Discurso durante a 38ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ANALISE DOS DADOS DA PESQUISA NACIONAL DE SANEAMENTO BASICO, DIVULGADOS PELO IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA, QUE REVELAM UMA LASTIMAVEL REALIDADE SOCIAL EM NOSSO PAIS.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SANITARIA.:
  • ANALISE DOS DADOS DA PESQUISA NACIONAL DE SANEAMENTO BASICO, DIVULGADOS PELO IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA, QUE REVELAM UMA LASTIMAVEL REALIDADE SOCIAL EM NOSSO PAIS.
Aparteantes
Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 11/04/2002 - Página 4013
Assunto
Outros > POLITICA SANITARIA.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, PESQUISA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), SANEAMENTO BASICO, DEMONSTRAÇÃO, INSUFICIENCIA, COLETA, LIXO, ABASTECIMENTO, TRATAMENTO, AGUA, ESGOTO, MUNICIPIOS, RESIDENCIA, PREJUIZO, SAUDE PUBLICA.
  • COMENTARIO, INSUFICIENCIA, INVESTIMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, POLITICA DE SANEAMENTO BASICO, ELOGIO, PROGRAMA DE GOVERNO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, AUMENTO, VERBA, SANEAMENTO BASICO, HABITAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

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SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o direito à moradia digna e adequada, essencial como é para o bem-estar e equilíbrio das famílias, permanece longe de ser atendido para boa parte de nossa população. Componente fundamental do conceito de “moradia digna e adequada” é, sem dúvida, o saneamento básico, que abrange serviços como o fornecimento de água apropriada para o consumo humano, coleta e tratamento de esgotos e coleta de lixo.

Os dados que vêm sendo publicados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) descrevem uma lastimável realidade social no que se refere ao saneamento em nosso País. “Censo sanitário humilha Brasil” foi simplesmente a manchete do Jornal do Brasil do último dia 28 de março, quando foram divulgados os dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico referentes ao ano de 2000. A revista IstoÉ, por sua vez, referiu-se, no título da matéria, a um “País sujo”.

Preocupantes como são as estatísticas, deve-se reconhecer que houve melhoras em determinados itens, em relação a uma situação anterior ainda mais precária. Mas se mostram tais melhoras, de modo geral, modestas e insuficientes diante de um quadro social alarmante, em que as cidades têm enfrentado, sem condições adequadas, o crescimento descontrolado da sua população, ao mesmo tempo em que a zona rural e as pequenas cidades permanecem desassistidas e enredadas em dificuldades econômicas.

Em relação a 1989, constatamos que o percentual de Municípios com esgotamento sanitário subiu de 47,3% para 52,2%. Não há dúvida de que um crescimento de 5% em 11 anos é demasiadamente inexpressivo, uma vez que quase metade dos Municípios do País continua sem rede de esgotos. Já os Municípios servidos por água encanada, que, em 1989, eram 95,6% do total, chegaram a 97,9%, aproximando-se, portanto, da totalidade dos Municípios brasileiros.

Não nos esqueçamos, no entanto, Sr. Presidente, de que esses dados referem-se aos Municípios e não a toda a população que neles habita. Detalhando um pouco mais os dados da pesquisa, vemos que 36%, ou mais de um terço de nossas residências, não dispõem de um serviço tão básico como a água encanada. Será necessário lembrar que essas residências não-atendidas são as da parcela mais pobre da população?

Já o número de domicílios que não contam com esgotamento sanitário somam nada menos que 67% do total. Se sobrepusermos a essa estatística os dados de que apenas 35,25% do esgoto coletado recebe algum tipo de tratamento, enquanto o esgoto de 75,6% dos domicílios é despejado in natura nos rios, nos lagos e no mar, teremos uma das principais razões por que a qualidade da nossa água vem-se deteriorando rapidamente.

O problema da destinação dos dejetos domiciliares e industriais, abrangendo esgoto e lixo, é muito sério, já que está fortemente vinculado à saúde da população. No que se refere ao esgotamento sanitário, vemos que há grandes disparidades regionais, uma vez que mais da metade dos lares no Sudeste tem seu esgoto coletado, enquanto, na Região Norte, apenas 2,4% dos domicílios contam com tal serviço.

Não é de se espantar, portanto - embora seja de se lastimar -, que uma pesquisa da Organização Mundial de Saúde, baseada em dados coletados pelo IBGE em 1997, indique que as doenças infecciosas e parasitárias, fortemente vinculadas à ausência de saneamento, são as maiores responsáveis pelas mortes de crianças de um a quatro anos na Região Norte, respondendo por 27,6% dos óbitos.

Também no Estado de Goiás, a situação do esgotamento sanitário encontra-se em baixíssimo patamar. Basta dizer que, em 2000, dos 242 Municípios existentes, apenas 37 contavam com rede de esgotos. Esse número corresponde a 15% das cidades goianas, um percentual sensivelmente inferior aos 52,2% da média nacional.

Quanto à coleta e destinação do lixo, há algumas melhoras efetivas, relacionadas a um melhor desempenho das grandes metrópoles. As 13 maiores cidades brasileiras produzem 31,9% do lixo coletado, o qual é destinado, em sua grande totalidade, a aterros sanitários e a aterros controlados. Já os Municípios de até 20 mil habitantes, que correspondem à maior parte dos Municípios brasileiros - em 2000, 4.026 dos 5.507 Municípios -, depositam seus dejetos sólidos em lixões e em alagados, na proporção de 68,5% deles.

Nas grandes cidades, o problema que se agrava é o do lixo não coletado, que se acumula nas ruas e terrenos baldios. Esse fenômeno, somado a problemas de adensamento populacional, de obras de drenagem inadequadas, além do assoreamento dos rios, tem sido responsável pelo aumento das inundações e enchentes em nossas cidades dos mais diversos tamanhos. Entre 1998 e 2000, 22,4% dos Municípios brasileiros tiveram que se haver com essas ocorrências, por vezes calamitosas.

A insuficiência de água encanada, a coleta reduzida de esgoto domiciliar, a destinação inadequada de lixo em nosso País, com todos os seus efeitos danosos sobre a saúde da população, refletem a ausência de uma priorização efetiva de saneamento básico pelo Governo e a falta de um planejamento adequado para implantá-lo.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nossas cidades crescem desordenadamente, com um grande número de habitações sendo erguidas em condições impróprias. Veja-se, a propósito, que o Censo 2000 aponta um crescimento considerável no número de favelas: tínhamos então - de acordo com o critério restritivo do IBGE, que exclui os conjuntos com menos de 51 residências - 3.905 favelas espalhadas pelo País, mostrando um crescimento de 22,5%, em relação a 1991. Como enfatiza a socióloga Alba Zaluar, “houve um crescimento muito rápido da população urbana e nenhum governo se preparou para isso, nem economicamente, para gerar empregos, nem com uma política habitacional”.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Concedo um aparte ao Senador Romeu Tuma, com muito prazer.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Desculpe interrompê-lo, Senador. É muito importante o pronunciamento de V. Exª sobre saneamento básico, um setor desassistido nas grandes cidades. Vejo na minha São Paulo o sofrimento da população com a falta de infra-estrutura. Falta ao cidadão que mora na favela, na periferia, orientação sobre como se conduzir para que o próprio lixo seja recolhido, o que não acontece. O lixo cai nos córregos, nos rios e, em seguida, vêm aquelas enchentes terríveis, destruindo e trazendo terríveis desgraças para vários segmentos da população, inclusive doenças graves, como colocado no seu discurso. V. Exª foi um dos baluartes na aprovação do Estatuto das Cidades, quando foi discutido na nossa Comissão de Assuntos Sociais. É importante que esse Estatuto seja analisado pelos Srs. Prefeitos, para que realmente possam usar todos aqueles dispositivos que nele estão escalonados. Há outros problemas gravíssimos, como a coleta de lixo, os aterros sanitários, as usinas de lixo, que no interior praticamente não existem. Hoje mesmo recebi três prefeitos tentando obter verbas para viabilizar usinas de lixo, para oferecerem melhores condições para a população. Com respeito à saúde, sabemos que o lixo é o responsável por doenças gravíssimas, transmitidas por vários insetos, mosquitos. V. Exª traz um assunto que deveria ser colocado nas primeiras páginas dos jornais para que os governantes leiam sobre ele e realmente se preocupem. Parabéns, Senador!

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Senador Romeu Tuma, agradeço o aparte de V. Exª, que tem sido um esteio forte em todas as votações que se referem à qualidade de vida, à moradia. V. Exª ajudou tanto na aprovação da emenda constitucional nesta Casa - foi líder nesse processo aqui no Congresso Nacional -, quanto na Comissão de Assuntos Sociais, presidida por V. Exª, onde deu prioridade total ao estudo do Estatuto da Cidade. Esse conjunto de leis, essa caixa de ferramentas hoje está disponível aos agentes públicos municipais, como vereadores, prefeitos, e à própria sociedade, visando a que enxerguemos a cidade de modo diferente e procuremos dar soluções aos problemas. Acolho com muito prazer as suas palavras. E V. Exª tem razão ao dizer que esse tema tem de ser debatido exaustivamente nesta Casa e deve ser pauta oficial, necessária e indispensável de qualquer programa de candidato à Presidência da República. Vejo com muito bons olhos o primeiro programa lançado, que foi o do presidenciável Ciro Gomes, que já propõe ações concretas, especialmente na área de habitação: a construção de 300 mil casas no período de um ano, para criar um cronograma de atendimento às pessoas que não têm moradia.

Vejo também a mesma preocupação por parte do PT, já discutindo a questão da moradia e da qualidade de vida nas grandes cidades. Penso que qualquer candidato tem de estar voltado para uma política habitacional forte e para a qualidade de vida dos grandes centros urbanos, onde moram hoje 82% da população brasileira. Agradeço o aparte de V. Exª, que enriquece o meu pronunciamento.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, essa ausência de planejamento reflete-se também na falta de integração entre as ações de saneamento. No comentário de Cristiano Leobas, jornalista de O Popular, diário da Capital goiana, a "primeira preocupação (do Governo) é em fornecer a água, depois em realizar a coleta de esgoto, e, por último, tratá-lo, quando o ideal seria que tudo fosse pensado de forma conjunta".

Enfim, há muitas propostas específicas de ações e soluções que devem ser questionadas e avaliadas, de modo a resultarem num modelo de saneamento básico para o País, integrando as três esferas de governo. E a necessidade de viabilizar moradia em condições adequadas para boa parte da população, que não a possui, deve ser pensada conjuntamente e deve ser contemplada pelo modelo, uma vez que o nosso déficit habitacional é calculado em 6,6 milhões de unidades.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, para universalizar o serviço de água e esgoto, de acordo com os técnicos do Governo Federal, seria necessário investir um montante de 0,4% do PIB durante 10 anos. Para sermos justos, devemos reconhecer que, no Governo Fernando Henrique Cardoso, os investimentos corresponderam, em média, a 0,25% do PIB, bem acima do 0,11% gasto no período de 1990 a 1994. Esse montante, entretanto, fica abaixo do 0,28% do PIB investido na década de 80 e bem abaixo do 0,38% investido na década de 70, índice este que ainda fica um pouco abaixo do nível de investimentos que o próprio Governo sabe ser imprescindível para solucionar o problema.

O Governo Federal, ademais, diminuiu consideravelmente seu montante de investimentos após 1998. E vem mantendo a prática de reter verba orçamentária destinada ao saneamento básico, somando R$596 milhões que deixaram de ser investidos nos três últimos anos - ou seja, um terço da verba destinada a uma finalidade tão inadiável.

Essa não é uma prática isolada do Governo Federal, mas antes revela um comportamento que se espalha pelos governos estaduais e municipais. Afinal, a coleta de esgotos, como se faz por obra subterrânea e a sua relação direta com a saúde da população nem sempre é percebida, não costuma ser privilegiada nos programas de ação governamental. O mesmo raciocínio aplica-se ao tratamento de água, que, para nosso desalento, regrediu nos últimos anos: o volume de água não tratada representava 3,9% em 1989, subindo para 7,2% em 2000.

A precária situação, Srªs e Srs. Senadores, do saneamento básico em nosso País, que parece estar sempre patinando no mesmo lugar, deve ser mudada urgentemente, com uma política séria de investimentos, de enfrentamento sistemático dos problemas e das carências. Se não for pelo respeito devido à saúde do nosso povo, que seja por motivações econômicas, pois já se sabe que, para cada real investido em saneamento, são poupados cinco reais em gastos com a saúde pública.

A população brasileira agradece os investimentos realizados em saneamento básico e retribui com uma melhoria das mais expressivas em sua saúde.

São as colocações que faço hoje nesta Casa, pedindo que todos nós, Senadores, nos empenhemos para que os candidatos a Presidente da República de todos os partidos - e vejo ali o nosso pré-candidato a Presidente da República, Senador Pedro Simon - tenham políticas definidas e claras em relação a moradia e saneamento básico em nosso País.

Esta foi a grande falha do atual Presidente Fernando Henrique Cardoso nesses oito anos de mandato: não houve nenhuma intervenção forte, nenhuma ação que o caracterizasse como preocupado com a qualidade de vida nas nossas grandes cidades.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/04/2002 - Página 4013