Discurso durante a 20ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Transcrição de artigos publicados em encarte do jornal Correio Braziliense, edição do último domingo, sobre a necessidade da mídia brasileira rever a conduta de julgar precipitadamente acontecimentos políticos de repercussão nacional e promover acusações infundadas.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA.:
  • Transcrição de artigos publicados em encarte do jornal Correio Braziliense, edição do último domingo, sobre a necessidade da mídia brasileira rever a conduta de julgar precipitadamente acontecimentos políticos de repercussão nacional e promover acusações infundadas.
Publicação
Publicação no DSF de 15/03/2002 - Página 2255
Assunto
Outros > IMPRENSA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, IMPRENSA, ANTECIPAÇÃO, JULGAMENTO, ATIVIDADE POLITICA, AUSENCIA, COMPROVAÇÃO, PREJUIZO, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), AUTORIA, NATAL EUSTAQUIO, JORNALISTA, REFERENCIA, FALTA, ETICA, IMPRENSA, ANTECIPAÇÃO, JULGAMENTO, ESPECIFICAÇÃO, CONDENAÇÃO, GOVERNADOR, ESTADO DO MARANHÃO (MA), MOTIVO, SUSPEIÇÃO, IRREGULARIDADE, APREENSÃO, DINHEIRO, POLICIA FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), DEBATE, ETICA, IMPRENSA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fazendo uma retrospectiva histórica dos tempos da ditadura Vargas e do chamado regime militar, constatamos que muitos setores da sociedade lutaram pelo fim desses regimes de exceção e pela implantação do Estado de direito. Estiveram à frente, principalmente, os jornalistas, os homens da imprensa, de um modo geral, os intelectuais e os juristas.

            No Brasil, podemos dizer que, a duras penas, estamos construindo e consolidando uma democracia que se baseia exatamente no Estado de direito, naquela premissa de que todos são iguais perante a lei e, principalmente, que a pessoa é inocente até prova em contrário.

            Mas não é isso que temos visto ultimamente. De uns tempos para cá, e não muito recentemente, talvez devido ao período em que esteve amordaçada, censurada, tolhida, sem poder expressar sua opinião e mostrar a verdade dos fatos à população, a imprensa tem descambado, no meu entendimento, para outro lado.

            Tive a oportunidade de ver, no domingo, Sr. Presidente, um encarte do Correio Braziliense, cujo título é Pensar, que tem a seguinte manchete: “No banco dos réus”. E há uma submanchete, que diz: “A mídia tem o hábito de se precipitar no julgamento de acontecimentos políticos ou judiciários e atribuir culpas nem sempre comprovadas, mas deveria repensar sua conduta”.

            Há cinco artigos sobre o mesmo tema. Quero fazer, apenas, a leitura do primeiro, da lavra do jornalista Natal Eustáquio, da equipe do Correio Braziliense, intitulado “Juízes sem toga”, que tem a seguinte submanchete: Ao passar na frente dos ritos demorados de apuração e julgamentos e antecipar condenações, a mídia muitas vezes age de modo irresponsável e precipitado sem sofrer conseqüências”.

            Passo, portanto, a ler.

      Não interessam os meios, afinal o que importa são os fins - a antecipação da notícia, ou o chamado “furo”, no meio jornalístico. Esta é a filosofia que nos últimos anos parece imperar na mídia brasileira. Para tanto, não têm importância até mesmo os riscos assumidos ao se exporem publicamente indícios ou suspeitas como se fatos fossem. E, sobretudo, os prejuízos emocionais ou financeiros que se podem causar àqueles que são objeto da acusação.

      No princípio do mês, o país novamente viveu o fenômeno, ao acompanhar na mídia a invasão do escritório da empresa Lunus Participações, em São Luís, no Maranhão. A Polícia Federal partiu para a ação em atendimento a pedido do Ministério Público do Tocantins, que suspeita de desvio de verbas da antiga Sudam.

      Como a empresa é de propriedade da governadora Roseana Sarney, pré-candidata do PFL à Presidência da República, o procedimento de rotina tomou as páginas dos jornais e revistas e os noticiários das emissoras de rádio e de televisão do país. Interesses e jogos políticos à parte, a verdade é que, mais uma vez, a mídia se antecipou aos fatos e até mesmo à Justiça, dando aos indícios até agora constatados o status de comprovação.

      Trata-se, como dizem os estudiosos de comunicação social, da chamada “imprensa-tribunal”, que se caracteriza justamente pela condenação pública - muitas vezes até a execração - de um fato ou personalidade antes mesmo da apuração final dos fatos pelos órgãos de polícia competentes ou da manifestação oficial da Justiça.

      A motivação para o fenômeno, entende Alberto Dines, passa pelo comodismo dos profissionais e pela busca desenfreada de prestígio. “É comodismo sim. Você está na redação, recebe um grampo e diz: ‘Ah, vai ser uma bomba!’ Você vai vender três edições (risos). Publica”, diz o jornalista do Observatório da Imprensa, programa de televisão e jornal dedicados à análise crítica da mídia.

      “A ética é uma questão de foro íntimo. O jornalista hoje topa qualquer coisa - não todos, claro -, porque quer se projetar, fazer carreira, agradar determinados grupos”, pensa Dines, ao lembrar que o Observatório sempre se posicionou contrário à publicação de reportagens baseadas em vazamentos, grampos ou outras gravações obtidas de maneira ilícita ou nebulosa.

      Com Dines concorda o professor Luiz Martins da Silva, para quem a mídia atual, em geral, peca pela falta de checagem das informações. “É o principal problema. Se as informações fossem checadas, apuradas, a maioria esmagadora dos erros seria evitada. Não basta a acusação, é preciso haver investigação cuidadosa.’’

      Coordenador da linha de estudos de jornalismo do programa de pós-graduação do curso de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Martins percebe que atualmente a mídia não tem avaliado com cuidado o risco de incorrer em erros. “Em muitos casos, a imprensa denuncia, mas não investiga por conta própria. Se baseia em fontes. Às vezes de fé pública, mas nem por isso totalmente confiáveis.”

      O caso da Escola Base, ocorrido em São Paulo em 1994, é lembrado pelo acadêmico. Tendo como base declarações de um delegado, a imprensa noticiou a suspeita de assédio sexual às crianças da escola. O caso dominou a mídia nacional por dias a fio. Seis anos depois, as investigações foram concluídas e os donos da escola inocentados. Ficaram os prejuízos morais, emocionais e mesmo financeiros para as verdadeiras vítimas.

      “Esse é um caso claro em que a imprensa julgou e sentenciou. Era uma boa história jornalística, mas envolvia a vida de muitas pessoas. A sentença é implícita. Culpados ou inocentes, o método de apuração dos fatos é o mesmo. E o pior é que a visibilidade que se dá ao resultado da investigação é inversamente proporcional àquela dada na suspeita”, constata Martins.

      Um dos autores de Produção e Recepção dos Sentidos Midiáticos (Vozes), Antonio Albino Canelas Rubim lembra que “o fato de vivermos em uma sociedade em que a informação circula de maneira veloz não libera automaticamente as pessoas de investigar o que estão dizendo. Têm de dar conta das informações que estão passando adiante. Do contrário, em vez de me eximir, isso vai me criar problemas outros”.

      E os casos de erros e abusos cometidos pela mídia se multiplicam no dia-a-dia. Apenas o site do SOS Imprensa, projeto de pesquisa e extensão desenvolvido por Martins na UnB, lista aproximadamente cem episódios de que foram vítimas de atos desvairados da mídia personalidades, artistas ou pessoas comuns.

      Para Alberto Dines, a atitude resvala na “velha irresponsabilidade” da imprensa, há anos apontada pelo Observatório. “As pessoas têm de ser coerentes. Hoje, vejo gente que sempre defendeu agora criticando os vazamentos e grampos. Na verdade, a imprensa sempre ignorou a noção do que é público e privado. Só que agora isso tomou outra dimensão, ficou mais visível.

            Sr. Presidente, peço que os demais artigos sejam transcritos na íntegra, já que, por serem longos, não haverá tempo para lê-los da tribuna.

            Eles detêm os seguintes títulos: “Código de comunicação”; A imprensa é tribuna, não tribunal”, de Luiz Martins, para o Correio Braziliense, com o subtítulo “O que pode e o que não pode ser feito nesse momento na cobertura de fatos políticos que implicam não só os envolvidos diretos, mas a mídia em geral”; “Dos abusos midiáticos”, de Antonio Albino Canelas Rubim, também para o Correio, cujo subtítulo é “Ao mesmo tempo em que permitiram enorme concentração de poder nas mãos da mídia, as sociedades contemporâneas não criam mecanismos de controle dos excessos”; e, por fim, “A Fúria do Furo”, que tem como subtítulo “A pressa - e a vontade de surpreender a concorrência - não pode atrapalhar a justa apuração dos fatos jornalísticos, sob pena de comprometer o maior bem do jornalismo: a credibilidade”.

            Sr. Presidente, faço, portanto, este requerimento de transcrição desses artigos, cuja leitura termino por recomendar a todos nós, democratas, que queremos este País cada vez mais justo, mais transparente, onde seja condenado e punido apenas aquele que errou e não, de maneira prévia, o suspeito ou o investigado, como se fazia na malfadada Inquisição, em que previamente se escolhiam aqueles que deviam ser condenados e apenas depois se formalizava o ato.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210 do Regimento Interno.)

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            Modelo15/17/248:54



Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/03/2002 - Página 2255