Discurso durante a 36ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise do papel do Estado na economia.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Análise do papel do Estado na economia.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2002 - Página 3931
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • NECESSIDADE, ATUAÇÃO, ESTADO, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, BRASIL, OPÇÃO, AUMENTO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, SAUDE, ALIMENTAÇÃO, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, PROGRAMA, RENDA MINIMA.
  • ANALISE, INJUSTIÇA, POLITICA FISCAL, BRASIL, SUPERIORIDADE, AUMENTO, TRIBUTAÇÃO, SALARIO, IMPOSTO DE RENDA, PESSOA FISICA, COMPARAÇÃO, TRIBUTOS, BANCOS, REGISTRO, DADOS, RECEITA FEDERAL, DENUNCIA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
  • NECESSIDADE, ATENÇÃO, SOCIEDADE, COBRANÇA, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, REALIZAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é legítimo que haja divergências a respeito das questões de Estado. Cada cidadão ativo, que pensa politicamente a Nação, tem sua idéia sobre os problemas nacionais. Cada um tem sua concepção do papel que o Estado deveria desempenhar e de onde deveria ser traçada a fronteira entre o público e o privado. É natural também que os cidadãos comuns e que os políticos busquem contato com outras pessoas que pensem de forma parecida e, de acordo com o critério da semelhança ideológica, se organizem em grupos e partidos políticos.

Quanto ao papel do Estado na economia, por exemplo, alguns grupos mais à esquerda do espectro ideológico consideram que toda vez que o setor público chama para si a responsabilidade pela administração direta de setores produtivos, isso é um avanço para a sociedade. Para outros grupos mais à direita, muitos deles com origem na própria esquerda, a presença excessiva do Estado na economia dificulta, onera e sufoca o bom funcionamento da produção de bens e serviços, o que, no final das contas, é fator de empobrecimento para toda a sociedade. Na última década, no Brasil, tem predominado uma visão que reserva para o Estado uma atuação menos direta na economia, a qual passa a assumir função mais regulatória e fiscalizante.

Enfim, as divergências existem e, como diz o adágio, cada cabeça, uma sentença. Contudo, nessa questão específica a respeito do comportamento do Estado na economia, há um ponto de convergência teórica, sendo poucos os que dela não comungam, que é a seguinte: a visão de que o Estado deveria cumprir papel ativo para a melhoria da distribuição de renda no Brasil. Pegue-se o liberal mais empedernido em termos econômicos, consulte-se o político que mais suspeitas mantém sobre a atuação do Estado, e mesmo esses não hesitarão em dizer que, no Brasil, é necessário que o Estado promova melhor distribuição de renda. Pode haver divergência sobre a forma de se fazer isso, mas não sobre sua necessidade.

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, ainda haveria polêmica, a depender das preferências ideológicas e da opinião de cada um, sobre a melhor composição do gasto público que pudesse levar, da forma mais eficaz e mais rápida, a melhor distribuição de renda. Alguns privilegiariam os gastos em bens e serviços que pudessem levar os mais pobres à emancipação da dependência do Estado e que, no futuro mais breve possível, lhes permitiriam, com seu trabalho, criar sua própria renda, como são os gastos com educação, saúde e alimentação. Outros prefeririam eliminar intermediários e conceder recursos financeiros, de forma direta, aos necessitados, caso dos programas de renda mínima.

Então finalmente chego ao ponto a que queria chegar. Um ponto óbvio: o de que, para melhorar a distribuição de renda, independentemente de se saber como se deve gastar o dinheiro público, é necessário que o Estado arrecade mais dos estratos mais ricos da sociedade e menos dos estratos menos ricos. Não há o que contestar aqui. Se o Estado brasileiro continuar a fazer o que parece estar fazendo até hoje, que é retirar mais de quem tem menos; então, obviamente, a distribuição de renda no Brasil vai piorar cada vez mais, a cada dia.

Referi-me, de propósito, e não por eufemismo, aos estratos menos ricos da sociedade, em vez de dizer mais pobres. Pois quero hoje, aqui, trazer um exemplo - conhecido, aliás, por todos - da injustiça tributária brasileira, um exemplo que tem a ver com o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), que é imposto que os mais pobres entre os mais pobres da sociedade não pagam, embora o paguem, e de forma pesada, os estratos menos ricos da sociedade, ou seja, setores de classe média com emprego formal.

Uma reportagem de jornal dá-me a oportunidade de trazer o exemplo à consideração dos Senhores Senadores. Intitulada Imposto do Salário sobe 54%; de Bancos, 12%, foi publicada na Folha de S. Paulo do dia 9 de março último. Como o título já diz, a reportagem estabelece uma comparação; comparação entre o aumento da arrecadação da Receita Federal obtido, por um lado, do setor financeiro e, por outro lado, do Imposto de Renda das Pessoas Físicas. Isso, no período de oito anos, entre 1994 e 2001. Cumpre dizer, aliás, que a comparação foi extraída de estudo da própria Receita Federal. Os números exatos são os seguintes: a arrecadação do setor financeiro aumentou 11,77%, enquanto a arrecadação com IRPF cresceu 53,6%!1

Essa comparação, Senhor Presidente, é específica, é localizada, naturalmente está longe de abranger o sistema tributário brasileiro como um todo, nada diz dos impostos indiretos não progressivos, nos quais se apóia fortemente nosso sistema e que ajudam a fazer dele um instrumento de concentração de renda, nada diz dessa infame CPMF; mas serve como ilustração da injustiça tributária na qual estamos imersos há tantos anos. Pois o setor mais rico da economia, que indiscutivelmente é o setor financeiro, em oito anos contribuiu com apenas 12% para o aumento - aliás, brutal - da carga tributária. (Devo dizer que o aumento da arrecadação total da Receita Federal, no mesmo período, foi de 43% em termos reais!2) E os assalariados brasileiros que pagam imposto de renda, que são basicamente aqueles de classe média com emprego formal, contribuíram com nada menos do que 54% para tal aumento de arrecadação!

Vê-se, assim, que a renda, no Brasil, vai, cada vez mais, se concentrando. Os que têm mais, pagam menos; os que têm menos, pagam mais. Enquanto a atitude do Governo é jogar todo seu peso político para, por exemplo, impedir a correção monetária da tabela do IRPF - o que acabou por conceder pela metade, após sofrer grande pressão política -; ficamos sabendo, por reiteradas reportagens de jornais, que há muitas instituições financeiras, grandes, que, por meio de planejamento tributário, conseguem deixar de pagar ao Fisco um único centavo! A assimetria é patente, e não deveria ser tolerada!

Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, se há o consenso que acredito que efetivamente haja, no sentido de que o Estado brasileiro deve cumprir papel ativo para a promoção de melhor distribuição de renda entre nós, então façamos por onde isso alcançar!

Antes de qualquer discussão sobre a composição do gasto público melhor talhado para promover a distribuição de renda, envidemos esforços para impedir que a máquina arrecadadora do Estado continue a retirar mais recursos de quem tem menos, deixando os de quem tem mais à vontade. Não, isso não pode persistir!

Uma avaliação política realista indica que não é possível, ainda na vigência do atual Governo, promover uma reforma tributária ampla, duradoura e eficaz. Mas fiquemos a postos para que, tão logo assuma o poder o próximo Presidente, possamos lhe cobrar a coordenação e a iniciativa de conclamar os diversos setores ativos da sociedade brasileira para, em conjunto, elaborarmos um projeto de reforma tributária que vá ao encontro dos legítimos anseios do Brasil por justiça tributária!

Era o que tinha a dizer.

NOTAS:

           1. IMPOSTO DO SALÁRIO SOBE 54%; DE BANCOS, 12%. Folha de S. Paulo, Folha Dinheiro, p. B1, 09.03.2002.

           2 Idem.


Modelo1 9/26/246:53



Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2002 - Página 3931