Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

TRANSCRIÇÃO DE DEBATE PROFERIDO NO SEMINARIO MARACANAU 2002, PROMOVIDO PELA ASSOCIAÇÃO DOS VICE-PREFEITOS DO ESTADO DO CEARA - AVIPRECE, EM 19 DE ABRIL DO CORRENTE, PARA DISCUSSÃO DA MUNICIPALIZAÇÃO DA SAUDE NO BRASIL.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • TRANSCRIÇÃO DE DEBATE PROFERIDO NO SEMINARIO MARACANAU 2002, PROMOVIDO PELA ASSOCIAÇÃO DOS VICE-PREFEITOS DO ESTADO DO CEARA - AVIPRECE, EM 19 DE ABRIL DO CORRENTE, PARA DISCUSSÃO DA MUNICIPALIZAÇÃO DA SAUDE NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2002 - Página 5829
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • TRANSCRIÇÃO, DEBATE, AUTORIA, ORADOR, SEMINARIO, ASSOCIAÇÕES, VICE-PREFEITO, ESTADO DO CEARA (CE), REALIZAÇÃO, MUNICIPIO, MARACANAU (CE), DISCUSSÃO, COMPETENCIA, PODER PUBLICO, MUNICIPIOS, ADMINISTRAÇÃO, ORGANIZAÇÃO, EXECUÇÃO, POLITICA SANITARIA, SAUDE PUBLICA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (Bloco/PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago a este plenário debate por mim proferido no Seminário Maracanaú 2002, promovido pela Associação dos vice-prefeitos do Estado do Ceará - AVIPRECE, realizado no município de Maracanaú, em 19 de abril próximo passado, onde se discutiu a municipalização da saúde no Brasil.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

 

NOTA TÉCNICA Nº 360, DE 2002

MUNICIPALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL

O que deu e o que não deu certo

1. Um pouco de história

A municipalização das ações de saúde é uma idéia antiga e cara ao Movimento de Reforma Sanitária. Ela foi o tema da 3ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1961, e era o eixo fundamental da reforma sanitária que se formulava no período.

Com o golpe militar de 1964, estabeleceu-se um movimento de desmunicipalização das responsabilidades sociais e, dentre elas, a saúde. A centralização de recursos no nível federal durante o período autoritário -- em especial após a reforma tributária de 1967 -- e o crescimento da oferta de serviços de assistência médica pela Previdência Social durante a década de 70 tiveram, como conseqüência, a redução da participação de estados e municípios no investimento e no financiamento de ações e serviços de saúde.

As ações pioneiras intentadas nas décadas de 70 e 80 -- Programa Nacional de Controle da Tuberculose, Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento, Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde, Ações Integradas de Saúde, Sistema Único Descentralizado de Saúde -- testaram a estratégia de descentralização, pouco contribuindo, no entanto, para a municipalização, uma vez que as transferências federais se fizeram apenas para as secretarias estaduais de saúde e só muito excepcionalmente atingiram os municípios.

A diretriz de descentralização é a primeira a ser citada no texto constitucional que define o Sistema Único de Saúde: “descentralização com direção única em cada esfera de governo”. Sua implementação, no entanto, sofre tantos percalços quanto as demais. Entre outras coisas, as disponibilidades e os mecanismos de financiamento do sistema têm definido as características e as possibilidades de sua materialização.

A partir da promulgação das normas operacionais do Sistema Único de Saúde de 1993 e 1996, viu-se um redobrar de esforços no sentido de avançar a descentralização da saúde no País que se concretizou, principalmente, como municipalização.

O aprimoramento das transferências fundo-a-fundo e a responsabilização crescentemente assumida pelas administrações municipais com ações e serviços de saúde fizeram com que, hoje, a própria diretriz da Emenda Constitucional nº 29 - que determina a aplicação de percentuais mínimos das receitas tributárias com gastos com saúde nos níveis federal, estadual e municipal - tenha sido superada na grande maioria dos municípios brasileiros.

Segundo recente levantamento feito pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, mais de 80% dos municípios brasileiros já gastam com saúde mais do que os 15% de recursos de fonte tributária obrigatórios.

O avanço no processo de gestão municipal das ações e serviços de saúde ocorreu, com muita freqüência, acompanhando o fortalecimento da estrutura de poder municipal. A busca e a experimentação de processos e instrumentos gerenciais mais racionalizadores, mais democráticos e autonômicos em saúde não são fato isolado, mas, em uma proporção grande dos casos, fazem parte de um processo de modernização da administração municipal como um todo.

Em alguns municípios, entretanto, o setor saúde é que se adianta no processo e define um ritmo mais intenso.

2. Do que estamos falando

Municipalização está sendo aqui entendida como a competência do Poder Público Municipal para formular as políticas de saúde de âmbito local e para planejar, organizar, executar, avaliar e controlar as ações e serviços de saúde na sua área de atuação.

Ela é justificada pela maior racionalidade que confere à organização do sistema de saúde, uma vez que o poder de decisão se encontra mais próximo dos problemas a serem enfrentados.

Como todo processo de descentralização, consiste em redistribuição de poder, redefinição de papéis das três esferas de governo, reorganização institucional, reformulação de práticas e controle social.

3. O que deu certo

Em primeiro lugar, a transferência da gestão das ações e serviços de saúde para o nível municipal resultou em melhora concreta do atendimento e do acesso, com redução do volume de fraudes e irregularidades, comprovando o acerto da política de municipalização e regionalização quando bem conduzida.

Os estudos disponíveis mostram que há maior satisfação dos usuários nos municípios que assumiram mais a gestão de sua saúde.

Na medida em que envolve dimensões políticas, sociais e culturais, a efetivação da municipalização - e da regionalização como um todo - pressupõe diálogo, negociação e pactuação entre os atores. Esses processos vêm sendo desenvolvidos e aprimorados com o tempo e constituem a base de legitimação das decisões.

O exercício do poder, das responsabilidades e das competências políticas, gerenciais e técnicas, pelos municípios, no processo de assumir e exercer a gestão das ações e serviços de saúde tem representado para muitos deles uma conquista gradativa de recursos, de autonomia e de instrumentos de gestão que ampliam o espaço de governabilidade do município.

4. O que não deu certo

Importantes áreas de responsabilidade no âmbito das novas atribuições dos municípios que passaram a gerir seu setor saúde não foram assumidas por eles.

Assim, por exemplo, enquanto uma alta proporção de municípios passou a assumir o controle de doenças -- atribuição praticamente exclusiva do nível federal, no antigo modelo --, um em cada quatro não mantinha sistemas de vigilância epidemiológica.

A vigilância sanitária também não foi assumida por igual proporção de municípios que tiveram sua saúde municipalizada.

A assistência farmacêutica foi assumida de forma amadorística pela maioria dos municípios.

Igualmente a questão dos recursos humanos -- que tem assumido um caráter estratégico, nesses últimos anos, no setor como um todo -- vinha sendo tratada de maneira bastante incipiente por eles, ou simplesmente ignorada.

Na área de assistência médica, a municipalização tropeçou em sérios problemas, entre eles o fato de esses municípios não terem assumido as funções de fiscalização e controle dos serviços credenciados e contratados.

Muitos municípios tiveram e têm problemas sérios no que diz respeito às especialidades médicas, por conta das resistências e bloqueios que dificultam o estabelecimento de relações de referência e contra-referência.

São significativas as dificuldades de vários municípios em obter número e distribuição adequados de leitos para urgências e emergências.

Na maioria dos casos, não houve adequação das estruturas administrativas das prefeituras e secretarias municipais de saúde às novas atribuições advindas do processo de municipalização. Em decorrência dessa dificuldade, a maioria desses municípios vem atuando com uma estrutura informal ou paralela, marcada pelas relações pessoais entre técnicos e dirigentes.

Os principais problemas de gestão ainda presentes são a concentração de atividades em poucas unidades administrativas; a deficiência de unidades de administração e financeira; a inexistência de unidade de desenvolvimento de recursos humanos; a precariedade das redes de comunicação; a indefinição de papéis e competências das unidades administrativas; a inadequação dos planos de cargos e dos quadros de pessoal e a inexistência ou inoperância de organismos de controle e fiscalização.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2002 - Página 5829