Discurso durante a 58ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Solidariedade à família do Sr. Eduardo Vilela Mackenzie, falecido hoje, em Brasília. Homenagem pelo transcurso do Dia do Trabalhador, comemorado em 1º de maio. Comentários sobre dados do último censo do IBGE.

Autor
Marluce Pinto (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Maria Marluce Moreira Pinto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.:
  • Solidariedade à família do Sr. Eduardo Vilela Mackenzie, falecido hoje, em Brasília. Homenagem pelo transcurso do Dia do Trabalhador, comemorado em 1º de maio. Comentários sobre dados do último censo do IBGE.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2002 - Página 7872
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, EDUARDO VILELA MACKENZIE, PAI, SUPERINTENDENTE, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), ESTADO DE RORAIMA (RR).
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, TRABALHADOR.
  • REGISTRO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), REDUÇÃO, MORTALIDADE INFANTIL, AMPLIAÇÃO, SANEAMENTO BASICO, ACESSO, CRIANÇA, ENSINO FUNDAMENTAL, AUMENTO, EXPECTATIVA, VIDA, CONSUMO, BENS, DESEQUILIBRIO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • CRITICA, PUBLICAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL PLANALTO CENTRAL, DISTRITO FEDERAL (DF), DENUNCIA, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, UTILIZAÇÃO, DADOS, GRUPO EXECUTIVO, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE).

A SRª MARLUCE PINTO (PMDB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de iniciar meu discurso, registro o falecimento, hoje, em Brasília, do Sr. Eduardo Vilela Mackenzie, pai do Dr. Eduardo Alberto ViIela Morales, Superintendente da Embrapa do Estado de Roraima.

Se houver interesse para os que aqui vivem, o endereço do falecido é SHIS, QI 17, conjunto 3, casa 19, Lago Sul.

Sr. Presidente, aproveito esta oportunidade para solidarizar-me com a família do falecido. 

No dia 1º de maio recém-passado, comemoramos o Dia do Trabalhador.

Em homenagem ao trabalhador brasileiro, portanto, é que faço as reflexões de agora.

Tardia homenagem, porque nesta semana os oradores foram muitos. A pauta esteve muito extensa, e não houve possibilidade de pronunciar-me. Mas essa data é sempre atual porque todo dia é dia de trabalho; é dia de produzir, de levantar cedo e fazer funcionar as chaminés, os fornos, as máquinas e, principalmente, as mãos, as mentes e os corpos de todos nós que trabalhamos, geramos riquezas e não podemos parar, sob pena de pagarmos muito alto, o mesmo preço que, neste mundo competitivo e materialista, pagam aqueles que ficam aquém na qualidade e quantidade de seus produtos. Infelizmente, grosso modo, é essa a dura, fria e desumana realidade da matemática que confere valores em nossa atualidade.

Entretanto, Sr. Presidente, um item, uma palavra, uma ação, consegue sobrepor-se a tudo isso e continua a ser o mais nobre componente da função produtiva de qualquer sociedade: o trabalho.

Mesmo que a produção seja resultante da conjugação capital/trabalho, apenas o trabalho é digno de ser uma expressão maior da pessoa humana.

Em qualquer sociedade, toda e qualquer vantagem que possa o capital dar a quem o possua deve ser antecedida de honra, honestidade e dignidade no trabalho que o originou. E é a partir dessas palavras: honra, dignidade e ética, que cada um de nós, sejamos brasileiros, americanos, africanos, europeus, árabes, italianos ou argentinos, devemos examinar a questão das relações entre o capital e o trabalho.

Mais do que nunca, principalmente agora, na aldeia global quase sem fronteiras em que vivemos, devemos voltar nossas preocupações para a legislação concernente ao trabalho e elaborar novas propostas que protejam os que trabalham.

O trabalhador, em hipótese alguma, deve ser vislumbrado como uma mercadoria em leilão, que se compra pelo menor preço. O trabalhador não é um pedaço de vida que se aluga por tempo determinado.

Trabalhar, antes de quaisquer outros adjetivos, é honrar nossa condição humana.

Trabalhar e produzir são valores humanos ímpares, inerentes à nossa própria condição de estarmos vivos. Dois verbos que, na verdade, sintetizam as duas ações mais belas do ser humano, mobilizadas para a realização de obras dignas.

E, onde há trabalho, Sr. Presidente, há salário.

Refletindo sobre isso, é oportuno dizer que salário não é o simples pagamento por um trabalho realizado.

O salário não é apenas o preço pago por um insumo da produção.

O salário, antes e acima de tudo, é a contrapartida material a que o trabalhador tem absoluto direito por sua participação no empreendimento produtivo.

O salário, para o trabalhador, é o fruto resultante de seus conhecimentos, de seus esforços, de sua dedicação, do dever cumprido e da obra realizada.

Salário, para o trabalhador, deve, por direito, garantir-lhe todos os requisitos necessários a uma vida digna: alimentação, educação, saúde, habitação e lazer.

E ao trabalhador - não importa sua condição ou qualificação; não importa se autônomo, assalariado, artesão ou intelectual; não importa se no campo ou na cidade - não pode faltar o trabalho.

O trabalho, qualquer que seja ele, deve ser o caminho mais curto, mais amplo e mais limpo, para que o homem realize suas aspirações, pois nada é tão trágico e tão desumano quanto uma família sentada à mesa sem o pão de cada dia, em virtude de o pai ou a mãe estarem desempregados e não terem como prover a alimentação dos próprios filhos.

Sr. Presidente, meus nobres colegas, certo é - e é preciso que sejamos justos - que muito temos que comemorar no engrandecimento desta Nação, particularmente nesta última década. Muito, porém, ainda nos falta para que a realidade do trabalhador brasileiro se encaixe nas minhas palavras iniciais.

É mais do que justo enaltecermos os fatos positivos havidos, mas também é preciso abraçarmos, com mais força, mais vontade e mais veemência, o muito que ainda falta e que causa aflição e desespero a milhares de famílias por este imenso Brasil.

As informações divulgadas anteontem pelo IBGE, ontem estampadas nos jornais, dão-nos conta de que nosso País melhorou alguns índices sociais nos últimos dez anos, ressalvadas algumas exceções localizadas.

No geral, tivemos queda da mortalidade infantil em torno de 38%, um fato realmente merecedor de aplausos. O analfabetismo decresceu, passando dos 17,2% da população, em 1991, para menos de 13% em 2000. Ampliamos o acesso de nossas crianças na escola, ultrapassando o percentual dos 90% no ensino fundamental.

É motivo de orgulho para todos nós sabermos que o índice das residências brasileiras atendidas com água canalizada, esgoto e sanitário e coleta de lixo subiu para 62,3%, quando em 1991 era inferior a 50%. Esse fato proporcionou notável aumento da expectativa de vida dos brasileiros.

Outras informações positivas dizem respeito aos lares brasileiros que ficaram mais bem equipados nos últimos dez anos. O IBGE garante que houve significativo crescimento de bens duráveis e serviços nas casas dos brasileiros. Entre esses bens destacam-se o telefone fixo, que passou de 18,6% em 1991 para 39,7% em 2000, e a máquina de lavar, presente hoje em 26% das residências.

Das cerca de 44 milhões de residências brasileiras, as estatísticas do IBGE dizem que 39,1 milhões possuem rádio; 38,9% milhões possuem televisões e 37,2 milhões possuem geladeira ou freezer. Ou seja, 80% dos lares brasileiros possuem esses bens. E destaca que, desde 1991, os domicílios com automóvel subiram 42%.

Sem dúvida, ótimas notícias.

Contudo, paralelo a essas boas notícias, persistem as más.

Se, em termos globais, fomos mundialmente reconhecidos como um dos países que mais avançaram positivamente nos indicadores da mortalidade infantil, permanece entre nós flagrante disparidade entre as Regiões Nordeste e Sudeste. Quando, no índice geral, a redução foi de 34,6%, caindo de 45,3 para 29,6 óbitos por mil nascimentos e mortos antes de completar 1 ano de idade - número mais que satisfatório, abaixo do máximo de 33 óbitos por mil estipulado pela Organização das Nações Unidas na década passada -, no Nordeste o índice continua em 44,2 mortes por mil. Em Alagoas, o censo anterior mostrava o absurdo número de 70 mortes por mil, a maior taxa brasileira, comparável à de países africanos em guerra e abandonados à própria sorte.

No censo atual, a Região Norte aparece com 29,2 mortes por mil nascidos, contra 21,2 na Região Centro-Oeste, 20,6 no Sudeste e 19,7 no Sul. Mas, ao final, registra um agravante: neste País ainda morrem milhares e milhares de crianças por causas plenamente evitáveis, como a diarréia.

Ainda sob a ótica das disparidades regionais, o mesmo ocorre nas questões de educação e saneamento básico. Enquanto no Sul a taxa de analfabetos é de 7,8%, no Nordeste é de 26,6%. Oitenta por cento dos lares do Sul têm acesso à rede coletora de esgotos, enquanto nas Regiões Norte e Nordeste, apenas 7,5% das residências contam com esse serviço.

E o mais grave, Sr. Presidente, - que nos obriga a uma profunda meditação - é a constatação de que, entre nós, perpetua a má distribuição de renda.

O estudo do IBGE deixa claro que, mesmo com o aumento do rendimento médio nacional, que passou dos R$302 em 1991, para R$525 no novo milênio, 52% da população ocupada continua a auferir entre um e dois salários-mínimos mensais, contra os mais de 20 salários-mínimos de apenas 2,6% dos mais ricos.

E mais uma vez, mesmo que a pobreza atinja todos os quadrantes da Nação, a superioridade dos pobres sobrevive, exatamente nas regiões menos privilegiadas, isto é, nas Regiões Norte e Nordeste.

Perpétua, também, parece a idéia de que as mulheres são inferiores aos homens nos direitos e obrigações - uma afronta ao inciso I do art. 5° de nossa Carta Magna -, principalmente quando o assunto é retribuição pecuniária. Às mulheres, estejam elas no sul ou no norte, no leste ou no oeste, a média salarial para funções correlatas, ainda persiste em torno de 60% do que percebe o homem.

Sr. Presidente, meus nobres colegas, há muito, mas muito tempo mesmo, que passou a hora de unirmos em os dois Brasis que, queiramos ou não, existem e cujo divisor é representado pelo abismo das desigualdades sociais.

Os trabalhadores brasileiros, aqui e ali, no campo ou nas cidades, técnicos ou executivos, doutores ou braçais, fardados ou civis, merecem participar, com mais justiça e maiores benefícios, da mesa que distribui o bolo da riqueza nacional.

O trabalhador brasileiro merece a contrapartida justa pelo que produz. Merece ser remunerado de forma que garanta, a si e a sua família, acesso ao básico para uma vida mais digna e mais feliz.

É preciso que nós que legislamos e aqueles que executam as leis tenhamos como meta superior a quaisquer outros objetivos uma mais justa distribuição da renda nacional, um legítimo direito individual e social de cada brasileiro.

É preciso, Sr. Presidente, que manchetes como a publicada no Jornal Planalto Central, um semanário da capital do País, não se tornem uma constante entre nós, banalizando a vergonha. Em letras garrafais, a manchete desse semanário estampa que “Trabalho escravo envergonha o País”. E arremata: “Nem a pressão de organismos internacionais é capaz de fazer o Brasil erradicar esse mal... um crime que mancha a imagem do País no exterior.”

Até quando, Sr. Presidente?

Até quando, meus nobres colegas? Como conviver com isso, quando sustentamos o título da oitava economia do mundo? Como justificar a matéria desse semanário que denuncia um aumento de mil por cento no número de trabalhadores escravos no campo, comparado ao número registrado em 1995?

E novamente são citadas as Regiões Norte e Nordeste como as maiores escravocratas do País. Pela ordem, conforme a denúncia, os problemas se concentram nos Estados do Pará, do Maranhão e do Mato Grosso. Em seguida, são citados o Piauí, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás, Tocantins, Acre, Roraima e São Paulo.

A notícia, Sr. Presidente, traz a fonte das denúncias: o próprio Ministério do Trabalho e Emprego, baseada no registro do Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado, o Gertraf.

Causou-me mal-estar ver Roraima, meu Estado, citado neste documento, como também deve estar causando mal aos demais colegas, cujos Estados foram citados. De minha parte, não tenho dúvidas: dos órgãos competentes de meu Estado, exigirei informações mais precisas. Ao Ministério Público Estadual vou solicitar aprofundamento nas investigações e, caso se confirmem tais denúncias, a conseqüente punição de quem pratica tal crime.

Sr. Presidente, meus caros colegas, queria, em atenção aos trabalhadores de meu País, apenas enumerar conquistas. Não foi possível.

Se fui justa ao citar os dados positivos havidos, justa também devo ser ao alertar sobre as injustiças, o desemprego, a angústia e a aflição pelas quais passam milhares e milhares de brasileiros que querem e precisam trabalhar.

Não foi possível, também, diante da afirmação que, na semana passada, fez a revista IstoÉ: “Este ano, o Dia do Trabalho justificaria o codinome de Dia do Desemprego, pois, só na Grande São Paulo, 19,9% da população economicamente ativa, um exército de 1,84 milhão de pessoas, está desempregada”.

Eram essas, Sr. Presidente e meus nobres Colegas, as palavras que gostaria de deixar à reflexão de V. Exªs. E que nos inspire Deus para que, num futuro muito próximo, possamos encontrar o caminho que leve nosso povo à plena realização, o que apenas se consegue com o Trabalho, a Cidadania e a Justiça.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2002 - Página 7872