Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ELOGIOS AO ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA VIRTUAL DEBATER, DE AUTORIA DO CONSULTOR LEGISTIVO DO SENADO FEDERAL, DR. LUIZ CARLOS ROMERO, SOBRE A AGENCIFICAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E A REINSTITUIÇÃO DO SISTEMA MULTIPLO DE SAUDE.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • ELOGIOS AO ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA VIRTUAL DEBATER, DE AUTORIA DO CONSULTOR LEGISTIVO DO SENADO FEDERAL, DR. LUIZ CARLOS ROMERO, SOBRE A AGENCIFICAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PUBLICA E A REINSTITUIÇÃO DO SISTEMA MULTIPLO DE SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2002 - Página 5689
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, CONSULTOR, SENADO, ASSUNTO, REFORMULAÇÃO, SAUDE PUBLICA, APREENSÃO, AMEAÇA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), CRITICA, CONCENTRAÇÃO, PODER, ORGÃO REGULADOR, AGENCIA NACIONAL, REDUÇÃO, COMPETENCIA, MINISTERIO DA SAUDE (MS).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com muita satisfação, trago ao Plenário do Senado Federal uma manifestação técnica de um importante e qualificado servidor público do Senado Federal, Consultor Legislativo, Dr. Luiz Carlos Romero, um especialista na área de saúde pública. Foi um prazer ler seu artigo publicado na revista virtual Debater, no seu Boletim Informativo nº 12, em que aborda um tema que julgo da maior importância no cenário da saúde pública brasileira hoje e que deve ter a atenção de todos os Parlamentares. O artigo diz respeito à chamada reforma do aparelho de Estado e aborda especificamente o tema:

A Agencificação da Administração Pública e a Reinstituição do Sistema Múltiplo de Saúde.

1 - Agencismo

É preciso, antes de mais nada, esclarecer que sou médico especialista em Saúde Pública e não sou versado nem em Direito Público, nem em Administração Pública. Apesar disso, chama-me a atenção e preocupa-me o fenômeno do agencismo que tomou conta da Administração Pública, o seu entendimento, mesmo por pessoas que considero esclarecidas, como panacéia, e seus reflexos sobre a construção - tão trabalhosa e com tantos inimigos - do Sistema Único de Saúde.

As criações de agências, isto é, essa nova forma de autarquia que entrou em moda é compreensível, à luz do que dispõe a Constituição Federal sobre as competências da União para exercerem ações reguladoras sobre duas situações: a execução de atividade privadas sujeitas à regulação estatal, isto é, aquelas que, por sua relevância pública, têm sua regulamentação, fiscalização e controle atribuídos ao Poder Público, e quando se trata de serviço público concedido, isto é, um daqueles serviços em relação aos quais a Constituição permite a substituição da ação governamental direta pela de entes privados, mediante autorização, concessão ou permissão (telecomunicações, radiodifusão, energia elétrica, transportes, etc.)

As primeiras agências criadas realmente tinham função tipicamente reguladora e a abrangência acima. No entanto, não só não ficaram nisso - ampliando o seu espectro de atuação para além da mera regulação -, como começaram a ser criadas por outras em áreas não previstas, como meio ambiente, saúde, seguros, etc.

A criação de agências acabou virando uma panacéia para “melhorar o serviço público” e, como solução, se difundiu como fogo no mato seco.

Essa ‘agencificação’ produziu, no meu ponto de vista, uma concentração de poder como nunca se viu na Administração Pública: além da regulação, passaram a desempenhar também funções paralelas às do Legislativo e dos tribunais administrativos a atuarem com poder de polícia. Atuam como legislador, promotor e juiz. E, agora, aparecem também “agências executoras”. Tudo isso com uma grande autonomia não questionada. E acham que não têm que prestar contas a ninguém.

Quando da crise de energia, por exemplo, o Presidente da Agência, a que, supostamente, estava afeta a questão, negou-se a prestar informações ao Senado por não se considerar alcançável pelo dispositivo constitucional que dá às Casas do Congresso poder de convocação de “titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência de República” a prestarem informações. Ninguém fez nada. Não vi ninguém reclamar. Ficou por isso mesmo.

2. As agências e o Sistema Único de Saúde.

No âmbito do SUS, a “agencificação” está alcançando níveis tais que concorre para desconstruir o princípio constitucional da direção única em cada esfera do Governo. 

Quando a situação dos planos de saúde ficou insuportável, no ano passado, os usuários se dirigiram ao Ministro da Saúde. Ele disse não ter nada com isso, que agora era simplesmente responsabilidade do Presidente da Agência de Saúde Suplementar. É claro que teve que voltar atrás, mas o episódio deixou claro que esse é o “espírito da coisa”.

Com a criação de um conjunto de agências -- Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Agência Nacional de Saúde Suplementar e, agora, Agência Federal de Prevenção e Controle de Doenças (Apec) --, concluiu-se um processo que vinha sendo urdido desde 1988: a “inampização” do Ministério da Saúde.

Com a retirada de sua competência da regulação, fiscalização e até mesmo da execução de um conjunto de ações e serviços típicos de saúde pública - vigilância sanitária, saúde suplementar, controle de doenças -- ,o que sobra para o Ministério da Saúde? A assistência médica e a assistência farmacêutica - exatamente as atribuições do antigo Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social.

Mas a “inampização” não se restringe à passagem das atribuições de saúde pública da esfera do Ministério da Saúde para agências autônomas: todo o processo de financiamento do setor continua basicamente fundamentado no pagamento de procedimentos - como fazia o antigo Inamps. A ação ou serviço que não puder se caracterizar como um “procedimento” não tem como ser remunerada e, portanto, ninguém quer produzi-las. Um exemplo disso são as ações de educação para a saúde.

Como os procedimentos laboratoriais auxiliares do diagnóstico clínico são melhores pagos, os laboratórios de saúde pública se restringem a fazer exames de fezes, de urina e de sangue pedidos pelos clínicos, em vez dos testes necessários ao controle de doenças e vigilância sanitária.

Só fico esperando a epidemia de dengue do verão do ano que vem - ou, quem sabe, a reurbanização da febre amarela, que alguns já estão vaticinando - quando o Ministério da Saúde vai poder dizer que não tem nada com isso: ele só tem responsabilidade com a assistência médica; o controle de doenças é responsabilidade da Apec.

O “agencismo”, como remédio prescrito para a Administração Federal da Saúde, constitui, a meu ver, uma tentativa de reinstituição do Sistema Múltiplo de Saúde.

Brasília, 13 de março de 2002.

Luiz Carlos Romero

Médico de Saúde Pública

Consultor Legislativo do Senado Federal.

            Entendo que se trata de um belíssimo manifesto crítico a essa deturpação e violação que está sendo dada ao Sistema Único de Saúde, um bem sagrado da reforma política e da Constituição de 1988.

A minha homenagem ao Dr. Luiz Carlos Romero, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2002 - Página 5689