Discurso durante a 31ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EX-SENADOR JOSAPHAT MARINHO.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EX-SENADOR JOSAPHAT MARINHO.
Publicação
Publicação no DSF de 02/04/2002 - Página 3256
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOSAPHAT MARINHO, EX SENADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), PROFESSOR, JURISTA, ELOGIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA.
  • APOIO, INDICAÇÃO, NOME, JOSAPHAT MARINHO, EX SENADOR, DENOMINAÇÃO, LOCAL, REUNIÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, SENADO.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, tem razão o Senador Bernardo Cabral quando diz que há momentos em que não gostaríamos de estar nesta tribuna.

Quem conversou com Josaphat há poucos dias e o viu em sua plenitude física e mental, trabalhando como diretor de faculdade, escrevendo artigos para o Correio Braziliense, quase de página inteira, que eram aulas a nós, políticos, aos estudantes e intelectuais, em que semanalmente abordava o assunto mais importante no mundo, no Brasil, na Bahia. Com a sua competência esmiuçava, interpretava e buscava aquilo que não víamos, e, analisando as entrelinhas, apontava o caminho, apontava o rumo.

Quem acompanhava Josaphat Marinho não poderia imaginar que, de repente, fosse surpreendido como eu: morreu e foi enterrado. Certos homens públicos deviam ser proibidos de morrer em fim de semana ou, pelo menos, se morressem em fim de semana não deveriam ser enterrados antes que a sociedade tomasse conhecimento. Fora o enterro hoje, estaríamos todos lá na Bahia, levando a nossa homenagem, o nosso pranto, a nossa solidariedade. Mas se Deus nos judiou, a nós, Deus foi bom para Josaphat: morreu tranqüilo, sereno, no auge da sua capacidade; a morte de alguém que está em paz consigo mesmo e que pôde dizer quando saiu desta Casa nesta tribuna: “missão cumprida”. Em aparte concedido a S. Exª, por ocasião de sua despedida, desta tribuna eu dizia que considerava ridícula a figura do senador vitalício, como querem fazer numa emenda que anda por aí, segundo a qual ex-Presidentes se transformariam em senadores vitalícios. Achava até grosseiro. Mas quanto a S. Exª, o Senador Josaphat, deveria haver uma fórmula, um ato que determinasse a obrigatoriedade de estar aqui conosco permanentemente, todos os dias, para nos orientar, para nos elucidar, para ser o termômetro do que vive e do que pensa o Senado, para ser o condutor da linha média do pensamento desta Casa. Quando S. Exª me informou que não concorreria à reeleição, levei um choque. Isso para mim parecia tranqüilo. Na verdade nós nos surpreendemos lá no Rio Grande do Sul quando vimos a aliança de Antonio Carlos para Governador e Josaphat para o Senado. Mas aqui no Senado tivemos a oportunidade de entender e compreender que Antonio Carlos e Josaphat eram pessoas diferentes, com idéias muito diferentes, mas que se respeitavam e que cumpriram até o final o entendimento que os levou, num determinado momento, a uma aliança na Bahia. Mas dizia Josaphat que, durante os oito anos em que foi Senador aqui, manteve uma linha da mais absoluta independência com relação ao Governo Fernando Henrique, enquanto o seu colega, Antonio Carlos, quando chegou a esta Casa, mantinha uma posição de apoio ao Presidente Fernando Henrique. Dizia a mim Josaphat: “O Governador e eu temos um respeito recíproco. No que tange à Bahia, estamos absolutamente juntos; no que tange pessoalmente à figura de Antonio Carlos, eu mantenho o meu respeito por ele. Mas as idéias que eu tenho, eu as tenho. Eu respeito Antonio Carlos, e Antonio Carlos me respeita.

Quando procurei Antonio Carlos para fazer um apelo interpretando o pensamento de muitos Senadores para que Josaphat retornasse a esta Casa, falando com vários Parlamentares de vários Partidos, argumentaram eles até com a possibilidade de Josaphat Marinho ser um candidato quase unânime. Antonio Carlos disse que eu deveria falar primeiro com Josaphat. E quando eu falei, Josaphat me disse que seria impossível porque ele entendia a situação e o momento, e que não tinha como continuar sendo candidato, por isso, abandonava a vida pública.

E que bela vida pública, Sr. Presidente! Tem razão V. Exª ao dizer que não há outro brasileiro que não Josaphat Marinho para dar nome à sala da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que V. Exª tão bem preside. O outro, Rui Barbosa, já é o patrono do plenário do Senado. Assim sendo, penso que realmente cabe a nós indicarmos Josaphat Marinho para ser o patrono da sala da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Conheço Josaphat de longo período. Eu, lá no Rio Grande do Sul, Deputado Estadual, já tinha Josaphat Marinho entre os vultos que eu admirava, respeitava e acompanhava. Josaphat é daqueles vultos que hoje fazem falta ao Brasil: ele fala, nós ouvimos, lemos, vemos e com tal nos identificamos.

Hoje é muito difícil encontrar um Josaphat Marinho, um Hélder Câmara, um Barbosa Lima Sobrinho, pessoas que falam, o Brasil escuta e fica tranqüilo. Esse é o caminho, independentemente das dúvidas que possa ocasionar, por mais complexo que seja o caminho.

Eu me identifiquei com o Josaphat. Tanto me identifiquei que no início - na primeira eleição depois da morte do Senador do Acre na Presidência do Partido, quando o Dr. Ulysses Guimarães, como Vice-Presidente, assumiu - na primeira eleição, quando houve uma disputa entre o Dr. Josaphat e o Dr. Ulysses, eu fiquei do lado do Dr. Josaphat, que representava, naquela altura, o pensamento da Esquerda, o pensamento progressista do MDB de todo o Brasil.

O Josaphat tem uma história de integridade, de pureza, de grandeza. É difícil encontrar alguém que possa superá-lo. Na Petrobras, teve coerência e firmeza, no Conselho Nacional do Petróleo, defendendo um cargo nas horas difíceis que atravessava, foi ele quem deu orientação, quem deu determinação. E foi fiel ao seu trabalho.

No MDB ele nos honrou durante muito tempo. Saindo do Partido, continuou o mesmo Josaphat, com as mesmas idéias e com os mesmos pensamentos. Que trabalho magnífico o de Josaphat Marinho como Relator do Código Civil! Parece que de certa forma é destino do Brasil. No início do século passado, o Código Civil era Clóvis Bevilacqua, praticamente se resumia nele. Este Código Civil que está aí é Josaphat Marinho. O Código Civil ficou 12, 14, 16 anos na gaveta da Câmara dos Deputados e, na hora de ser votado, foi aprovado por acordo de Líderes. Isso é inédito na história do Brasil e do mundo: um código civil votado por acordo de Líderes, sem uma emenda e apenas com a votação geral. Veio para esta Casa e ficou em outra gaveta. Respeito ao Sr. Antonio Carlos, Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que designou Josaphat Marinho Relator. E Josaphat Marinho, em um trabalho hercúleo, monumental, extraordinário como Relator, fez com que esta Casa e o Brasil tivessem um novo Código Civil.

Josaphat Marinho, pelo que nos deu ao longo de sua vida pública, pela profundidade das suas idéias, democrata convicto, um homem de idéias de Esquerda na busca da justiça social, mas um homem tranqüilo, democrata, que sabia o que queria e coerente com o que queria, deixa na política e na vida brasileira um vazio que nos angustia.

Não faz mais do que 20 dias falava eu com um estudante de sua faculdade sobre as aulas de Josaphat. O estudante disse que ficava impressionado pelo conteúdo daquele seu professor, pela profundidade, pela independência e pela grandeza com que analisava os assuntos, dando aos alunos a possibilidade de conhecer os vários ângulos e não apenas aquele que julgava correto. E que ele, Josaphat, falava como se fosse um jovem de 30 anos. E que o tempo passava, e sem nada na frente ele falava, e falava de maneira que parecia que fosse durar a vida inteira. Ele dizia: “Faremos assim pensando no futuro. Amanhã faremos isto. Adiante, faremos aquilo”. O jovem até me perguntou como eu interpretava o fato de uma pessoa de mais de 80 anos que falava pensando que nunca iria morrer. Eu lhe respondi: meu querido amigo, não é que Josaphat achasse que não iria morrer; é que Josaphat estava preparado para morrer a qualquer momento e, como poderia morrer a qualquer momento, ele não podia perder uma oportunidade para falar e deixar aos seus alunos, aos seus amigos, aos seus leitores do Correio Braziliense uma mensagem, um conselho, uma palavra, uma orientação, um estímulo, a indicação de um caminho.

Trago aqui o abraço do amigo. Tive em Josaphat, talvez, uma das minhas maiores amizades no Congresso Nacional. Com ele tive a melhor convivência: convivência de amigo e convivência de irmão.

Levo à família de Josaphat, levo à Bancada da Bahia nesta Casa, levo ao Governo e ao povo da Bahia, levo ao povo e aos universitários de Brasília, enfim, levo ao Brasil a mensagem comovida de amor, de carinho e de respeito a este nome, perante o qual todos se curvam: Josaphat Marinho.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/04/2002 - Página 3256