Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem póstuma ao ex-Senador Josaphat Marinho, falecido no último dia 30 de março.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem póstuma ao ex-Senador Josaphat Marinho, falecido no último dia 30 de março.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2002 - Página 3833
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOSAPHAT MARINHO, EX SENADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), JURISTA, PROFESSOR, ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DEMOCRACIA, ETICA, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, REFORMULAÇÃO, CODIGO CIVIL.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, apesar de tudo que já se disse aqui nos últimos dias, quero também prestar minha homenagem a um dos maiores homens públicos que o Brasil já teve. Refiro-me à capacidade intelectual e política, que fizeram destacar a figura ímpar, que passou desta vida no último sábado, 30 de março, aos 86 anos, e que se manteve em atividade impressionante até os seus últimos momentos.

Sim, refiro-me ao grande Josaphat Ramos Marinho, com quem tivemos a honra e a satisfação de conviver, tirando proveito de sua enorme sabedoria de vida.

Josaphat foi o baluarte da reforma do Código Civil, da qual foi o relator, fazendo, dessa forma, com que o Brasil tivesse uma peça normativa importantíssima, já que a sociedade vem mudando, a cada dia que passa, com maior rapidez, necessitando, por isso, de um corpo legal condizente com o estágio de evolução das relações humanas e do nível de tecnologia alcançado.

Professor de Direito Constitucional com várias obras publicadas, Josaphat Marinho, mesmo tendo deixado a vida política no início de 1999, quando se encerrou seu mandato de Senador, continuou ativo, publicando artigos periodicamente no jornal Correio Braziliense, no qual era tido como o principal sentinela da aplicação do código de ética próprio, em cuja elaboração teve uma participação marcante. Foi também o primeiro presidente da Comissão de Ética desse importante veículo de comunicação, e argumentava que os jornais só sobreviverão se souberem aliar sua qualidade editorial ao rigor ético na apuração e veiculação das informações, tendo sempre como cuidado fundamental a proteção dos direitos do cidadão.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, para se avaliar a grandeza desse grande jurista e homem público que foi Josaphat Marinho, há que se fazer uma retrospectiva de sua trajetória.

No Estado da Bahia, foi Consultor Jurídico do Departamento de Serviço Público (1942), Membro da Assembléia Legislativa (1947-1951 e 1955-1959), Secretário de Estado do Interior e Justiça (1959-1960) e da Fazenda (1960-1962).

No âmbito federal, foi Presidente do Conselho Nacional do Petróleo (1961).

Elegeu-se duas vezes para o Senado Federal, a primeira, em 1962, e a segunda, em 1990. Na primeira, sua atuação ficou marcada pela oposição ao regime militar, imposto ao País a partir de 31 de março de 1964, período durante o qual se destacou como defensor de presos políticos. Com a implantação do bipartidarismo, acabou tornando-se um dos fundadores do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), para não fugir à sua marca de democrata convicto e militante do Estado de direito.

Foi notável, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, sua participação em fatos da maior relevância nos anos mais recentes da democracia brasileira!

Em maio de 1980, publicou artigo no Jornal do Brasil, em que criticava o enfraquecimento do Poder Legislativo em benefício do Poder Executivo, como conseqüência da implantação do regime militar.

Em julho de 1981, durante debate na XXXIII Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), manifestou-se a favor da convocação de uma assembléia nacional constituinte, “assegurada a livre manifestação de todas as tendências”, como forma de estabelecer no País a legalidade superior.

Como advogado, venceu duas importantes batalhas nos anos 80. A primeira, quando sustentou, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a tese de que o Partido Popular (PP) podia fundir-se com o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), e ganhou, o que possibilitou a fusão, ocorrida em 1982. A segunda, também no TSE, se deu por ocasião da vitória de Tancredo Neves para a Presidência da República, quando esposou o entendimento de que, no Colégio Eleitoral, não prevaleceria a exigência de fidelidade partidária.

Participou, ainda, como membro da Comissão de Estudos Constitucionais, criada pelo Presidente José Sarney, que funcionou sob a presidência de Afonso Arinos, para elaborar anteprojeto de Constituição.

Homem de posições firmes e convicções bem fundadas, Josaphat Marinho votou contra três das cinco propostas de reforma constitucional da ordem econômica que o Presidente Fernando Henrique enviou ao Congresso, por ser contra o fim dos monopólios estatais das telecomunicações e do petróleo e contra a extinção das diferenças entre empresas nacionais e empresas estrangeiras.

Na qualidade de parlamentar, participou, ainda, de duas reuniões do Parlamento Latino-Americano, uma no Uruguai e outra no Peru.

Não resta a menor dúvida, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, de que sua postura era ditada pela sua visão do que significaria o interesse público, desviando-se algumas vezes da orientação partidária, quando esta pudesse agredir suas convicções de intelectual e de representante dos interesses do povo e, por conseguinte, da Nação.

Foi membro do Instituto dos Advogados da Bahia, do Instituto dos Advogados Brasileiros, do Instituto dos Advogados do Distrito Federal, do Instituto Baiano de Direito do Trabalho, do Instituto Ibero-Americano de Direito Constitucional, da Academia de Letras da Bahia, da Academia Brasileira de Letras Jurídicas da Bahia e do Conselho Federal de Educação.

Felizes daqueles que com ele puderam conviver na qualidade de alunos. Exercendo o mister de professor, Josaphat Marinho atuou como contratado para lecionar Teoria Geral do Estado, Direito Constitucional e Introdução à Ciência do Direito, na Faculdade de Direito da Bahia, atualmente integrante da Universidade Federal da Bahia. Depois, passou a Professor catedrático para a cadeira de Direito Constitucional e de Direito Público Comparado, no curso de Doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Na Universidade de Brasília, para onde se transferiu em 1971, lecionou Direito Constitucional e Teoria Geral do Direito Público, esta, também no curso de Mestrado, onde ministrou igualmente aulas de Técnica Jurídica e de Direito Administrativo. Pelo seu reconhecido mérito e saber jurídico, recebeu a honraria de Professor Emérito da Universidade de Brasília.

A morte de Josaphat Marinho, Sras e Srs. Senadores, cria no meio intelectual e político brasileiro uma lacuna que, provavelmente, jamais será preenchida.

É difícil descrever o sentimento de pesar com que recebi a infausta notícia do seu passamento inesperado. Sim, porque há poucos dias ainda estávamos haurindo de sua sabedoria nas páginas do Correio Braziliense, onde suas idéias ainda eram colocadas de forma muito lúcida e esclarecedora.

Sabemos que Josaphat não era aquele parlamentar de ocupar todo dia a tribuna desta Casa, mas, quando o fazia, era para expor suas opiniões de maneira a receber o maior respeito e atenção dos nobres Pares. Nas ocasiões de maior indefinição jurídica, é que sua voz se agigantava e suas idéias aclaravam o cenário político, dando a definição exata das opções mais condizentes com o interesse público.

Por isso, se dissermos que o Brasil está mais pobre no campo intelectual, não sei se algum de nós teria como contradizer essa afirmação. E realmente é o que sinto.

O nosso saber jurídico perdeu uma boa parte do seu brilho!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2002 - Página 3833