Discurso durante a 59ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a epopéia da construção de Brasília. Necessidade de redirecionar o planejamento econômico de Brasília com o objetivo de aumentar a geração de empregos.

Autor
Lindberg Cury (PFL - Partido da Frente Liberal/DF)
Nome completo: Lindberg Aziz Cury
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
NOVA CAPITAL. POLITICA DE EMPREGO.:
  • Reflexão sobre a epopéia da construção de Brasília. Necessidade de redirecionar o planejamento econômico de Brasília com o objetivo de aumentar a geração de empregos.
Aparteantes
Francisco Escórcio.
Publicação
Publicação no DSF de 14/05/2002 - Página 7941
Assunto
Outros > NOVA CAPITAL. POLITICA DE EMPREGO.
Indexação
  • EXPOSIÇÃO, HISTORIA, CONSTRUÇÃO, NOVA CAPITAL, ELOGIO, INICIATIVA, JUSCELINO KUBITSCHEK, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, IMPORTANCIA, DECISÃO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, DEPOIMENTO, CONSOLIDAÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), BUSCA, CRESCIMENTO ECONOMICO, AUTONOMIA, REPRESENTAÇÃO POLITICA, REGISTRO, ATUAÇÃO, ORADOR, ASSOCIAÇÃO COMERCIAL, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).
  • EXPECTATIVA, ELEIÇÕES, DEFESA, URGENCIA, POLITICA DE EMPREGO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado com o objetivo principal de rememorar um período de vivência nesta capital.

Sou do Estado de Goiás, precisamente da cidade de Anápolis. Num determinado momento da história política do nosso País, um candidato a Presidente da República anuncia e assume o compromisso de construir, no coração de Goiás, uma nova capital: Brasília. É verdade que o Brasil não acreditou nessa promessa. Diziam todos que era mais uma promessa de um político.

Juscelino Kubitschek de Oliveira, um homem determinado, logo no segundo ano do seu mandato, organiza a construção de Brasília, atendendo ao chamamento do povo da região. Ele tinha por meta trazer para o centro do Estado de Goiás, para o coração de Goiás, o desenvolvimento.

Até então, São Paulo e Rio de Janeiro concentravam as indústrias e o comércio. Esta parte central do nosso País e os Estados do Norte e Nordeste viviam diante da impossibilidade de crescimento se não houvesse uma atração para o desenvolvimento dessa região.

Em 1957, Juscelino Kubitschek autoriza rasgar o cerrado em forma de cruz. O brasileiro acreditou. Vieram pessoas de todos os Estados com a finalidade de criar uma nova capital. Deus me deu o privilégio de iniciar essa epopéia. Em 1957, vim de Anápolis para cá fornecer gêneros alimentícios - meu pai tinha um armazém - às companhias que estavam instalando seus canteiros para marcar o plano de construção da nova capital.

Foi realizado um concurso, do qual participaram diversas pessoas. Foram vencedores dois grandes gênios: Oscar Niemeyer, na parte da arquitetura, e Lúcio Costa, na parte da estrutura e engenharia da cidade.

A epopéia da construção de Brasília começa com o Núcleo Bandeirante, à época chamado Cidade Livre. Aqui chegam pessoas de todos os rincões do nosso País, que vinham com a esperança da criação de uma nova capital.

O sentimento de patriotismo era muito grande. Na minha juventude, ainda emocionado com a criação da nova capital, para cá me desloquei, a fim de acompanhar de perto os primeiros passos da construção.

Não é fácil para nenhum governo obter recursos até mesmo para construir uma ponte de grande extensão - como está ocorrendo aqui em Brasília. Juscelino Kubitschek - é preciso que reflitamos sobre a questão - prometeu criar em três anos, embora seu mandato fosse de quatro, uma nova capital no coração de Goiás. Não existiam vias de transporte ligando a cidade de Anápolis à futura capital. Para chegar a Brasília, saí de caminhão às 5 horas da manhã, de Anápolis rumo a Corumbá de Goiás, e depois a Brazlândia, cidade goiana com poucos habitantes - talvez menos de mil - e apenas uma rua principal, onde havia uma cafeteria.

O sentimento de brasilidade cresceu e assumiu proporções enormes. Os mineiros, os nordestinos, os nortistas, os goianos, que estavam aqui e viram os primeiros passos da construção de Brasília, acreditaram no projeto, deslocaram-se para cá e aqui tentaram fazer a grande capital.

No início da construção de Brasília, Juscelino Kubitschek importava tijolo, que vinha de avião, de outros grandes centros de produção. Existia entre o povo uma vontade enorme de construir a nova capital, um sentimento patriótico que estava acima de todas as convicções. Não se falava em política nem em credo religioso. Políticos deslocaram-se para a região e igrejas vieram dar amparo espiritual à população.

Brasília foi inaugurada em 1960, após três anos de construção.

Sr. Presidente, trata-se de uma epopéia que as pessoas mais velhas que aqui habitavam tiveram o privilégio de viver. Deus me deu esse privilégio de acompanhar a construção da cidade e a sua inauguração.

Pouco tempo depois, com o advento do Governo Jânio Quadros, paralisou-se tudo, inclusive os investimentos. Havia falta de credibilidade no Presidente, que, a todo momento, ameaçava voltar a capital para o Rio de Janeiro. E Brasília, então, estaria abandonada e seria uma cidade-fantasma.

A cidade tentou se reconstruir, se organizar, chamando empresas. Os funcionários públicos que aqui já estavam não tinham condições de retornar e as empresas que aqui investiram não dispunham de meios para voltar. Brasília precisaria ser feita de qualquer maneira. Não havia mais como retroceder.

            Caiu o Governo Jânio Quadros e veio o governo militar, polêmico, trazendo alguns resultados bons, outros discutíveis. Há, entretanto, um grande mérito: consolidou a Capital da República, dizendo ao povo que a revolução construiria Brasília e a levaria à frente.

            O retorno da credibilidade passou a ecoar por todo o Brasil e os investimentos começaram a surgir. Na década de 1970, havia uma previsão de que Brasília teria 500 mil habitantes no ano de 2000, mas hoje ultrapassa todas as perspectivas, porque ninguém acreditava que teria essa população, hoje, de cerca de dois milhões de habitantes.

            E a cidade começou a crescer. O crescimento maior foi na década de 1970. Nessa década, construiu-se a Asa Norte, começaram-se a preencher os vazios, porque era uma cidade grande, onde os vazios eram ocupados com o correr do tempo. O mundo político já estava aqui nesta cidade. Vinham os políticos de todas as localidades para cá e com uma grande vantagem: diminuir o custo operacional dos deslocamentos, porque Brasília estava a uma hora ou a uma hora e meia, ou a duas horas ou a duas horas e meia dos maiores centros do nosso País, sendo a Capital central. Isso facilitou o poder de decisão. Até longe das pressões políticas que existiam no Rio de Janeiro, das pressões trabalhistas, das greves constantes que por lá existiam.

A partir desse momento, tivemos um período de dificuldade. O comércio já começava a ficar saturado. Não se abria mais o mercado de trabalho. As instituições públicas também estavam ocupadas, não tinham muitas vagas. Nesse período, era muito comum não anunciar em jornal quem queria procurar emprego. Quando tínhamos as nossas empresas, pedíamos, pelo amor de Deus, que nos conseguissem um contador, dez mecânicos, dois auxiliares de contabilidade, um segurança.

A cidade não tinha o perigo de hoje. Não existia o crime, essas quadrilhas de roubo, nem o mundo da droga. Nessa época, não existia aqui ou em parte alguma do Brasil. Pelo menos, não tomávamos conhecimento, mas a população começou a subir, a crescer e, atualmente, vivemos um drama muito sério.

Pelos idos de 1977, assumi a Associação Comercial do Distrito Federal, e a nossa associação que se interessava diretamente pelos problemas da cidade levantou um programa de desenvolvimento econômico. Nessa época, não existia a Secretaria de Indústria e Comércio. Criamos, no Governo José Aparecido, aquela Secretaria.

Não se falava em comércio, era proibido falar em indústria no Distrito Federal e diziam: “Brasília foi feita para ser uma cidade administrativa”. É verdade que os políticos, o mundo cultural, os jornalistas e a imprensa de um modo geral entendiam que essas indústria seriam colocadas aqui perto do Plano Piloto. Muito ao contrário, o Plano de Desenvolvimento Econômico foi preparado para ser feito nas cidades-satélites, onde havia uma população e um contingente de pessoas desempregadas.

            Era o drama da ocasião! Grandes empresas passaram a acreditar em Brasília e se deslocaram para cá, principalmente de São Paulo. E o mundo precisava dar continuidade a esse projeto, porque Brasília passou a ser conhecida no mundo inteiro. Era a nova Capital! Oscar Niemeyer, com seu conhecimento, foi convidado a construir outras cidades, em outros países. E o Brasil começava a exportar tecnologia e conhecimento por meio desse grande arquiteto. Temos, no Iraque, obras suas. Quando estive na última reunião da Organização Mundial do Comércio, em Catar, cidade feita, tive a oportunidade de acompanhar suas linhas arquitetônicas, inspiradas principalmente em Oscar Niemeyer, nas linhas redondas que fugiam à regra de exceção daquele período.

No campo do desenvolvimento econômico, o Proin, que foi estabelecido em 1980, quando assumi a Secretaria de Indústria e Comércio, teve uma aceitação muito grande para aqueles que compreendiam que Brasília teria que gerar uma opção de emprego, teria que gerar renda, teria que formalizar uma proposta para os nossos filhos que aqui nasciam. E, nessa ocasião, já tínhamos um contingente muito grande de desempregados. Esse número já assumia proporções preocupantes, mas a Secretaria de Indústria e Comércio e o Programa de Desenvolvimento Industrial não foram levados a sério, sofreu um combate muito grande da população, que não entendeu, ou não quis entender o que ocorria nessa cidade. Taguatinga passava a ser a segunda cidade, com grande concentração de indústrias, mas um tanto afastada, sem incentivos, enquanto os Estados vizinhos promoviam programas de incentivos, concedendo oportunidades a fim de que as empresas para lá se deslocassem.

O atual Governo levou à frente o Programa de Desenvolvimento Econômico, por meio do Pró-DF, a fim de que unidades produtivas fossem colocadas em torno das cidades-satélites, em áreas previstas. O Plano começa a crescer. Esse mérito, devo dizer, pertence ao Governador Joaquim Roriz, que pressentiu o crescimento da população, que hoje ultrapassa os dois milhões. Se levarmos em consideração as cidades da região do Entorno, cerca de três milhões e quinhentos mil habitantes, justamente a população do Uruguai.

Mas ainda nos preocupamos com dois assuntos. Primeiro, com a autonomia política alcançada. Brasília passou a ter direito ao voto. E aqui está presente Nísio Tostes, a quem respeito muito, pessoa ligada à história de Brasília, que lutou conosco pela representação política. Era o regime militar, tínhamos sérias dificuldades, e a primeira vez em que promovemos um comício público, com a presença de diversos Presidentes de Partidos, fomos detidos e acabei sendo chamado pelo SNI, por alguma vezes, para prestar esclarecimento, recebendo das autoridades justamente aquela imposição de que Brasília jamais teria uma representação.

O Sr. Francisco Escórcio (PMDB - MA) - Senador Lindberg Cury, V. Exª me permite um aparte?

O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Ouço V. Exª com muito prazer, Senador Francisco Escórcio.

O Sr. Francisco Escórcio (PMDB - MA) - Senador Lindberg, sei que Brasília deve muito a V. Exª. Estou chegando, nesse momento, da Faculdade Euroamericana, onde estava com o auditório cheio, a debater o meu projeto da criação do Estado do Planalto Central aqui, nesta região. Sou um pioneiro, amo Brasília. Costumo dizer que tenho uma mãe que me pariu, que foi o Maranhão, mas tenho uma mãe que me criou, que foi Brasília. Tenho um amor especial por essa terra. Vim para cá em 1963, ainda garoto, e me lembro de toda essa nossa luta pela emancipação política de Brasília. V. Exª, como um dos fortes empresários de Brasília, como Presidente da Associação Comercial, tinha amor pela cidade, até porque tinha chegado no seu início. E não fico distante, porque devo muito a esta terra. Lembro-me da nossa época de Associação Comercial, quando fui Conselheiro da Associação Comercial do Distrito Federal e V. Exª era um dos pilares de sustentação daquela entidade. Aqui em Brasília não tínhamos representação política; ela se dava praticamente naquela entidade, que criou outros núcleos, como a Associação Comercial e Industrial de Taguatinga, da qual tenho orgulho de dizer que participei como vice-Presidente. Sei de toda essa luta. O testemunho que V. Exª está trazendo sobre a História de Brasília para esta Casa, eu o corroboro. Eu dizia ainda agora, Sr. Senador, da necessidade de repensarmos Brasília. Vejamos: a Capital do País foi projetada para que, no ano 2000 - do qual saímos ainda agora -, tivesse 500 mil habitantes. E V. Exª admite que hoje vivem em Brasília cerca de 3,5 milhões pessoas. Isso significa dizer que o Orçamento, previsto para 500 mil pessoas para o ano de 2000, deve ser aumentado sete vezes. Quem vai pagar isso, Sr. Presidente? Quem vai bancar o crescimento desordenado desta cidade tão querida? Esta cidade precisa ser repensada. V. Exª disse que há muito temos pensado e anunciado aos quatro cantos que precisamos fomentar o desenvolvimento desta cidade. Por isso quero me juntar a sua mensagem de carinho ao Governador Joaquim Roriz pelo fato de, como expressa um dito popular, “antes tarde do que nunca”, ter procurado criar muitos empregos. Nobre Senador, a situação da Grande Brasília é estarrecedora! Vê-se um acúmulo de pessoas vindas do meu querido Maranhão, do seu querido Estado e de todos os Estados brasileiros. Esse amontoado de pessoas, que se instala principalmente na Região do Entorno, é um verdadeiro barril de pólvora pronto para estourar a qualquer momento. Meus parabéns pelo seu amor, pelo seu carinho a esta terra, terra tão querida, terra de Juscelino Kubtischek. Meus parabéns pelo pronunciamento muito valioso de V. Exª.

O SR. LINDBERG CURY (PFL - DF) - Muito obrigado, Senador Francisco Escórcio, pelo seu aparte. V. Exª tem muita vivência em Brasília.

Pediria permissão ao nobre Presidente para encerrar esta minha participação.

Fiz todo esse preâmbulo para dizer que Brasília hoje tem cerca de 200 mil desempregados. Tenho visto nas campanhas e plataformas de todos os candidatos à Presidência da República o compromisso de gerar empregos. Esta cidade tem um contingente de aproximadamente 17% de desempregados e sempre vem uma nova geração pela frente que precisa entrar no mercado de trabalho. Não temos recursos para isso.

É preciso repensar Brasília. É preciso exercer a reflexão de maneira positiva para gerar empregos. Todos esses candidatos têm de comprometer-se não apenas com Brasília, mas também com todo o Brasil. Emprego é a plataforma almejada por todos e Brasília não foge à regra. A nossa estrutura educacional e hospitalar, na verdade, não consegue atender à população das cidades dos Estados de Goiás e de Minas Gerais, localizada na região geoeconômica e que vem para a Capital da República à procura de trabalho, de estudo e, principalmente, de tratamento hospitalar.

E aproveito para fazer um apelo a todos os membros da nossa Bancada, ao futuro Governador, aos Deputados, para que façam uma concentração de propósitos e reflexões em planos que possam gerar indústrias e desenvolvimento econômico. Só assim acabaremos com a droga e reduziremos o desemprego.

Agradeço a V. Exª a gentileza de ter-me permitido estender o meu pronunciamento um pouco mais.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/05/2002 - Página 7941