Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Importância da análise, pelo Senado Federal, do projeto de lei de iniciativa do Governo Federal, que trata da flexibilidade da CLT.

Autor
Carlos Wilson (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Importância da análise, pelo Senado Federal, do projeto de lei de iniciativa do Governo Federal, que trata da flexibilidade da CLT.
Publicação
Publicação no DSF de 02/03/2002 - Página 1323
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • CRITICA, URGENCIA, APRECIAÇÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), REPUDIO, LOBBY, GOVERNO FEDERAL, QUESTIONAMENTO, FAVORECIMENTO, GRUPO ECONOMICO, AUSENCIA, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, TRABALHADOR, EMPRESARIO, DEFESA, DEBATE, MODERNIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
  • APREENSÃO, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, ILEGALIDADE, DESRESPEITO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, NORMAS, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, chegou a vez de o Senado apreciar o projeto de iniciativa do Executivo que pretende a flexibilização da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho.

            Sr. Presidente, mais de uma vez já me manifestei a respeito desse tema e, hoje, reitero a minha estranheza ao ver um projeto tão importante como esse sendo apreciado de forma tão afoita e açodada. Nunca vi nada tão precipitado. Sr. Presidente, não entendo o porquê da pressão exercida pelo Governo Federal e pelo Presidente Fernando Henrique sobre os Deputados federais. Nunca vi nada tão desmedido! Mas tudo isso me permite uma análise: ou o Governo sabe algo que não sabemos ou também está sob fortíssima pressão de grupos empresariais.

            Mesmo os Parlamentares que concordam com o fato de que a CLT está superada, mesmo os mais liberais, que defendem a relação absoluta e livre entre o capital e o trabalho, concordam comigo no sentido de que não são os direitos trabalhistas, por hipótese nenhuma, que inviabilizam o emprego. Essa responsabilidade é muito mais pela brutal carga tributária que incide sobre a atividade econômica. Então, pergunto: por que tanta pressa?

            A CLT, Srªs e Srs. Senadores, tem 63 anos. O Sr. Fernando Henrique Cardoso está no poder há sete anos e a crise fiscal não começou agora. Por que, de repente, essa pressa em querer deixar de ser obrigatório o 13º salário, as férias e as horas extras? Isso passou a ser algo insuportável para o Governo Federal? Penso que o Brasil já passou da hora de ter um novo diploma legal trabalhista condizente com os tempos modernos.

            Soa estranho que ainda estejamos submetidos a uma legislação onde o empregador demite por justa causa, sem ter que prová-la a priori; onde a dita livre organização sindical seja tutelada pelo Estado; onde o trabalhador seja obrigado a um pagamento compulsório de imposto sindical.

            A legislação brasileira ainda está muito distante de temas como a co-gestão ou da distribuição de lucros. A estabilidade no trabalho, notadamente na iniciativa privada, pode ser resgatada com o simples pagamento do Fundo de Garantia. Isso quando o empregador se digna a depositá-lo na forma da lei.

            Boa parte das profissões regulamentadas são alvo de críticas. E não raro se confunde atividade ocasional com atividade profissional.

            Mais grave ainda: a mesma CLT que regula as relações dos trabalhadores de uma Volkswagen regula também a da pequena oficina da esquina.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não me alinho entre os críticos históricos da CLT. Entendo mesmo que ela representou um avanço fundamental à sua época. Até porque, antes que o Presidente Getúlio Vargas a decretasse, em pleno Estado Novo, não havia nenhuma regulamentação. Não havia lei, e o trabalhador era praticamente escravizado pelo patrão.

            Desde então, não surgiu nada melhor ou mais avançado. Atravessamos a vigência de quatro constituições, enfrentamos o rigor de um regime militar, mas ninguém ousou tocar na CLT.

            Não é o Governo que clama pela reformulação da CLT. É o trabalhador que quer uma nova e profunda discussão sobre isso. São os sindicatos, que experimentam a crise de representatividade, que exigem o debate.

            Definitivamente, Srªs e Srs. Senadores, não é com esse apressado projeto de flexibilização da CLT, como quer o Governo, que serão atendidas as reivindicações dos trabalhadores e dos empresários.

            O interesse do Governo em dar aos direitos e garantias trabalhistas natureza facultativa e não mais eficácia obrigatória, por mais estranho e suspeito que pareça, não me soa, em absoluto, como uma novidade. Ao contrário, é para mim impossível não relacioná-lo com os episódios recentes das extinções relâmpago da Sudam e da Sudene, por medida provisória, privando o Nordeste de um importante e tantas vezes bem-sucedido instrumento institucional de superação de desequilíbrios regionais, ao invés de reformá-las e aperfeiçoá-las. Agora, mais uma vez, o Governo Federal aponta as suas baterias e recursos promocionais, em campanha pela tevê, orçada em mais de R$2,5 milhões contra a CLT, último reduto legal de defesa do trabalhador. O pretexto é sempre o mesmo: desonerar a atividade produtiva, mas desobrigando-se de uma discussão racional sobre as imensas possibilidades de modificar seu texto.

            O que me parece idêntico em ambos os episódios - o da Sudene, o da Sudam e o da CLT - é a posição oficial, que em nada lembra a do administrador zeloso, disposto a separar o joio do trigo. Trata-se de mais uma atitude preconcebida e dogmática de exonerar, a todo custo, o Poder Público de suas responsabilidades.

            A rigor, o estado ideal para os padrões do oficialismo neoliberal parece só dispor de uma única e monótona resposta a todas as demandas sociais de arbitragem institucional de conflitos. E essa resposta é: ausente. Sem falar que há itens do projeto do Governo, como o que permite a redução de férias, que viola a Convenção n.º 132 da OIT - Organização Internacional do Trabalho, aliás, ratificada pelo Brasil e só possível de denúncia de dez em dez anos.

            Isso mostra como certas normas protetoras do trabalho têm merecido da comunidade internacional o máximo resguardo jurídico, por intermédio de regras imperativas, não apenas estatais, mas supra-estatais. Vale dizer que não se pode, legitimamente, tornar relativos e facultativos direitos e garantias trabalhistas, ao sabor de circunstâncias econômicas desfavoráveis aos trabalhadores. Estados soberanos não podem revogá-las sem infringir a ordem jurídica supranacional.

            Ora, a pergunta é: por que só se quer globalizar o mercado e não o direito?

            Estou certo de que nós, Senadores e Senadoras, teremos o bom senso da cautela. Levaremos em conta, principalmente, a delicadeza do momento que atravessamos. Quando apenas um fio tênue sustenta o emprego de milhões e milhões de trabalhadores, quando os sindicatos - exceção feita a meia dúzia - estão esvaziados, aprovar a supremacia de um acordo sindical sobre o texto da lei pode - e, com certeza, vai - representar um grande prejuízo social.

            Não creio que qualquer dos Srs. Senadores pretenda se negar a uma discussão profunda sobre a CLT. E ninguém está se negando a mexer na CLT. Mas não dessa forma. Não com essa pressa. Não com esse afogadilho.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti.

 

            


            Modelo15/2/243:39



Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/03/2002 - Página 1323