Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à privatização do Banco do Estado de Santa Catarina - BESC.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • Posicionamento contrário à privatização do Banco do Estado de Santa Catarina - BESC.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2002 - Página 8006
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, CRITICA, GOVERNO, ENTREGA, RECURSOS, LUCRO.
  • CRITICA, GOVERNADOR, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ACORDO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), GOVERNO FEDERAL, PRIVATIZAÇÃO, BANCO DO ESTADO DE SANTA CATARINA S/A (BESC), DESCUMPRIMENTO, COMPROMISSO, CAMPANHA ELEITORAL, ALEGAÇÕES, REPARAÇÃO, FINANÇAS, DENUNCIA, ORADOR, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA, PERDA, AGENTE, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, INTERIOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CASILDO MALDANER (PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma vez, trago a esta Casa uma preocupação antiga sobre algo que vem ocorrendo no Brasil e, por extensão, em Santa Catarina.

Na época das privatizações, houve movimentos em vários setores da economia nacional, levando a Nação, de certo modo, a compreender a questão. Em determinado momento, quando se falava na privatização da Petrobras, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, alguns setores da sociedade começaram e se levantar e a dizer: ”Chega! Agora não dá. Não é possível!” Não podíamos continuar tendo o céu como limite nessa entrega, na privatização, na internacionalização. Precisávamos de uma pausa.

Ao longo desse tempo todo, o Governo conseguiu favorecer a entrada de recursos externos no País, sim, mas em muitos casos o próprio Governo tem usado recursos nossos, por intermédio do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social - o BNDES, para financiar empresas internacionais, permitindo que adquirissem o controle de empresas nacionais com a privatização.

Com isso, diversos setores da sociedade perceberam que os nossos recursos, ao invés de serem destinados à criação e à motivação de pequenos negócios nacionais, capazes de produzir, gerar mais riquezas e oferecer mais empregos e renda, estavam sendo desviados.

Levantou-se também a tese de que poderíamos, no campo da energia elétrica, por exemplo, permitir a privatização da parte excedente de energia, ou seja, ceder, conceder, privatizar o que se construir dali em diante, para que a geração seja maior, permitindo a prevenção.

O que aconteceu? O Governo caiu na tentação e entregou o que já estava com o seu potencial em campo, isto é, aquilo que estava produzindo e gerando renda. Penso que esse foi o erro estratégico da política governamental, em todos os setores. No campo de energia foi isso.

No entanto, deveríamos ter cedido para, depois, privatizarmos. Com a entrada de capital externo, aumentaríamos o potencial de nossa energia e avançaríamos corretamente, buscando saídas para o Brasil.

Mas esses equívocos aconteceram, e há uma série de coisas. Há o racionamento de energia. O Brasil fez um racionamento sério e responsável em vários setores, e o da energia foi um deles.

Colocando alguns senões, Sr. Presidente e nobres colegas, gostaria de falar sobre o meu Estado, Santa Catarina. Na campanha de 1998, já se falava nisso, mas o Governo de então resistia, e o candidato, que hoje é Governador em Santa Catarina, dizia, em plena campanha, alto e bom som, a quem quisesse ouvir e sentir, em uma carta inclusive dirigida a todos os setores da sociedade: “O Banco do meu Estado não! Ele foi criado há 40 anos e tem uma grande meta de servir aos catarinenses. Não abrirei mão, de forma alguma, porque conheço o trabalho, a dedicação e os serviços que está prestando à sociedade como um todo”.

Qual não é a surpresa, Sr. Presidente, quando chega ao Governo e, às escondidas, reúne-se no Banco Central e acerta os entendimentos! Trai aquilo que tem pregado não só aos que pertencem ao Banco, mas à sociedade catarinense. Acerta com o Governo e com o Banco Central, aqui em Brasília, para entregar o nosso patrimônio, em troca de algumas benesses e vantagens para o seu Governo em Santa Catarina, que pudessem permitir condições melhores nas ambições familiares.

E o que aconteceu, Sr. Presidente? O patrimônio que se construiu ao longo de 40 anos no meu Estado está sendo dilapidado. Dói-nos ver buscarem junto ao Governo Federal algo em torno de R$2 bilhões com o suposto objetivo de sanear aquela instituição financeira que se distribuí pelos 293 Municípios do nosso Estado, servindo de alavanca de negócios e prestando serviços à coletividade. Esses recursos foram buscados, repito, com o objetivo de saneamento.

Diante das condições desse empréstimo, que deve ser devolvido ao longo de trinta anos, com todos os custos e juros, comenta-se nas bases, em meu Estado, que há um quadro desenhado: vão entregar o nosso banco, patrimônio público catarinense, para um banco, talvez internacional, por um valor entre R$400 e R$600 milhões. E qual é o fim da história, Sr. Presidente? Vamos ficar com uma conta para pagar de R$1,7 bilhão mais ou menos: a sociedade catarinense vai pagar esse valor com juros ao longo de uma geração e, ao final, ficará sem o banco. Esse é o comentário que se ouve em Santa Catarina.

Mal comparando ou, talvez, bem comparando se guardarmos as proporções, pode-se dizer que a situação assemelha-se ao que se antevia quando se falava na privatização do Banco do Brasil. Guardadas as proporções, seria o mesmo que privatizar o Banco do Brasil - cedê-lo para o Eximbank, por exemplo, ou outro banco internacional - e perder grande parte de nossa soberania. Com o Banco do Brasil vendido, internacionalizado, não teríamos mais o comando da política nacional. Guardadas as proporções, é o que ocorre em Santa Catarina: querem privatizar o banco dos catarineneses, abrir mão de um patrimônio que é nosso, dilapidar o que é de todos, querem entregar o banco, trocando-o por uma dívida que deverá ser paga ao longo de uma geração.

Com essa privatização, estar-se-á privando as pequenas comunidades do atendimento que hoje lhes é oferecido pelo banco. Hoje vê-se quem pregava diferentemente em campanhas anteriores sendo dócil, concordando, facilitando, atuando como coadjuvante nesse processo todo.

Já dissemos mais de uma vez lá em Santa Catarina que essa venda significa perdermos um pouco também do princípio federativo. Vai perder o nosso Estado, que tem uma economia diversificada, que é conhecido e reconhecido no Brasil não pelo seu tamanho geográfico, mas pela qualidade e pela pujança de seu povo, de seu trabalho, de sua formação, de sua economia diversificada. Essa instituição, lá inserida há mais de quarenta anos, objetiva fomentar o desenvolvimento, facilitar os pequenos negócios, interiorizar o desenvolvimento, tornar mais eqüitativa a ocupação geográfica do Estado. Vamos fazer desmoronar isso tudo como se fosse uma estrutura de areia, o que ofende os catarinenses, ofende todos nós.

O Governo, que tinha que ser o primeiro a se opor a essa venda, a resistir à privatização sem se acovardar, está encabeçando o processo. Vamos perder aquilo que é nosso e vamos enfraquecer, como disse antes, o princípio federativo, a autonomia, que é característica de um Estado como o nosso.

Sr. Presidente e nobres Colegas, não pude evitar trazer aqui o sentimento de revolta, de constrangimento, de inconformismo. Graças a Deus, em nível nacional, esse processo de privatização de bancos está paralisado, mas, em Santa Catarina, não sei por que cargas d’água, ainda continua essa onda, continuam querendo levar avante um projeto desse tipo.

A Justiça tem concedido liminares para que se evite essa dilapidação, mas o Governo do Estado, aliado ao Banco Central, está procurando de todas as formas fazer com que sejam derrubadas essas decisões judiciais e fazer com que se entregue, se dilapide o patrimônio público catarinense.

Trago essa preocupação, trago esse sentimento, Sr. Presidente, porque onde se vai, sente-se isso. Aliás, acho até que cabe falar em apuração de responsabilidade nesse caso, porque fazer o que estão fazendo, da maneira pela qual estão fazendo, não deixa de afrontar o princípio da responsabilidade. Pela maneira como se conduz o processo, não tenho a menor dúvida de que a comunidade do meu Estado não perdoará e haverá de chamar à responsabilidade as pessoas que o conduzem - processo que, levado a cabo, trará um triste fim para Santa Catarina.

Em nível nacional, como eu disse antes, deu-se andamento a esse processo de privatização, mas em determinado momento ele foi paralisado, sentiu-se que não era esse o melhor caminho. Temos os exemplos da Argentina e de outros países que foram por esse caminho e resolveram parar, mas chegaram tarde. O Brasil resolveu parar, mas não sei se isso será possível.

O meu Estado, agora, segue por esse caminho. Precisamos nos agarrar a todos os dispositivos possíveis e inimagináveis para tentar salvar aquilo que é nosso, que é dos catarinenses, aquilo que é um dos motivos do nosso orgulho. Associam-se ao banco catarinense expressões como: ‘É o banco da gente, é o orgulho da terra catarinense”. Isso vem de pai para filho, de geração para geração, ouve-se nas escolas, entre as crianças e as pessoas mais experientes, na coletividade, enfim, em todos os lugares do nosso Estado.

Por isso, trago mais uma vez essa preocupação, esse sentimento de dor. Essa instituição deveria estar sendo ajudada para atuar na fronteira com a Argentina, para socorrer os pequenos produtores, que sofrem com a estiagem, para desenvolver os negócios. No entanto, o que acontece? Vêm arrancar da comunidade o banco para entregar a uma instituição que procurará obter lucros fáceis, usando um patrimônio enorme como aquele. Isto não se faz.

Está sendo feito um levantamento para avaliar o patrimônio real envolvido, para quantificar o lado material da privatização. Não se avalia, porém, não se mensura aquilo que é uma construção de quarenta anos, aquilo que é um patrimônio da comunidade. Não se mensuram esses valores. Isso não se conseguiu de graça. Abrir caminhos e levar agências para o interior tem enormes custos. Não foi fácil levar agências para Peperi-Guaçu, que fica na fronteira com a Argentina, para o Vale do Passo de Touros, na divisa com o Rio Grande do Sul, para Porto União, na divisa com União da Vitória, enfim, para todos os quadrantes do Estado. Onde quer que imaginemos há uma agência: é o patrimônio da comunidade distribuído por todos os lugares. E agora isso não é mensurado, não tem valor, nem se pensa nisso.

Veja o que o Bradesco fez agora, Sr. Presidente: para ter o direito de usar as agências dos Correios com funções de banco, para poder lá colocar os seus equipamentos, só para ter o direito de usar as instalações, está assinando com os Correios um contrato no valor de, mais ou menos, R$200 milhões apenas pela concessão, para poder usufruir desse mercado que os Correios abriram nas comunidades brasileiras onde não existe o Bradesco.

Agora veja o nosso banco, os caminhos que desbravou, o patrimônio que conseguiu acumular ao longo de 40 anos de existência. Tudo isso é abstrato, não há como se mensurar, o que gera uma revolta, Sr. Presidente. Qualquer produto que é colocado no mundo tem seus valores agregados, e não só pelo produto. Use-se o exemplo da agroindústria: os produtos de empresas como a Perdigão e a Sadia valem também pelo preparo, pela marca, pelo nome que se consolidou. E assim, no nosso Estado, temos um nome que se criou, mas ao qual não se dá valor nenhum, o que, de certo modo, gera uma sacrossanta revolta.

Essas são algumas ponderações, Sr. Presidente e nobres Colegas, que não pude deixar de registrar no dia de hoje, aqui, no Senado, sem contudo deixar de ir adiante na luta - aqui, no Estado, nas barras da Justiça, onde for - pela preservação do patrimônio dos catarinenses. Assim, Sr. Presidente, procuraremos responsabilizar - ou as urnas o farão - os culpados, pois não podemos permanecer omissos diante de um descalabro dessa ordem.

Muito obrigado, Sr. Presidente e nobres Colegas.

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2002 - Página 8006