Pronunciamento de Alvaro Dias em 14/05/2002
Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Críticas à atuação do governo brasileiro quanto à política protecionista das nações desenvolvidas que impõem elevadas tarifas de importação aos produtos agrícolas dos países em desenvolvimento e concedem subsídios à produção interna. (Como Líder)
- Autor
- Alvaro Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
- Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA AGRICOLA.
COMERCIO EXTERIOR.:
- Críticas à atuação do governo brasileiro quanto à política protecionista das nações desenvolvidas que impõem elevadas tarifas de importação aos produtos agrícolas dos países em desenvolvimento e concedem subsídios à produção interna. (Como Líder)
- Aparteantes
- Ademir Andrade.
- Publicação
- Publicação no DSF de 15/05/2002 - Página 8052
- Assunto
- Outros > POLITICA AGRICOLA. COMERCIO EXTERIOR.
- Indexação
-
- CRITICA, PROTECIONISMO, PAIS INDUSTRIALIZADO, CONTRADIÇÃO, TEORIA, ECONOMIA, LIBERALISMO, ESPECIFICAÇÃO, REFERENCIA, SUBSIDIOS, AGRICULTURA, REGISTRO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO, MUNDO.
- CRITICA, GOVERNO BRASILEIRO, POLITICA EXTERNA, INCOMPETENCIA, COMERCIALIZAÇÃO AGRICOLA, COMERCIO EXTERIOR, DEFESA, INTERESSE NACIONAL.
- APOIO, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO (MAPA), DEFESA, UNIÃO, PAIS, TERCEIRO MUNDO, LUTA, DEMOCRACIA, POLITICA INTERNACIONAL, DESENVOLVIMENTO.
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. ÁLVARO DIAS (PDT - PR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, confesso que tenho dificuldades para compreender a lógica da política usada pelas nações mais ricas do mundo ao adotarem políticas protecionistas que asfixiam as nações em desenvolvimento.
Amparadas pelas mais modernas teorias econômicas, sustentam o princípio da livre iniciativa. No entanto, na prática, adotam políticas públicas que as contrariam frontalmente.
A agricultura é considerada questão de segurança nacional pelas nações importantes, exatamente pela peso social no que diz respeito à segurança alimentar, ao combate à fome, ao acesso à terra pelo trabalhador rural, associada à grande influência de natureza econômica, com a oferta de alimentos a preços compatíveis e o fornecimento de matéria-prima para o processo de industrialização. Além disso, a agricultura tem estreita relação com os problemas ambientais, a biodiversidade, o efeito estufa e a qualidade da água. Portanto, esta importância estratégica é razão do forte protecionismo adotado pelas nações poderosas do mundo.
Contudo, Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, não me parece ser inteligente a postura das nações ricas ao adotarem, além das barreiras tarifárias e não-tarifárias para produtos como açúcar, álcool, suco de laranja, produtos de origem animal e outros, subsídios portentosos. Cerca de US$1 bilhão por dia em subsídios, suportando o interesse de nações poderosas em detrimento do interesse das nações em desenvolvimento. Enquanto as nações ricas subsidiam a agricultura, a nossa sobrevive com dificuldades, em função dos impostos proibitivos e das enormes dificuldades de infra-estrutura.
Hoje a comercialização supera a produção como fator limitativo da atividade agrícola. É difícil vender. É muito mais difícil vender que produzir. Produzir, o produtor brasileiro o faz com competência; vender, o Governo brasileiro o faz com incompetência.
Certamente a nossa agricultura seria muito mais forte e os agricultores brasileiros estariam muito mais felizes se o Governo brasileiro fosse competente na superação de alguns obstáculos da política internacional e adequasse os interesses nacionais compatibilizando-os aos interesses das nações poderosas.
Parece-me, Sr. Presidente, não ser muito inteligente esta atitude imediatista das nações poderosas. Afinal, estamos presenciando uma redução cada vez maior da área de plantio no mundo. No ano de 2000, foram apenas 674 milhões de hectares utilizados para produção agrícola no mundo, a menor área de plantio desde 1972. Com isso, o estoque de produtos alimentícios seria suficiente para apenas 86 dias de consumo mundial. Portanto, insuficiente se ocorresse uma má colheita.
Creio que esse é um risco presente e visível que não está sendo considerado pelas nações poderosas do mundo. Certamente essa política protecionista, com as barreiras tarifárias ou não, sobretudo com os subsídios nos preços, há de desestimular os plantadores em todo mundo.
Há uma previsão de redução ainda maior da área de plantio. O que houve para essa redução até aqui foi o aproveitamento das fazendas de encostas no Japão, utilizadas para florestas e pastagens; também a retirada de doze milhões de hectares nos Estados Unidos para o programa de reserva para preservação. Áreas com risco de erosão foram protegidas, sendo retiradas do processo produtivo e incluídas no programa de reserva para preservação. Áreas também próximas a aqüíferos, com a preocupação natural do Governo norte-americano em relação ao abastecimento de água da sua população.
Há agora, Senador Ademir Andrade, uma previsão, ainda mais dramática, em relação à redução da área de plantio no mundo. Anuncia-se que, especialmente na China e na Índia, a produção de grãos, com irrigação, sofrerá uma redução significativa. Há aqüíferos em exaustão e, por conseqüência, enormes áreas de plantio serão também, brevemente, retiradas do processo produtivo.
Creio que é necessário fazer esse alerta às nações poderosas. A política do egoísmo, do imediatismo, do oportunismo, que compromete os interesses das nações em desenvolvimento, pode ser fatal, inclusive para a população das nações mais poderosas.
O Sr. Ademir Andrade (PSB - PA) - V. Ex.ª me concede um aparte?
O SR. ÁLVARO DIAS (PDT - PR) - Concedo com prazer o aparte ao Senador Ademir Andrade.
O Sr. Ademir Andrade (PSB - PA) - Senador Álvaro Dias, ouço com toda a atenção o discurso de V. Ex.ª. Sei que o tema tem causado enorme preocupação ao Brasil e, de certa forma, provocado escândalo, em função do enorme subsídio que os Estados Unidos decidiram conceder aos seus produtores; mas tenho um pensamento um pouco diferente. A atividade agrícola, não só no Brasil mas no mundo, também a atividade da pecuária, a atividade no campo, a atividade rural, de maneira geral, tende a ser cada vez mais cara. Num mundo que se moderniza, se automatiza, se informatiza, essa atividade tende a ser subsidiada. Isso ocorre principalmente nas principais economias do Planeta, como, por exemplo, na Europa e, mais acentuadamente, nos Estados Unidos. O Brasil já foi a oitava economia do mundo - hoje somos a décima primeira. De qualquer forma, ainda somos uma economia extremamente importante. Produzimos atualmente 100 milhões de toneladas de grãos, mas podemos atingir a cifra de 800 milhões - temos potencial para isso. Creio que é chegado o momento de o Brasil assemelhar-se aos países desenvolvidos e começar a pensar a sua agricultura, sua pecuária, sua atividade de campo, de produção da terra como uma atividade também a ser subsidiada pelo Governo. Todas as economias mais ricas do Planeta já o fazem. V. Exª sabe que o cidadão do interior, nos países da Europa, está recebendo mais do que o dobro do valor que efetivamente produz para permanecer no campo. Interessa a esses países que essas pessoas permaneçam no campo, pois assim não superpovoam os centros urbanos e se mantêm empregadas e ocupadas. Em vez de o Brasil criticar e se lamentar, talvez fosse a hora de começar a pensar como um grande país, subsidiando seu setor produtivo, garantindo preços e dando proteção a quem produz, a quem vive no campo. No Brasil, ainda é um sacrifício viver no campo. Portanto, é chegada a hora de mudar. Não há subsídio para a agricultura no País. Ao contrário, o produtor toma dinheiro emprestado e ainda precisa pagar juros muito maiores do que a inflação. Em outros países, recebem praticamente o dobro do valor daquilo que produzem a preço de mercado. O Brasil deveria repensar no assunto. Em vez de usar o dinheiro arrecadado do povo brasileiro para beneficiar um sistema financeiro nacional e internacional, como vem ocorrendo, comprometendo, neste ano, R$92 bilhões para pagamento de juros da nossa dívida, o Brasil deveria começar a subsidiar a agricultura, da mesma forma que os Estados Unidos e os países europeus. Creio que é chegado o momento de se pensar numa mudança de rumo nesse setor. Essa é a minha idéia. Senador Álvaro Dias, ouço com atenção as argumentações de V. Exª. Muito obrigado.
O SR. ÁLVARO DIAS (PDT - PR) - Senador Ademir Andrade, sou eu que agradeço o ilustre aparte de V. Exª.
Evidentemente, não temos nem podemos ter a pretensão de influir nas decisões das grandes nações do mundo, especialmente os Estados Unidos da América e os países da Europa. Se os governos europeus desejam patrocinar a mordomia dos agricultores da Europa na Avenida Champs Elysées, em Paris, esse é um problema dos governos. Se desejam subsidiar os produtos agrícolas e, portanto, alavancar a atividade dos produtores rurais da Europa, também é um problema que compete aos governos daqueles países resolver. A nós não cabe influir. Entendemos que é necessária a democratização das decisões internacionais. Os países em desenvolvimento precisam estabelecer uma luta política nos fóruns internacionais para compatibilizar interesses. O tratamento que desejamos aos nossos produtos na Europa é o mesmo que o nosso País oferece aos produtos europeus no Brasil quando importamos.
Portanto, cabe ao Governo brasileiro decidir se há condições de subsidiar a nossa agricultura ou se os serviços da dívida consomem todos os recursos disponíveis no País, nada restando para o subsídio à atividade agrícola, que é tão importante, inclusive considerada de segurança nacional pelas nações de governos mais inteligentes.
Pregamos desta tribuna, em apoio até mesmo às palavras do Ministro da Agricultura no dia de hoje, que os governos dos países em desenvolvimento devem reunir-se nessa luta política a ser travada nos fóruns internacionais, para, nessa democratização das decisões, estabelecer políticas que compatibilizem os interesses e jamais admitir que nações em desenvolvimento sejam subjugadas por políticas impostas por nações poderosas, que impeçam o processo de desenvolvimento, já que são mercados emergentes que certamente interessam, e muito, às Nações mais poderosas nesse processo de globalização da economia.
Cito como exemplo especial o meu Estado do Paraná. O agronegócio é responsável por 64% do Produto Interno Bruto em meu Estado. O Paraná, que tem um Produto Interno Bruto ao redor de R$71 bilhões, tem sua agricultura respondendo por cerca de 64% desse total. Portanto, é inadmissível que a agricultura no nosso País continue desassistida. Além disso, das nossas exportações para o exterior, 36% se direcionam para os países da Europa. Por isso fiz referência especial aos países europeus, evidentemente sem excluir a importância, nesse processo de comercialização dos nossos produtos, dos Estados Unidos e México, responsáveis pela aquisição de 18% dos produtos agrícolas exportados pelo meu Estado.
Sr. Presidente, só nos cabe, integrando um partido de oposição, apoiar o esforço que o Ministro da Agricultura pretende desenvolver neste momento. O Governo brasileiro tem sido tímido em excesso no trato desta questão. Não tem tido o Presidente da República a habilidade necessária para envolver e liderar os demais países em desenvolvimento num mesmo projeto, com o mesmo objetivo de tentar democratizar as decisões internacionais, a fim de que as nações em desenvolvimento não sejam subjugadas por uma política internacional de perversidade incomum que se exacerba a cada momento.
Não é só a questão dos produtos primários, oriundos da agricultura. Os produtos da nossa siderurgia são também alvos de salvaguardas norte-americanas, que contrariam os nossos interesses.
A nossa preocupação maior, pela vocação agrícola indiscutível do nosso país, é exatamente com as políticas protecionistas adotadas em relação aos produtos agrícolas produzidos em nosso País e exportados especialmente para Europa, Japão e Estados Unidos da América do Norte.
Sr. Presidente, ao concluir o nosso pronunciamento, quero mais uma vez assinalar o nosso descontentamento em relação à fraqueza das ações do nosso Governo, mas firmar o nosso apoio, neste momento, quando há mais uma iniciativa que parte do Ministro da Agricultura, com o objetivo de superar dificuldades e estabelecer um novo cenário de maior responsabilidade internacional, compatibilizando os interesses, sim, sobretudo dos países em desenvolvimento, em favor da paz mundial. Porque, sem sombra de dúvidas, a paz é a irmã preferida da justiça social.
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