Discurso durante a 52ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REFLEXÃO SOBRE O DIA DO TRABALHADOR. (COMO LIDER)

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DE EMPREGO.:
  • REFLEXÃO SOBRE O DIA DO TRABALHADOR. (COMO LIDER)
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/2002 - Página 6826
Assunto
Outros > HOMENAGEM. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA DE EMPREGO.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, TRABALHADOR.
  • REPUDIO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CENSURA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, ILDO SAUER, PROFESSOR UNIVERSITARIO, UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), CRITICA, POLITICA ENERGETICA.
  • COMENTARIO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE), ESTATISTICA, EMPREGO, DESEMPREGO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Como Líder, sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, como Líder do Bloco de Oposição, Líder do Partido dos Trabalhadores, queremos fazer uma reflexão sobre o Dia do Trabalho, data que todos os anos é internacionalmente comemorada desde o ano de 1889, como justa homenagem aos trabalhadores de Chicago. No ano de 1886, milhares de empregados no centro industrial de Chicago, na época, o principal centro industrial dos Estados Unidos, organizaram uma greve geral protestando sobre as más condições de trabalho. E em decorrência daquela iniciativa sofreram forte atos de repressão, prisões, graves ferimentos, e até mesmo morte.

O movimento serviu de exemplo para todo mundo. Conquistas como a redução da jornada de trabalho de treze horas para oito horas em países como o Brasil e até menos em outros são exemplos da tradição de luta dos trabalhadores.

Como parte da reflexão sobre o Dia do Trabalho, nós queremos registrar que houve da parte do Governo Fernando Henrique Cardos algo extremamente sério.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - E eu gostaria de conceder, com muita honra, aparte à Senadora Heloísa Helena, pois, relacionado ao direito dos trabalhadores, está o direito à palavra, à liberdade de expressão, e informa-me a Senadora Heloísa Helena que algo grave ocorreu, merecendo, portanto, ser registrado no pronunciamento da Liderança do PT. Concedo à Senadora, com muita honra, um aparte, que será incorporado ao discurso desta Liderança.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Eduardo Suplicy, saúdo-lhe o pronunciamento, na tarde de hoje. Sei que o Senador Geraldo Cândido, ontem, também proferiu discurso enfocando esse tema. Mas, conforme debate travado na Liderança da Oposição - e estou convicta de que estaremos expressando o constrangimento de todas as pessoas que lutam pela liberdade de expressão e daquilo que existe de mais belo em relação ao trabalho -, para nossa surpresa, fomos comunicados pelo Professor Ildo Sauer, uma das referências técnicas do nosso País, sobre o debate da energia. Trata-se de um homem de bem, uma pessoa de paz, um dos quadros mais qualificados da universidade brasileira no que tange a um tema extremamente importante. Tem sido, inclusive, uma pessoa que contribui com a discussão, independentemente das convicções ideológicas. Teve a oportunidade de contribuir com o debate travado com Parlamentares do PFL, das mais diversas concepções partidárias e convicções ideológicas. E, para surpresa de todos nós, o Ministro Pedro Parente, de forma abominável, encaminhou pela Presidência da República - o ofício é da Presidência da República, da Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica - ao Reitor da Universidade de São Paulo um documento em que S. Exª faz uma ameaça explícita, a partir do momento em que solicita um pronunciamento do Reitor sobre as declarações técnicas feitas pelo Professor Ildo Sauer. Passo a ler um parágrafo do texto, para não especular acerca do que o Ministro Pedro Parente faz:

Assim sendo - diz o 2º parágrafo da carta -, para o fim de resguardar direitos e prevenir responsabilidades, inclusive no que toca à eventual propositura de ação judicial de reparação de danos, solicito a Vossa Magnificência que se digne a esclarecer se o Profº Ildo Sauer expressa ou não entendimento do colegiado da Universidade de São Paulo.

Da mesma maneira, para a nossa surpresa, também o Diretor Presidente Interino da Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial o faz. O que é mais grave, Senador Eduardo Suplicy, é que praticamente os mesmos termos são utilizados tanto pela Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial quanto pelo Ministro Pedro Parente ao Professor Ildo Sauer. O Governo Fernando Henrique quer promover também o apagão de idéias e da liberdade de pensamento. Assim, passo a ler a nota sobre a ameaça de processo contra o Professor Ildo Sauer, para que seja incorporada ao pronunciamento de V. Exª:

O Governo FHC, através do Ministro Pedro Parente, da Casa Civil e da Câmara de Gestão da Crise Elétrica, e do Presidente da Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial (CBEE), encaminhou dois ofícios de igual teor à Universidade de São Paulo, com ameaça de processo judicial contra o Professor Ildo Sauer, em razão de suas críticas e do relatório entregue às autoridades, apontando irregularidades e indícios de improbidade na compra de energia emergencial e nas compensações dadas às concessionárias, através da Medida Provisória nº 14, de 21/12/2001.

Essa medida foi amplamente discutida nesta Casa e, para surpresa de todos nós, os argumentos técnicos não foram devidamente apresentados pela base governista.

A manifestação do Governo é duplamente lamentável:

Em primeiro lugar, a consulta à USP é descabida, pois o relatório e as manifestações feitas à imprensa e junto ao Ministério das Minas e Energia, ao Congresso Nacional, ao Ministério Público Federal (no âmbito do inquérito civil público instaurado para investigar a legalidade e a constitucionalidade da cobrança do ‘seguro apagão’ e o funcionamento da CBEE) foram subscritas pessoalmente e jamais apresentadas em nome da USP ou de suas unidades; portanto, revela uma notória ignorância sobre os princípios que regem o funcionamento das universidades, baseados na liberdade de pensamento e expressão de seus integrantes.

            Aliás, a liberdade de pensamento e de expressão dos integrantes da universidade brasileira é uma das mais belas conquistas da democracia brasileira, ainda iniciante.

Em segundo lugar, por constituir uma tentativa de intimidação e constrangimento; trata-se de atitude típica de um Governo obscurantista, amigo da escuridão e do pensamento único, que foi responsável por dois apagões e um racionamento, e agora recorre à intimidação e às ameaças para tentar cercear do direito de expressão, visando promover também o apagão de idéias e da liberdade de pensamento. Ao invés de promover ameaças e intimidações, o Governo deveria promover as apurações requeridas e oferecer explicações convincentes à sociedade.

Portanto, Senador Eduardo Suplicy, tenho certeza de que falo em nome de V. Exª e de todos os Membros da Oposição, com a nossa manifestação de solidariedade ao Professor Ildo Sauer e a todos os professores da Universidade de São Paulo, da Unicamp, de várias universidades do País, do movimento sindical brasileiro, todas as pessoas que têm tido o privilégio de contribuir com o debate de forma qualificada, sem nenhuma vinculação política, nenhuma vinculação ideológica. Ao contrário, têm feito isso de uma forma extremamente bonita, que é pela liberdade de expressão duramente conquistada no nosso País. Agradeço o aparte de V. Exª e deixo registrada a nossa solidariedade ao Professor Ildo Sauer, na certeza de que ameaças e intimidações não serão suficientes para promover aquilo que tão bem o professor fala, que é o apagão das idéias, porque nenhum de nós somos amigos da escuridão e do pensamento único. Muito obrigada.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senadora Heloísa Helena, é de se estranhar que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, Professor Emérito da Universidade de São Paulo, considerado um dos príncipes da Sociologia, que inclusive foi objeto de perseguição pelo regime militar, esteja agora, por intermédio do Ministro da Casa Civil, Pedro Parente, a censurar o pensamento, as palavras e a expressão do Professor Ildo Sauer, daquela mesma universidade, que tem sido um dos mais eminentes técnicos na área de energia elétrica.

Ainda hoje, no Rio de Janeiro, juntamente com o Professor Luis Pinguelli Rosa e outros, o Professor Ildo Sauer foi um dos que apresentaram a proposta de planejamento do setor de energia do Instituto de Cidadania, que está colaborando com o programa apresentado por Luiz Inácio Lula da Silva.

É inadmissível que o Governo Fernando Henrique Cardoso possa estar tentando censurar e pressionar a Instituição, a própria Universidade de São Paulo, por permitir a seus professores que expressem livremente o seu pensamento.

No Dia do Trabalho, é pertinente que deixemos claro o conceito de trabalhador e do espaço formal ou informal onde se realizam atividades traduzidas pelo trabalho e desenvolvidas pela classe trabalhadora. Trabalhador e/ou trabalhadora são todos os cidadãos e cidadãs aptos(as) ao trabalho, ou seja, não se resume apenas ao conceito de empregado, ou de operário, bem como trabalho não se restringe ao mercado formal e, sim, a todos os espaços e formas de desenvolvimento da atividade de trabalho.

Face a isso, quando analisamos fatos e fenômenos ligados aos interesses profissionais dos trabalhadores e trabalhadoras, não nos referimos simplesmente ao mercado de trabalho e, sim, ao mundo do trabalho, seus vários setores e modelos, inclusive àqueles ainda não catalogados pelas instituições da estrutura do Estado responsáveis pela área.

Pela Constituição brasileira, a partir dos 15 anos de idade é que os brasileiros e brasileiras estarão aptos ao trabalho, compondo a População Economicamente Ativa que, segundo os últimos dados do IBGE, é formada por pessoas de 15 a 65 anos, somando um montante de 79,3 milhões, dividindo-se em: 71,6 milhões de ocupados e 640 mil desocupados. Vale salientar que aí não estão incluídos os que trabalham por conta própria, ou aqueles que estão sem carteira assinada e inacessíveis aos registros oficiais do IBGE.

Vivemos um período difícil de comemorar, pois convivemos com um quadro assustador de desemprego, de subocupações, de diferenças salariais baseadas no preconceito de relações de gênero e de etnia.

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Como afirmam as informações do próprio Ministério do Trabalho e documento da Unesco sobre a população: em média, a mulher percebe uma renda 60% inferior à dos homens; de 1992 a 1997, a proporção de mulheres ocupadas, com pelo menos segundo grau, cresceu de 22,4% para 28,3% e a de homens, de 15,9% para 19,4%; essa evolução não tem mudado o perfil de renda ente homens e mulheres; entre a população que vive abaixo da linha de pobreza, o número de mulheres é significativamente maior que o de homens, representando 31,3% da população ocupada; e, em 1998, um chefe de família branco, com doze anos de estudo, percebia R$881,00; um homem preto, R$423,00; mulheres brancas, R$559,00; e mulheres negras, R$226,00.

Segundo a última Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, a taxa média de desemprego aberto correspondeu a 6,2% da população economicamente ativa no ano passado, 0,9 ponto percentual abaixo da de 2000 - que era de 7,1% - e a menor desde 1997, quando ficou em 5,7%. Essa diferença entre a taxa média de 2001 e a de 2000 resulta de dois fatos: o aumento de 0,6% na população ocupada e a queda de 0,4% na população economicamente ativa.

No que se refere ao bem-estar da população, considerando a relação população/trabalho, chamamos a atenção para uma situação que nos tem assustado: o trabalho infantil. Os últimos dados do Ministério do Trabalho, de 1999, mostravam que a atividade agrícola detinha 80,4% das crianças ocupadas de 5 a 9 anos de idade e 63,2% das ocupadas de 10 a 14 anos de idade. Constatou-se, ainda, que o diferencial entre os gêneros foi mantido. De 1995 para 1999, a proporção de crianças ocupadas no contingente de 5 a 14 anos de idade passou de 14,5% para 11,8% entre os meninos e de 7,8% para 6% entre as meninas. Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas aponta que crianças menores de 14 anos de idade ainda representam quase um terço da mão-de-obra empregada na agropecuária brasileira.

É importante discutirmos o tema e tomarmos posições claras e definidas, uma vez que a principal legislação criada para regular direitos em defesa dos trabalhadores, a Consolidação das Leis do Trabalho, está, hoje, no cenário dos debates, sob uma perspectiva de reforma.

É oportuno salientar que a Bancada de Oposição no Senado, atendendo aos apelos da centrais sindicais como a CUT e a CGT, solicitou que fosse retirada a urgência do projeto que trata da flexibilização, adiando sua votação para depois das eleições, o que permitirá maior discussão e amadurecimento da matéria.”

Sr. Presidente, se considerarmos os últimos dados relativos ao desemprego, verificaremos que o número médio de desempregados nas 10 Regiões Metropolitanas era de 824 mil no segundo semestre de 1994 e passou para 1 milhão e 253 mil no primeiro semestre de 2002. O trabalhador levava, em dezembro de 1994, 16 semanas para conseguir um novo emprego, tendo esse tempo passado para 32 semanas, em dezembro de 2001.

Cabe salientar que a distribuição da renda pouco mudou nos últimos 7 anos. A participação proporcional dos mais ricos e dos mais pobres ficou aproximadamente a mesma, cabendo aos que pertencem ao grupo dos mais ricos - 1% da população - 13,9% em 1995 e 13,3% em 1999, restando para os 50% mais pobres algo próximo dessa proporção. Eram 47,2 milhões de brasileiros que viviam abaixo da linha da pobreza em 1994; número que aumentou para 54,5 milhões em 1999. A renda média do trabalhador, em termos reais, na Grande São Paulo, em índices corrigidos pelo IPCE, pelo Índice de Preços por Atacado, mostra uma evolução negativa, com uma diminuição dos rendimentos médios dos trabalhadores, sobretudo no período que vai de 1997 a 2001.

Portanto, pouco há que se comemorar nesse Dia do Trabalho, a não ser a reflexão sobre como é que vamos reverter esse quadro.

Sr. Presidente, gostaria de concluir informando que tive a honra de receber do ganhador do Prêmio Nobel de Economia, Professor Milton Friedman, uma carta, datada de 4 de abril de 2002, em que, como pesquisador sênior do Hoover Institution, uma instituição para pesquisa sobre a guerra, revolução e paz, diz o seguinte: (tradução livre)

Prezado Senador Suplicy:

Muito obrigado por ter-me enviado uma cópia de seu trabalho e do livro. Fiquei fascinado por aprender a respeito dos sucessos no Brasil através dos diversos programas que são relacionados às oportunidades de educação em várias comunidades. Também fiquei muito interessado em saber a respeito da Rede Européia da Renda Básica. Eu ainda não havia conhecido qualquer coisa a respeito anteriormente.

No que diz respeito ao que acontece nos Estados Unidos, o crédito fiscal por remuneração recebido, o ali denominado Earned Income Tax Credit, é uma versão do imposto de renda negativo, mas tem o defeito de ser adicionado a todos os demais programas de bem-estar, ao invés de ser um substituto para ele.

O meu apoio ao imposto de renda negativo sempre foi feito na intenção de que seria utilizado como um substituto aos diversos mecanismos ou medidas de bem-estar que agora temos, muitos dos quais não atendem o seu objetivo.

Espero que você obtenha todo o sucesso no seu trabalho no Brasil e apreciarei se puder me manter informado das mudanças que ocorrem.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/2002 - Página 6826