Discurso durante a 39ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Necessidade de conscientização social da importância da racionalização dos recursos hídricos mundiais.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Necessidade de conscientização social da importância da racionalização dos recursos hídricos mundiais.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2002 - Página 4299
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, SUPERIORIDADE, RECURSOS HIDRICOS, BRASIL, ESTADO DE GOIAS (GO), DENUNCIA, PERDA, AGUA, FALTA, CONSCIENTIZAÇÃO, GOVERNO, POPULAÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, EXODO RURAL, FAVELA, ZONA URBANA, AUSENCIA, SANEAMENTO, AUMENTO, LIXO, POLUIÇÃO, CONTAMINAÇÃO, FONTE.
  • IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE AGUAS (ANA), GESTÃO, RECURSOS HIDRICOS, DEFESA, IMPLANTAÇÃO, COMITE, BACIA HIDROGRAFICA, PREVENÇÃO, CONFLITO, PARTILHA, AGUA, ESTADOS.
  • REGISTRO, DADOS, BACIA, ESTADO DE GOIAS (GO).

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Sr. presidente, Srªs e Srs. Senadores, detentor de 17% de toda a água doce do mundo, o Brasil bem poderia ser chamado o país da água. Dessa fração nacional, 16%, ou 2,72% da água doce da terra, estão na região Centro-Oeste, que perde apenas para a região Norte, onde se localiza a maior parte da gigantesca bacia hidrográfica do Amazonas.

Particularmente em Goiás, Estado situado no coração geográfico no País e que circunda também o centro de nossas decisões políticas, o Distrito Federal, está situado o encontro dos divisores de águas de três grandes bacias hidrográficas, a do Tocantins, a do São Francisco e a do Paraná - a Reserva Biológica de Águas Emendadas. No subsolo goiano situa-se, ainda, 6,5% do aqüífero internacional Guarani, o maior manancial de água subterrânea do mundo.

Essas condições de abundância deveriam fazer do Brasil um país sem problemas relativos ao suprimento de água, e de Goiás um Estado particularmente privilegiado. No entanto, infelizmente, não é o que acontece. Nossa imprevidência, como Governo e como Nação, pode deixar tudo a perder.

Imprevidência manifesta principalmente no desperdício de água tratada, mas que tem na manutenção de um contingente enorme de pessoas na miséria e na pobreza um fator de ameaça à salubridade dos recursos hídricos. Por um lado, nossa gente das áreas urbanas mais bem atendidas por serviços públicos, como esgoto e água tratada, costuma não ter pena de desperdiçar o recurso em atividades como banhos demorados ou a lavagem de varandas, calçadas ou automóveis com o uso de mangueiras d’água. Goiás, segundo estatísticas oficiais, é um dos Estados campeões de desperdício.

Por outro lado, nossa incapacidade de lidar com a migração das populações do campo para as cidades, onde elas se instalam como podem, à margem de qualquer planejamento e sem saneamento, vem agravando os problemas com o lixo e com a contaminação de lençóis e mananciais.

Por felicidade, vem crescendo a consciência do valor da água. Não é para menos: o crescimento populacional e econômico do mundo vem fazendo aumentar as tensões sobre o ambiente em toda parte do globo. As sempre crescentes necessidades de água para consumo humano, para usos industriais, para dessedentação animal e, principalmente, para irrigação de áreas agricultadas, já causam nos estudiosos do assunto a certeza de que os grandes conflitos diplomáticos e bélicos deste século haverão de se dar em torno dos direitos de acesso a fontes de água utilizável.

Em áreas como o Oriente Médio, por exemplo, a questão da água é fator nada desprezível para o aumento das tensões de ordem política, étnica e religiosa que fazem da região um barril de pólvora.

Nesse sombrio contexto mundial, o Brasil não poderia mesmo continuar imobilizado pela ilusão de sua abundância do recurso. A criação da Agência Nacional de Águas (ANA), incumbida, juntamente com o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, da coordenação da gestão integrada das águas do País, da implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e da arbitragem em caso de conflitos pelo uso da água entre entidades públicas ou privadas, constitui passo significativo para a necessária mudança de nossa mentalidade quanto ao valor do líquido.

Em Goiás, segundo o superintendente-executivo da Secretaria de Meio Ambiente e Habitação do Estado, Sr. Pedro Novaes, não existe nenhuma região com escassez natural de água. Os problemas enfrentados pelos municípios do Nordeste do Estado, que têm enfrentado crises de abastecimento, são de origem antrópica, isto é, causados pela ação humana. O desmatamento e o uso inadequado do solo, principalmente nos chapadões da Bahia, seriam as causas dessas crises. Esse fato, em que o uso da água em um Estado afeta a população de outro, demonstra a necessidade da implantação rápida dos comitês de bacia, com a participação de representantes de todas as comunidades utilizadoras dos cursos d’água da unidade hidrográfica.

De fato, essa noção de responsabilidade pelo compartilhamento da água diz muito respeito a nosso Estado. Goiás tem um grande compromisso nesse sentido, por ser a origem das águas que vão correr as terras de muitos outros Estados brasileiros. Das doze regiões hidrográficas brasileiras definidas pela ANA, três têm origem em Goiás: a Região Hidrográfica do Tocantins, a Região Hidrográfica do São Francisco e a Região Hidrográfica do Paraná. Consideradas em conjunto, elas escoam por uma área equivalente a quase 30% do território nacional, onde residem cerca de 45% da população brasileira, percorrendo quatorze Estados e mais o Distrito Federal.

Das três regiões hidrográficas com cabeceiras em Goiás, a maior em extensão de terras é a do Tocantins. De fato, é a maior bacia localizada inteiramente em território nacional. Ela cobre 943 mil quilômetros quadrados, percorrendo áreas pertencentes aos Estados de Goiás, Tocantins, Pará, Maranhão e Mato Grosso, além do Distrito Federal - seis Unidades da Federação. Aí habitam 7,8 milhões de brasileiros, um pouco menos de 5% da população nacional. Sua vazão média, de 11,8 mil metros cúbicos por segundo, representa uma média anual por habitante de mais de 47 mil metros cúbicos.

Deve-se destacar o longo trecho navegável do Araguaia, desde a confluência com o rio das Mortes até a represa de Tucuruí, situada já no baixo curso do Tocantins. Aliás, ainda no Mato Grosso, o rio das Mortes apresenta boa navegabilidade até quase as proximidades dos contrafortes da chapada dos Guimarães.

Em Goiás, essa bacia hidrográfica abrange basicamente o norte e o oeste do Estado, sendo seus rios mais importantes o Araguaia, o das Almas, o Maranhão, o Tocantinzinho e o Paranã. Na confluência entre o Tocantinzinho e o Maranhão, que são os formadores do Tocantins, encontra-se a usina hidrelétrica de Serra da Mesa, cujas águas alagam cerca de 1.800 quilômetros quadrados, com seus remansos chegando até as proximidades da cidade de Uruaçu, às margens do rio das Almas.

A segunda maior bacia em extensão territorial é a do Paraná. Ela se espalha, na sua parte em território nacional, por cerca de 857 mil quilômetros quadrados. Abrange áreas pertencentes a nada menos de sete Unidades da Federação: Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Goiás e Distrito Federal. Sua vazão média é de 11 mil metros cúbicos por segundo, o que, distribuído pelos 55 milhões de pessoas que aí vivem, 32% da população do País, resulta em uma média anual de 6,3 mil metros cúbicos por habitante.

Sendo assim tão habitada e muito industrializada, é, apesar da enorme quantidade de água disponível, uma região de muitos conflitos atuais e potenciais pelo uso de água. Há conflitos entre uso industrial e humano em vários pontos, entre transporte fluvial e necessidade das hidrelétricas, especialmente no curso baixo do Tietê, e, na área de Goiânia e do Distrito Federal, conflito entre diluição de efluentes e abastecimento humano.

Em Goiás, os mais importantes dos rios integrantes dessa bacia são o Paranaíba e seus afluentes: o Claro, o dos Bois, o Corumbá, onde se encontra um importante salto, grande atração turística, e o São Marcos. Outro rio da bacia do Paraná digno de nota em Goiás é o Aporé, que faz a divisa do Estado com o do Mato Grosso do Sul.

Trata-se, igualmente, de bacia densamente aproveitada em seu potencial hidrelétrico: nada menos de onze grandes hidrelétricas se localizam ali, sendo três no Tietê, duas no Paraná, entre elas Itaipu, a maior do País, duas no Paranaíba e duas no rio Grande.

Finalmente, de Goiás partem também águas que correm para a bacia do São Francisco - o velho Chico, Rio da Integração Nacional. Essa bacia se espalha por 645 mil quilômetros quadrados, cerca de 8% do território nacional, habitados por mais de 14 milhões de pessoas, equivalentes, também, a 8% da população do País. A vazão média da bacia é de 2.850 metros cúbicos por segundo, o que resulta em uma média anual por habitante de 6,3 mil metros cúbicos. Embora a densidade demográfica da bacia corresponda exatamente à média do Brasil, que não é alta, a bacia do São Francisco compreende uma parte da área brasileira onde os problemas relativos à água são mais dramáticos - o semi-árido nordestino. Os seus problemas são inúmeros, com conflitos entre irrigação, consumo humano e geração de energia, áreas críticas de poluição, como o entorno de Belo Horizonte, e sérias complicações resultantes do desmatamento das áreas de barrancas e conseqüente assoreamento dos rios, principalmente do São Francisco.

Seis Unidades da Federação compartilham das águas da bacia do São Francisco, entre os quais se destacam os da região Nordeste: Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. Grande é o aproveitamento da bacia para a produção de energia elétrica, com grande concentração de usinas na área de divisa entre Bahia e Pernambuco, e Bahia e Alagoas. Os outros Estados percorridos pela bacia são Minas Gerais, onde se encontra a grande usina hidrelétrica de Três Marias, e Goiás.

Apenas uns poucos e pequenos rios do Leste de Goiás e do Distrito Federal escoam para essa bacia, como os rios Bezerda, que passa por Unaí, e o Preto, mas não deixa de ser uma responsabilidade do Governo e do povo do Estado a participação na preservação da qualidade de suas águas.

Sras e Srs. Senadores, o Brasil é, sem a menor dúvida, um País privilegiado quanto a suas reservas de água. No entanto, nossos problemas sociais, culturais, políticos e econômicos constituem ameaça a essa riqueza. A administração racional de nossos recursos hídricos é necessidade urgente, e para isso devemos implementar, o mais rapidamente possível, os comitês de bacia. A criação da ANA e a legislação das águas, embora fundamentais, representam apenas um começo dessa racionalização.

Os privilégios conferidos ao nosso País pela natureza não podem mais continuar a servir de justificativa para nossa imprevidência e desperdício.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2002 - Página 4299