Discurso durante a 17ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro do transcurso dos seis meses do atentado terrorista nos Estados Unidos, em 11 de setembro. Saída do PFL da base de sustentação do Governo.

Autor
Lúdio Coelho (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Lúdio Martins Coelho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA NACIONAL. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Registro do transcurso dos seis meses do atentado terrorista nos Estados Unidos, em 11 de setembro. Saída do PFL da base de sustentação do Governo.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2002 - Página 1994
Assunto
Outros > ECONOMIA NACIONAL. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, ECONOMIA, AMERICA LATINA, APREENSÃO, FUTURO, ECONOMIA NACIONAL.
  • DESAPROVAÇÃO, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL), AFASTAMENTO, GOVERNO, DESAJUSTAMENTO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
  • IMPORTANCIA, ESFORÇO, CONSOLIDAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, MELHORIA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • CRITICA, CONGRESSO NACIONAL, INCAPACIDADE, REALIZAÇÃO, REFORMA POLITICA, APOIO, DECISÃO, NELSON JOBIM, MINISTRO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), CONSOLIDAÇÃO, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, AMBITO NACIONAL, MELHORIA, POLITICA PARTIDARIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Senadores, há poucos dias, eu trouxe ao plenário do Senado Federal um tema que diz respeito ao financiamento do Sistema Único de Saúde, assunto complexo que sempre envolve raciocínio, análise e manifestação da área técnica e que pede resposta efetiva do Parlamento brasileiro em relação ao art. 198 da Constituição Federal. O referido artigo estabelece, entre outras situações e obrigatoriedades, a necessidade de regulamentação, em lei complementar, das obrigações da União, dos Estados e dos Municípios referentes ao financiamento do Sistema Único de Saúde. Temos essa dívida histórica, desde a Constituinte, e a necessidade do ajuste da legislação.

            Por uma feliz coincidência, o Conselho Nacional de Saúde, reunido semana passada, apontou a fragilidade das obrigações da União, dos Estados e dos Municípios em relação ao financiamento do setor de saúde, bem como a necessidade de contribuição efetiva do Parlamento, incluindo a sensibilização, por uma agenda posterior do Conselho Nacional de Saúde, em relação à matéria.

            Tive o prazer de apresentar, antecipadamente à reunião daquele Conselho, um projeto de lei complementar que teve sua origem numa discussão minha com o nobre Senador Paulo Souto, da Bahia, o qual apontava a busca de ajustes, de correção dos rumos do financiamento do setor saúde que veio ao encontro da aprovação da Emenda Constitucional n.º 29, que decidiu pela obrigatoriedade dos gestores, no caso a União, os Estados e os Municípios.

            Lamentavelmente tivemos, no início da aplicação da Emenda Constitucional n.º 29, o descumprimento por parte do ator principal: a União. Esta não cumpriu o que está estabelecido na Emenda Constitucional n.º 29, que é o elemento central da obrigação das instâncias da União; seria a aplicação do valor empenhado nos dois exercícios imediatamente anteriores mais a variação nominal do PIB. Com o não cumprimento por parte da União, nós temos uma perda concreta de, pelo menos, R$1,1 bilhão ao ano. Vamos ter uma perda em torno de R$4 bilhões ao longo de três anos por uma omissão da União.

            A Bancada Parlamentar envolvida com o tema da saúde no Congresso Nacional apresentou as suas razões, as suas críticas e o Ministério da Saúde, naquele momento, hipotecou sua solidariedade. A Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional decidiu assegurar R$1,2 bilhão, que estavam alheios à inclusão no Orçamento da União deste ano. Foi aprovado na Comissão Mista de Orçamento e, posteriormente - o que é lamentável -, contingenciado pelo Ministério do Planejamento. Estamos em uma situação de impasse: é necessária a obrigatoriedade das instâncias da União em relação às suas obrigações no financiamento do Sistema Único de Saúde, mas o ator principal, a União, não cumpriu a sua parte, pois já contingenciou aquilo que seria sua obrigação - houve um corte de R$1,2 bilhão.

            Apresento este projeto de lei complementar que seguramente dará mais um passo concreto e tornará inadiável o cumprimento da Emenda Constitucional n.º 29 e do art. 198 da Constituição Federal.

            Faço uma leitura breve do Projeto de Lei do Senado n.º 35, de 2002 - Complementar, como contribuição efetiva do meu mandato ao Congresso Nacional, à Constituição Federal e ao setor de saúde:

      Estabelece os percentuais do produto da arrecadação de impostos a serem aplicados anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços de saúde; os critérios de rateio dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus respectivos Municípios; as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, do Distrito Federal e municipal; e as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União, nos termos do § 3º do art. 198 da Constituição Federal.

      ...................................................

      Art. 1º A União aplicará, anualmente, em ações e serviços de saúde, o montante correspondente ao empenhado para essa finalidade no exercício financeiro anterior crescido de, no mínimo, o percentual correspondente à variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB) ocorrida entre os dois exercícios financeiros imediatamente anteriores ao que se refere a lei orçamentária.

      § 1º Quando oficialmente conhecido o valor estimado no caput, projeto de lei de créditos adicionais deverá promover os ajustes correspondentes.

      § 2º Em caso de variação negativa do PIB, o valor de que trata o caput não poderá ser reduzido, em termos nominais, de um exercício financeiro para outro.

      Art. 2º Os Estados aplicarão, anualmente, em ações e serviços de saúde, pelo menos doze por cento da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, da Constituição Federal, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios.

      Art. 3º Os Municípios e o Distrito Federal aplicarão, anualmente, em ações e serviços de saúde pelo menos quinze por cento da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b, e § 3º, da Constituição Federal.

      Art. 4º Os recursos do Fundo Nacional de Saúde destinados a ações e serviços do Sistema Único de Saúde, a serem executados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, nos termos do inciso IV e do parágrafo único do art. 2º, da Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, serão transferidos diretamente e de forma regular e automática, em conformidade com cotas previstas em programação e cronograma aprovados pelo Conselho Nacional de Saúde, dispensada a celebração de convênios ou outros instrumentos jurídicos, ressalvado o disposto no art. 4º da referida lei.

      Art. 5º Dos recursos da União destinados a Estados, ao Distrito Federal e a Municípios para ações e serviços do Sistema Único de Saúde:

      I - setenta por cento serão distribuídos segundo o coeficiente de sua divisão pelo número de habitantes, independentemente de qualquer procedimento prévio;

      II - vinte e cinco por cento serão distribuídos segundo os critérios definidos no art. 35 da Lei n.º 8.080, de 19 de setembro de 1990;

      III - cinco por cento serão distribuídos em função de metas de desenvolvimento tecnológico e de ampliação da capacidade assistencial, pactuadas entre o Ministério da Saúde e as respectivas unidades federadas, em percentuais inversamente proporcionais à capacidade instalada da unidade federada correspondente, calculada em função da quantidade e do valor dos procedimentos realizados no exercício financeiro anterior.

            O inciso III, Sr. Presidente, é uma inovação que apresento, resultante de todo o debate realizado desde a 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1988, até hoje. O assunto interessa a todos nós, Estados do Centro-Oeste, do Norte, do Nordeste e até da região Sul. O objetivo de tal instrumento inovador é corrigir a distorção da seguinte regra de financiamento do setor de saúde, alheia à lógica e à coerência: atualmente, faz-se o investimento per capita, ou seja, por habitante representado de sua Unidade federada na União e, posteriormente, pela alta complexidade já instalada. Dessa forma, São Paulo receberá mais porque é o Estado mais bem aquinhoado em tecnologia e sofisticação de recursos para dar atendimento à sua população. Com isso, há um desequilíbrio progressivo entre as Regiões do Brasil. Os Estados do Norte, Centro-Oeste, Nordeste e Sul do Brasil sofrem uma queda progressiva dos investimentos em saúde, enquanto os Estados da Região Sudeste, os mais bem aquinhoados, sempre recebem mais. O inverso nunca é feito, ou seja, se há uma fila de pacientes que não conseguem resolver seus problemas de saúde em seus próprios Estados, em vez de se alocarem recursos de saúde para esses Estados, os doentes são encaminhados a São Paulo, ao Rio de Janeiro e a Belo Horizonte, o que acarreta perda progressiva de qualidade de serviços em cada Unidade federada não beneficiada com esse financiamento.

            Com os 5%, cobraremos o estabelecimento de uma meta, ou seja, se tal Unidade da Federação, pactuada com o Ministério da Saúde, estabelecer que alcançará, em três anos, determinado resultado no procedimento de doenças renais, do aparelho digestivo e cardiológicas, esse Estado ou Município, acompanhado e fiscalizado pelo Ministério da Saúde e pela União, conseguirá um investimento maior do que a regra do repasse automático. Assim, inverteremos a lógica: diminuiremos as desigualdades de alta complexidade entre os Estados e reduziremos o problema do atendimento distante, existente nos pequenos Estados da Federação. Corrigindo essa distorção, garantiremos que a sociedade seja tratada na sua Região, no seu Estado, no seu Município.

            Trata-se de um instrumento lógico a ser assegurado pela lei, que romperá a grande dificuldade vivida pelos sanitaristas e pelas autoridades burocráticas brasileiras quando estabeleceram os critérios de financiamento para o setor de saúde no passado. Naquele momento, o critério mais lógico encontrado consensualmente foi o da distribuição dos investimentos per capita, ou seja, proporcional ao número de habitantes de cada Unidade federada. Esse foi o critério assegurado pela Constituição Federal e utilizado pelo Sistema Único de Saúde para distribuir os investimentos e o financiamento na área de saúde.

            Agora, podemos fazer mais: podemos atualizar esse modelo e torná-lo mais justo. Para isso, julgo decisivo esse critério que acata as resoluções estabelecidas no Congresso Nacional pela Emenda Constitucional nº 29 e, ao mesmo tempo, assegura a destinação de 5% de investimentos adicionais para o inverso da capacidade instalada, pelas metas pactuadas, pela complexidade porventura alcançada, pelos esforços da Unidade Federada em prol da qualidade do serviço e pelo acesso digno à saúde conferido à população, segundo tais critérios.

            Penso que estamos associando aos outros critérios de vigilância epidemiológica e de vigilância sanitária os critérios de condições de investimentos e de capacidade já estabelecidos pelos Estados. O inciso III quebra a progressiva desigualdade e a distribuição injusta dos recursos do SUS.

            Sr. Presidente, é muito importante ressaltar que esse instrumento de lei complementar é uma dívida do Parlamento brasileiro para com a Constituição Federal, que agora poderá ser sanada. Poderemos passar por um rico processo de debate com o Conselho Nacional de Saúde, com todos os dirigentes de hospitais e setores de Saúde do Brasil, além de ouvirmos os Conselhos Regionais de Medicina, os Conselhos Federais, conselhos das diversas categorias profissionais, a fim de encontrarmos, finalmente, a solução correta. Talvez surja uma pequena emenda a este projeto para enriquecê-lo, mas, sem dúvida alguma, cumpriremos a meta do Parlamento brasileiro de não ficar omisso diante de leis complementares inadiáveis, como é o caso desta.

            Outro elemento preocupante que essa lei virá a resolver é a indagação levantada há poucos dias no Conselho Nacional de Saúde de que recursos do Sistema Único de Saúde estariam sendo desviados e aplicados em merenda escolar, saneamento básico e até em investimentos em alimentos e apoio a situações de presidiários. Essa é uma situação grave, porque esses recursos são sagrados. A Saúde Pública do Brasil, que dá passos com muitas dificuldades para melhorar seu nível e dar maior dignidade ao cidadão brasileiro que procura o Sistema, não pode passar por esse tipo de embaraço, de complicação. Só uma lei complementar dando continuidade à responsabilidade imposta pela Constituição Federal assegurará um freio definitivo nessa matéria.

            Existem até denúncias ao Conselho Nacional de Saúde dando conta de que recursos do Sistema Único de Saúde estão sendo usados, em alguns lugares, para construção e manutenção de Instituto Médico Legal. São situações graves, que precisam de uma resposta rápida das autoridades de Estado e, no caso, do Ministério da Saúde.

            Portanto, esse projeto de lei complementar vem ao encontro dessa situação: rompe com a incapacidade de se definirem as obrigações e assegura o direito do cidadão brasileiro a uma política mais lógica de financiamento da saúde pública.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR TIÃO VIANA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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            Modelo112/18/249:04



Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2002 - Página 1994