Discurso durante a 46ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Posicionamento contrário ao Projeto de Lei da Câmara 65, de 1999, batizado de "Lei da Mordaça", que impõe censura a agentes públicos.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • Posicionamento contrário ao Projeto de Lei da Câmara 65, de 1999, batizado de "Lei da Mordaça", que impõe censura a agentes públicos.
Publicação
Publicação no DSF de 23/04/2002 - Página 5605
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • ANALISE, CONSTITUCIONALIDADE, AUTONOMIA, MINISTERIO PUBLICO, REGISTRO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, DEFESA, DEMOCRACIA, COMBATE, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, REPUDIO, PROJETO DE LEI, PROIBIÇÃO, PROCURADOR, PROMOTOR, POLICIAL, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA, INFORMAÇÃO, INVESTIGAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos principais avanços democráticos consagrados na Carta Magna de 88 foi, sem dúvida alguma, o fortalecimento do Ministério Público, nela definido como “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado”, incumbida da “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

De forma coerente, com o alargamento das funções do Ministério Público, com o acréscimo de seu prestígio e de suas prerrogativas, a Carta assegurou-lhe autonomia e garantiu a independência funcional de seus Membros.

A marcha da história veio a comprovar que o legislador constituinte fora lúcido e estivera sintonizado com a realidade do tempo presente ao conferir esse novíssimo e revolucionário status institucional ao Ministério Público. Desde a promulgação da nova Lei Maior até o presente, tem sido decisiva a participação do Ministério Público em alguns dos mais importantes episódios da história recente do País, por exemplo, o escândalo que acabaria por levar à deposição de Fernando Collor de Mello da Presidência. Mais recentemente, no vergonhoso episódio do milionário desvio de verbas destinadas à construção do Fórum Trabalhista de São Paulo.

Várias outras investigações, sobretudo aquelas que envolvem o trato com o dinheiro público, estão em curso, e os papéis do Ministério Público, da polícia, do Tribunal de Contas da União e, também, da imprensa têm sido fator preponderante na continuidade dessas investigações. No entanto, para as forças políticas que deram e dão sustentação para o Governo que aí está, uma investigação competente constitui um estorvo, uma autêntica pedra no sapato.

Cabe recordar que já tramitaram no Congresso Nacional diversos Projetos de Lei, alguns dos quais ainda em tramitação nesta Casa, mediante os quais se pretende proibir procuradores, promotores e policiais de darem qualquer informação à imprensa acerca de investigações e processos em andamento. Trata-se de uma verdadeira pérola de arbítrio, digna dos piores tempos do regime militar. Afinal, sem a cobertura da imprensa, as pressões para abafar casos envolvendo pessoas poderosas seriam enormes, e o trabalho do Ministério Público ficaria extremamente vulnerável.

Pois bem, há poucos dias, figurou na pauta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado um projeto que já estava praticamente descartado das discussões desta Casa, sobretudo pela afronta que representa à democracia. Trata-se do projeto, batizado de "Lei da Mordaça", que prevê alterações na Lei 4898/65 (Lei do Abuso de Autoridade), impondo censura aos Promotores de Justiça, Procuradores, Delegados de Polícia, Juízes e Conselheiros dos Tribunais de Contas - eles ficam proibidos de se manifestar ou divulgar fatos de que tenham ciência "em razão do cargo" e que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada, a imagem e a honra das pessoas". Entre as sanções previstas estão a detenção entre seis meses a dois anos, multa, perda do cargo e a inabilitação, por três anos, para o exercício de outra função pública. Por pressão da sociedade, novamente o projeto foi retirado de pauta.

Embora negado pelos correligionários da Governadora Roseana Sarney, fica claro para a sociedade que a volta deste tema esteve vinculada ao vazamento à imprensa de informações sobre as investigações da empresa Lunus, no Maranhão.

Há um aparente equívoco, Sras. e Srs. Senadores. As investigações que envolvem a Governadora ocorrem em caráter sigiloso, portanto, a punição para o vazamento de informações como as que ocorreram neste episódio, já estão previstas na legislação vigente.

O que não é razoável é que fatos como este sirvam de pretexto para desengavetar uma proposta que agrida a democracia e tem nos seus fundamentos elementos que reeditem práticas obscuras que a nossa sociedade já expurgou e não aceita mais.

De resto, Sr. Presidente, a publicação de indícios e denúncias contra ilícitos estimula a colheita de provas. Em nossa experiência recente, o País teve oportunidade de colher os bons resultados dessa prática. Foi em conseqüência da ampla divulgação dos escândalos pelos meios de comunicação que surgiram motoristas, mensageiros e secretárias dispostos a dar o seu depoimento e, com isso, fundamentar o único caso de impeachment contra um Presidente da República no Brasil.

A nossa preocupação e de todos os que agora se levantam contra essa proposta e outras similares, é que, reduzidos aos poderes investigatórios dos Promotores de Justiça, Procuradores, Delegados de Polícia, Juízes e Conselheiros dos Tribunais de Contas, por meio desse tipo de diploma legal que tem caráter intimidatório, na realidade, estará se promovendo o enfraquecimento dos mecanismos de controle da Administração Pública em detrimento dos princípios constitucionais que a regem, representando, por fim, fator de agravamento de um quadro de insegurança jurídica.

            Para finalizar, gostaria de registrar a posição contrária do meu partido em relação ao PLC nº 65, de 1999, que está para ser apreciado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, bem como, em relação a outras propostas similares que tenham no âmago, inibir investigações contra agentes públicos que porventura tenham cometido ilícitos.

Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/04/2002 - Página 5605