Discurso durante a 39ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo para a união entre o Estado e a população para busca de soluções às questões sociais brasileiras, que dificultam o desenvolvimento sócio-econômico.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Apelo para a união entre o Estado e a população para busca de soluções às questões sociais brasileiras, que dificultam o desenvolvimento sócio-econômico.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2002 - Página 4301
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • DEFESA, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, INTEGRAÇÃO, PROJETO, BEM ESTAR SOCIAL.
  • COMENTARIO, ESTUDO, GONZAGA MOTA, PROFESSOR, POLITICO, EX GOVERNADOR, ESTADO DO CEARA (CE), ASSUNTO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, BRASIL, REGIÃO NORDESTE, DEFESA, INTEGRAÇÃO, SETOR PUBLICO, SOCIEDADE CIVIL, SEMELHANÇA, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB).

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O SR. ROMERO JUCÁ (Bloco/PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos principais obstáculos ao desenvolvimento brasileiro tem sido a falta do hábito de se pensar o Brasil. Quero dizer com isso que falta-nos refletir sobre o que foi, o que é e o que desejamos que seja este País de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, habitado por uma comunidade que hoje supera os 170 milhões de pessoas.

Sr. Presidente, seja em nível individual ou coletivo, não há como traçarmos um destino para nós sem que esteja muito claro o que queremos ser e aonde almejamos chegar. Ora, essa consciência de brasilidade é que nos falta, individual e, mais ainda, coletivamente.

Somos herdeiros de uma cultura individualista, oligárquica, predatória mesmo, na qual explorar o espaço e as pessoas para auferir o máximo de benefícios sempre foi quase que uma lei natural. Isso não quer dizer que sejamos perversos egoístas atávicos. Quer dizer apenas que raramente nos damos conta de como somos individualistas e pouco sensíveis ao fato de que o bem comum é também o nosso bem individual.

A cultura européia do tempo das monarquias absolutistas aprofundou raízes nessa nossa terra Brasil de tal forma, que muitas vezes não nos damos conta de que temos repetido por todos esses séculos esse mesmo modo de nos relacionarmos em sociedade. Achamos, muitos ainda, que Estado e propriedade particular podem se confundir, numa paráfrase plebéia do que dizia o rei Luiz de França: “O Estado sou eu”. O resultado é que, na maioria das vezes, sobra para o cidadão comum o ter de se cuidar sozinho, e para os ricos e poderosos, a apropriação espúria dos bens da Nação.

Contudo, Sr. Presidente, se nos reportarmos à civilização indígena, berço primeiro de nossa história, veremos o sentido profundo do viver em coletividade e veremos, também, como a visão do bem-estar coletivo pode ser vivenciada como fonte de bem-estar individual. Numa comunidade indígena praticamente não existe o ser marginal, o despossuído, o descartado. Todos têm uma razão de ser na sociedade e nela devem exercer um papel preciso que valoriza cada indivíduo e contribui para o bem-estar de todos. São comunidades que levaram às vezes centenas de anos, se não mais, para se organizarem de modo harmônico, dando a cada indivíduo um lugar certo e justo, onde competir não é o centro do projeto de realização pessoal, mas sim participar para o projeto coletivo de bem-estar da comunidade.

Em contraposição, nós, do autodenominado mundo civilizado, perdemos completamente essa perspectiva da realização individual inserida na harmonização social. Fica assim muito difícil equacionar as questões que afligem o Brasil, muitas das quais remontam aos primeiríssimos tempos após a chegada dos portugueses. Fazer 170 milhões de pessoas pensarem de modo coerente e convergente um projeto de Brasil e de brasileiros é hoje uma tarefa para pessoas e lideranças de alto carisma e grande poder de convencimento e mobilização. E não pode ser algo de cunho personalista, já que a história universal demonstrou sobejamente aonde terminam os cultos à personalidade de líderes políticos nacionais.

Com o elevadíssimo contencioso que temos em nossa história coletiva, tudo que se diga ou faça a partir de iniciativas setorizadas ou fruto de pequenos segmentos sociais soa como demagogia ou falso ardor cívico. É uma grande pena que estejamos em nível de descrédito tão elevado, mas esta é uma realidade que podemos sentir em todos os recantos do País. Mesmo quando algum líder político, empresarial, trabalhista ou social se pronuncia sobre um tema relevante que toca nossa realidade, na maioria das vezes ele é atacado por todos os lados, quanto mais não seja por estar dizendo obviedades, matéria, portanto, vencida no campo da percepção social. É o mecanismo das vaidades se movimentando, uns dizendo dos outros - “não fui eu que propus então não merece crédito, não tem valor”. Casos como o de Betinho, que conseguiu mobilizar o Brasil todo, são, para nosso infortúnio, raras exceções. E são exceções porque nele não se pôde ver qualquer pretexto escuso de proveito pessoal, mas o desejo sincero de ajudar a quem precisa.

É aí, Sr. Presidente, que esbarram quase todas as propostas de hoje em dia: falta-lhes credibilidade junto à opinião pública, cansada do engodo de belas palavras e de práticas pouco ou nada defensáveis. Mesmo projetos bem feitos e com bons resultados não conseguem se impor como práticas honestas e socialmente válidas. Persiste o eterno ranço de séculos de malversação do interesse público.

Contudo, Sr. Presidente, o grande teatrólogo e cronista Nelson Rodrigues já dizia que o óbvio ululante é freqüentemente o mais difícil de ser percebido pelas pessoas. Assim, estou convencido de que estamos muito longe do tempo de descartar os discursos sobre o óbvio, se eles ainda não são capazes de levarem pessoas e grupos sociais para o equacionamento de nossas questões maiores como sociedade.

A esse propósito, Sras e Srs. Senadores, estive, há poucos dias, relendo dois fascículos publicados pelo Prof. Gonzaga Mota, ilustre político cearense, que hoje é o Secretário Executivo da Fundação Ulisses Guimarães, o conhecido organismo de estudos do PMDB. O nosso eminente líder tece considerações sobre as questões sociais que afligem o Brasil no fascículo “A Questão Social Brasileira - Termo de Referência” e sobre o desenvolvimento de sua região natal, no texto “Nordeste - Desafio Nacional”.

Vi, com satisfação, a visão do homem público, dedicado ao interesse coletivo, analisando com cuidado as questões relevantes que aponta como pressupostos a serem resolvidos para que o Brasil e o Nordeste, em particular, alcancem um patamar de desenvolvimento social desejável para todos os brasileiros. No documento em que analisa o Brasil, o Deputado e ex-Governador Gonzaga Mota sugere a criação de uma Agência Brasileira para Integração Social (ABIS), cujo objetivo seria o de mobilizar de modo integrado os setores público e privado - órgãos de governo, empresas e organismos da sociedade civil - para iniciativas de promoção social. Vejo com satisfação as melhores cabeças do PMDB formulando tais propostas, pois encaro tal postura uma demonstração do acerto da iniciativa inovadora que foi o projeto Comunidade Solidária, cujas bases já seguem fundamentalmente as proposições feitas pelo Prof. Gonzaga Mota.

Desse modo, Sr. Presidente, creio poder enxergar nos documentos que mencionei um ponto, ou melhor, um vasto campo de aproximação entre meu partido, o PSDB, e o Governo que ele hoje exerce, e o partido de S. Exª, o Deputado autor dos textos que acabo de comentar brevemente.

S. Exª tem razão quando diz que o Nordeste brasileiro continua sendo a região mais carente do País. Infelizmente o Norte tende a se juntar ao Nordeste, na medida em que sua população aumenta e o equacionamento dos problemas sociais daí decorrentes não vem a tempo e a hora. Temos uma tarefa digna dos grandes povos a enfrentar. O governo do PSDB não se furtou a enfrentá-la na medida de suas forças. Contudo, é necessário muito mais do que a ação do Estado. É preciso que toda a comunidade esteja mobilizada para o enfrentamento de sua próprias mazelas. Esperar que o Estado seja o protetor onipotente de todos é imaginar que o Estado possa existir independentemente da sociedade que representa e que possa agir apesar dela ou, pior ainda, a sua revelia. É fantasia e prova de imaturidade política e social esperar que as soluções possam vir todas pela ação apenas do Estado.

Sabemos que o Brasil tem um passivo social elevadíssimo, que se agravou pela opção por um processo de desenvolvimento que não enfrentou a fortíssima concentração de bens e riquezas nas mãos de poucos, iniciada no tempo da colonização de nosso território. Na verdade, o caminho adotado favoreceu ainda mais a concentração de renda e o crescimento das massas de excluídos, com o aumento da população e o desaparelhamento do Estado e das forças sociais para enfrentarem as disparidades crescentes.

Estamos, Sr. Presidente, no limiar de um novo tempo. Ou a Nação toma novos caminhos de autodeterminação ou ingressaremos em tempos de crise social aguda. O PSDB e o Governo que ora se finda têm apontado as opções que entendem melhores para esse novo caminho. Esperamos que outros se juntem a nós e que possamos discutir um acordo de progresso do Brasil que atenda a todos e a cada um no que de mais essencial temos: a construção de uma Nação justa onde todos seus habitantes, brasileiros ou não, possam viver dignamente e em paz.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2002 - Página 4301