com o meu aparte foi anterior à deliberação do TSE. Portanto, o nosso posicionamento não se deve a essa deliberação. Mas é possível que ela venha a arejar as mentes de todos nós, que fazemos parte desses Partidos, para que possamos agir nessa direção.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluirei insistindo que é necessária uma reunião, na semana que vem, entre Líderes do Senado e Câmara, para que se explicite o posicionamento, particularmente da Câmara, em relação à emenda constitucional apresentada no Senado, porque, se não houver vontade política por parte da Câmara dos Deputados no sentido de vê-la aprovada em tempo hábil, não haverá nenhum sentido em abreviarmos os prazos de tramitação desta emenda no Senado, o que será lamentável. Mas, acabará prevalecendo a tutela do TSE sobre toda a sociedade brasileira, como já disse o Senador Roberto Freire.

            Muito obrigado.


            Modelo14/20/241:32



Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/03/2002 - Página 1250