Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A BIOPIRATARIA, O NARCOTRAFICO E UMA EVENTUAL INGERENCIA NORTE-AMERICANA NA AMAZONIA, ALERTANDO PARA A IRREGULARIDADE DA ATUAÇÃO DE DIVERSAS ONGS NAQUELA REGIÃO.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SOBERANIA NACIONAL. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG).:
  • PREOCUPAÇÃO COM A BIOPIRATARIA, O NARCOTRAFICO E UMA EVENTUAL INGERENCIA NORTE-AMERICANA NA AMAZONIA, ALERTANDO PARA A IRREGULARIDADE DA ATUAÇÃO DE DIVERSAS ONGS NAQUELA REGIÃO.
Aparteantes
Lauro Campos, Luiz Otavio.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2002 - Página 2900
Assunto
Outros > SOBERANIA NACIONAL. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG).
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, AMBITO INTERNACIONAL, ACUSAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, BRASILEIROS, OPERAÇÃO, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, AMERICA LATINA, APREENSÃO, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, POSSIBILIDADE, INTERVENÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REGIÃO AMAZONICA.
  • NECESSIDADE, ATENÇÃO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL, COMBATE, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, RECURSOS MINERAIS.
  • IMPORTANCIA, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), CRITICA, NEGLIGENCIA, GOVERNO, AMEAÇA, SOBERANIA, BRASIL, NECESSIDADE, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, CONTROLE.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há poucos dias assisti, pela CNN, ao pronunciamento do chefe do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que acusava formalmente três membros das Farc colombianas e três brasileiros, entre eles o famoso Fernandinho Beira-Mar, de participarem do que classificava de uma conspiração para vender drogas para os Estados Unidos, bem como de, por meio desse comércio de drogas ilegais, financiar a guerrilha colombiana pelas Farc.

Então, fizeram questão de frisar que, pela primeira vez, estavam, formalmente, acusando membros das Farc e também três brasileiros a elas relacionados. Aliás, é bom lembrar que Fernandinho Beira-Mar foi preso lá na Colômbia. Portanto, vejam que o narcotráfico colombiano já está intimamente ligado ao narcotráfico brasileiro e, portanto, transnacional.

Na verdade, se formos ver mais profundamente, isso ocorre em toda a América Latina e, possivelmente, com traficantes dos Estados Unidos. Os Estados Unidos se colocam como xerifes nessa história, mas são os maiores consumidores da droga. Não haveria produção se não houvesse consumo. No entanto, o que nos inquieta não é o consumo ou a situação da sociedade americana, que deve ser uma preocupação dos americanos primordialmente.

Preocupa-nos o evidente preparo da opinião pública internacional para uma futura intervenção dos Estados Unidos, que, aliás, não será a primeira. Na Colômbia, já há uma intervenção branca dos Estados Unidos por meio do Plano Colômbia. Inicialmente, o Congresso americano aprovou apenas ajuda e assistência para o combate ao narcotráfico, o que agora já está mudando, com a desculpa de avançar na questão militar.

Tenho repetido aqui desta tribuna, como homem da Amazônia, que nos devemos mirar no exemplo da Colômbia para evitar que, amanhã, haja pretexto para intervenção, branca ou não, dos Estados Unidos na nossa Amazônia.

Ouvi, há pouco, o pronunciamento do Senador Edison Lobão, que citou exemplos de organizações não-governamentais que estão atuando prioritariamente na Amazônia e na Região Centro-Oeste, mas também no restante do Brasil.

Isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não deveria ser preocupação apenas dos Parlamentares da Amazônia. O Maranhão, Estado do Senador Edison Lobão, por coincidência, tem uma situação peculiar: uma parte do Estado pertence ao Nordeste e outra, quase a metade, pertence à chamada Amazônia Legal - que inclui ainda uma parte do Mato Grosso, além dos outros sete Estados da Região Norte.

            Sr. Presidente, também quero trazer alguns outros fatos que mostram como precisamos fazer uma análise mais ampla, procurando olhar além das notícias, além do que é colocado por algumas instituições que, de uma maneira romântica, inocentemente ou não, tratam essas instituições não-governamentais - e até algumas organizações ilegais e criminosas, como as do narcotráfico - de uma maneira complacente. Tenho aqui, inclusive, uma notícia produzida pela ONG Amigos da Terra, em que uma parte é dedicada à Amazônia brasileira. Essa notícia foi tirada da Internet, no dia 21 de março, e diz o seguinte:

Suíços detidos tentando embarcar cerca de 500 insetos amazônicos

Cinco suíços (...) foram presos em flagrante, ontem, por agentes da Polícia Federal quando tentavam embarcar em um vôo, com destino a São Paulo, no Aeroporto Internacional Eduardo Gomes [em Manaus], levando aproximadamente 500 insetos voadores, mariposas e borboletas, segundo eles capturados nas matas de Manaus e de municípios vizinhos.

Eles alegam, em sua defesa, serem colecionadores. Mas, na verdade, todos os que estudam essa matéria sabem que é justamente na fauna e na flora que estão várias matérias-primas de medicamentos que a indústria farmacêutica ambiciona com muita insistência e interesse. Não é por acaso que a Suíça é um dos países que mais produzem medicamentos no mundo.

Os suíços foram presos e, segundo o Delegado da Polícia Federal, serão enquadrados em artigo da Lei dos Crimes Ambientais.

Ora, é pouco, considerando que eles estão praticando um roubo contra a nossa biodiversidade. Deveríamos ser mais rígidos e pedir o enquadramento em uma legislação mais rigorosa. Aliás, estamos devendo à Nação brasileira a aprovação de uma lei rígida sobre a biopirataria, que vem sendo praticada há muito tempo na Amazônia.

Temos uma outra notícia produzida por essa ONG, que diz o seguinte: “Polícia Federal apreende três quilos de diamantes em Roraima”. A Polícia Federal prendeu um garimpeiro que estaria saindo do Brasil - de Roraima - para a Guiana, levando três quilos de diamantes. E a região onde foi preso é aquela que inúmeras ONGs querem transformar em uma reserva indígena chamada Raposa Serra do Sol. Para quem não conhece a região, pode parecer que essa área é pequena; mas, na verdade, existe uma distância enorme entre a região da Raposa e a região da Serra do Sol. E ali, por acaso, só por acaso, localizam-se talvez as maiores jazidas de diamantes do mundo. Só esse garimpeiro estava com três quilos de diamantes. Esses são acasos, portanto, sobre os quais precisamos estar muito atentos.

Entendo que essas reservas indígenas não podem estar sendo criadas com a intenção de colocar fim, por exemplo, à exploração de diamantes. O Brasil, tendo grande parte do seu povo passando fome, devendo uma fortuna de dívida externa e interna, não se pode dar ao luxo de não explorar as suas riquezas minerais e as suas riquezas da biodiversidade.

Uma notícia publicada no jornal O Estado de S.Paulo, no dia 10 de março, sob o título “Garimpo ilegal dos Cintas Largas: pode ser o fim”, nos dá conta de que os índios cintas largas, em Rondônia, associaram-se com os garimpeiros e estão explorando diamantes. Diz a matéria: “Índios e garimpeiros se uniram para explorar o que talvez seja a maior jazida do minério da América do Sul”.

            Trata-se, novamente, de uma ação na Amazônia que precisamos analisar com cuidado.

Há também uma outra matéria, Sr. Presidente, publicada no jornal A Crítica, de Manaus, cujo título é: “Índios Macus fogem da aldeia temendo Farc”. Ou seja, são índios da Colômbia fugindo para o Brasil. Diz a matéria: “Fuga de pelo menos 190 indígenas da etnia para a Vila Bittencourt ocorreu há uma semana, após visita ameaçadora de guerrilheiros”.

            Há, portanto, também o problema da presença dos guerrilheiros das Farc no território brasileiro, fazendo com que índios colombianos fujam para o lado brasileiro.

Sr. Presidente, se não estou enganado, o Senador Luiz Otávio fez referência, em aparte ao Senador Edison Lobão, ao que todos vimos ontem no Jornal Nacional, da Rede Globo: uma ONG oferecendo mais do que o valor da produção para os agricultores não plantarem soja. Ou seja, uma ação realmente orquestrada, em que, como disse o Senador Edison Lobão em seu discurso, uma verdadeira tropa de choque dos interesses econômicos internacionais querem não só esterilizar as riquezas minerais, as riquezas da nossa biodiversidade, mas também impedir até a produção agrícola de áreas já agricultáveis, já exploradas. Não se trata mais de estar desmatando ou depredando. Ou seja, o agricultor está recebendo oferta de dinheiro para não plantar em áreas que já foram plantadas.

Portanto, é preciso que não só nós, da Amazônia, mas o Brasil todo - repito -, estejamos atentos e denunciemos essas coisas. Os cidadãos da Região Sul, Sudeste, enfim, os homens e mulheres deste Brasil, cujos Estados têm um desenvolvimento invejável, não devem pensar que a Amazônia não é um problema de todos os brasileiros. A Amazônia representa 60% do território nacional.

Existem notícias - que já teriam sido “desmentidas” - de que, nas escolas dos Estados Unidos, já se ensina Geografia mostrando o Brasil sem a Amazônia e sem o Pantanal mato-grossense, colocando-os como pertencentes a uma área internacional. O Brasil seria somente o Nordeste, o Sudeste e o Sul.

Aprendi, desde muito pequeno, com meus pais, que “onde há fumaça, há fogo”. Há muitos indícios e muitas comprovações de que realmente estamos sendo roubados na Amazônia e em alguns pontos do Centro-Oeste. Mas o que se está fazendo?

Instituímos, aqui, uma CPI das ONGs, como mencionou o Senador Edison Lobão, da qual tenho a honra de ser o Presidente. Já temos, pela primeira vez no Brasil, um levantamento, embora preliminar, de quantas ONGs existem no Brasil. Mas ainda queremos saber como elas atuam, como são financiadas e para que estão aqui.

Como diz aquele ditado, “quando a esmola é grande, o santo desconfia”. Ora, se há alguém interessado em pagar para o agricultor não trabalhar, se há gente interessada em vir da Suíça caçar borboletas na Amazônia e levar 500 espécimes diferentes de insetos, dá para desconfiar.

Porém, o mais absurdo, Sr. Presidente, é que órgãos do Governo Federal estejam coniventes com a ação dessas ONGs, inclusive repassando recursos para elas. Embora as organizações não-governamentais não pertençam ao Governo, como o próprio nome diz, passaram a receber recursos do Governo. Por exemplo, o Ministro José Serra deixou a saúde indígena nas mãos das ONGs. Inicialmente, tirou a função da Funai passando-a para a Funasa e, depois, terceirizou-a, entregando milhões de reais nas mãos de ONGs constituídas por meia dúzia de pessoas que, às vezes, não têm qualificação alguma para prestar assistência médica, odontológica e sanitária àquelas populações. É preciso esclarecer essa situação.

O pior é a conivência do Governo Federal, que assume uma posição de entreguismo. O Brasil é apenas uma nação, a Nação brasileira. Várias etnias formaram o povo brasileiro: os índios, os negros, e os não índios e não negros, que são os descendentes dos europeus que vieram para cá. Dessa miscigenação, surgiu a Nação brasileira.

No entanto, de uns tempos para cá, movimentos comandados por essas ONGs teimam em fazer duas coisas. Primeiro, sob a falsa bandeira de preservar os costumes dos índios, querem que eles voltem a falar idiomas que falavam na época em que Cabral chegou aqui. Ora, neste mundo globalizado, falar português já não vale quase nada! Quem se comunica em português neste mundo? Apesar de sermos uma Nação com 170 milhões de habitantes e de Portugal e outros países falarem a língua portuguesa, a primeira língua no mundo é o inglês. Quem não se comunica em inglês, não avança em quase nada. Mas essas ONGs, que são em sua maioria de origem estrangeira, teimam em fazer que a maioria das etnias indígenas fale sua língua original.

Em segundo lugar, insistem em chamar essas tribos de nação, criando uma espécie de apartheid no Brasil, fragmentando a Nação brasileira.

Há alguns dias, protestei contra um encarte, uma propaganda que vinha sendo divulgada pela Eletronorte. Esse órgão fez um convênio com a Funai e criou o Programa Waimiri Atroari - nome de um grupo indígena do sul de Roraima e noroeste do Amazonas. E vejam como é o título: “Uma Nação Volta a Nascer”. O encarte, de muito boa qualidade, vinha sendo inserido na mídia, em publicações recebidas por todos nós, Senadores e Deputados, e, obviamente, distribuído em outros lugares. Portanto, a Eletronorte, um órgão federal - e embaixo do texto está escrito Ministério de Minas e Energia, Eletrobrás, Eletronorte e Governo Federal -, admite a existência de uma nação dentro do País.

Ora, Sr. Presidente, com todo esse caldo de cultura existente e notícias de guerrilheiros, narcotráfico, exploração de reservas indígenas no País, estará dado o pretexto para que, amanhã, haja uma intervenção no Brasil da ONU - leia-se Estados Unidos, que é quem, na verdade, comanda este mundo e intervém em países como o Kuwait, o Afeganistão, independentemente da ONU querer ou não. Estamos deixando uma porta escancarada para que a Amazônia, amanhã, de fato, não seja brasileira.

O Sr. Luiz Otávio (Bloco/PPB - PA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Com muito prazer, quero ouvir o Senador Luiz Otávio, do Pará.

O Sr. Luiz Otávio (Bloco/PPB - PA) - Senador Mozarildo Cavalcanti, vou utilizar o menor tempo possível. Quero, apenas, reforçar o seu ponto de vista e apoiá-lo com relação à CPI das ONGs. Não tenho nada contra as ONGs, não tenho preconceito contra os “ongueiros”. Mas a matéria do Jornal Nacional de ontem a respeito da ONG Focus, que pagou para um produtor brasileiro R$10 mil para ficar em casa e não produzir soja para exportação, colocou V. Exª, Presidente da CPI das ONGs, com a faca e o queijo na mão, ou seja, deu o motivo para que a CPI seja instalada. Devemos convidar o Ministério Público, o Ministério da Agricultura, a Polícia Federal, a própria mídia brasileira como um todo, para que seja esclarecida essa notícia. Inclusive, o representante da Focus, ouvido na matéria jornalística da Rede Globo, não negou nada; ao contrário, disse que era um fato normal uma ONG internacional - essa é americana - trazer seus recursos para cá para que brasileiros não produzam soja. E o agricultor disse: já que vai sobrar soja, por que não a entregamos a essa quantidade enorme de pessoas mal nutridas não só do Brasil mas do mundo todo? Este é o meu alerta a V. Exª.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Senador Luiz Otávio, agradeço muito o aparte de V. Exª. Devo dizer a V. Exª que a CPI das ONGs está funcionando, apesar das dificuldades que tem encontrado devido aos tumultos e eventos ocorridos no Senado nos últimos tempos. Inclusive, já detectamos alguns fatos importantes.

O Vice-Presidente de uma ONG denominada Cooperindio - o nome é até sugestivo, Cooperativa dos Índios -, de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, foi preso pela Polícia Federal transportando uma tonelada de ametista, uma pedra preciosa de alto valor, e 300 quilos de tantalita, um mineral nobre de terceira geração. Esse é um fato provado, materializado pela apreensão dos minérios.

Uma outra ONG, comandada por um escocês, um italiano e um argentino, comprou irregularmente 174 mil hectares em Ribeirinhos, no sul do meu Estado, curiosamente registrados no Estado do Amazonas, num cartório que estamos investigando.

Nesta última semana, ouvimos o depoimento da Presidente da ONG Núcleo para Proteção dos Portadores de Câncer - por sinal, uma ONG com objetivo nobre. Mas o que está por trás disso? Uma denúncia, confirmada pela Presidente, de que um laboratório internacional estava pagando a essa ONG para que ela fizesse uma espécie de pressão junto ao Ministério da Saúde não só para registrar o medicamento no Brasil como para permitir o rápido andamento desse procedimento de registro. Nesse caso, está envolvido aquele famoso lobista que está sendo investigado no Ministério da Saúde.

Senador Luiz Otávio, precisamos de que todos se interessem pela CPI. Peço a V. Exª que solicite a presença mais intensa do representante do seu Partido na CPI. Ela fará, realmente, um raio X dessa situação e indicará os caminhos a serem seguidos.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sr. Presidente, apesar do alerta de V. Exª, gostaria de ouvir o aparte do Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - Nobre Senador Mozarildo Cavalcanti, prestei muita atenção nessa importante exposição de V. Exª e gostaria de aproveitar a oportunidade para tentar colocar meu ponto de vista a respeito de uma questão que, realmente, é muito difícil de ser compreendida. Em uma determinada ocasião, os Ministros da Suprema Corte dos Estados Unidos colocaram-se em uma posição muito parecida com essa, de reação contra as medidas do Governo Roosevelt, que consistiam em pagar os fazendeiros para que não plantassem. Isso ocorreu nos Estados Unidos, em 1933, e a Suprema Corte, com exceção de três Ministros - o Ministro Lorenzo foi um deles -, julgava a favor do Governo de Roosevelt. Os demais consideravam inconstitucional essa doação de dinheiro para que não se plantasse. O questão aqui é a seguinte: temos um Brasil cujo problema é a insuficiência de capital e de produção, e um outro em que há excesso de produção. A soja está sendo produzida em excesso e, obviamente, como o consumo do mercado interno é muito reduzido, ela é destinada, em grande parte, à exportação, o que vai ocasionar grandes problemas aos países importadores. Eles terão que pagar lá para comprar e armazenar, como Getúlio fez aqui certa vez com o café - comprou café e jogou-o no mar, pois não havia quem o consumisse. O problema do capitalismo acaba sendo o excesso de produção em relação à insuficiência e à pobreza do consumo. De modo que estamos diante de dois problemas muito expressivos para esclarecer essa dualidade. Parece-me que essa ONG que está pagando para que não se plante soja deve ser estatal. Ela recebe dinheiro e realiza aquilo que é em parte resultado de um processo antigo, que faz que os empréstimos externos, os estímulos externos, o dinheiro que vem de fora seja utilizado para desviar a capacidade produtiva do Brasil, a fim de que o País não concorra com os produtos industriais de seu país de origem. Então, lá, emprestam para irrigarmos, para fazermos pontes, para plantarmos. E esses empréstimos externos, esses estímulos para nos desviar da indústria e nos limitar à agricultura fez com que ela se desenvolvesse a um nível tão grande que o mercado interno não consegue absorver a produção, e a exportação também encontra inúmeros problemas lá fora. De modo que parabenizo V. Exª por tratar desses problemas, que são muito preocupantes. Eu mesmo assinei o pedido para abertura da CPI das ONGs, porque penso que tudo deve ser examinado. Esse acompanhamento que V. Exª está fazendo é muito importante e eu gostaria apenas de colocar a minha posição diante desse problema que confunde muita gente. Quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso estava na Alemanha, passeando de avião com Schroeder, perguntou-lhe que plantação era aquela lá embaixo. Schroeder disse-lhe: “Aquilo é colza”. “Como funciona isso?”, perguntou-lhe Fernando Henrique. Schroeder disse-lhe que o governo mandava o dinheiro e não mandava examinar, não mandava fiscalizar coisa nenhuma. Assim, também lá a agricultura, a plantação de colza tinha chegado a um nível tão elevado que já estava ocasionando problemas. Nos Estados Unidos, por exemplo, o excedente agrícola geralmente é comprado pelo governo e armazenado.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - No Alasca.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PDT - DF) - No Alasca também. Assim, é melhor não plantar do que plantar, colher, comprar, pagar para tudo, para depois armazenar e a produção apodrecer. Esse é um problema que cedo ou tarde aparece na economia capitalista. Nós não estamos acostumados com ele. Por isso estranhamos quando ele acontece. O problema do capital é o próprio capital, o capital mercadoria excedente. Peço desculpas a V. Exª por ter me excedido no tempo determinado para um aparte. Muito obrigado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sr. Presidente, quero encerrar meu pronunciamento, já que excedi o tempo regulamentar, fazendo um renovado apelo não só ao Senado, não só à Câmara dos Deputados, ao Congresso Nacional, mas a todas as forças deste País, para que não façamos ouvidos moucos ou olhos cegos para o que está aí acontecendo. Que possamos realmente tomar uma atitude neste momento da história brasileira, a fim de que amanhã não nos arrependamos ao ver que o colonialismo moderno, exercido agora não por meio da vinda de caravelas e similares, como disse o Senador Edison Lobão, mas por meio dessa verdadeira tropa de choque dos interesses internacionais, representada por muitas dessas ONGs, vem para roubar o nosso patrimônio.

Quero também deixar uma frase final: não tenho predisposição contra nenhuma ONG, até porque, em tese, pertenço a duas ONGs. Uma delas é a Igreja Católica, na qual sou, pelo menos, batizado; a outra é a maçonaria. Então, não entendo que as ONGs em si sejam maléficas, mas precisamos separar o joio do trigo. E é esse o papel que a CPI das ONGs do Senado quer fazer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2002 - Página 2900