Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do pronunciamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso, na reunião do BIRD, em Fortaleza.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA EXTERNA.:
  • Análise do pronunciamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso, na reunião do BIRD, em Fortaleza.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2002 - Página 2183
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, APOSENTADORIA, ALMIR PAZZIANOTTO, MINISTRO, TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST), HOMENAGEM, ATUAÇÃO.
  • LEITURA, ELOGIO, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REUNIÃO, BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID), CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO CEARA (CE), CRITICA, ATUAÇÃO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), REDUÇÃO, POSSIBILIDADE, CRESCIMENTO ECONOMICO, PAIS SUBDESENVOLVIDO, REPUDIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PROTECIONISMO, AÇO.
  • DEFESA, IGUALDADE, TRATAMENTO, PAIS SUBDESENVOLVIDO, PAIS INDUSTRIALIZADO, COMERCIO EXTERIOR, NECESSIDADE, REVISÃO, CALCULO, JUROS, DIVIDA EXTERNA.

  SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, farei dois registros muito breves.

            Primeiramente, quero registrar que o Ministro Almir Pazzianotto está-se despedindo do Tribunal Superior do Trabalho, em virtude de aposentadoria. Houve, hoje, uma sessão solene, a que não pude comparecer.

            Registro a aposentadoria do Ministro Almir Pazzianotto, porque, como advogado trabalhista, Ministro do Trabalho no Governo Sarney e Ministro e ex-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, revelou-se um homem profundamente vinculado às questões e aos direitos dos trabalhadores, aos problemas sindicais, enfim, é um estudioso dessas questões, além de ter sido Deputado Estadual em São Paulo com grande atuação. Fala-se até que reverteria sua atividade político-partidária, disputando mandato na próxima eleição.

            Faço essa manifestação no momento em que S. Exª deixa o Tribunal Superior do Trabalho, porque reconheço que prestou grande serviço ao trabalhismo brasileiro, seja como advogado, Ministro do Trabalho ou Ministro-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

            O outro tema, Sr. Presidente, diz respeito ao pronunciamento do Sr. Fernando Henrique Cardoso na reunião do BID, em Fortaleza. O Senhor Presidente da República, primeiramente, presidiu um seminário chamado “Desafios da democracia na América Latina”, a que compareceu também o Presidente do Peru, Alejandro Toledo, o Presidente do Equador, Gustavo Noboa, o ex-Presidente do Chile, Patricio Aylwin, e o Governador da Lombardia, Roberto Formigoni, pois a próxima assembléia do BID será em Milão.

            Posteriormente, na solenidade de abertura das assembléias do BID, o Presidente Fernando Henrique Cardoso reportou-se, de modo muito incisivo, à questão da estrutura do sistema econômico internacional. Na mesma esteira do discurso do Presidente Alejandro Toledo, do Peru, Sua Excelência fez duras críticas e questionamentos a esses organismos financeiros internacionais, a exemplo do FMI. Entretanto, não falou tanto sobre a taxa operacional básica TOB. Quem a imaginou faleceu sem vê-la aplicada como instrumento regulador dessas dificuldades relacionadas aos países em desenvolvimento e dessas instabilidades econômicas, em grande parte originadas pelo fluxo rápido de capitais.

            O Presidente Fernando Henrique foi muito específico e objetivo ao dizer textualmente: “Não estamos pedindo uma reforma da ordem universal. Deixemos isto para o Criador do Universo. Também não quero falar de taxa Tobin, que todos dizem que tem problemas técnicos. Estamos querendo medidas concretas, objetivas, e mudanças de regras que nos estão sufocando: aumento nos Direitos Especiais de Saque; uma nova forma de contabilizar nossas dívidas, igual à da Europa. Por que reduzir com manobras contábeis as nossas possibilidades de crescimento? Quando vamos discutir isso, o FMI nos trata como se fôssemos analfabetos. O presidente do Peru, que está aqui, é economista. Eu sou sociólogo, mas com um grupo de economistas e o apoio do povo brasileiro, conseguimos estabilizar a economia” - afirmou o Presidente Fernando Henrique Cardoso.

            O FMI faz ouvidos moucos para essas questões objetivas que interferem na nossa capacidade de endividamento e criam dificuldades para a própria manutenção da nossa estabilidade econômica. O Presidente do Peru, nas suas intervenções, apresentou-se a mim como homem muito sincero. Sua Excelência foi de uma transparência que poucas vezes se vê nos homens públicos. Mostrando sua perplexidade, disse: Fui eleito Presidente, já estou caindo nas encuestas - quer dizer, nas pesquisas de opinião -, não quero, de maneira nenhuma, abandonar o compromisso com a estabilidade da economia, não quero déficit na economia, não quero inflação, quero manter a economia equilibrada, estável, mas o que fazer com tantas demandas sociais, o que fazer quando o povo nos cobra, quando as populações empobrecidas do meu País - mais de 50% de pobres e miseráveis - reclamam do desemprego e da falta de oportunidade de trabalho?

            O que fazer? Que resposta dar? Como caminhar nessa estrada tão difícil, se não tivermos realmente o apoio de uma nova ordem econômica internacional, se não tivermos condições de inserção na economia internacional.

            E dizia ele: “A economia de mercado se mostrou muito eficaz para gerar riqueza, mas não o é para distribuí-la”.

            Assim, são necessários instrumentos novos que permitam gerir esses países de maneira responsável, mas de forma a atender a essas demandas. Caso contrário - e o seminário era justamente sobre o desafio da democracia -, a democracia vive em permanente risco, porque a democracia não é apenas um ritual, não é a convocação periódica dos cidadãos para votar. A democracia é um exercício permanente, diário, cotidiano, cidadão, que não pode existir se os cidadãos não estão instruídos, se não estão na escola, se não têm emprego e um mínimo de dignidade na sua vida.

            Nesse contexto, temos que fazer justiça à maneira incisiva com que o Presidente Fernando Henrique apresentou as questões diante do FMI e de outras organizações que até agora não se sensibilizaram com o apelo que esses países estão fazendo. Não se trata de pedir comiseração; não se trata de suplicar, mas de invocar direitos.

            Agora mesmo estamos enfrentando o problema do protecionismo americano em relação ao aço. Pelos cálculos, as medidas que, de certa forma, penalizaram menos o Brasil do que outros países representam um prejuízo de US$400 milhões por ano para o nosso País. Na hora em que ganhamos competitividade em um setor, logo vêm medidas protecionistas. Quer dizer, é como se aquela rodada Uruguai de liberalização do comércio mundial tivesse institucionalizado instrumentos protecionistas para os países ricos. Ora, isso só nos deixa cada vez mais ressabiados em relação à Alca, porque estamos vendo que não prospera a nossa intenção de exportar mais produtos agrícolas. Os americanos aumentaram em bilhões de dólares os subsídios da agricultura americana, enquanto subsídio aqui no Brasil é heresia. Fala-se em subsidiar alguma coisa aqui e o mundo vem abaixo. Cai tudo! Mas nos Estados Unidos pode!

            Tudo isso nos leva a imaginar se as mudanças que ocorreram no mundo da economia, como abertura, internacionalização da economia, não vieram apenas para consolidar, cristalizar as assimetrias já existentes: quem está pobre fica pobre; quem está remediado fica remediado e quem está rico fica cada vez mais rico.

            Não podemos assistir a isso de braços cruzados! Temos que erguer a nossa voz, a voz das nossas Lideranças políticas acima de divergências políticas internas - naturais numa democracia. Mas temos de apoiar ações, atitudes como essa do Presidente, quando denuncia, quando cobra, quando exige o mínimo de atenção às postulações que fazemos no foro apropriado e de maneira racional.

            A Argentina sangra. Há uma hemorragia de recursos, de energias, mais do que de dinheiro. É uma hemorragia que não se estanca. No entanto, não se ouve nenhuma voz no sentido de socorrer aquele país, que procura, dentro do possível, num quadro de extrema instabilidade social, equacionar as questões econômicas.

            É o registro que gostaria de fazer, Sr. Presidente, descrevendo - pois estava presente nos eventos que aqui mencionei - a forma como o Presidente Fernando Henrique Cardoso apresentou a posição do Governo brasileiro em relação ao sistema econômico internacional e ao tratamento que temos recebido deles quanto a uma série de itens que podem ser perfeitamente alterados, até por uma questão de isonomia. Mencionei objetivamente aqui alguns deles a fim de demonstrar que não falamos apenas no plano retórico ou no plano das intenções. Há propostas objetivas para o cálculo de endividamento de nossos países; há os direitos especiais de saques; e outros tantos itens a que o FMI até agora não respondeu de maneira convincente.

            Muito obrigado.


            Modelo111/26/2410:36



Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2002 - Página 2183