Discurso durante a 41ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Anúncio da votação amanhã, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, do substitutivo elaborado por S.Exa. ao projeto de lei de autoria do Senador José Sarney, que propõe cotas para a população negra nas universidades e nas vagas para os cargos públicos. Proposta de realização de seminário no Senado Federal a respeito da clonagem de seres humanos. Defesa da clonagem terapêutica exclusivamente a partir de células somáticas.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Anúncio da votação amanhã, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, do substitutivo elaborado por S.Exa. ao projeto de lei de autoria do Senador José Sarney, que propõe cotas para a população negra nas universidades e nas vagas para os cargos públicos. Proposta de realização de seminário no Senado Federal a respeito da clonagem de seres humanos. Defesa da clonagem terapêutica exclusivamente a partir de células somáticas.
Publicação
Publicação no DSF de 17/04/2002 - Página 4572
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • INFORMAÇÃO, REALIZAÇÃO, VOTAÇÃO, SUBSTITUTIVO, AUTORIA, ORADOR, PROJETO DE LEI, INICIATIVA, JOSE SARNEY, SENADOR, GARANTIA, COTA, NEGRO, VAGA, CARGO PUBLICO, MATRICULA, UNIVERSIDADE, SETOR PUBLICO.
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, PROIBIÇÃO, CLONE, REPRODUÇÃO HUMANA.
  • APOIO, VALOR TERAPEUTICO, REPRODUÇÃO, ORGÃO HUMANO, REALIZAÇÃO, CLONE, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, RELATORIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, REALIZAÇÃO, SEMINARIO, PARTICIPAÇÃO, SOCIOLOGO, AUTORIDADE RELIGIOSA, CIENTISTA, DEBATE, CLONE.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (Bloco/PDT - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna nesta tarde para tratar de uma assunto de grande interesse para a humanidade: a clonagem de seres humanos. Antes, porém, apenas a título de informação, gostaria de mencionar que o projeto de lei, de autoria do Senador José Sarney, que estabelece quotas para a população negra nas universidades e nas vagas para os cargos públicos será votado amanhã, em caráter definitivo, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, do Senado. Como Relator, o meu voto é favorável ao projeto, na forma de um substitutivo. O projeto foi amplamente debatido, foi concedido um pedido de vista, e a discussão já foi encerrada, ficando marcada para amanhã a sua votação na Comissão. Portanto, em breve, o Brasil poderá ter uma legislação moderna e eficiente na busca de uma maior eqüidade racial e social.

Mas, como já disse, meu objetivo na tarde de hoje é tratar de um assunto de interesse mundial, de interesse de toda a humanidade, na condição de autor de um projeto de lei, apresentado no Senado Federal, que proíbe a clonagem de seres humanos no Brasil.

Esse assunto está sendo debatido no mundo inteiro. A Inglaterra, por exemplo, autorizou a clonagem terapêutica, ou seja, de embriões humanos ou de células somáticas, não embrionárias, para fins terapêuticos, de produção de tecidos etc. Os Estados Unidos também se debruçam sobre isso; estão discutindo uma legislação sobre clonagem, com um enfoque mais ou menos nesse mesmo aspecto, permitindo a clonagem terapêutica e produzindo a clonagem reprodutiva.

Quero conceituar os termos que estou usando para que todos os Senadores, assim como aqueles que tenham a oportunidade de assistir ao nosso discurso nesta tarde, possam entender, da maneira mais comum e simples, o que é a clonagem, como ela se divide, quais são os seus conceitos fundamentais e por que eu, por exemplo, apresentei um projeto proibindo-a no Brasil.

Nos doze minutos que me foram concedidos pelo Presidente, falarei um pouco da questão da ciência, da ética, do Direito, da religião e da política, fatores que influenciam na decisão que qualquer nação deve adotar a respeito da clonagem.

Do ponto de vista da ciência, a clonagem pode ser reprodutiva ou terapêutica. A reprodutiva é aquela que tem por objetivo criar um novo indivíduo, um novo ser humano; a terapêutica tem por finalidade obter tecidos para serem utilizados no corpo humano, em seu benefício e da humanidade.

A clonagem terapêutica pode-se dar a partir de células germinativas - um óvulo, por exemplo, que é a célula germinativa da mulher, que dá origem a um novo ser humano -, ou de células somáticas, ou seja, de outras partes do corpo - elas não são células embrionárias, nem são células germinativas (óvulos), são células que permitem, pelas suas características, produzir tecidos. São chamadas, cientificamente, de células totipotentes ou, comumente, de célula-tronco. São células que podem se diferenciar, podem se transformar em qualquer tecido do organismo humano: em tecido nervoso, tecido muscular, tecido ósseo. A ciência estuda a possibilidade inclusive de transformação da célula-tronco em órgãos, como, por exemplo, coração, fígado etc., para fins de transplante.

Então, a que conclusão chegamos? Na minha modesta opinião, o Brasil deveria, do ponto de vista científico, proibir, de uma vez por todas, a clonagem reprodutiva - aquela que tem por finalidade obter um novo ser vivo, um novo indivíduo - e também a clonagem terapêutica a partir de células germinativas, isto é, a clonagem que manipula o óvulo, substitui o núcleo do óvulo por um núcleo de uma pessoa adulta - pode até mesmo ser de uma criança, mas, normalmente, quer-se clonar um outro ser humano já adulto. Esse tipo de clonagem, mesmo com o objetivo terapêutico, ou seja, desenvolver o embrião até mais ou menos oito células para depois cessar a sua vida para obter a célula-tronco apenas - não seria criado um outro indivíduo, apenas para obter a célula-tronco a fim de se produzirem novos órgãos -, pode ser problemático, pois não há limites científicos para se definir quando parar para que não haja problemas. Ademais, o País dificilmente teria condições de fiscalizar os cientistas, os laboratórios, para constatar se eles vão efetivamente paralisar a pesquisa no momento certo, no momento em que existirem apenas as oito células, a fim de que, a partir dali, não seja gerado um outro embrião. É praticamente impossível fiscalizar-se isso. É por isso que a clonagem terapêutica também a partir de células germinativas deve ser proibida. Ou seja, qualquer tipo de clonagem a partir de célula germinativa - do óvulo -, seja para produzir um novo ser humano, seja com o objetivo de produzir novos tecidos ou órgãos, deve ser proibida.

Para que a ciência não seja prejudicada, para que as pesquisas não sejam abolidas, para que o País avance também no meio científico e para que os brasileiros, assim como toda a humanidade, possam ser beneficiar da clonagem, temos a possibilidade de fazer a clonagem de células somáticas, que, como disse, são células de outros tecidos, como, por exemplo, o cordão umbilical, a medula, o tecido nervoso. Todos eles possuem células com essas mesmas características de célula-tronco e, portanto, podem se transformar em qualquer tecido, em qualquer órgão. Então, esse tipo de clonagem que não prejudica a vida humana, que não tem por objetivo criar um novo ser humano, deve ser permitida, no meu entendimento.

Inclusive, Sr. Presidente, em relação ao projeto de minha autoria, que já tem relatório elaborado pelo nobre Senador Leomar Quintanilha na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, entendo que, de certa forma, houve um equívoco na sua elaboração. Entendo que o próprio relatório precisa ser adequado à realidade da ciência, da ética e da moral e, para tanto, devemos proibir a clonagem reprodutiva e a clonagem terapêutica a partir de células germinativas e permitirmos a clonagem a partir de células somáticas. É isso que vou defender.

Nesse sentido, apresentarei, amanhã, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e também na Comissão de Assuntos Sociais, um requerimento propondo a realização de um seminário no Senado reunindo cientistas, religiosos, sociólogos e estudiosos do assunto. Temos, por exemplo, a autora da novela O Clone, Glória Perez. Não estou dizendo que vamos convidá-la, mas me pergunto se não seria interessante o Senado e o Brasil ouvirem o ponto de vista da sociedade leiga, não-científica, a respeito desse assunto. Então, em relação à clonagem, há, sem dúvida nenhuma, uma gama de assuntos a serem discutidos.

Do ponto de vista ainda da ciência, o que mais se contesta na clonagem de seres humanos é o problema dos defeitos congênitos, defeitos genéticos, a questão do envelhecimento precoce e a grande morte de fetos, que, como nos animais, deverá também ocorrer com os seres humanos, ceifando a vida de milhares ou de milhões de embriões. Isso do ponto de vista da ciência.

Do ponto de vista ético, o principal problema é que a clonagem pode se transformar num grande comércio. Hoje, a clonagem é motivo de grande publicidade, inclusive em relação ao comércio de embriões, ao comércio de óvulos. São cientistas tentando se projetar no cenário científico ou no cenário econômico mundial por meio da clonagem. E aí a ética certamente não prevalecerá quando se tratar da reprodução de um novo indivíduo a partir de uma célula ou de um conjunto de células. Por isso, do ponto de vista ético, também não é aconselhável a clonagem reprodutiva.

À clonagem terapêutica a partir de células que não são células germinativas ou de embriões, reafirmo que sou favorável.

Do ponto de vista do Direito, precisaria de muito tempo para falar sobre esse assunto. Por isso, praticamente vou suprimi-lo. Digo apenas que a clonagem geraria uma série de relações, que precisariam ser firmadas em leis específicas sobre o assunto, entre aquele indivíduo que nasceu a partir de uma clonagem e aquele que lhe permitiu a origem, a geração. Sem dúvida nenhuma, isso é motivo de muito debate. Espero que nesse seminário tenhamos a oportunidade de ouvir também especialistas na área do Direito a respeito do tema clonagem.

Do ponto de vista da religião, sem dúvida nenhuma, a grande contestação é a criação da vida. Os religiosos acreditam que somente Deus tem a possibilidade de criar um novo ser humano, e não cabe ao homem interferir nessa área. Por essa razão, as igrejas, de modo geral, condenam a clonagem nesse aspecto da criação do ser humano. Entendo que será benéfico para o Senado, além de produtivo, ouvir os religiosos a respeito desse assunto.

Na questão política, o problema é de decisão. O Brasil precisa decidir sobre isso. Dias atrás, o Senador Tião Viana usou da tribuna exatamente para afirmar isto: o Brasil não tem dado a importância que o assunto requer; nem o Governo, nem o Parlamento. Não digo omissão, mas uma negligência se observa na abordagem desse tema, que é tão importante, tão fundamental, embora a legislação da biossegurança já faça referência a organismos geneticamente modificados e à proibição de manipulação de material genético em células germinativas. Mas é preciso distinguir, como acabei de dizer, clonagem reprodutiva de clonagem terapêutica, a clonagem a partir de células germinativas da clonagem a partir de células somáticas, e, a partir daí, tomar uma posição política, uma decisão política, que, a meu ver, deve ser no sentido de permitir a clonagem terapêutica a partir de células somáticas e proibir todo e qualquer outro tipo de clonagem.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/04/2002 - Página 4572