Pronunciamento de Ricardo Santos em 13/03/2002
Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Necessidade de acompanhamento do processo de transferência do controle acionário da Chocolates Garoto S.A., para a multinacional Nestlé.
- Autor
- Ricardo Santos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
- Nome completo: Ricardo Ferreira Santos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA INDUSTRIAL.:
- Necessidade de acompanhamento do processo de transferência do controle acionário da Chocolates Garoto S.A., para a multinacional Nestlé.
- Aparteantes
- Lindberg Cury, Paulo Hartung.
- Publicação
- Publicação no DSF de 14/03/2002 - Página 2187
- Assunto
- Outros > POLITICA INDUSTRIAL.
- Indexação
-
- ANALISE, EFEITO, VENDA, EMPRESA NACIONAL, FABRICAÇÃO, CHOCOLATE, MUNICIPIO, VILA VELHA (ES), ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), EMPRESA ESTRANGEIRA.
- NECESSIDADE, CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONOMICA (CADE), DEPUTADO ESTADUAL, ACOMPANHAMENTO, TRANSFERENCIA, CONTROLE ACIONARIO, EMPRESA NACIONAL, FABRICAÇÃO, CHOCOLATE, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), EMPRESA ESTRANGEIRA, APREENSÃO, EMPREGADO, POSSIBILIDADE, DISPENSA.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado pela atenção, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, como foi amplamente noticiado pela imprensa, consumou-se, no último dia 1º de março, a venda da Chocolates Garoto S.A. para a multinacional Nestlé, que agora passa a controlar aproximadamente 53% do mercado de chocolate no Brasil.
A Chocolates Garoto, fundada em agosto de 1929 pelo imigrante alemão Henrich Meyerfreund, teve seu crescimento baseado no constante aperfeiçoamento dos produtos, por meio de novas tecnologias e reinvestimento permanente dos lucros.
Em 1962, a H. Meyerfreund e Cia., primeira razão social da empresa, passou a ser uma sociedade anônima familiar, de capital fechado, sob a denominação de Chocolates Garoto S.A.
Com duas fábricas localizadas em Vila Velha, município da Grande Vitória, a Garoto conta ainda com inúmeros escritórios de vendas e centros de distribuição em diferentes capitais do País. A empresa reúne hoje 2.500 funcionários, que deverão produzir 80 mil toneladas de chocolate em 2002.
Ao longo dos seus 72 anos de existência, a Garoto criou e desenvolveu produtos que fazem parte do dia-a-dia de milhões de consumidores no Brasil e no exterior. Respondia por 22% de participação no mercado brasileiro de chocolates, algumas vezes disputando a liderança desse mercado. Com exportações de seus produtos para 40 países, a Garoto é a marca alimentícia brasileira mais conhecida na Argentina, enquanto no Uruguai detém a liderança do mercado de chocolates.
Obteve posições de destaque em todos os mercados consumidores regionais do País, além da liderança indiscutível em mercados de maior expressão, como os do Rio de Janeiro, Minas Gerais e de todo o Nordeste brasileiro.
Esta empresa, além de seu desempenho econômico extraordinário em grande parte de seus 72 anos de existência, mantinha inúmeros projetos de relacionamento com a comunidade nos campos de apoio à cultura, ao esporte e à promoção social. Não há dúvida de que sua imagem se confundia com a própria identidade capixaba.
A venda de todo o controle acionário da empresa para a multinacional suíça Nestlé e a transferência do comando da Garoto, no último dia 1º de março, tomou todos os capixabas de forte apreensão pelo futuro da marca, da empresa e de seus funcionários, bem como da consternação, por parte do seu ex-principal acionista, Sr. Helmut Meyerfreund, filho do fundador da Garoto e responsável por uma brilhante gestão da empresa durante 25 anos.
A venda da Garoto foi o último ato de uma disputa acionária que tirou do comando da empresa, em dezembro de 1998, o Sr. Helmut Meyerfreund e vários gerentes e funcionários de sua confiança. Com uma dedicação ao trabalho admirável e um alto nível de especialização no ramo do chocolates, o Sr. Helmut transformou uma modesta fábrica de balas, com uma produção anual de 5 mil toneladas, na maior fábrica de chocolate da América latina, com capacidade instalada de 130 mil toneladas anuais.
Por tudo o que acabamos de expor sobre essa empresa, a transferência de seu controle acionário precisa ser acompanhada de perto pelos parlamentares brasileiros e capixabas, em especial, em resposta às preocupações e cuidados que esse símbolo do trabalho, da determinação e da competência empresarial do Espírito Santo e de todo o Brasil merece e exige.
Não temos, em absoluto, qualquer restrição à venda, já que não foi possível um acordo que permitisse à família Meyerfreund permanecer à frente da empresa, e muito menos temos qualquer restrição à empresa suíça Nestlé, um grupo que já opera no Brasil há 80 anos, com 23 fábricas instaladas em várias regiões do País.
Queremos aqui expressar nossa disposição de acompanhar o desdobramento desse processo de transferência, gerador de forte apreensão, principalmente para os funcionários e seus familiares com relação ao futuro de seus empregos, para a municipalidade de Vila Velha, que tem na empresa a sua principal atividade empresarial e uma das principais fontes de tributos, apreensão também por parte dos fornecedores locais e de toda a população do Estado do Espírito Santo, pelas razões já expostas, que confirmam a forte relação entre a marca e a sua representatividade para a economia local.
Por isso, apoiamos, na Comissão de Assuntos Econômicos, a iniciativa do Senador Paulo Hartung, que apresentou requerimento para realização de audiência pública, aprovado por aquela Comissão, com a finalidade de ouvir o Dr. João Grandino Rodas, Presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômico, sobre o processo de aquisição do controle acionário da Chocolates Garoto pela Nestlé, considerando os diversos aspectos relacionados com esse processo de transferência de controle acionário e os condicionantes apresentados pelo Cade para a efetivação da operação.
O Sr. Paulo Hartung (PSB - ES) - Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Ricardo Santos?
O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES) - Com muita satisfação, ilustre Senador Paulo Hartung.
O Sr. Paulo Hartung (PSB - ES) - Faço coro com as preocupações de V. Exª. Essa empresa faz, de certa forma, parte dos símbolos importantes do nosso Estado. Eu até dizia a um dos jornalistas que me procurou para ouvir-me sobre este assunto que o Espírito Santo é conhecido por muitas atividades econômicas: pelo aço produzido pela CST - Companhia Siderúrgica de Tubarão, pelo vigor da nossa agricultura, particularmente da nossa cafeicultura, pela culinária - a moqueca capixaba tem uma marca muito forte na culinária brasileira -, pelas belezas naturais. Além desses setores, outro ponto que sempre mereceu destaque, no contexto nacional e internacional, e que principalmente atraiu turistas ao nosso Estado foi essa fábrica de chocolates. Com mais de 70 anos, a luta para construí-la foi muito dura. E foi uma fábrica que continuou competitiva, mesmo depois da abertura de nossa economia, o que é muito difícil. Ela se manteve presente, com uma faixa de mercado expressiva no Brasil. Então, desejo associar-me às preocupações de V. Exª. Apresentei o requerimento - que já foi aprovado -, marcaremos essa audiência em momento oportuno, mas desejo aqui ressaltar as preocupações com a marca, com a produção local, com o emprego e com os compromissos sociais da empresa. Queremos que essas condicionantes sejam levadas em conta pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ao avaliar esse processo. Além disso, que essa avaliação seja acompanhada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, como fizemos no caso da AmBev, empresa resultante da fusão das cervejarias Antarctica e Brahma. Creio que aquele acompanhamento que fizemos foi produtivo para o País. E agora - ressalte-se - há um processo de concentração brutal com essa aquisição, conforme já citado por V. Exª. A Nestlé dominará mais de 53% do mercado de chocolates, uma área importante de alimentos. Então, todos esses aspectos nos preocupam, Senador Ricardo Santos. Hoje mesmo, de Vila Velha, recebi correspondência dos trabalhadores, assinada pela Srª Linda Maria Moraes, coordenadora-geral desse movimento, apresentando suas preocupações. Ela fala da relevância da empresa - conforme dados já apresentados por V. Exª -, da relação afetiva do nosso povo e do Brasil com a empresa Chocolates Garoto e também da preocupação com as informações contraditórias veiculadas sobre a venda da fábrica. São preocupações justas e necessárias. Não é uma visão menor; muito ao contrário, é uma visão nacional. Garantir a concorrência é respeitar o consumidor. Como capixabas, devemos zelar por isso, e penso que esta Casa assim também deve fazer, em nome do Brasil. Então, associo-me às palavras de V. Exª. As suas preocupações são as minhas, as do povo de Vila Velha, as do povo capixaba, enfim, as do povo brasileiro, que deseja estabelecer uma concorrência sadia que leve à qualidade e ao preço adequado dos produtos. Parabéns, Senador Ricardo Santos.
O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES) - Senador Paulo Hartung, incorporo o seu aparte ao meu pronunciamento com muito prazer. Enriquecem este discurso as observações de V. Exª, que teve a sensibilidade de requerer à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal a realização de audiência pública, de tal forma que o Cade venha explicar a aquisição da Garoto pela Nestlé, cuja conseqüência, como já se disse aqui, será uma concentração muito grande no mercado de chocolates no Brasil.
Gostaria também de dizer à líder do sindicato dos trabalhadores da área de chocolate no Espírito Santo, a Srª Linda Maria Moraes, que vamos procurá-los para dividir essas preocupações e, quem sabe, encaminhar medidas e gestões aos novos proprietários, para que não só a marca e os empregos sejam preservados como também seja mantida a identidade da empresa com a comunidade do Município de Vila Velha e com todo o nosso Estado.
O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Concede-me V. Exª um aparte?
O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES) - Tenho o prazer de conceder o aparte ao Senador Lindberg Cury.
O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Senador Ricardo Santos, com bastante atenção, acompanhei a exposição de V. Exª. É lamentável que sejam vendidas, a empresas multinacionais, indústrias tradicionais como a Garoto, uma fábrica de balas que, no decorrer do tempo, transformou-se numa das maiores exportadoras de chocolates para a América do Sul, detendo também grande fatia do mercado brasileiro. A Garoto, conhecida em todo o Brasil, pertence ao círculo de empresas autenticamente nacionais que, ao longo dos anos, demonstraram ser capazes de gerar emprego. Faz parte do roteiro turístico de Vila Velha a visita à antiga Fábrica de Chocolates Garoto. Lembro-me de que, na primeira vez em que estive nas belíssimas praias capixabas, acompanhei uma visita turística à fábrica. O chocolate trouxe uma marca importante para o desenvolvimento do Estado do Espírito Santo, marca essa hoje ameaçada. O que aconteceu com a Garoto está ocorrendo com várias empresas nacionais. Fui Presidente da Associação Comercial durante 15 anos e atualmente sou o 1º Vice-Presidente da Confederação de Associações Comerciais. Lidando com questões como essa, tenho verificado que empresas desse tipo estão se perdendo no tempo e no espaço, dando espaço para que companhias estrangeiras tomem o mercado nacional. Por isso, louvo a iniciativa de V. Exª de vir a público comentar o assunto, pois temos o dever de zelar por nossas empresas. Temos realizado vários trabalhos em casos semelhantes, com o apoio do Senado. No caso da AmBev, por exemplo, trabalhamos com as três maiores marcas. E a primeira pretensão da AmBev era vender a cerveja diretamente para a rede de supermercados, eliminando mais de 2.500 distribuidores que, por acreditarem na sua indicação e nomeação, investiram muito, compraram frota de caminhões e depósitos e treinaram vendedores. Hoje, estão à margem da falência. Devemos zelar por essas empresas, inclusive pela Fábrica de Chocolates Garoto S. A. A afirmação de V. Exª é muito oportuna. Congratulo-me também com o Senador Paulo Hartung, que já apresentou um requerimento à Comissão de Assuntos Econômicos solicitando a instalação de uma audiência pública, de que certamente participaremos. Quando se tratar de empresa nacional, é nossa obrigação, como Senadores da República do Brasil, zelar por seus interesses. Senador Ricardo Santos, no fim de sua exposição, V. Exª disse algo muito importante aos novos donos da Garoto, a Nestlé suíça: que pelo menos conservem a tradição da marca Garoto - e creio que o farão. Também seria fundamental a manutenção do mercado de trabalho. Inúmeras famílias, ao longo das gerações, trabalharam nessa empresa. Não deveriam substituir trabalhadores por mecanismos modernos que produzem tudo, sem zelar pela geração de emprego. Senador, parabéns pelo pronunciamento. Vamos trabalhar juntos no sentido de preservar o direito das empresas nacionais à sobrevivência.
O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES) - Agradeço o aparte, ilustre Senador Lindberg Cury. V. Exª tem se notabilizado no Senado pela defesa da livre concorrência e do pequeno e médio empresário, sobretudo o comerciante.
Lembro também, aproveitando o seu aparte, que essa empresa sempre foi extremamente competitiva. Ela disputou, durante anos, com a Nestlé e a Lacta, a liderança do mercado de chocolates no Brasil, sendo uma empresa genuinamente capixaba e, portanto, brasileira, conseguindo atualizar-se do ponto de vista tecnológico e ser competitiva, inclusive no mercado externo, uma vez que exporta, como eu disse, para mais de 40 países.
Incorporo ao meu pronunciamento as manifestações de V. Exª, que convergem para as nossas preocupações no sentido de defender a empresa nacional e os empregos dessas famílias atualmente apreensivas com relação ao futuro da empresa Garoto, além da própria marca. Nós, como capixabas, também defendemos a identidade dessa unidade industrial com a comunidade espírito-santense.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
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